• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 4 – A PREVALÊNCIA DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO

4.4. Da segurança jurídica

Antes da vigência da Reforma Trabalhista, a Justiça do Trabalho sempre analisou acordos e convenções coletivas com certa desconfiança, o que engendrou jurisprudência205 limitante à vontade das partes.

O ordenamento jurídico, aliado a uma cultura sindical ultrapassada, não respeitava, plenamente, a vontade das partes e também não atribuía o devido valor à negociação coletiva de trabalho.

Por tais razões, a insegurança jurídica de normas de convenções ou acordos coletivos de trabalho sempre foi considerada obstáculo para os avanços nas negociações, haja vista a possibilidade de interferência do Estado para desconstituir o que outrora havia sido pactuado.

Logo, é incontroversa que a previsão de segurança jurídica, trazida pela Lei nº 13.467/2017, a qual impõe a prevalência do negociado sobre o legislado, permite aos atores sociais maior liberdade e avanço para que as negociações nos locais de trabalho sejam incentivadas e, principalmente, adaptadas às especificidades dos interesses do ambiente de trabalho.

Nenhum Tribunal ou legislador conhece, de modo íntimo e profundo, os meandros das relações de trabalho tão bem como as partes. Empregado e empregador conhecem a própria rotina diária de trabalho, o que permite com que negociem e acordem o que é bom para ambos, sob fundamento do princípio da autonomia da vontade coletiva.

Constata-se, assim, que as modificações introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, no âmbito das negociações coletivas, devem ser parte integrante da regulação do trabalho no país, fazendo cumprir o preceito constitucional expresso e outrora desdenhado pela jurisprudência.

205 Nesse sentido, podemos citar a decisão proferida pelo TRT da 7ª Região, nos autos nº

0000984-21.2016.5.07.0028, de relatoria do Des. Antônio Marques Cavalcante Filho, publicada no DOE em 16.04.2018.

A prevalência da autonomia da vontade coletiva serve não apenas para o fiel cumprimento dos direitos sindicais fundamentais dos trabalhadores, mas, também, e primordialmente, para a redução dos elevados índices de litigiosidade na Justiça do Trabalho, cumprindo, assim, seu dever de colaboração com o Poder Público, além de proporcionar a existência de efetivos e adequados mecanismos alternativos de soluções extrajudiciais dos conflitos trabalhistas, tais como as convenções e os acordos coletivos de trabalho, conferindo às relações e conflitos, entre o capital e o trabalho, maior segurança jurídica, social e econômica no trato sucessivo de suas relações normativas.

Verifica-se, portanto, que a Lei nº 13.467/17 trouxe alterações relevantes no campo das relações individuais e coletivas de trabalho e que obrigam os intérpretes do Direito à reflexão para reconstruir o Direito do Trabalho sob as novas diretrizes206.

As modificações trazidas foram de substancial relevância, especialmente no âmbito coletivo, quanto à facultatividade da contribuição sindical e quanto à afirmação de valor da autonomia da vontade coletiva para atribuir às negociações maior segurança jurídica, e aos sindicatos, maior responsabilidade negocial.

4.5. Representatividade e Proteção Sindical

Maurício Godinho Delgado207 elucida que, no final do século XIX, surgiram as primeiras associações de trabalhadores livres e assalariados e que a experiência associativa se ampliou no início do século XX. Essas associações eram as “ligas operárias, sociedades de socorro mútuo, sociedades cooperativas

206 JOÃO, Paulo Sérgio. A intervenção mínima do Judiciário na autonomia da vontade coletiva.

Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-ago-24/reflexoes-trabalhistas-intervencao-

minima-judiciario-autonomia-vontade-coletiva. Acesso em: 06 out. 2019.

207 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: LTr, 2013. p.

de obreiros, enfim, diversos tipos de entidades associativas que agregavam trabalhadores por critérios diferenciados”208.

O objetivo de associação e reunião de trabalhadores sempre foi a luta por melhores condições de trabalho, de modo que a barganha e resistência pudesse acontecer de modo equilibrado frente ao poder econômico do empregador. Logo, imperiosa a necessidade de representatividade efetiva dos sindicatos.

Em recente decisão, por 6 (seis) votos a 3 (três), o Supremo Tribunal Federal confirmou a constitucionalidade da alteração trazida pela Lei nº 13.467/2017 quanto a já mencionada facultatividade da contribuição sindical, que ficou condicionada à autorização prévia, expressa e individual do trabalhador.

