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Direito Administrativo II

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Academic year: 2021

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Direito Administrativo II

O Procedimento Administrativo (PA)

Divisão em duas grandes partes: 1. A parte geral;

2. A parte especial.

O Procedimento Administrativo é um caminho, uma via. O percurso que conduz a uma decisão. Temos estudado princípios que regem uma decisão (art. 266 CRP) contudo, não é apenas importante o conteúdo da decisão, mas também o caminho que leva a essa decisão.

Ex: Alguém cometeu na realidade um crime, mas a confissão do crime é feita através da tortura. O facto de se ter descoberto a confissão através da tortura, faz com que a aplicação da lei penal não possa ser aplicada. O procedimento administrativo é também uma forma de limitar o poder porque define os termos em que o poder se forma, expressa ou executa uma vontade.

A definição de procedimento administrativo encontra-se no art. 1º CP - Todo o agir administrativo tem uma

decisão material (o conteúdo da decisão) e uma decisão procedimental (o caminho que leva a decisão).

O CPA não esgota as normas de natureza procedimental, mas é o direito subsidiário: quando não há normas, encontramos a sua disciplina no CPA. E se não houver aqui nada que regule a situação em causa? Então, encontra-se a resposta por via analógica ou no funcionamento dos órgãos colegiais - e, quando não há norma específica no âmbito do funcionamento dos órgãos colegiais, aplica-se o Regimento da Assembleia da República.

O procedimento administrativo pode ser:

 De 1º grau- quando pela primeira vez se pede a análise de determinada matéria/situação;  De 2º grau- quando se pede a revisão modificação ou substituição de uma matéria já vista;  De natureza declarativa- diz o Direito;

 De natureza executiva- quando se aplica uma anterior decisão materializando os procedimentos que podem ser materializados em suporte de papel ou eletrónicos ou mistos;

 Simples;

 Complexos/federativos- ex: licenciatura, porque é o conjunto de uma pluralidade de procedimentos. Cada disciplina em cada semestre é um procedimento autónomo. Questão: É um procedimento ou vários? P.O: Trata-se de um único procedimento - o propósito que unifica é o fim (o licenciar alguém em algo) + a média do curso.

NOTA: o procedimento administrativo distingue-se do processo contencioso (que se passa nos tribunais) e do

processo administrativo (que encontra a sua definição no art. 1º/2 CPA)

$ Evolução do Procedimento Administrativo:

 Começou por ser uma preocupação do séc. XX- havia que regular o caminho da AP. A Constituição de 76 impõe também a regulamentação dessa preocupação.

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 Existindo um código de procedimento, não pode deixar de existir o mesmo código a regular a mesma matéria — podem as normas ser revogadas, modificadas, mas não podem deixar de existir num todo - art. 267º/5 CRP.

 O procedimento administrativo limita a arbitrariedade.

 O procedimento administrativo legitima a decisão (legitima democraticamente).  O procedimento administrativo permite uma previsibilidade do agir.

Fontes fundamentais do procedimento administrativo: 1. A natureza interna (Direito Constitucional);

2. A CEDH (DIP de natureza procedimental art.6, nº1); 3. A Carta dos Direitos Fundamentais da UE.

O Procedimento Administrativo pode ter um propósito só de interesse privado - licença para construir uma melhoria -, de interesse público ou de interesse misto – Ex: concurso para catedráticos - interesse público: Universidade, interesse privado: o do candidato.

Natureza do Procedimento Administrativo:

 Atividade administrativa;  Atividade instrumental;

 Cria uma relação jurídico-procedimental;

Fontes do Procedimento Administrativo: o CPA;

o Leis avulsas;

o Usos, procedentes, costumes; o Uma margem de discricionariedade;

o Regulamentos (art. 20º/3 CPA), atos legislativos (art. 78º/3 CPA) ou via contratual (art. 57º e 78º CPA).

NOTA: Nem todas as normas do Procedimento Administrativo são injuntivas- prova: art. 57º CPA; e mesmo as

normas injuntivas podem ceder em casos de estados de necessidade administrativa- art.3º/2 CPA e, existem ainda normas de caráter extra-jurídico.

