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Das competências e habilidades: o que se espera do professor de

No documento Ensino e pesquisa na educação geográfica (páginas 60-71)

Geografia dos anos iniciais

As habilidades e competências que configuram o exercício da docência se constituem de modo contínuo, passando pela for- mação inicial, através da aquisição dos diversos conhecimentos teóricos e práticos construídos durante o curso de graduação, e que se ampliam durante as ações didáticas e pedagógicas vivenciadas no cotidiano profissional.

O ensino de Geografia nos anos iniciais ocupa um lugar essencial para a formação de crianças. Conforme explicitado,

construiu, ao longo de sua história, um corpo conceitual, uma linguagem metodológica que particulariza suas análises socioes- paciais. Resguardando as devidas particularidades, assim como na ciência, na Geografia Escolar, os conceitos inerentes a esse campo também fazem parte dos conteúdos abordados em sala de aula. Ou, ainda, podemos dizer que os conceitos orientam as possibilidades analíticas dos conteúdos, inclusive os programa- dos para os anos iniciais. Nesse contexto, não se pode conceber uma prática docente que não prepare o profissional de modo a oferecer uma clara compreensão dos conceitos e conteúdos a serem ensinados. Mesmo não sendo o domínio teórico que defina a prática docente, esta será sempre um processo dialógico que se estabelece entre conhecimentos específicos da área que se ensina e os pedagógicos.

Para essa análise, o interesse se volta para uma reflexão sobre quais as habilidades e saberes (geográficos e pedagógicos) compete ao professor de Geografia dos anos iniciais, tendo em vista os objetivos e conceitos apresentados. Sendo o licenciado em Pedagogia o professor que assumirá o ensino dessa área, faz sentido pensar como o curso de formação inicial, no caso, a graduação, tem preparado esse profissional. Aqui, abro um precedente para expor que não é minha intenção discutir o currículo do curso de Pedagogia, nem dar um parecer acerca da formação de seus cursistas. Nossa análise se limita a pensar e a refletir a respeito das questões levantadas, tomando como ponto de partida a minha vivência como professora. No mesmo sentido, as experiências expostas não representam a realidade total da formação inicial dos professores dos anos iniciais; refletem, apenas, uma representação parcial de uma realidade maior e mais complexa.

Nesse processo, cabe à formação inicial, entre outros aspectos, propiciar ao licenciando as condições para que este possa ter clareza da sua função social como professor, e da valorização e pertinência do conhecimento que por ele será lecionado. Ao falar sobre os cursos de formação de professores, Pimenta (2009, p. 17-18, grifo da autora) ressalta:

Para além da finalidade de conferir uma habilitação legal ao exercício profissional da docência, do curso de formação inicial se espera que forme o professor. Ou que colabore para sua formação. [...] Dada a natureza do trabalho docente, que é ensinar, como contribuição ao processo de humanização dos alunos historicamente situados, espera-se da licenciatura que desenvolva nos alunos conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que lhes possibilitem permanentemente irem construindo seus saberes-fazeres docentes a partir das necessidades e desafios que o ensino como prática social lhes coloca no cotidiano.

Compreender o trabalho docente como contribuição ao processo de humanização requer do professor a construção de uma visão que abranja, de um lado, a significação social de sua função e os valores que conferem a sua prática, e do outro, a importância do conhecimento ensinado para a emancipação sociocultural dos seus alunos e de si mesmo. Nesse contexto, urge também a necessidade de se pensar quais instrumentos os cursos de licenciatura têm oferecido aos graduandos para que possam dispor de meios que lhes possibilitem o desenvolvimento inicial das habilidades e competências essenciais ao exercício da docência. Corroborando a perspectiva exposta por Pimenta (2009), Callai (2003), ao se referir especificamente à formação da Geografia, enfatiza o papel da instituição formadora, no sentido de promover ao graduando a aquisição dos conheci- mentos básicos acerca dos métodos e fundamentos científicos

Essa base fundamental para a formação do profissional (seja ele professor ou técnico) deve ser construída pelo sujeito individual, inserido no trabalho coletivo, e o ensino de gradu- ação deve ser realizado de tal modo que possibilite produzir um saber que o habilite ao exercício profissional. Essa não é apenas tarefa do sujeito, mas da instituição [...] A competência profissional é algo que exige uma formação holística, o que supõe o conhecimento e a apropriação dos referenciais teóri- cos fundamentais, o domínio do método da ciência com que trabalha e a possibilidade de saber escolher as técnicas como estratégias operacionais adequadas. Além disso, ter acesso às informações, ao conhecimento historicamente produzido e, principalmente, saber como recuperá-los, organizá-los e como usá-los (CALLAI, 2003, p. 21).

Nessa perspectiva, os fundamentos profissionais ocorrem por meio do domínio teórico/conceitual do conteúdo com que se trabalha em um processo que envolve, simultaneamente, a elaboração individual do sujeito e os subsídios que a sua formação lhe confere. Cabe à instituição oferecer um ensino que permita a construção e a apropriação do conhecimento por parte do aluno. No tocante ao professor de Geografia dos anos iniciais, o processo de formação precisa dar conta das especi- ficidades teóricas e conceituais que abrangem o conhecimento geográfico. Esse domínio guiará sua prática na escolha das estratégias metodológicas que melhor se adéquem à realidade.

