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No documento o Ator e Seus Duplos (páginas 64-102)

o teatro grego ao teatro popular da Idade Média, as máscaras sempre representaram arquétipos (o poder, o bem, o mal, o demónio), tipos sociais, sempre genéricos. Eram máscaras inteiras que cobriam todo o rosto.

Na Renascença, período em que o homem é considerado o centro do universo, o ator também começa a se afirmar como indivíduo.1S A máscara ainda não é totalmente eliminada mas apresenta-se pela metade. A meia-máscara da Commedia dell’Arte representa bem esse período de transição pois possui um duplo significado: a parte superior - a máscara, propriamente - representa a tradição, o passado; a parte baixa do rosto - com a boca exposta - representa a sensualidade e a

racionalidade, a ousadia contestatória do homem

renascentista. A meia- máscara é uma máscara falante, em que a palavra adquire grande importância na cena, atendendo às exigências do público e às necessidades dos próprios atores. O texto (cannovacio) é fixo e flexível. E também dual: mantém o preestabelecido e apresenta o improviso livre.12 13

12

Esse período é marcado também pelo início do teatro profissional.

13

Em seu artigo “Le rôle du masque dans la formation de 1’acteur”, Jacques Lecoq diz que falar numa meia-máscara é “[...] encontrar a sua voz, sua linguagem, seu estilo de representar”.

Máscaras neutras - neutralização relativa às feições de cada um Pesquisa Teatro de Animação, 2000/2001.

Recriando a própria máscara

O sair de si

A máscara e o objeto, em contracena Laboratório O ator e seus duplos, 2000. Foto de Berenice Farina Rosa.

Brincando - Bonecos de luva

Máscaras expressivas

Cena de A Benfazeja, de João Guimarães Rosa. Foto de Angela Garcia.

Cena de Palomares - Bonecos de luva

Passando emoções

Laboratório O ator e seus duplos, 2000. Foto da autora.

Cenas de O paraíso perdido

Criação coletiva, direção de Joana Albuquerque. Alunos da ECA/USP, 1995. Foto da autora.

Cena de Tempo de espera - Bonecos articulados

Adaptação para bonecos da peça de Aldo Leite. Apresentação de alunos da ECA/USP, 1994-

Descobrindo movimentos e formas

História da batata - Improvisação com objetos Laboratório O ator e seus duplos, 2000. Foto da autora.

A contracena

Objeto e ator

Cena de A Coisa — Vibrações/Luz do Objeto-lmagem

Criação coletiva, direção de Ana Maria Amaral. Montagem de O Casulo, 1989/1990.

Cena de A Coisa - Vibrações/Luz do Objeto-Imagem

Criação coletiva, direção de Ana Maria Amaral. Montagem de O Casulo, 1989/1990.

Assim, da comédia italiana e do teatro de feira francês até o final do século XIX, prepondera um novo tipo de teatro, literário e racionalista. Mas aí também a meia- máscara foi perdendo seu espaço. O ator maquiado substitui a máscara e, sempre centrado no homem, as exacerbações do Romantismo acabam levando o teatro e o ator a um excesso individualista e a uma interpretação exageradamente naturalista.20 Essa tendência só se atenua com o Simbolismo que, surgido no final do século XIX, perdura até hoje.

A máscara é sempre um símbolo, símbolos de realidades próximas e símbolos que fogem à nossa compreensão lógica. Trágicas ou caricatas, referem-se à vida cotidiana natural; já as abstratas pressupõem outro tipo de vida, mais sobrenatural.

Máscaras abstratas são máscaras com pouco ou nenhum referencial do cotidiano humano. Apresentam traços simples, podendo ser geométricos.21 As máscaras abstratas dos surrealistas despertam o onírico. Ambas relacionam-se com idéias, com tipos míticos, com o inconsciente. Apresentam o estranho, despertam o medo, o diabólico, e seu reverso, o divino, o sagrado.

E irrefutável a importância do teatro abstrato no panorama atual das artes cênicas. O teatro abstrato é equivalente ao movimento abstrato que ocorreu nas artes plásticas. “O seu hermetismo”, diz E. T. Kirby, “denuncia a existência de um outro tipo de vida”.22

Desperta suspeitas

20

A maquiagem não deixa de ser também uma máscara, que se taz e refaz a cada dia.

:i

Exemplos de máscaras abstratas são as máscaras africanas, as máscaras dos indígenas brasileiros, e também as máscaras abstratas da Bauhaus.