Principais regras interpretativas a ter em consideração:

1. Princípio da interdição/proibição do formalismo excessivo - art. 8º e art. 108º/2 CPA;

2. Princípio proactione - deve prevalecer a decisão sobre o mérito. Na dúvida, opta-se pela decisão material - art. 108º e 109º CPA;

3. Princípio da economia processual - não se deve impor diligências inúteis - art. 60º/2 CPA; 4. Princípio da segurança e tutela da confiança;

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5. Princípio do justo procedimento/procedimento equitativo/devido procedimento legal - fundamento: art. 266º/2 CRP. Começou por ser sustentado pelo Tribunal Europeu dos direitos do homem com base no art. 6º/1 da CEDH que consagra o devido processo legal.

Estabelece-se então que as pessoas devem ser julgadas respeitando as normas legais. Este devido processo legal não deveria ser só utilizado pelo tribunal, mas também em determinados processos administrativos - AP em matéria de sanções está obrigada a respeitar este princípio.

A carta dos direitos humanos da UE consagra o mesmo no seu art. 41º/1.

P.O.: Este princípio deixou de ser um princípio geral para passar a ser um direito fundamental.

Natureza das Normas Procedimentais:

Art. 56º CPA: o Procedimento Administrativo tanto tem normas jurídicas injuntivas como normas jurídicas

supletivas: sem embargo da disponibilidade aplicativa do conteúdo destas últimas, a verdade é que ambas as

categorias de normas produzem efeitos imperativos- as normas dispositivas se não forem afastadas e substituídas por outras, são tão imperativas quanto as normas injuntivas.

A área de imperatividade das normas procedimentais delimita negativamente:

1. A esfera de discricionariedade do responsável pela direção do procedimento na respetiva estruturação e a margem de autonomia dos diversos intervenientes na prática dos atos instrumentais e preparatórios do ato conclusivo;

2. A competência do órgão competente para essa decisão final.

Nem toda a imperatividade das normas procedimentais goza, no entanto, da mesma força jurídica ou do mesmo tipo de desvalor jurídico em caso de violação: a desconformidade do agir administrativo face às normas procedimentais, correspondendo a casos de violação da imperatividade da sua estatuição, pode obter como resposta a nulidade ou a anulabilidade dos atos ilegais.

A regra é a da anulabilidade, uma vez que a nulidade, envolvendo um regime mais gravoso de privação de efeitos dos atos ilegais que dela enfermam, fica reservada aos casos mais graves de violação da imperatividade das normas jurídicas- as normas procedimentais cuja violação acarrete a nulidade têm uma força jurídica

reforçada face às normas procedimentais cujo desvalor resultante da sua violação se reconduz à

anulabilidade.

Em segundo lugar, o art. 163º/5 CPA dispõe que, mesmo dentro da anulabilidade, há casos em que, apesar de existir violação da normatividade, não se produz o efeito anulatório:

a) Se o conteúdo do ato não pode (legal ou factualmente) ser outro;

b) Se, apesar da preterição da exigência procedimental ou formal, o fim desta foi alcançado; c) Se, sem o vício, o ato teria sido praticado com esse mesmo conteúdo.

Em tais casos, a imperatividade da norma procedimental conhece um último nível de debilitação: o efeito anulatório decorrente da violação de tais normas é afastado pela lei, numa expressão do aproveitamento dos atos inválidos, num claro “esvaziamento do princípio da legalidade e dos direitos procedimentais dos interessados”- ocorre aqui um “golpe” às garantias dos cidadãos, passível de lesar o princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva.

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Este artigo torna-se, assim, uma verdadeira cláusula de inexecução legítima de normas procedimentais, gerando um triplo efeito:

(i) Um aparente sistema rígido de resposta à violação da imperatividade das normas procedimentais encontra aqui uma abertura flexibilizadora da sua vinculatividade;

(ii) A ilegalidade cede lugar à mera irregularidade ou, formalmente, a uma anulabilidade que não produz efeito anulatório;

(iii) Desenvolve-se uma atividade administrativa contra legem que, sem produzir efeito anulatório, acaba sendo aceite pela ordem jurídica.

◊ Os cidadãos como destinatários das normas procedimentais O procedimento administrativo tem dois destinatários típicos:

1. Estruturas administrativas e tribunais;

2. Particulares que se relacionam com a Administração Pública.

As normas procedimentais devem, neste sentido, refletir clareza, objetividade, simplicidade e percetibilidade para o cidadão comum, caso contrário, haverá um cumprimento defeituoso da vinculação emergente do art. 267º/5 CRP.

