Dois adolescentes recusavam-se à visitação do pai. Na avaliação, o perito designado pela vara de famíla decidiu gravar em vídeo as sessões conjuntas do pai com os filhos, mesmo sem a concordância dos últimos. Os adolescentes se recusaram a permanecer na sala de exame e, mais tarde, em sessão, relataram o ocorrido ao psiquiatra-assistente que os acompanha desde a separação dos genitores. O psiquiatra-assistente, então, a pedido dos próprios adolescentes, comunicou o fato à mãe (detentora da guarda), que, por intermédio de seu advogado, transmitiu a informação ao juiz. Em decorrência, por determinação judicial, imediatamente foi suspensa a perícia e solicitado ao perito esclarecimento sobre o incidente. Esse fato indica como é importante, mesmo em avaliação pericial, estabelecer-se com a criança e o adolescente um clima de confiança e entendimento, evitando-se, assim, constrangimentos desse tipo.
Os casos judiciais que envolvem crianças e adolescentes, sejam de natureza essencialmente cível, sejam infracionais, geralmente guardam íntima relação com os postulados legais do direito de família. Na primeira hipótese, são comuns as disputas sobre a guarda dos filhos e a necessidade de intervenções que protejam a prole de disputas e condutas inadequadas dos genitores ou familiares próximos. É frequente, também, no âmbito desses litígios, a investigação judicial de suposta exploração sexual e/ou de maus-tratos físicos e/ou psicológicos. Em relação aos atos infracionais cometidos por adolescentes, muitas vezes, deve-se esclarecer o papel da família, que, por alguma razão, está falhando na formação de seu filho. Dessa forma, o psiquiatra forense da criança e do adolescente, além da capacidade técnica de avaliação, deve levar em consideração o mosaico social no qual está inserida a criança ou o adolescente. Assim, contando com a colaboração de uma equipe multidisciplinar, poderá fornecer a melhor orientação e a melhor conduta ao caso concreto.
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