Paulo Sérgio João209 adverte que:

A autorização prévia, expressa e individual do empregado para que seja realizado o desconto, de acordo com o artigo 579 da CLT, introduzido pela Lei 13.467/17, homenageia o exercício da liberdade sindical individual, de acordo com o que estabelece a Convenção 87 da OIT.

Esse ponto da reforma trabalhista foi objeto de inconformismo de diversas entidades sindicais, o que ensejou a propositura de cerca de 19 (dezenove) Ações Direitas de Inconstitucionalidades (ADI´s), sendo todas julgadas improcedentes pelo STF no mês de junho do ano corrente.

Entre os argumentos da decisão que entendeu pela constitucionalidade da facultatividade da contribuição sindical, ressalta-se a afirmação de deficiência na representatividade dos sindicatos, estando este

208 Ibid. p. 1332-1333.

209 JOÃO, Paulo Sério. Direito à recusa da contribuição sindical aprovada em assembleia.

Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-ago-16/reflexoes-trabalhistas-direito-recusa-

déficit intimamente ligado não só a contribuição obrigatória, mas também ao modelo sindical adotado no Brasil.

A legislação pátria permite a existência de apenas um único sindicato representativo de determinada categoria profissional ou econômica na mesma base territorial, sendo que o sindicato que obtiver primeiro o seu registro para representar determinada categoria o fará “eternamente”, haja vista a impossibilidade legal de criação de outro sindicato no mesmo local, para a mesma categoria210.

O sistema sindical brasileiro ainda determina a representação obrigatória, de modo que mesmo que o trabalhador não seja associado ao sindicato da categoria, este o representará compulsoriamente, sendo o quanto fixado em assembleia e negociação coletiva, incorporado ao seu contrato individual de trabalho, independentemente da sua vontade.

Antes das alterações trazidas pela Reforma Trabalhista, tanto o empregado quanto o empregador, ainda que não associado ao sindicato da categoria, estava obrigado a pagar a contribuição sindical, independentemente de sua efetiva representação ou atuação. Tratava-se da mais alta fonte de receita das entidades sindicais.

Com efeito, não há na Constituição Federal referência à compulsoriedade da contribuição sindical. Há apenas referência à unicidade sindical, o que representa certa incoerência, haja vista o Brasil ser um dos membros fundadores da OIT, que defende a pluralidade sindical.

Dessa forma, Homero Batista Mateus da Silva211 leciona que:

210 BRITO FILHO. José Claudio Monteiro de Brito Filho. Direito Sindical: Análise do Modelo

Brasileiro de Relações Coletivas à Luz do Direito Estrangeiro Comparado e da Doutrina da OIT – Proposta de Inserção da Comissão de Empresa. 7. ed. São Paulo: LTr, 2018. p. 91.

211 SILVA, Homero Batista Mateus da. Comentários à reforma trabalhista. São Paulo: Editora

Nunca fomos capazes de ratificar a Convenção 87 da OIT, que afirma categoricamente a ligação entre o Estado Democrático de Direito e a pluralidade sindical, sendo incompreensível que o país ainda discuta fórmulas rígidas de sindicalização.

O suporte financeiro, garantido outrora pela lei, fez com que boa parte dos sindicatos deixasse de efetivamente representar e buscar atender aos interesses de seus representados. Não é de surpreender que, em 2017, o Brasil alcançasse a margem de 17.200 sindicatos, sendo que apenas 14,4% da classe trabalhadora do país possuía vínculo associativo com a entidade sindical de sua categoria212.

De acordo com a pesquisa fornecida pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), com a Reforma Trabalhista, as receitas dos sindicatos foram reduzidas em cerca de 80% no primeiro trimestre de 2018, em relação ao mesmo período de 2017, caindo de R$ 170 para R$ 34 milhões213. Já as centrais sindicais (CUT, Força Sindical e a UGT) deixaram de arrecadar aproximadamente R$ 100 milhões214.

Os sindicatos, por força da Constituição Federal, representam integralmente a categoria, sendo que a negociação coletiva obriga e beneficia as partes que estão no campo de abrangência dos sindicatos que estabeleceram a negociação.

Sendo assim, visando obter retorno financeiro de seus representados, caberá aos sindicatos traçar nova linha de convencimento, a fim de demonstrar

212 IBGE. Sindicalização cai para 14,4% em 2017, a menor taxa em cinco anos. Disponível em:

https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/22954-

sindicalizacao-cai-para-14-4-em-2017-a-menor-taxa-em-cinco-anos. Acesso em: 06 out. 2019.