:: Ver E. T. Kirby, “The Mask: Abstract Theatre, Primitive and Modern”,

em TDR, setembro de 1972.

de uma outra ordem de existência, que transforma e ame- aça a nossa. O incógnito provoca sempre um mal-estar. Existe, segundo Kirby, uma relação entre o teatro abstrato contemporâneo e a magia dos rituais. O teatro abstrato, assim como os rituais, é a-racional, não-pessoal.14 Ambos apresentam o não-homem, o homem-animal, o homem- deus, o super-homem - seres mutantes, enfim. O ator em máscara é o não-indivíduo, seus gestos não são os do cotidiano, tocam, portanto, outras dimensões.

KOMAGCM, Df&tÇÃO,

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teatro Nô do Japão é uma combinação de poesia lírica e dança. Sua origem vem de danças religiosas que se realizavam nos templos em homenagem aos deuses e espíritos dos antepassados. Essas danças eram sempre acompanhadas por máscaras. No início, por influência da índia, as máscaras usadas (gugaku) eram muito grotescas; aos poucos, porém, foram se aperfeiçoando e se tornaram mais delicadas (bugaku).

O teatro Nô reflete o pensamento budista e é importante conhecê-lo para entender esse teatro. A filosofia budista apóia-se sobre dois princípios básicos: mutação do universo e anulação do ego.15 O universo vive em constante mutação e não existe eu nenhum capaz de interromper esse processo ou que possa dominar as leis que

14

A despersonalização do teatro abstrato é semelhante à despersonalização da arte abstrata.

15

Eico Suzuki, Nô, teatro clássico japonês (São Paulo: Editora do Escritor, 1977).

provocam essas mudanças.25 Para se atingir a verdade existe o caminho do esforço próprio e o caminho direto. O cami- nho do esforço próprio é o que se trilha seguindo os ensinamentos de Buda, a filosofia zen e através do exercício da arte (dança, música, poesia). O outro caminho é aquele que se percorre sob inspiração da misericórdia divina, por isso chamado de caminho direto. Os fenômenos do universo ocorrem em vários espaços. Há o espaço dos animais e aves; há o espaço kazurá, dos seres humanos que vivem sob condições de carência, impotência e perecibilidade; o

assurá é o local dos seres divinos que convivem com os

humanos; o inferno são espaços particulares, onde seres inferiores coabitam com os homens em vales, encostas, lugares escuros ou lodosos; há também o céu, lugar que, uma vez atingido, não se perde mais.

O teatro Nô é povoado por deuses, espíritos, monstros, figuras fantásticas da mitologia, em cena representados sempre por máscaras. Com máscaras são também apresentados os personagens femininos e os homens anciãos. Essas máscaras são refinadas peças de escultura, construídas por artistas que seguem técnicas tradicionais. Possuem certas peculiaridades: um lado da máscara é levemente diferente do outro, para mostrar mudanças de sentimento; pela modelagem dos lábios, entreabertos, se a máscara olha para baixo, tem-se a impressão de estar triste, se olha para cima sugere um sorriso; conforme o formato dos olhos, expressa doçura.

Os atores que representam os personagens

masculinos apresentam-se sem máscara. Seus rostos, sem ma- quiagem, são absolutamente neutros, sem qualquer ex-

25

As causas e efeitos podem ser bons ou maus.

pressão fisionómica. Trabalham com gestos simbólicos. São mais de 250 gestos codificados para expressar tristeza, alegria, sono, ciúmes, vingança, tédio. E um tipo de interpretação na qual os atores constroem máscaras corporais e criam em seus rostos máscaras neutras vivas.

No teatro Nô, o protagonista está sempre em viagem, é portanto alguém desligado de seu cotidiano. Em linguagem poética, monólogos, diálogos e coro, em versos arcaicos, são cantados e acompanhados por flautas e tambores. Esses textos não devem ser lidos ou interpretados literalmente, mas sim percebidos como se “estivéssemos ouvindo música”, segundo Fenollosa.26

As peças são de diferentes categorias: as fantásticas; as de diversão; as que tratam do céu; as que tratam dos humanos e dos seres divinos; peças do assurá; peças do

kazurá sobre problemas relativos à fragilidade da condição

humana.27

O teatro Nô não reproduz fatos, não imita a vida, como também os gestos empregados não reproduzem os gestos do cotidiano. A expressão facial dos seus atores é neutra; eles se expressam apenas por meio de símbolos, ritmo, música e canto. O teatro Nô não trata da realidade, mas sintetiza o sentido dos acontecimentos e dos sentimentos como se vistos apenas sob a ótica interior da alma. E, nesse tipo de teatro, a máscara cobre totalmente sua função. Em nossa cultura ocidental houve um processo histórico pelo qual as máscaras foram eliminadas da cena, mas isso hoje já se reverteu: “No início era a máscara”, disse Vigo-Arjena, “[...] por trás da máscara surgiu o ator.

