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Estratégias de ensino-pesquisa nos estágios supervisionados de Geografia

No documento Ensino e pesquisa na educação geográfica (páginas 37-44)

Compartilho da visão de Anastasiou e Alves (2004) de que o professor é um “verdadeiro estrategista” que se empenha em pesquisar, selecionar e organizar situações de aprendiza- gem que aliam métodos e técnicas adequadas à construção do conhecimento pelo aluno. E, nesse sentido, procuro, nos estágios supervisionados de Geografia, explorar estratégias que favoreçam a articulação teórico-prática do ensino e da pesquisa, pois, como nos lembra Paulo Freire (2013, p. 30): “Ensinar exige pesquisa. Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que fazeres se encontram um no corpo do outro”.

Partindo desse entendimento, concebo que o principal papel da Geografia Escolar é levar o aluno a compreender a relação dos conteúdos trabalhados com a realidade espacial que o cerca. Realidade esta que é histórica – resulta da relação sociedade-natureza – e também dialética, ou seja, expressa

múltiplas interações entre o lugar vivido do aluno e o mundo por ele percebido/concebido. Assim, a realidade do aluno não se restringe aos limites do lugar de moradia, mas está inserida em um contexto espacial maior – regional, nacional, mundial – e mais complexo – social, político, econômico e cultural.

Essa riqueza da realidade espacial, em tese, deveria fazer da Geografia uma das melhores disciplinas do currículo escolar. Aquela detentora de um bom instrumental para que o aluno fizesse as pontes entre os conteúdos escolares e o mundo real.

Essa “geografia”, ao ser integrada ao currículo da escola, no intuito de motivar os alunos, de fazer ligações com os conteúdos apresentados pela escola, contribui para a res- ponsabilidade do trabalho docente de intervir nos motivos e nos interesses pessoais dos alunos, a fim de, ao mobilizá- -los, mediar os processos de reflexão. (CAVALCANTI, 2012, p. 116-117).

Porém, a Geografia Escolar acabou desenvolvendo-se no mesmo plano de abstração das outras disciplinas, tornando-se uma “tortura” para muitos jovens e crianças que não viam relação entre os conteúdos “repassados” e o espaço vivido ao redor da escola, a natureza, o trabalho dos homens, a vida do campo e da cidade.

No Brasil, na metade do século passado, Pierre Monbeig (1954) já constatava que a Geografia era, para muitos adultos, uma lembrança extremamente penosa da infância. E também já alertava:

O professor de Geografia no curso secundário9 tem obrigação de ser muito prudente e de não pretender pensar em prepa- rar pequenos geógrafos. Sua posição é a mesma de todos os professores de ginásio, cuja missão não é recrutar especialista

desta ou daquela matéria, mas colaborar com todos os seus colegas na formação de mentes capazes de pensar e de criticar (MONBEIG, 1954, p. 6).

Passados quase 70 anos, o alerta de Monbeig permanece

atual10, embora seja necessário reconhecer que “a disciplina

sofreu transformações até significativas, mas ainda mantém con- tinuidades” nas suas metodologias de ensino (ALBUQUERQUE, 2011, p. 27). Para muitos alunos, aprender Geografia permanece uma atividade massacrante na qual a teoria repetidamente memorizada não encontra relação e significância com a prática e, logo, não gera saber que acompanha o aluno por toda a vida.

Apesar dos avanços, esse problema é constatado frequen- temente nos relatórios de estágio e em pesquisas da Geografia e da Educação, levando a inúmeras reflexões cujas propos- tas defendem a superação da chamada Geografia Tradicional (BRABANT, 1993; ALBUQUERQUE, 2011) e a efetivação (para além dos discursos) da Geografia Crítica e Pluralista nas escolas (KAERCHER, 2007; VESENTINI, 2009; CAVALCANTI, 2012). Tais ideias também são tributárias dos novos pressupostos pedagó- gicos que têm, na Didática Crítica e Renovada, instrumentos de orientação do processo de ensino e de ação dos professores (ZABALA, 1998; LIBÂNEO, 2002; CANDAU, 2009).

Nesse contexto, os materiais ou recursos didáticos são alternativas frequentemente apontadas para fazer a ligação 10 Mais recentemente, Lestegás (2002, p. 174, grifo do autor) reforça essa assertiva quando diz: “Saberes científicos e saberes escola- res respondem a finalidades diferentes: enquanto os primeiros buscam seu reconhecimento como ‘verdadeiros’, os conteúdos escolares tratam simplesmente de ser úteis à formação de pes- soas que, em princípio, não serão especialistas nem produtores de novos conhecimentos nas disciplinas correspondentes”.

entre a sala de aula e a realidade. Vários tipos de materiais didáticos têm como função precípua representar a realidade da melhor maneira possível para o aluno.

Todavia, também é conhecido que muitos licenciandos não aprendem, ainda na universidade, a utilizar corretamente esses materiais e muito menos a confeccionar recursos didáticos mais simples que lhes poderão ajudar no trabalho futuro em sala de aula. Ao instituir o estágio como momento de pesquisa na formação inicial do professor, busquei direcionar a ação-re- flexão para a investigação da prática escolar e para a produção de materiais didáticos de baixo custo que contribuam para a melhoria da formação do professor pesquisador.

Pontuschka, Paganelli e Cacete (2009, p. 96) reforçam a importância de tais estratégias para ensinar e aprender Geografia quando afirmam:

Segundo os novos referenciais oficiais (DCN) de formação docente, cabe ao professor da escola básica desenvolver nos alunos uma atitude investigativa, situação em que a pesquisa venha a constituir, ao mesmo tempo, instrumento de ensino e conteúdo de aprendizagem. Ocorre que, para o professor poder cumprir esse objetivo, é imprescindível que ele mesmo tenha aprendido e seja capaz de dominar a habilidade de produzir a pesquisa.