As normas procedimentais, impondo condutas aos cidadãos ou regulando o modo como a obtenção de determinadas vantagens depende do cumprimento de certas previsões, mostram-se suscetíveis de serem desrespeitadas: a violação das normas procedimentais pelos cidadãos não conhece um único modelo de

sanções. É possível recortar três diferentes efeitos decorrentes dessa violação:

a) Pode significar a preclusão ou preenção do exercício de uma posição jurídica de vantagem ou de um ónus do particular;

b) Pode, em sentido diferente, o desrespeito habilitar o exercício de um poder de livre apreciação da conduta em causa pela Administração ou, em alternativa, justificar a rejeição liminar do requerimento ou o seu indeferimento liminar, o paralisar do procedimento ou a sua extinção, incluindo fundamentar a ausência de dever de resposta;

c) O desrespeito poderá ainda consubstanciar efeitos sancionatórios de natureza pecuniária.

A conduta procedimental da Administração face a um caso concreto não se mostra isenta de produzir efeitos extraprocedimentais- salvo declaração de reserva, essa conduta:

1. Assume um papel autovinculativo para o seu autor;

2. Revela-se passível de servir de base material de gestação de um precedente; 3. Podem alicerçar-se nela situações de investimento da confiança de terceiros.

Mas também os atos jurídicos preparatórios ou instrumentais, assim como meros comportamentos factuais da Administração Pública ao longo do procedimento, habilitam que, por indução, se possa extrair uma regra de conduta aplicável a futuras intervenções administrativas procedimentais.

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5 $ Âmbito aplicativo do CPA

- Aplicação Subjetiva- art. 2º CPA:

❖ Órgãos de todas as entidades públicas, desde que exerçam funções administrativas a título principal (art. 2º/4);

❖ Autoridades públicas que, sem integrarem a Administração Pública, exerçam uma atividade regulada por disposições de Direito Administrativo (art. 2º/1);

❖ Entidades privadas que exerçam poderes públicos ou pautem a sua conduta de modo específico por normas de Direito Administrativo (art. 2º/1).

NOTAS:

1. O CPA pode ainda ser aplicado por privados que não exerçam poderes de autoridade, desde que, ao abrigo da autonomia da vontade, tenham convencionado ou determinado a aplicação das suas normas.

2. Por força de normas de conflitos estrangeiros, desde que remetam para a aplicação do Direito Procedimental português, o CPA pode ser aplicado por autoridades administrativas estrangeiras face a condutas transnacionais e que tenham conexão com a OJ portuguesa.

- Aplicação Material

Nem todas as normas do CPA são aplicáveis por igual a todas as estruturas orgânicas submetidas ao seu complexo normativo:

1. Há normas procedimentais que gozam de aplicação geral, aplicam-se a todas as entidades públicas e privadas que exerçam poderes públicos ou cuja regulação se faça pelo Direito Administrativo:

- Princípios gerais da atividade administrativa (incluindo a atividade técnica e a de gestão privada); - Normas do CPA que concretizam preceitos constitucionais.

Ou seja, a Parte I, III e IV do CPA são aplicáveis a quase todas as entidades, por força do primeiro critério do art. 2º/1 CPA.

2. Há normas que apenas são aplicáveis a certos tipos de atividade administrativa:

- As normas sobre o funcionamento de órgãos (arts. 20º a 52º CPA- Parte II) apenas se aplicam aos órgãos da Administração Pública, devendo deles se excluir:

a) Os órgãos do Estado e das regiões autónomas que não exercem funções administrativas a título principal e, por maioria de razão, aqueles órgãos que nem sequer exercem quaisquer funções administrativas;

b) Os órgãos de entidades privadas que, apesar de exercerem funções administrativas, não integram, à luz do art. 2º/4 CPA, a Administração Pública, salvo e na medida em que exerçam poderes de autoridade.

As normas do CPA são ainda aplicáveis, a título subsidiário, aos procedimentos administrativos especiais (art. 2º/5), devendo entender-se que as disposições que reconhecem garantias apenas poderão ser aplicáveis se aumentarem essas garantias e não se comportarem uma redução ou diminuição face às garantias que já decorrem das normas procedimentais especiais.

