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3 FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA

6. A transcrição favorece o processo de análise do texto gravado e, sem ser

3.3.4 Debate público regrado

A escolha pelo gênero textual a ser nosso foco durante o período da pesquisa é consequência de nossa preocupação com a capacidade dos alunos de se posicionarem de forma crítica e embasada frente a qualquer tema. Isso porque, como professora regente da turma, percebi que eles estavam muito “presos” ao senso comum, ou seja, discutiam sobre diversos assuntos, em sala de aula, com base no que pensavam e achavam a respeito de tal tópico.

Por essa razão, decidimos explorar um gênero que promovesse avanços quanto à capacidade argumentativa dos participantes, uma vez que, constantemente, deparamo-nos com situações comunicativas em que precisamos argumentar, a fim de defender nossas ideias e opiniões. Val e Zozzoli (2009, p. 10) afirmam que “a vida em sociedade acarreta inúmeras ocasiões em que uns precisam convencer os outros a atender às suas necessidades e interesses, a abraçar suas ideias”. Por isso, acreditamos que nossa escolha está de acordo não apenas com as questões pedagógicas, como também com as sociais, formando cidadãos mais críticos e reflexivos quando diante de situações que envolvam assuntos polêmicos. Dessa forma, buscamos promover a autonomia dos estudantes envolvidos neste estudo para pesquisar informações que respaldassem suas falas, bem como mudanças referentes a questões comportamentais, como, por exemplo, respeito a opinião do outro, quando diferente da sua.

A partir disso, entendemos que, para tais fins, seria adequado que trabalhássemos com algum gênero textual oral – visto ser o nosso foco a oralidade – pertencente ao campo argumentativo e que admitisse pontos de vista distintos. Dessa forma, decidimos pelo trabalho por meio do debate oral, visto que, segundo Costa (2014):

Este gênero coloca em jogo capacidades humanas fundamentais sob o ponto de vista: (i) linguístico, como as técnicas de retomada do discurso do outro, marcas de refutação, etc.; (ii) cognitivo: como as capacidades crítica e social (escuta e respeito pelo outro) e (iii) individual: como as capacidades de se situar, de tomar posição, de construção de identidade (COSTA, 2014, p. 94, grifos do autor).

Assim, entendemos que o gênero em questão vai ao encontro do que buscamos proporcionar aos alunos ao longo do processo do estudo, pois, conforme Ribeiro (2009, p. 49), o debate “configura-se num importante instrumento de desenvolvimento da oralidade e das capacidades argumentativas”. Após definir o gênero com o qual trabalharíamos, era preciso selecionar o tipo de debate a ser realizado, uma vez que, de acordo com Dolz, Schneuwly e Pietro (2004, p. 215-216), há três formas de debate:

Quadro 37 – Formas de debate a partir de Dolz, Schneuwly e Pietro

FORMAS DE DEBATE DESCRIÇÃO

Debate de opinião de fundo controverso

Tem a “finalidade de influenciar a posição do outro, assim como de precisar ou mesmo modificar a sua própria”. Além disso, esse tipo de debate representa “um poderoso meio não somente de compreender um assunto controverso por suas diferentes facetas, mas também de forjar uma opinião ou de transformá-la” (p. 215).

Debate deliberativo “[...] visa a uma tomada de decisão”, sendo “necessário a cada vez que há escolhas ou interesses opostos” (p. 215-216).

Debate para resolução de problemas

“A oposição inicial é aqui da ordem dos saberes, dos conhecimentos, ou, antes, dos não saberes ou dos saberes parciais: uma solução existe, mas ela não é conhecida e é preciso elaborá-la coletivamente, explorando as contribuições de cada participante” (p. 216).

Fonte: Adaptado pelas autoras desta dissertação a partir de Dolz, Schneuwly e Pietro (2004, p. 215-216).

Dentre essas três possibilidades de debates, poderíamos optar pela primeira apresentada, tendo em vista que busca persuadir o outro, sendo necessário para isso visões opostas em relação a um tema qualquer. No entanto, optamos pela escolha de uma quarta forma de debate: o debate público regrado, o qual se caracteriza, conforme Costa (2014), pela presença de regras e de um mediador – sujeito responsável pela organização e foco dos debatedores.

