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A participação dialógica, alicerçada numa concretização de mecanismos de diálogo entre a Administração e os destinatários das suas decisões, fazendo estes contribuir com a sua visão do

No documento Direito Administrativo II (páginas 75-80)

Regime Comum do Procedimento Administrativo » Aspetos comuns:

A) A exigência de formalidades pode ser uma consequência do devido procedimento legal, adequado ao tipo de decisão a adotar – pode ser a expressão da ideia do procedimento equitativo Sempre que a

2. A participação dialógica, alicerçada numa concretização de mecanismos de diálogo entre a Administração e os destinatários das suas decisões, fazendo estes contribuir com a sua visão do

interesse público para o procedimento, transportando também os seus interesses próprios para uma ponderação decisória final a cargo das estruturas administrativas. A participação dialógica pode assumir duas feições:

(i) Audiência prévia dos interessados – arts. 121º a 124º CPA. Sempre que a Administração toma

uma decisão que é desfavorável ao particular, a Administração está obrigada a ouvir previamente o particular. Ninguém pode ser objeto de uma decisão desfavorável sem que previamente tenha tido a chance de ser ouvido. É uma manifestação do princípio do contraditório e do procedimento equitativo.

Existem três casos em que a preterição da participação tem como consequência a violação do núcleo essencial de direitos fundamentais (o direito a um procedimento equitativo), ou seja, a nulidade:

o Quando estão em causa decisões de natureza sancionatória – ex: procedimentos disciplinares; o Decisões ablativas do direito de propriedade – ex: uma nacionalização, uma expropriação;

o Decisões lesivas de uma liberdade – ex: recusa da entrada de um estrangeiro em território nacional. A audiência prévia é, aqui, um direito fundamental de defesa que, além das situações de aplicabilidade direta nos procedimentos sancionatórios emergentes da CRP, por via da cláusula aberta do art. 16º/1, assume uma natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias.

A audiência prévia dos interessados tem como alicerçe o princípio da participação e, por isso, fora destes casos, a sua preterição não tem como consequência a nulidade e sim a anulabilidade.

A convalidação da ilegalidade decorrente da preterição da audiência prévia dos interessados mostra-se admitida pela jurisprudência do STJ, numa manifestação do princípio do aproveitamento: a ilegalidade pode ser expurgada por via da efetiva realização da audiência ou, em alternativa, pela revelação objetiva dos pressupostos de inexistência ou dispensa desse dever de audiência.

A audiência prévia tem situações em que se justifica a sua preterição – art. 124º - casos de dispensa de

audiência prévia. Compete à Administração a prova de que se está perante um dos casos de dispensa. O

interessado tem legitimidade para contestar a validade da decisão de dispensa de audiência prévia.

(ii) Consulta pública – art. 124º/1 d). Se o número de interessados tornar impraticável a audiência prévia, a lei prevê a sujeição a consulta pública de projetos de regulamento ou de atos administrativos. Esta também pode estar sujeita às situações de dispensa aplicáveis à audiência prévia e a sua preterição determina um vício de forma gerador de anulabilidade.

» Fundamentação:

Tem a ver com a justificação e a transparência da decisão. Tem dois propósitos:

1. É um dever da Administração – impor à Administração que demonstre a coerência do seu percurso decisório; que demonstre, pela justificação, que aqueles pressupostos conduzem àquela decisão. É através da fundamentação que podemos ter presente a causa do ato. É a adequação entre os pressupostos e a decisão.

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2. É uma garantia dos cidadãos – não só sabemos o porquê, como a Administração tem de demonstrar um nexo lógico entre os pressupostos e a decisão. É uma janela que se abre para ver a racionalidade e a coerência da atuação administrativa.

Requisitos da fundamentação – art. 153º:

(a) Tem de ser clara – tem de utilizar uma linguagem percetível, acessível ao cidadão comum;

(b) Tem de ser coerente – entre as razões que justificam e o conteúdo da decisão. É por isso que a decisão obedece a regras de lógica, não pode ser contraditória;

(c) Tem de se mostrar adequada – mas adequada qb (o quanto baste para justificar a decisão), ou seja, tem de ser idónea e suficiente para dar a conhecer as efetivas justificações ponderativas que estiveram subjacentes à decisão.

Duas regras:

- Se a decisão não for clara, ou não for congruente ou não for suficiente, determina-se a falta de

fundamentação.

- A fundamentação é um imperativo constitucional, cuja preterição consubstancia, quando estão em causa atos lesivos de posições jurídicas dos cidadãos, a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental (procedimento equitativo), ou seja, a nulidade.