26

Ezra Pound & Emest Fenollosa, The Classic Noh Theatre of Japan (Nova York: New Directions, 1959).

27

E. Suzuki, Nô, teatro clássico japonês, cit.

O ator se apropriou do teatro. E a imagem do homem se apropriou dos símbolos que até então residiam na máscara. A revolução antropocentrista que aconteceu no teatro, entre outras conseqüéncias, transferiu ao autor dramático o fardo da originalidade”.16

Com essas considerações, Vigo- Arjena quer dizer que o que a máscara por si mesma expressa transformou-se numa tarefa que os dramaturgos assumiram, nestes últimos três séculos, tentando colocar em palavras aquilo que a máscara por si mesma fala. E no momento atual, isto é, no processo de retorno à máscara ocorrido ao longo do século XX, vemos surgir um número cada vez mais crescente de grupos e diretores que procuram expressar-se através dela.

O Bread and Puppet é um teatro ligado à vida. E segundo Françoise Kourilsky, entre as décadas de 1960- 1980, foi modelo para grupos que queriam afastar-se do teatro enquanto instituição e aproximar-se da realidade cotidiana. Os seus muitos e variados espetáculos, procissões de protesto ou simples eventos têm todos, em sua dramaturgia, algo em comum. Ainda que pareçam diferentes entre si, seja pelos espaços em que atuam (em rua, igrejas, fábricas ou palco), seja pelos diferentes públicos aos quais se dirigem, têm uma estrutura semelhante.

Peter Schumann, diretor do grupo, não parte de um texto escrito e, mesmo quando parte de histórias da Bíblia, de contos de Grimm ou fábulas de Esopo, não conserva desses textos nem as palavras nem o “espírito”, a história apenas corre paralela. O seu estilo é a narrativa. O próprio Schumann se diz um contador de histórias, e

:s

Miguel Vigo-Arjena, “Dieu ex-masque”, em Puck, n® 8, Charleville- Mézières, Insticut Internacional de la Marionnette, 1995.

nem sempre sente a necessidade de diálogos. No teatro, segundo ele, o diálogo acontece entre duas pessoas e alguém que escuta. Só que esse alguém (o público) não pode intervir, pois a situação teatral impede o público de se manifestar. Em seu teatro, quando existem diálogos, são quase sempre colocados pelo narrador. Françoise Kourilsky explica essa técnica, dando como exemplo um diálogo entre uma mulher e um soldado. O narrador diz: “[...] a mulher falou, meu filho morreu”. Mulher: “[...] meu filho morreu”. O narrador continua: “[...] o soldado diz, eu não sou culpado”. Soldado: “[...] eu não sou culpado”. Os diálogos são colocados pelo narrador e repetidos pelos personagens. No final da peça, os atores fazem perguntas aos personagens, abrindo um diálogo também com o público. Os diálogos, intermediados pelo narrador, são sempre reduzidos ao mínimo e reproduzem a linguagem do dia-a- dia, as conversas do cotidiano.

Outra característica da dramaturgia do Bread and Puppet são os roteiros, que partem de artigos de jornal ou discursos políticos. Por exemplo, o discurso do presidente Johnson, de 1966, em que ele define a sua concepção sobre a “grande sociedade”. Extraindo das mensagens os seus pontos mais cruciais, deixa claro o seu conteúdo. E, contrapondo-se às palavras recitadas pelos atores, as máscaras executam ações que despertam ansiedade no povo, exatamente o contrário do que o discurso pretendia despertar.17

Originalmente escultor, Peter Schumann escolheu o teatro como sua expressão definitiva, porque “[...] no teatro pode-se apontar com o dedo”. O gesto da máscara, e do boneco, tem o poder de exagerar e penetrar fundo