Nas palavras da autora supracitada, a competência profissional exige uma formação holística. Um pensamento bastante apropriado no que se refere à docência, que demanda considerar os diversos elementos que envolvem o processo de ensino/aprendizagem para o qual a prática docente se volta. O licenciando em Pedagogia terá sua formação também mediada por outras áreas do saber, entre elas, a Geografia. A compreensão dos saberes pedagógicos e dos conhecimentos

científicos é, nesse sentido, um caminho eficaz na construção das habilidades e competências que se espera desenvolver por parte do professor de Geografia.

No que se refere ao ensino dessa área nos anos inicias, os conceitos de lugar e paisagem, aliados às noções de localização espacial, constituem a base dos conteúdos a serem desenvolvidos nessa fase do ensino, como vimos anteriormente. No entanto, compreender em que consiste cada conceito é imprescindível para que o professor possa construir estratégias didáticas e metodológicas que orientem os educandos na elaboração desses conhecimentos.

A observação em sala de aula me permite construir algumas reflexões que ajudam a pensar o contexto em que alunos de graduação (re)elaboram o conhecimento de natureza geográfica trabalhado na disciplina Ensino de Geografia, e que posteriormente guiará sua prática didática. É importante considerar que os alunos de graduação trazem consigo uma série de conhecimentos geográficos, elaborados no Ensino Fundamental e Médio, e obtidos por meio das relações espaciais que mantêm com os lugares.

Da mesma forma, os conceitos de território, região, lugar e paisagem também fazem parte do imaginário desses alunos, sobretudo porque, a despeito dos sentidos que assumem para a ciência geográfica, também são utilizados por outros ramos do conhecimento e pelo senso comum, e por isso assumem sentidos variados. O desafio inicial consiste em considerar as referências dos alunos e, a partir delas, buscar, com eles, a reelaboração dos conceitos, tendo por base os pressupostos teóricos que conferem especificidade geográfica.

No processo de ensino/aprendizagem da disciplina, as discussões acerca dos conceitos/categorias geográficos de ter- ritório, região, lugar e paisagem têm sido significativas para adotar como estratégia metodológica a realidade vivida por esses alunos, como forma de exemplificar em que consiste cada conceito sob a ótica da Geografia. Dessa forma, a apreensão tem se mostrado mais significativa. Na medida em que os alunos reelaboram o próprio conhecimento geográfico, passam a pensar de forma mais autônoma sobre as possibilidades didáticas e metodológicas que poderão explorar em sala de aula. Desse modo, dialogo com Callai (2003, p. 38), cuja posição é de que:

o próprio curso de graduação deve permitir aos licenciados que exercitem uma prática de sala de aula que não seja a mera repetição de conteúdos transmitidos a cada semestre [...] O professor da universidade deveria dar condições a que o próprio aluno consiga transformar as informações, as leituras, as discussões e exposições em sala de aula em conhecimento organizado por ele próprio, isto é, que faça a construção de sua aprendizagem exatamente aquilo que será exigido dele em sala de aula nos ensinos fundamentais e médio.

Nessa perspectiva, a disciplina assume maior relevân- cia no sentido de proporcionar aos alunos a construção dos conhecimentos e das habilidades que serão desenvolvidos em sua prática pedagógica. Ainda nesse contexto, o processo de apropriação dos conceitos deve ocorrer, levando em conside- ração a relevância de seus pressupostos teóricos, com a leitura e interpretação do espaço. É fundamental que o aluno seja capaz de diferir e articular cada conceito de acordo com suas particularidades. Esse exercício é proposto em sala de aula, por meio de discussões que tratam da realidade local vivenciada pelos alunos, sobretudo quando se discute o conceito de lugar e paisagem, tão empregados nas orientações metodológicas

do ensino de Geografia nos anos iniciais. Essa compreensão favorece o aluno, pois a competência teórica é o que, de certa forma, pode garantir que este, na condição de professor, não faça interpretações equivocadas dos conceitos utilizados, bem como saiba escolher os melhores caminhos para realizar a transposi- ção didática entre o conhecimento de cunho científico e aquele que será trabalho nas salas de aula do Ensino Fundamental.

Ainda no que confere às competências e habilidades, do ponto de vista teórico/prático, fundamentais para a atividade do professor de Geografia, destacam-se as que dizem respeito à chamada alfabetização cartográfica. Alguns autores, entre eles Castrogiovanni (2000), afirmam que muitos professores que atuam nos anos iniciais não foram alfabetizados em Geografia, ou seja, entre outros aspectos, não dominam totalmente as noções básicas de localização, orientação espacial e repre- sentação espacial. A pergunta que se coloca é: como ensinam aquilo que não têm domínio? O resultado que podemos intuir a partir dessa realidade é o de que esses conceitos e habilidades pouco são trabalhados em sala de aula, ou quando são, dão-se de forma insatisfatória. Callai e Callai (2010, p. 65) afirmam que, na ausência de uma orientação clara e segura do que ensinar,

[...] o professor se preserva, trabalhando nada ou muito pouco desta área do conhecimento, ou arrisca-se ensinando o que lhe parece mais adequado. O resultado em qualquer uma das hipóteses tem sido frustrante para alunos, para professores e, por que não, para os pais.

