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O uso de técnicas lúdicas audiovisuais: uma alternativa reflexiva para o ensino de Geografia

No documento Ensino e pesquisa na educação geográfica (páginas 115-119)

Para se discutir as técnicas lúdicas audiovisuais e sua ligação com o ensino de Geografia, utilizou-se, como recorte para o estudo, as intervenções pedagógicas realizadas na Escola Estadual 12 de Outubro, situada no bairro de Felipe Camarão, zona oeste de Natal.

A escola foi fundada no ano de 1982 em um dos mais caren- tes bairros da capital do Rio Grande do Norte, onde, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), há uma população total de 52.745 habitantes, com uma renda domiciliar média de 1,1 salário mínimo, a quarta menor renda dentre os bairros da capital potiguar.

Com um número de 600 alunos nos três turnos, sendo 145 alunos no turno noturno, a escola possui destaque regional, uma vez que recebe estudantes oriundos de todos os conjuntos habitacionais circunvizinhos ao bairro de Felipe Camarão, como Bom Pastor, Promorar e Guarapes. Entretanto, apesar da grande quantidade de alunos, muitos deles não possuíam o estímulo necessário para a conclusão de seus estudos, uma vez que, além das dificuldades econômicas e sociais vivenciadas por eles, ainda havia uma deficitária estrutura, especialmente de materiais didáticos que incentivassem os alunos a um maior aprendizado.

Tal quadro estimulou o docente Iapony Rodrigues Galvão, até então vinculado ao Departamento de Práticas Educacionais e Currículo – DPEC/UFRN, juntamente com Kellia de Oliveira Bezerril, então integrante do PIBID (Programa Institucional de Iniciação à Docência), a realizar um trabalho que buscasse um maior aproveitamento dos discentes da escola, especialmente

Jovens e Adultos (EJA). Também foi relevante para a realização desse trabalho o auxílio do professor Adriano Lima Troleis, coordenador do PIBID da área de Geografia/UFRN, o qual dispo- nibilizou outros discentes e recursos didáticos do programa para a realização da atividade. Assim, o trabalho iniciado em maio de 2013 objetivava, além de estimular os alunos a concluírem os seus estudos, um maior aprendizado da ciência geográfica, fugindo de abordagens enfadonhas e desestimulantes.

O grupo iniciou as atividades com diálogos permanentes com os atores sociais envolvidos e com a direção da escola, especialmente com o diretor Antônio Silva, o qual se tornou fundamental para auxiliar na redução de uma resistência inicial por parte do docente de Geografia e até mesmo de alguns alunos.

Em seguida, após a surpreendente constatação de que a escola havia recebido, no ano de 2011, três equipamentos de projeção multimídia e de que existiam dois televisores e dois aparelhos de DVD (disco digital versátil), buscou-se, a partir desta averiguação, o direcionamento para possíveis usos desses recursos lúdicos audiovisuais.

Inicialmente, os alunos do 4° e do 5° ano da EJA, os quais totalizavam 110 dos 145 alunos do turno noturno, começaram a ter acesso, semanalmente, a vídeos e a apresentações em

PowerPoint sobre os assuntos abordados em Geografia nos seus

respectivos níveis. Tal abordagem auxiliou consideravelmente a reduzir as dúvidas dos alunos nos assuntos tratados, além de ampliar as possibilidades de um aprendizado mais eficaz.

Mas, sem dúvida, a grande mudança para os discentes da EJA foi, a partir de agosto de 2013, a utilização efetiva das técnicas lúdicas audiovisuais por parte dos alunos. Eles foram

grupos por sala, uma vez que havia três turmas do 4° ano e três turmas do 5° ano, e foram estimulados a produzir vídeos sobre seu cotidiano, interligando-os aos assuntos abordados na Geografia. Tal atividade tornou-se possível pelo fato de os conteúdos do 4° e do 5° ano permitirem tal ligação, uma vez que o assunto planejado para o 4° ano tratava dos usos da hidrosfera e o 5° ano estudava o mundo do trabalho.

Após mais de um mês de qualificação, a partir de oficinas realizadas com os discentes e com os demais professores de outras disciplinas, os quais também auxiliaram na difusão do projeto, os alunos iniciaram a produção de seus vídeos. Os equipamentos utilizados foram singelos, mas eficientes. Foram usadas máquinas fotográficas e máquinas filmadoras digitais, associadas a um programa gratuito de edição e finalização de textos por cada um dos grupos, os quais também contaram com o apoio técnico oferecido pelos discentes do PIBID envolvidos no projeto.

Após um mês de produção, em outubro de 2013, os doze grupos envolvidos realizaram uma grande exposição dos traba- lhos produzidos na escola. O resultado foi bastante proveitoso, uma vez que os vídeos, com duração média de 15 minutos, apre- sentaram o conteúdo abordado em sala de aula num contexto próximo da realidade dos discentes.

No 4° ano, o tema da hidrosfera foi abordado de forma didática e ao mesmo tempo dinâmica, demonstrando, por exem- plo, a poluição do Rio Potengi, principal manancial existente no bairro e que sofre, na atualidade, um sistemático abandono por parte das autoridades competentes. Essas produções audio- visuais elaboradas pelos discentes levaram os espectadores a refletir sobre um corpo d’água que, muitas vezes, é esquecido pelos moradores, mas que pode transformar-se em uma efetiva

fonte de lazer, quando revitalizado, conforme uma sugestão proposta por um dos grupos, a qual recebeu muitos elogios da equipe responsável pelo projeto.

No 5° ano, a questão do emprego foi tratada de forma a demonstrar os “malabarismos” que muitos dos discentes da escola realizam para manter seus empregos e obter os dividendos necessários para a sua sobrevivência. Os alunos enriqueceram sua apresentação com relevantes dados estatísticos e a utili- zação de conceitos, como os ligados ao trabalho precarizado (informal ou mesmo “circuito inferior”, advindo da teoria do grande geógrafo brasileiro Milton Santos). Os vídeos realizados pelos discentes do 5° ano os ajudaram também a refletir sobre a sua própria situação de vida e sobre a relevância de um ensino eficaz para a ampliação de suas perspectivas para o futuro.

Dessa forma, os vídeos consolidaram as discussões realiza- das em sala de aula e, além de fontes de entretenimento para os alunos, serviram igualmente como fontes de reflexão sobre sua realidade, apontando caminhos para um futuro mais vitorioso para eles. Além disso, os discentes também demonstraram um maior aproveitamento, o qual pode ser creditado, entre outros aspectos, a um maior estímulo dos alunos a frequentarem os bancos escolares, mesmo com o cansaço de uma jornada exaustiva de trabalho, praticada por 80% dos alunos, conforme pesquisa realizada no início do projeto.

Esse estímulo refletiu em um aproveitamento melhor dos discentes e uma reduzida evasão escolar, uma vez que apenas 15,5% dos discentes desistiram dos estudos no ano de 2013, o que demonstrou a eficácia do uso de técnicas lúdicas audiovisuais no ensino de Geografia. O sucesso do projeto, no ano de 2013, levou a uma continuidade por parte da instituição

de ensino em 2014. Tal continuidade comprova que, apesar das notórias dificuldades encaradas por uma comunidade escolar que possui baixos rendimentos, a intervenção contribuiu para reduzir a evasão escolar e ampliar o aprendizado dos discentes.

O paradigma reflexivo e a EJA:

No documento Ensino e pesquisa na educação geográfica (páginas 115-119)