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Decurso do tempo

No documento Direito Administrativo II (páginas 95-97)

Invalidades e desvalores jurídicos do agir administrativo

4) Decurso do tempo

Numa conjugação com expressa disposição legal, o decurso do tempo pode começar por suprir efeitos normais da falta de certas formalidades, tal como sucede com a exigência de pareceres obrigatórios (art. 92º/5) ou mesmo vinculativos (art. 92º/6), numa antecipação preventiva da necessidade de reabilitar futuros efeitos inválidos: o legislador decidiu aqui, em vez de paralisar a conduta administrativa ou de a sujeitar a vício de forma, dispensar a formalidade, flexibilizando a exigência do seu cumprimento ou os efeitos normais decorrentes do seu incumprimento.

Nada disto impede, porém, eventuais efeitos disciplinares para os titulares dos órgãos envolvidos na conduta omissiva que representou o incumprimento da regra geral.

Num sentido mais profundo, o simples decurso do tempo mostra-se passível de reabilitar efeitos inválidos de conduta administrativa em três diferentes cenários:

(1) Em casos de anulabilidade, por efeito da preclusão do prazo para a sua invocação judicial ou para a anulação administrativa das condutas em causa;

(2) Em casos de nulidade, se existir um prazo para a sua arguição, num cenário de “nulidade atípica”, ou, em termos gerais, permitindo até que, por efeito conjugado com outros princípios gerais do ordenamento, se possam atribuir efeitos jurídicos a condutas nulas, justificando-as;

(3) Em situações de inexistência derivada ou consequente, numa aplicação dos princípios gerais subjacentes ao art. 162º/3, o decurso do tempo pode conduzir à atribuição de certos efeitos jurídicos. O decurso do tempo não tem como efeito, porém, sanar a invalidade dos efeitos das condutas administrativas em causa, tornando-as válidas:

a) As situações de anulabilidade não deixam de ser inválidas, antes se observa que o poder judicial deixou de ter a faculdade de as controlar para efeitos de anulação, assim como a Administração Pública deixou de poder proceder à sua anulação.

b) A excecional atribuição de efeitos jurídicos aos casos de nulidade ou até de inexistência derivada, por decurso do tempo, sempre em conjugação com outros princípios gerais do ordenamento atendíveis, não elimina a invalidade das condutas, antes habilita a tutela da aparência e a proteção da confiança, numa modelação de efeitos apostada na justiça do caso concreto.

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Num certo sentido, pode dizer-se que o decurso do tempo, tornando inimpugnável judicialmente uma situação de invalidade, excluindo a sua anulação administrativa ou, por efeito da atribuição de efeitos jurídicos em casos de nulidade, impedindo a sua declaração de nulidade (ou inexistência derivada), gera uma preclusão da relevância operativa da causa geradora da invalidade. Isto conduz à consolidação de situações geradoras de efeitos inválidos ou até à atribuição de efeitos jurídicos a puras situações de facto que, subsistindo há muito, a OJ entende proteger, atendendo até a que a vida administrativa se habituou a que existissem. O decurso do tempo mostra-se passível, deste modo, de transformar uma pura situação de facto numa

situação jurídica, mostrando a sua capacidade de situações nascidas à margem da juridicidade, fora da

juridicidade ou contra a juridicidade, serem integradas dentro do sistema jurídico, justificando-as.

→ A retificação – art. 174º

A retificação, tendo como propósito repor ou estabelecer a integridade ou genuidade de um enunciado linguístico, fazendo-o corresponder ao texto original ou à declaração de vontade efetiva do decisor, limita-se a harmonizar a declaração errada com a vontade real.

Por este motivo, não assume um papel destrutivo ou modificativo de uma anterior vontade decisória, nem visa sanar um vício na formação da vontade; antes tem como único propósito corrigir erros materiais de expressão da vontade real e que sejam facilmente detetáveis ou comprováveis.