Uma das dificuldades para se evitar que essa realidade se perpetue é sanar algumas das deficiências apresentadas pelos estudantes de licenciatura. Estando no Ensino Superior, sem que tenham a alfabetização cartográfica completa, tor-

difícil, uma vez que nem sempre é possível aprender em uma disciplina de graduação todo o conteúdo que deveria ter sido apreendido durante a Educação Básica.

A exemplo do que ocorre na disciplina Ensino de Geografia, observo que muitos alunos têm dificuldades em compreender as noções básicas de localização e leitura cartográfica. Dessa forma, é preciso encontrar estratégias de ensino que os levem, simultaneamente, a desenvolver seu raciocínio espacial e a cons- truir possibilidades metodológicas que possam ser adaptadas ao contexto da sala de aula em que irão lecionar. O caminho encontrado tem sido trabalhar por meio de oficinas lúdicas nas quais os alunos, sob minha orientação e com base em referên- cias teóricas, desenvolvem atividades práticas empregando as noções de localização cartográfica e representação espacial. Essa tem sido uma experiência positiva para os alunos, ao passo que aprendem e/ou ampliam seus conhecimentos e elaboram alternativas para desenvolver durante a prática docente.

A formação inicial dos professores, inclusive a do pro- fessor de Geografia dos anos inicias, é um ponto estratégico para se alcançar a qualidade do ensino desse componente curricular presente na escola básica. Para esta reflexão, bus- cou-se evidenciar a necessidade de se discutir as habilidades e saberes que são requisitos para a prática docente nessa área. Tomando como referência os objetivos propostos pelos PCN para o ensino de Geografia nos anos inicias e as abordagens de autores e pesquisadores na área de ensino, é possível chegar ao entendimento de que o exercício docente nessa fase da aprendizagem requer do profissional o desenvolvimento de saberes e habilidades que incialmente lhe assegurem a capaci- dade de orientar e mediar os conteúdos e conceitos inerentes à Geografia estudada nos anos iniciais.

Para tanto, espera-se que durante a formação inicial, compreendida aqui como sendo o curso de licenciatura em Pedagogia, seja possível a aquisição e apreensão desses saberes e habilidades, ou parte deles, no tocante aos conceitos e funda- mentos teóricos que especificam o conhecimento produzido pela Geografia, o que reforça, sobremaneira, a qualidade da formação inicial. Não menos importantes são os saberes e habilidades advindos do conhecimento didático/pedagógico que envolve o processo de ensino/aprendizagem, especialmente das crianças, no que se refere à Geografia.

É preciso, portanto, conhecer cada etapa de seu desenvolvimento cognitivo para propor atividades que se adéquem a cada fase. Saberes específicos (geográficos) e pedagógicos não devem ser vistos de modo hierárquico, nem fragmentado, mas compreendidos como uma única fase do processo de ensinar e aprender Geografia. Dessa forma, acredito que a busca pela competência docente inicia-se na formação inicial, na construção de uma sólida base teórico-conceitual e de uma prática que se (re)constitui e se (re)elabora na vivência cotidiana.

Referências

CASTROGIOVANNI, A. C. (Org.). Ensino de geografia: práticas e textu- alização no cotidiano. Porto Alegre: Mediações, 2000.

CASTROGIOVANNI, A. C. Brincar e cartografar com diferentes

mundos geográficos: a alfabetização espacial. 2. ed. Porto Alegre:

EDPUCRS, 2006.

CASTROGIOVANNI, A. C. Geografia em sala de aula: práticas e refle- xões. 5. ed. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2010.

CALLAI, H. C.; CALLAI, J. Grupo, espaço e tempo nas séries iniciais. In: CASTROGIOVANNI, A. C. Geografia em sala de aula: práticas e reflexões. 5. ed. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2010.

CALLAI, H. C. A formação do profissional da geografia. 2. ed. Ijuí: Unijuí, 2003.

CALLAI, H. C. Estudar o lugar para compreender o mundo. In: CASTROGIOVANNI, A. C. (Org.). Ensino de geografia: práticas e textu- alizações no cotidiano. Porto Alegre: Mediação, 2000.

CAVALCANTI, L. S. Geografia, escola e construção do conhecimento. Campinas: Papirus, 1998.

PIMENTA, S. G. (Org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2009.

SANTOS, M. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988. STRAFORINI, R. Ensinar geografia: o desafio da totalidade-mundo nas séries iniciais. 2. ed. São Paulo: Annablume, 2008.

METEOROLÓGICO E ENSINO DE

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