Nessa perspectiva, além de incentivar a pesquisa sobre recursos didáticos para as aulas de Geografia, entendo que a utilização de materiais tradicionais como quadro, mapa e livro didático continua sendo importante, já que são fundamentais para que professores e alunos explorem textos e imagens e desenvolvam habilidades basilares à aprendizagem geográfica, tais como: observação, descrição, correlação, representação, análise e síntese (CALLAI, 2000).

Mas esses recursos, por si sós, não são suficientes, como nenhum outro poderia ser. Cabe ao professor do atual “período técnico-científico-informacional” (SANTOS, 1994) incorporar também recursos modernos, baseados nas multimídias (como o computador, internet, datashow, lousa eletrônica, tablet, etc.) e produzir aulas realmente desafiadoras e significativas para o aluno. Perrenoud (2000) alerta que os professores que não se atualizam com as novas tecnologias ficam defasados e em desvantagem em relação àqueles que fazem uso das multimídias.

Vale a advertência de Passini (2007, p. 103) de que, inde- pendente de serem tradicionais ou tecnológicos, “[...] não são os recursos didáticos que transformam as aulas de reprodução em aulas de construção”. São a intencionalidade do professor, sua criatividade e o compromisso com a profissão os diferenciais da sua ação docente. Zabala (1998, p. 193) ainda ressalta:

De nenhum modo os materiais curriculares podem substituir a atividade construtiva do professor, nem a dos alunos, na aquisição das aprendizagens. Mas são recursos importan- tíssimos que, se bem utilizados, não apenas potencializam o processo como oferecem ideias, propostas e sugestões que enriquecem o trabalho profissional.

Partindo dessa concepção, busco aprimorar a pesquisa e a formação docente nos estágios supervisionados por meio de

oficinas11 que favoreçam “o aprender a fazer melhor o ofício”

(ANASTASIOU; ALVES, 2004, p. 72). Estou cônscio, todavia, de que há uma grande variedade de materiais didáticos, os quais 11 As oficinas tiveram o apoio do Programa de Consolidação das Licenciaturas (Prodocência/Capes) e do Projeto de Melhoria do Ensino que coordenei na UFRN sob o título “O planejamento e a produção de materiais didático-pedagógicos: instrumentos mediadores na docência em História e Geografia”.

devem ser sempre tratados como meios para atingir os objetivos educativos. O conhecimento dessa multiplicidade de recursos pode auxiliar os estagiários no planejamento de sequências didáticas adequadas para o trabalho de diferentes conteúdos (conceituais, procedimentais e atitudinais), nos mais diversos contextos e situações de ensino-aprendizagem que irão enfren- tar no exercício da docência em Geografia.

OFICINA 1: maquetes temáticas, globo e planetário

O uso de folhas e esferas de isopor, massa de modelar, tinta guache, tesoura, lápis de cor e cola pode resultar em maquetes bem criativas sobre o sistema solar, modelados de relevo, placas tectônicas, entre outros temas. Ao associarem tais maquetes com a construção do globo terrestre e do planetário, professores e alunos podem reduzir o grau de abstração que, frequentemente, é encontrado no estudo dos fenômenos naturais responsáveis pela dinâmica da Terra, tais como tectonismo e plutonismo, a distribuição dos continentes, as estações do ano, as coordenadas geográficas, as camadas da Terra e etc. Cabe ainda frisar que as maquetes são recursos tridimensionais que facilitam a compreensão de importantes noções cartográficas como escala, convenções e tipos de representação espacial.

OFICINA 2: jogos artesanais

O uso de materiais simples – como cartolina, papel duplex, dado, pincel, tinta, cola e tesoura – permite a construção de jogos didáticos de baixo custo e de grande aceitação pelos alunos. Tais jogos promovem a vivência do conteúdo por meio da diversão e da competição sadia que potencializa o desen- volvimento cognitivo e humano. Os jogos possuem um forte apelo estético e tanto podem ser produzidos pelos professores quanto pelos alunos.

Fotos: Oficinas dos estágios apresentadas na CIENTEC

Fonte: Arquivo pessoal – UFRN (2013)

OFICINA 3: multimídias e jogos eletrônicos

Os jogos eletrônicos são excelentes recursos para apri- morar o processo de ensino-aprendizagem da Geografia. Várias são as opções disponíveis na internet, em sites especializados como o “Só Geografia” e o “Baixaki”, nos quais há jogos inte- ressantes, como: Montando o Brasil, Blocos Econômicos, Relevo e Clima do Brasil, entre outros. Os professores em formação precisam conhecer e fazer uso dessas ferramentas tecnológicas que hoje são de grande conhecimento e de domínio dos alunos. Tais jogos podem criar um ambiente novo em sala de aula, em que o real e a ficção se relacionam para o surgimento de novas

questões que instigam a aprendizagem espacial (PEREIRA; ARAÚJO; HOLANDA, 2011).

Além de jogos, com o uso do computador e da internet, é possível coletar no portal do IBGE (www.ibge.gov.br) perfis municipais, mapas, gráficos, tabelas e links interessantes (como o IBGE teen) que podem ressignificar o ensino-aprendizagem de Geografia, por meio do enfoque sobre os lugares de vivência dos alunos. Nessa proposta, eles podem ser coautores do saber, não apenas assimilando o conhecimento pronto e instituído nos sites (comparando-se ao livro didático), mas permitindo recriar conceitos geográficos e metodologias de ensino a partir da descoberta de novas informações e recursos.

Fotos: Oficinas promovidas nos estágios em Geografia

Fonte: Arquivo pessoal – UFRN (2013)

No documento Ensino e pesquisa na educação geográfica (páginas 37-44)