Esse último tipo de debate apresentado assemelha-se muito com a primeira forma proposta por Dolz, Schneuwly e Pietro, diferenciando-se apenas pela presença das normas que regem a realização do debate e do papel do mediador. Assim, visto que, como mencionado, além da argumentação, tínhamos como foco questões de comportamento, optamos pelo debate público regrado, não apenas pela presença do mediador, como também, e principalmente, pela existência de regras a serem obedecidas.

Além disso, nessa forma de debate, existe a possibilidade de integrar todos os alunos da turma em uma mesma atividade discursiva, assumindo, cada um, papéis e funções distintos, os quais podem ser observados detalhadamente no Apêndice K (p. 356).

Para a realização dos debates, foi necessário definirmos os temas a serem debatidos. Essa escolha foi realizada em conjunto com a turma, conforme os interesses dos alunos, não esquecendo da necessidade de ser um assunto polêmico e que admitisse dois pontos de vista diferentes. Nas palavras de Ribeiro (2009, p. 52), “os temas escolhidos não podem ser tão difíceis que os alunos não dominem, nem tão fáceis que não permitam um avanço cognitivo”. Em relação a isso, Dolz, Schneuwly e Pietro (2004, p. 225), elencam quatro dimensões que devem ser consideradas:

Quadro 38 – Dimensões a serem consideradas na escolha de um tema para o debate

DIMENSÃO DIZ RESPEITO À(S) ...

Psicológica motivações, afetos e interesses dos alunos.

Cognitiva complexidade do tema e repertório dos alunos.

Social espessura social do tema, potencialidades polêmicas, contextos, aspectos éticos, entre outros.

Didática escolha de um tema que não seja muito cotidiano e que comporte aprendizagens.

Fonte: Adaptado pelas autoras desta dissertação a partir de Dolz, Schneuwly e Pietro (2004, p. 225).

Considerando os aspectos já mencionados – interesse dos alunos; necessidade de ser polêmico e possibilidade de duas ideias opostas –, escolheram-se, para os quatro debates realizados, incluindo o debate 4 que não será analisado, os seguintes temas:

Quadro 39 – Temas selecionados pelos alunos para os debates ao longo da pesquisa

DEBATE TEMA

Diagnóstico Pena de morte

Debate 2 Legalização da maconha

Debate 3 Redução da maioridade penal

Debate 4 Pena de morte

Fonte: Elaborado pelas autoras desta dissertação.

Na seção de Análise e discussão dos resultados (p. 179), é possível perceber a influência que o tema tem em relação ao desempenho dos alunos no debate, ou seja, quanto menos interessante o tema para eles, menos eles pesquisavam, acarretando em menor quantidade de argumentos – como argumentos de autoridade ou com dados comprobatórios. Ressaltamos que os debates diagnóstico e 4 tiveram, por coincidência, o mesmo tema porque o último não estava previsto, sendo realizado por solicitação dos alunos em concordância com a PP. Isso reforça nossa concepção quanto à importância de os estudantes participarem do processo de forma ativa, pois a realização do último debate foi possível em razão do trabalho conjunto entre a PP e a turma. Salientamos, entretanto, que o debate 4 não será analisado por dois principais motivos: a) não estava previsto no nosso cronograma de desenvolvimento da pesquisa; b) a análise acarretaria em um grande acréscimo de páginas a esta dissertação.

Nos debates desenvolvidos, havia quatro possibilidades de papéis a serem assumidos pelos alunos participantes: mediador; debatedor; avaliador e plateia. Lembramos que cada grupo teve responsabilidades próprias e que todos os grupos tiveram momentos de fala, ou seja, não apenas mediador e debatedores, como também avaliadores e plateia precisavam expor suas considerações oralmente. Apresentamos a configuração dos debates realizados durante o período da pesquisa:

Figura 7 – Configuração dos debates realizados com a turma

Fonte: Elaborado pelas autoras desta dissertação.

Com essa configuração, foi possível integrarmos todos os alunos ao debate – já que avaliadores e plateia precisavam estar atentos para que, após o debate, expusessem as avaliações referentes à participação dos colegas que debatiam. Ademais, priorizávamos a modalidade oral para exposição dos argumentos e avaliações.