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em nós como “sons que cortam o silêncio”, diz Kourilsky. Tanto os gestos como os sons ou as palavras são muito mais evidentes quando apresentados cada um isoladamente. E no Bread and Puppet a palavra vem sempre separada do som, e o som, separado do gesto. Cada um desses elementos é uma leitura à parte, cada um tem sua importância. Essa técnica reforça a narrativa. Ações, palavras e sons acontecem separadamente - como no Bunraku japonês, onde o recitativo acontece independentemente da ação dos bonecos.30

O Bread and Puppet é um teatro em que não apenas existe um mínimo de palavras, diálogos, como também os gestos e as ações das máscaras e dos bonecos são extremamente sucintos, com um máximo de economia, eliminando todo o supérfluo.

O povo chicano é uma mistura de raças, composta de índios, mexicanos, americanos e hispânicos, que vive na fronteira do México com os Estados Unidos. É uma minoria oprimida que encontrou no Teatro Campesino sua grande expressão.

O Teatro Campesino, atuante desde a década de 1960, é dirigido por Luiz Valdez, um ator antes filiado ao San Francisco Mime Troupe que, seguindo técnicas de interpretação da Commedia deli*Arte, usa a caricatura para satirizar tipos da sociedade rural ou para ressaltar a situação carente dos camponeses que vivem nessa região. Seu teatro está ligado ao movimento sindicalista agrário, organizado por Cesar Chaves. Fundamentalmente um tea-

30

O Bimraku é uma das técnicas do teatro de bonecos do Japão, considerada uma arte trina por apresentar uma parte visual, plástica (os bonecos), uma parte literária (o texto) e a música (o recitativo acompanhado de canto).

tro de máscaras, com elas são colocadas situações e per* sonagens do dia-a-dia. Os patrões capitalistas são caricaturalmente apresentados com feições animalescas, os capatazes têm expressões aterradoras, os rostos dos que se deixam por eles manipular são rígidos, em oposição ao rosto nu, natural, humano dos que se rebelam.

O Teatro Campesino ressalta a presença do índio entre os chícanos. A população indígena mexicana ainda conserva as tradições culturais herdadas dos seus ancestrais, os maias e os astecas, seja no seu cotidiano seja nos seus rituais. Através da apresentação de antigos mitos, o Teatro Campesino constantemente lembra a origem divina do homem.

“As máscaras permitem que se trabalhe o confronto de dois grandes princípios das filosofias asteca e maia, conseguindo uma síntese entre o dualismo asteca de que a

vida está na morte e a morte está na vida, e o princípio maia

de harmonia cosmogónica universal”, segundo Geneviève Fabre.31

No sincretismo cultural desse povo estão sempre presentes arquétipos, como figuras da morte e do diabo, entre outros. Se a morte é um personagem tradicional no teatro mexicano e espanhol, é também “f...j uma realidade cotidiana na vida dos chícanos”.3:

Não tem porém nenhum sentido macabro, nem trágico; ao contrário, empresta leveza, humor, malícia. A máscara, no Teatro Campesino, desperta o riso e ao mesmo tempo a reflexão.

Se o objetivo do teatro de Valdez é despertar uma consciência política, o simples uso de máscaras em suas

31

Geneviève Fabre, “Les masques dans le théâtre américain d’aujourd’hui: le Bread and Puppet Theatre et le Théâtre Campesino", em O. Asían (org.), Le masque, du rice au théâtre (Paris: CNRS, 1985).

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apresentações, por si, já cria um distanciamento natural para sua melhor percepção.

Julie Taymor é uma artista ligada às artes cênicas que fundamentalmente se expressa através de máscaras e bonecos, combinando diferentes formas, gêneros e tradi- ções. Como disse Eileen Blumenthal, Julie Taymor tem um trabalho eclético que abrange não só o teatro como também a ópera e o cinema. Sutilmente incorpora técnicas de teatro japonês, da Indonésia, da Ópera de Pequim, sombras chinesas e do teatro tcheco. Ao utilizar sombras, cria efeitos cinematográficos. Por exemplo: na apresentação de um casario, em que pequeninas janelas pouco a pouco se acendem - percebendo-se através delas silhuetas em movimentos -, tem-se a impressão exata de uma câmara passando.33