213DIEESE. Subsídios para o debate sobre a questão do financiamento sindical. Nota Técnica n.

200, dezembro 2018. Disponível em:

https://www.dieese.org.br/notatecnica/2018/notaTec200financiamentoSindical.pdf. Acesso em:

06 out. 2019.

214 CUT. Central Única dos Trabalhadores. Com reforma trabalhista, sindicatos perdem 80% da

receita no primeiro trimestre. Disponível em: https://www.cut.org.br/noticias/com-reforma-

trabalhista-sindicatos-perdem-80-da-receita-no-primeiro-trimestre-f6e5. Acesso em: 06 out.

a sua relevância na conquista e preservação de direitos para, dessa forma, fortalecer-se de modo orgânico215.

Há agora, mais do que nunca, a imperiosa necessidade de representação efetiva das categorias como forma de sobrevivência das entidades sindicais, que deverá conquistar maior número de associados.

Isso implicará, necessariamente, em uma mudança de postura dos entes sindicais que, obrigatoriamente terão de assegurar e fomentar maior participação de seus representados na organização, gestão, administração e deliberações sindicais, além de buscar, efetivamente, a participação da categoria representada no processo de reivindicação, deflagração, conclusão e aprovação da negociação coletiva ou dissídio de greve, garantindo-lhe, portanto, maior formação, participação e liberdades cívicas efetivas no processo de autogestão, deliberação e autorregulamentação de seus interesses e direitos, enquanto sujeitos livres destinatários de suas próprias escolhas e responsabilidades na ordem jurídica216.

Essa mudança de paradigma trará validade e maior eficácia aos instrumentos normativos autônomos (ACT ou CCT) que atenderão às realidades e especificidades de suas demandas, principalmente, nas hipóteses de prevalência do acordo coletivo sobre a convenção coletiva, ainda que esta última apresente condição mais benéfica.

As inovações trazidas pela Reforma Trabalhista ensejaram, ainda, a participação e o entendimento diretos das entidades sindicais com os organismos de representatividade dos trabalhadores dentro das empresas como, por exemplo, as CIPAs e as Comissões de Representatividade dos

215 JOÃO, Paulo Sérgio. Contribuição Sindical por decisão em assembleia e a exclusão de

trabalhadores. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mar-15/reflexoes-trabalhistas-

questoes-contribuicao-sindical-exclusao-trabalhadores. Acesso em: 06 out. 2019.

216 MACHADO, Marcel Lopes. A validade e eficácia das normas coletivas: mudança de

paradigma interpretativo – Supremo Tribunal Federal e Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista). Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, NE, p. 184, nov., 2017.

Empregados, sendo estas últimas, inovação apresentada pela Lei nº 13.467/2017, cumprindo, assim, com seus deveres e responsabilidades legais.

Walküre Lopes Ribeiro da Silva217 destaca que:

Reconhece-se que o sindicato transcende a esfera de representação de um grupo restrito de trabalhadores e alcança uma dimensão maior ao buscar promover o interesse geral. Para a OIT “as organizações de trabalhadores desempenham uma função que nenhuma outra instituição (especialmente, nenhuma organização não governamental) conseguiu exercer”, pois “dão a palavra aos que trabalham ou querem trabalhar, contribuem para um equilíbrio harmonioso na produção e distribuição dos frutos do crescimento e constituem um fator de integração na sociedade civil”.

Constata-se, assim, que as alterações trazidas pela Lei nº 13.467/2017, confirmadas pelo Supremo Tribunal Federal, consolidaram-se, entre outros, como medida de redução do déficit de representatividade sindical, podendo ser o início de uma reflexão para uma nova organização sindical no Brasil.

As dúvidas que permeiam a Reforma Trabalhista permanecem, mas, certamente, o tema das relações coletivas traz muito aprendizado e desprendimento da prática sindical de mais de 70 anos, fortalecendo a autonomia da vontade e a boa-fé nas negociações coletivas.

217 SILVA, Walküre Lopes Ribeiro da. Representação e representatividade das organizações

sindicais de trabalhadores no contexto da liberdade sindical. Disponível em:

http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:1v4hTkRTHE8J:www.revistas.usp.br/r

fdusp/article/download/67706/70314+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&client=firefox-b-d.

CONCLUSÃO

O presente estudo teve como objetivo propor um novo olhar sobre as relações coletivas de trabalho sem, contudo, perder a essência do pensamento jurídico, buscando demonstrar a possibilidade da coexistência de proteção e desenvolvimento nas relações de emprego.