A retificação pressupõe a existência de um erro material que, tendo atingido a perfeição da exteriorização ou declaração da vontade administrativa, não gera uma situação de invalidade, pois a gravidade dessa imperfeição mostra-se inidónea a causar uma anulabilidade, antes se consubstancia numa mera

irregularidade.

Assumindo sempre natureza retroativa (art. 174º/2), a retificação pode ser praticada a todo o tempo (art. 174º/1) e pode ser desencadeada por iniciativa da própria Administração ou a pedido dos cidadãos. Uma vez verificada, vincula o órgão competente a retificar: há um dever jurídico de retificar as condutas administrativas feridas de erro material.

Uma vez que a retificação pode ser feita a todo o tempo, poderá suceder que, em cenário de “erros essenciais”, registando-se uma longa vigência do ato passível de ser retificado, se tenham alicerçado situações jurídicas à sombra do erro material, criando expectativas e permitindo investimentos nessa formulação do enunciado jurídico:

- Em tais casos, por força dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, num propósito de tutela da aparência, a retificação nunca poderá deixar de ressalvar efeitos já produzidos, desde que mais

favoráveis ou, pelo menos, fora dos casos de aplicação da lei mais favorável por imperativo constitucional, de

97  REGULAMENTOS

i) Competência – quem pode emanar regulamentos?

 Competência regulamentar alicerçada na CRP – não está na disponibilidade do legislador. As estruturas com competência regulamentar alicerçada na CRP são:

(a) Governo – tem dois tipos de competência regulamentar:

- Competência regulamentar complementar (de execução) – é uma competência que visa pormenorizar aquilo que a lei definiu;

- Regulamentos independentes – são aqueles que não estão diretamente relacionados com uma única lei: podem estar relacionados com várias leis ou alicerçarem-se no art. 199º/g) CRP.

Os regulamentos do Governo são os mais importantes, pelo posicionamento que o Governo tem na estrutura da Administração Pública, pelo conjunto de competências materiais que a CRP atribui ao Governo e porque o Governo, no âmbito dos regulamentos independentes, pratica os decretos-regulamentares (forma mais solene de regulamentos, porque são sujeitos a promulgação por parte do PR).

(b) Regiões autónomas – têm dois tipos de competência regulamentar:

- Regulamentam a legislação regional – regulamentam os decretos-legislativos regionais e regulamentam, em termos independentes, os regulamentos independentes regionais (alicerçados no próprio estatuto político-administrativo);

- Competência regulamentar das leis da República – sempre que os órgãos da República não reservem para o Governo da República essa mesma regulamentação. Esta competência não é apenas das leis da República da área concorrencial: mesmo as das de reserva parlamentar estão sujeitas.

(c) Autarquias locais – tem fundamento na CRP, mas, apesar disso, não há regulamentos autárquicos alicerçados na CRP, ou seja, carecem sempre de precedência de lei.

Os regulamentos das autarquias têm de respeitar os regulamentos das entidades de tutela e o poder regulamentar das autarquias tem ainda de obedecer aos regulamentos dos respetivos municípios.

(d) Universidades Públicas – têm competência regulamentar (art. 76º/2), com duas particularidades: (i) a autonomia regulamentar das Universidades é não só uma competência, mas um direito fundamental e (ii) a competência regulamentar das Universidades limita a reserva de lei, porque a lei não pode esvaziar nem evadir a área de competência das Universidades, designadamente a autonomia estatutária (cada Universidade tem o poder de autodefinição das regras sobre a sua organização e funcionamento). Tudo isto, sem prejuízo de o legislador poder sempre emanar normas que tenham aplicação a título supletivo (supletividade do Direito do Estado).

(e) Associações Públicas e Autoridades Administrativas Independentes (que resultem da CRP). - Competência regulamentar alicerçada na lei. Tem a configuração que o legislador lhe queira dar.

Problemas:

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