Julie Taymor, uma americana de Boston, teve uma precoce e diversificada formação teatral. Suas experiências vão desde uma escola de teatro para crianças à Universidade de Ohio, onde trabalhou com Joseph Chakin, do Open Theatre. Mais tarde, freqüentou a Escola de Jacques Lecoq, em Paris, onde se familiarizou com as máscaras, experiência essa reafirmada depois no contato com o Bread and Puppet. Também importante para sua carreira foi o período em que participou do grupo de Herbert Blau, do California Institute of the Arts. Mais marcante ainda para sua carreira foram os anos que passou na Indonésia, na Academia Nacional de Arte Taman Ismail Marzaki. Impressionou-se com a conexão que percebeu aí

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E. Blumenchal, Julie Taymor, Playing wich Fire (Nova York: Harry N. Abrams, 1995).

existir entre arte e comunidade, uma ligação profunda entre o humano e o divino. E durante os anos que passou em Bali montou Tirai, com um elenco muito heterogéneo. O tema desse trabalho tratava justamente dos confrontos e assimilações culturais. Em Tirai, máscaras estilizadas contracenavam com atores, misturando uma interpreta- ção estilizada e naturalista. Tirai provocou grandes controvérsias, pois, em Bali, os trabalhos criados por estrangeiros sobre a cultura balinesa são vistos (e com razão) com desconfiança. De volta aos Estados Unidos remontou o mesmo espetáculo com atores americanos, obtendo grande sucesso no teatro La Mama. A partir daí sua carreira prosseguiu com êxito. Atualmente, conta com um grande número de produções realizadas nos Estados Unidos, Europa e Ásia. Além de dirigir, esculpe e constrói, ela mesma, suas máscaras e bonecos, sendo também excelente cenógrafa e figurinista.34

Em seu trabalho com máscaras foi fundamental a influência que recebeu de Herbert Blau, dele assimilando, e depois desenvolvendo em seu próprio estilo, exercícios nos quais os atores, para apresentar a essência de uma história, devem buscar o que ele chama de “gesto ideográfico”, ou seja, deve-se passar emoção através de um único gesto. Assim, para expressar amizade e traição, dois atores devem criar, juntos, uma posição de equilíbrio que expresse a amizade e a confiança entre eles; num segundo momento, quando essa amizade é abalada pelo ciúme, a posição corporal muda, pois perdeu-se o equilíbrio que havia entre eles.35 Quando quer expres-

34

Suas máscaras implicam a figura completa do personagem, por isso, para cada máscara ela cria figurinos.

35

E. Blumenthal, Julie Taymor, Playing with Fire, cit.

sar a ambigüidade de um personagem, apresenta, simultaneamente, o rosto e a máscara, ou a máscara e o corpo descoberto.

Nas palavras de Eileen Blumenthal, Julie Taymor “[...] congrega num só quadro elementos de arte da Indonésia, da Itália, do Japão, da Grécia, integrando também palavras, imagens, sons e movimentos, numa experiência muito orgânica”.36

Mas esse conjunto complexo e diferenciado, ao mesmo tempo que colabora para seu sucesso, fazem-na ser vista por alguns como uma coleciona- dora de tradições exóticas. Na verdade, nada mais faz do que expressar a pós-modernidade, onde a miscelânea é a grande característica. De qualquer forma, para nós, interessados na encenação de máscaras e bonecos, é fascinante observar a relevância que esses elementos assumem em seu teatro.

O Mummenschanz é um grupo composto por dois suíços e uma italiana, que se iniciaram na mímica com Jacques Lecoq, em Paris. São eles, André Brossard, Bernie Schurch e Floriana Frasetto. No início, o Mummenschanz trabalhava com máscaras faciais simples, mas o grupo sentiu logo a necessidade de metamorfoseá-las. Tentou então as máscaras maleáveis, que se criavam e se desfaziam à vista do público. Suas máscaras faciais apresentavam, no início, todos os traços de um rosto, mas logo vieram formas mais abstratas. O estágio seguinte foi a descoberta da cabeça-objeto ou máscara-objeto. Mas a verdadeira característica do grupo são as suas máscaras corporais, isto é, máscara-cabeça-corpo.37

36

Ibidem.

Ana Maria Amaral, Teatro de formas animadas, 3â ed. (São Paulo: Edusp, 1997).

As máscaras corporais exigem um grande aprendi' zado de movimentos. Bernie, André e Floriana assimila* ram muito bem os exercícios de máscara neutra da Escola de

No documento o Ator e Seus Duplos (páginas 64-102)