Sob esse viés, considerando que no âmbito das relações coletivas a supremacia do poder econômico é atenuada, entendemos que a prevalência do negociado sobre o legislado poderá adquirir relevância na reconstrução do direito coletivo.

Deve-se ter em mente que a principal função do Direito do Trabalho é a regulação das relações de trabalho na medida em que, empregados e empregadores merecem amparo da tutela estatal, sendo necessário combinar sua atuação com os interlocutores sociais, resguardando espaço à autonomia da vontade privada coletiva.

Desse modo, a formação do negócio jurídico se dá pela manifestação de vontade que se destina a criar, regulamentar ou extinguir relações jurídicas, devendo ser respeitados os requisitos estabelecidos no art. 104 do Código Civil, quais sejam: capacidade do agente, objeto lícito, possível e determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.

Trazendo o negócio jurídico para o Direito Coletivo do Trabalho, o sindicato, com a representação legal, é o indicado como agente capaz na forma do artigo 104 do Código Civil, sendo essa capacidade adquirida mediante assembleia dos interessados, que autoriza a materialização da vontade coletiva em acordo ou convenção coletiva.

Os sindicatos, por força da Constituição Federal, representam integralmente a categoria, sendo que os termos da negociação coletiva obrigam e beneficiam as partes que estão no campo de abrangência territorial dos sindicatos que estabelecem a negociação.

As alterações trazidas pela Lei nº 13.467/2017 rompem com o círculo vicioso quanto à necessidade de que o fruto da negociação coletiva seja revisto pelo Judiciário que, considerando o sindicato frágil em sua representatividade, geralmente, desqualificava a norma pactuada.

A prevalência do negociado sobre a lei e a intervenção mínima do Judiciário na autonomia da vontade coletiva, no nosso sentir, não visa obstaculizar a prestação jurisdicional, mas garantir que a autonomia da vontade seja a expressão dos interesses manifestados em assembleia, base fundamental e nuclear das relações coletivas do trabalho.

É certo que temas como unicidade e representatividade sindical precisam ser enfrentados, visando o fortalecimento da negociação coletiva. Todavia, independentemente de uma futura reforma sindical, é necessário trabalhar com o modelo vigente, buscando formas de fortalecimento do negócio jurídico coletivo trabalhista.

O modelo sindical brasileiro, criticado pela maior parte da doutrina, antes financiado pela contribuição sindical obrigatória, estimulava o surgimento de inúmeros sindicatos sem representatividade, o que dificultava a formação segura do negócio jurídico trabalhista.

Há, agora, com a nova redação do art. 579, da CLT, a imperiosa necessidade de representação efetiva das categorias como forma de sobrevivência das entidades sindicais, que deverão conquistar o maior número de associados.

Isso implicará, necessariamente, uma mudança de postura dos entes sindicais que, obrigatoriamente, terão de assegurar e fomentar maior participação de seus representados na organização e gestão sindicais, além de buscar, efetivamente, a participação da categoria representada no processo de reivindicação, da negociação coletiva ou dissídio de greve, garantindo-lhes, portanto, maior participação efetiva no processo de autogestão, deliberação e

autorregulamentação de seus interesses e direitos, enquanto sujeitos livres destinatários de suas próprias escolhas e responsabilidades na ordem jurídica.

Essa mudança de paradigma trará validade e maior eficácia aos instrumentos normativos autônomos (ACT ou CCT) que atenderão às realidades e especificidades de suas demandas, principalmente, nas hipóteses de prevalência do acordo coletivo sobre a convenção coletiva, ainda que esta última apresente condição mais benéfica.

Constata-se, assim, que as alterações trazidas pela Lei 13.467/2017, confirmadas pelo Supremo Tribunal Federal, consolidaram-se, entre outros, como medida de redução do déficit de representatividade sindical, podendo ser o início de uma reflexão para uma nova organização sindical no Brasil.

Nesse sentido, defendemos que a Constituição Federal, ao admitir, expressamente, a possiblidade de flexibilização de determinados temas do Direito do Trabalho, conferindo elevado prestígio à negociação coletiva, não pretendeu limitar sua atuação de forma subsidiaria à lei.

Ao ampliar a competência da negociação, a Lei nº 13.467/2017 permite que sejam as normas pactuadas moldadas ao caso em concreto, atendendo integralmente ao interesse das partes naquela ocasião.