Nos casos em que a fundamentação não tem a ver com atos administrativos lesivos de posições jurídicas ativas dos cidadãos, a sua preterição gera apenas anulabilidade:

- Quando traduz um imperativo legal;

- Quando traduz a expressão do exercício de um puro poder discricionário do decisor.

A jurisprudência do STA admite, todavia, por força do princípio do aproveitamento dos atos, o seguinte: a) Tratando-se de um ato vinculado, e desde que se tenham respeitado os seus pressupostos legais, se

torne irrelevante a existência de vícios de ilegalidade na fundamentação concreta utilizada;

b) Em igual sentido, verificando-se o mesmo quadro, o juiz não se encontra impedido de negar relevância invalidante à errada fundamentação.

» Publicidade:

A publicidade do agir administrativo, visando informar, num propósito definidor de condutas e, simultaneamente, sujeitar a Administração a escrutínio público, incluindo a controlo judicial imediato, traduz um corolário inerente a um modelo de Estado democrático e a uma sociedade aberta. O propósito é dar a conhecer, tornar transparente a atuação administrativa.

A ausência de publicidade (ex: art. 110º/2 CPA), nunca podendo deixar de ser pautada pelo princípio da proporcionalidade, segundo as suas vertentes da necessidade e da adequação, apenas se justifica ante a ocorrência de iguais valores resultantes da CRP, do Direito Internacional geral ou do DUE (ex: segurança do Estado, reserva da intimidade ou vida privada dos cidadãos, etc).

A publicidade do agir administrativo, sendo passível de incidir sobre o início do procedimento ou face ao projeto de decisão e, num momento posterior, sobre a própria decisão final, incluindo se esta revestir natureza bilateral, permite diferenciar duas realidades autónomas:

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(i) O ato que confere publicidade – ex: notificação ou publicação no jornal oficial, exteriorizando uma declaração de vontade administrativa. O ato de publicidade, sendo a expressão de um subprocedimento formalmente autónomo daquele que esteve subjacente à formação do ato publicitado, mostra-se passível de ter vicissitudes próprias que não se repercutem sobre a validade ou regularidade do ato publicitado.

(ii) O ato que foi publicitado – ex: o regulamento, o ato administrativo, o contrato, enquanto realidade decisória que é objeto da comunicação ou transmissão por via da publicidade.

Meios de publicidade: a) Notificação.

b) Publicação em jornal oficial – seja ele o Diário da República (arts. 101º/1, 112º/4 e 139º), publicação oficial da entidade pública (arts. 101º/1 e 139º) ou Jornal Oficial da União Europeia.

c) Publicação na internet – usando-se o site institucional da entidade administrativa (art. 101º/1 in fine). d) Disponibilização dos atos para consulta dos interessados num serviço público.

e) Afixação nos locais adequados f) Notificação por meio eletrónico.

Por força do art. 268º/3 CRP, todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, têm de ser notificados, o que os torna atos recetícios. Recorta-se aqui um direito fundamental à decisão. A falta de notificação de tais atos torna-os inoponíveis aos respetivos destinatários, inexistindo qualquer dever de obediência ou se sofrer os seus efeitos.

A lei pode ampliar as situações de notificação obrigatória, passando a compreender também decisões que não afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo até a notificação de terceiros face aos destinatários do objeto da notificação, passando aqui a existir um direito fundamental, por via da cláusula aberta do art. 16º/1 CRP.

A notificação obedece a requisitos de conteúdo, falando-se em elementos obrigatórios – art. 114º/2: o A identificação do procedimento, autor e data;

o O corpo da decisão objeto de notificação – o texto ou dispositivo decisório e, se for o caso, a sua fundamentação;

o Os meios de impugnação da decisão e o respetivo prazo.

A falta de publicidade gera ineficácia jurídica do ato, sendo inoponível o seu conteúdo desfavorável aos respetivos destinatários (art. 160º), devendo aplicar-se este mesmo regime às situações de publicidade absolutamente insuficiente e às situações de publicidade que enfermem de uma deficiência lesiva do seu propósito comunicativo típico.

Os atos constitutivos ou ampliadores de direitos produzem efeitos, independentemente de publicação, desde que conhecidos dos seus interessados. Significa que a vinculação do autor a tais atos é independente da sua publicação ou notificação, encontrando-se proibido de livremente os revogar durante esse intervalo de tempo

❖ Forma

Tem a ver com o revestimento externo, com a aparência desses atos. Todas as decisões comportam sempre uma dupla dimensão:

a) Há uma vontade dotada de um conteúdo decisório (decisão material), no caso administrativa formada num determinado contexto procedimental;

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b) Há uma vontade de exteriorizar esse conteúdo decisório material (decisão formal), correspondendo à fase final de um procedimento administrativo ou a uma derradeira subfase autónoma de formalização externa da decisão.