O entendimento jurisprudencial vem se amoldando às mudanças trazidas pela Reforma Trabalhista. Tanto assim é, que recentes decisões, proferidas pelo STF, já mencionadas e que seguem como anexo ao presente estudo, oferecem considerável mudança interpretativa sobre os efeitos da negociação coletiva, com especial relevância no aspecto jurídico, já que foram proferidas em sede de repercussão geral e, como tal, possuem os efeitos de conferir estabilidade, coerência e integridade na jurisprudência da Suprema Corte.

Além disso, critérios objetivos podem ser adotados para coibir a prática de negócio jurídico coletivo fraudulento, como por exemplo, a

especificação da abrangência da contratação coletiva, que é essencial para garantir que esta seja, de fato, determinada por necessidades concretas dos empregados e empregadores. Nesse contexto, defendemos a prevalência do acordo sobre a convenção coletiva de trabalho, considerando a especificidade de seus termos ao caso concreto.

Ainda, embora se defenda a prevalência da autonomia da vontade coletiva, não se deve admitir que a contratação in pejus tenha eficácia indeterminada no tempo. Se hoje toda negociação coletiva possui prazo de vigência limitado de dois anos, nos moldes do art. 614, § 3º da CLT, o mesmo deve ocorrer quanto ao instrumento normativo que flexibiliza a lei em desfavor do trabalhador.

Assim, não estando elencado no rol fixado no artigo 611-B, da CLT, como objeto ilícito para compor a convenção ou acordo coletivo de trabalho, às partes caberá o pleno exercício de liberdade da autonomia da vontade coletiva, fixando e determinando entre elas as normas que as regularão.

Defendemos, ainda, que a prevalência da autonomia da vontade coletiva serve não apenas para o fiel cumprimento dos direitos sindicais fundamentais dos trabalhadores, mas, também, para a redução dos elevados índices de litigiosidade na Justiça do Trabalho, conferindo às relações e conflitos, entre o capital e o trabalho, maior segurança jurídica.

Embora se reconheça que os direitos sociais são protegidos como cláusulas pétreas e, portanto, irrenunciáveis, defendemos que tais direitos são passíveis, mediante negociação coletiva, de aplicação alternativa a cada caso concreto, desde que haja a devida compensação que assegure a vedação ao retrocesso social.

O que se constata, portanto, é que cada vez mais o Poder Judiciário tem buscado privilegiar o princípio da autonomia da vontade coletiva, reconhecendo, assim, a validade e eficácia do negócio jurídico coletivo trabalhista.

Por fim, com os pensamentos impressos neste trabalho, entende-se que a negociação coletiva, como forma autocompositiva que é, mostra-se como o melhor meio de solução dos conflitos entre o capital e o trabalho, sendo que a credibilidade de um sistema que privilegia a norma negociada em detrimento da norma legal, deve, indubitavelmente, passar pelo crivo da boa-fé na atuação das partes envolvidas na atividade negocial.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, Antônio Carlos. Negociação Coletiva de Trabalho. São Paulo: Saraiva, 2011.

AGUIAR, Antônio Carlos. O negociado sobre o legislado e a função do sindicato.

Revista do Advogado, São Paulo: AASP, n. 137, p. 9, mar., 2018.

AMARAL, Arnaldo José Duarte do. Estado Democrático de Direito: nova teoria geral do direito do trabalho – adequação e compatibilidade. São Paulo: LTr, 2008.

AMARAL NETO, Francisco dos Santos. A autonomia privada como princípio fundamental da Ordem jurídica. Perspectivas estrutural e funcional: Estudos em homenagem ao Prof. Doutor A. Ferrer-Correia. Boletim da Faculdade de Direito-

Universidade de Coimbra. Coimbra, 1989.

AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia. 4. ed. atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10-1- 2002). São Paulo: Saraiva, 2002.

AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio Jurídico e Declaração Negocial. São Paulo, 1986.

BARBAGELATA, Héctor Hugo. O particularismo do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1996.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2013.

BARROS, Cassio Mesquita. Modernização da CLT à luz da realidade brasileira.

Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – FDUSP, São

Paulo, v. 86, p. 103, 1991.

BATUÍRA, Marcelo da C. Losso Pedroso. Irrenunciabilidade no direito do

trabalho e liberdade: uma abordagem econômica para uma revisão crítica. 2003.

Tese (Doutorado em Direito). Universidade de São Paulo, Faculdade de Direito, São Paulo, 2003.

BERNARDES, Hugo Gueiros. Princípios da Negociação Coletiva. Relações

Coletivas de Trabalho: estudos em homenagem ao Ministro Arnaldo Süssekind.

São Paulo: LTr, 1989.

BETRAN, Ari Possidônio. A autotutela nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 1996.