Em Direito Administrativo, a forma traduz o modo de apresentação ou comunicação da manifestação da vontade administrativa.

Há 5 mecanismos que podem dar expressão à forma:

1. Forma escrita – pode ser em suporte de papel ou por via eletrónica; 2. Forma verbal;

3. Formas luminosas ou simbólicas – ex: semáforos ou os demais sinais de trânsito;

4. Formas gestuais ou acústicas – ex: gestos do polícia sinaleiro ou os toques de campainha da escola; 5. Comportamentos factuais concludentes.

A exigência de uma determinada forma especial de exteriorizar a vontade administrativa, sendo dominada por razões de interesse público (sem prejuízo de visar também a proteção de posições jurídicas dos cidadãos), pode assumir diversos propósitos:

 Garantir maior ponderação de interesses e de argumentos ao autor ou autores, numa aplicação atenta do direito;

 Assegurar um reforço da certeza de conteúdo e de autoria dos destinatários;  Facilitar a prova da sua existência e efeitos;

 Tornar mais acessível o seu controlo público.

Em Direito Administrativo, a validade da declaração de vontade administrativa encontra-se dependente do respeito pela forma legalmente prevista, assumindo tais normas uma natureza injuntiva.

Regime no Direito Administrativo:

a) A forma escrita é a regra geral, atendendo a razões de segurança. Para efeitos probatórios, é um

documento autêntico. A forma escrita pode ser imposta pela natureza do ato, sem que exista uma

norma expressa a impor esse modelo de exteriorização (ex: se a lei impõe a publicação ou notificação do ato). Contudo, existem exceções à forma escrita:

- As deliberações dos órgãos colegiais, salvo preceito legal em contrário, são praticadas sob forma oral, encontrando-se a sua eficácia dependente, todavia, de serem exaradas em ata – art. 150º/2;

- Certos contratos que, expressamente por lei, se encontram dispensados de redução a escrito; - As ordens de polícia, atendendo a exigências de imediata execução ou obediência;

- O exercício do poder de direção no âmbito hierárquico mostra-se passível de assumir forma verbal, sem prejuízo da faculdade de o subalterno pedir a transmissão por escrito das ordens ou instruções – art. 271º/2 CRP;

- Os comportamentos factuais concludentes.

b) A cessação ou modificação de uma decisão administrativa deve revestir a forma legalmente prescrita para as declarações iniciais (forma devida, art. 170º/1) – princípio do paralelismo ou identidade das formas – salvo se inicialmente a lei não tiver estabelecido qualquer forma ou tiver sido usada uma forma mais solene do que a legalmente prevista, caso em que deverá ser esta a adotada (forma

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c) A preterição da forma legalmente exigida gera vício de forma que, em certas circunstâncias, pode ter como consequência a nulidade. Por exemplo, art. 161º/2 g). Nos outros casos, a regra é a

anulabilidade (art. 163º/1). Todavia, a falta de certos elementos essenciais de natureza formal pode

gerar nulidade ou até inexistência jurídica (ex: a falta de promulgação ou de referenda ministerial de decreto regulamentar).

Temos ainda de ter presente que pode bem suceder que deparemos com a injustiça resultante de uma invocação da invalidade formal ser feita por quem, tendo dado azo a essa mesma invalidade, vir agora aproveitar-se desse vício, num cenário de “abuso de direito”, violador do princípio da boa fé, à luz da proibição de venire contra factum proprium. Ou, em alternativa, a invocação ser feita num quadro em que todas as

partes tenham combinado não observar a forma legalmente devida, num consenso de informalidade e num

mútuo investimento na confiança.

Em tais casos, num apelo à tutela da materialidade dos interesses em causa decorrentes da unidade do sistema jurídico e ainda dos princípios da justiça e da boa fé, sem prejuízo do possível reforço argumentativo decorrente dos efeitos decorrentes da prescrição aquisitiva, deve entender-se admissível a figura das

inalegibilidades formais: a injuntividade das normas sobre formas, ao nível dos efeitos típicos da nulidade da

preterição da forma legalmente devida, cede perante a tutela da confiança e a proibição do abuso de direito. - Os arts. 283º/4, 283º-A/2 e 3 e 285º/1 CCP e o art. 163º/5 CPA, afastando o efeito anulatório de formas bilaterais e unilaterais do agir administrativo, utilizando argumentação fundada na ideia de ponderação de efeitos, incluindo à luz da proporcionalidade e da boa fé, mostra-se um afloramento da operatividade das inalegabilidades formais no âmbito do procedimento administrativo.

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No documento Direito Administrativo II (páginas 75-80)

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