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- Aplicação Temporal

O art. 8º/1 do diploma que aprovou o CPA de 2015 (DL nº 4/2015 de 7 de janeiro), estabelece um regime de aplicação no tempo das suas disposições que se resumem nos seguintes termos:

1. A totalidade das disposições do CPA só será aplicável aos procedimentos que se iniciem após a entrada em vigor do novo CPA;

2. Os arts. 53º a 76º e 82º a 134º não se aplicam aos procedimentos administrativos em curso à data da entrada em vigor do CPA de 2015, continuando estes a reger-se, nos referidos domínios dispositivos, pelas normas do CPA de 1991.

- Aplicação Territorial

Não integra o CPA qualquer norma referente à aplicação no espaço das normas procedimentais, numa reiterada omissão de regulação de situações administrativas transnacionais, talvez no pressuposto (errado) de que tais normas apenas se mostram aplicáveis no território português, sem prejuízo da sua aplicabilidade nas embaixadas dos portugueses no estrangeiro.

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Princípios gerais do Procedimento Administrativo

Princípios Regra do Procedimento Administrativo

1. Princípio do Procedimento Equitativo ou Devido Procedimento Legal

Envolve as ideias de justo procedimento ou devido procedimento legal: é uma decorrência do princípio da justiça e, por essa via, do Estado de Direito material.

Fonte Externa: Tribunal Europeu, ampliado pela Carta da UE e depois, em Portugal- art.262º/2 CRP e, cláusula aberta.

Em matérias passíveis de produzir efeitos lesivos para os destinatários, o princípio supra mencionado envolve 8 corolários:

a) Audição prévia dos destinatários- quem é destinatário de uma decisão ou efeito lesivo deve sempre ser chamado a pronunciar-se (Participação Defensiva). Ex: Universidade Inglesa em que o aluno foi expulso e não foi ouvido. O ato foi destruído judicialmente.;

b) Direito de acesso dos interessados aos documentos- a pessoa deve ter conhecimento prévio sobre aquilo que vai ser ouvido. Não basta ter acesso aos documentos, a pessoa tem de dominar a língua em que os documentos se encontram;

c) Faculdade que a pessoa tem de ser acompanhado por um advogado- documentos são escritos em linguagem jurídica. As pessoas não podem criar situações embaraçosas - reforça o procedimento equitativo;

d) Decisão final- esta tem de ser emanada por alguém que é imparcial e que respeita o princípio da igualdade. Estes são elementos essenciais para compor a decisão final;

e) Fundamento da decisão - parte integrante do processo equitativo;

f) Prazo razoável- para tudo: estudar os documentos, dar respostas, etc. Não dar um prazo violável viola o processo equitativo;

g) Publicidade- procedimentos secretos é tudo menos um procedimento equitativo. A transparência e clareza são dadas pela publicidade;

h) Acesso à justiça- a melhor garantia de um justo procedimento é a faculdade de “bater à porta” de um tribunal.

Conclui-se então, o porquê de o princípio em causa ter começado por ser um princípio geral e, ser agora, um direito fundamental. Sem um procedimento equitativo, não haverá efetiva vinculação administrativa ao princípio da justiça, tal como o art. 266º/2 CRP estipula.

A violação do princípio do procedimento equitativo, traduzindo-se na ofensa ao direito fundamental a um procedimento equitativo, mostra-se suscetível de, sem prejuízo de responsabilidade civil por danos morais, gerar um efeito invalidante das respetivas condutas administrativas: se essa violação atingir o “conteúdo essencial” do direito fundamental, a lei determina a nulidade do ato jurídico.

2. Princípio da Adequação Procedimental- art. 56º CPA

Significa que as normas do procedimento têm de ter flexibilidade, têm de poder ser adaptadas a cada fim do procedimento. Significa instrumentalidade das normas do procedimento. Este princípio procura respeitar quatro ideias:

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8 1. Participação;

2. Eficiência; 3. Economicidade; 4. Celeridade.

Este princípio revela-se instrumental e garantístico de um procedimento equitativo: a adequação procedimental existe ao serviço do devido procedimento legal ou de um modelo de procedimento justo e equitativo.

O responsável pela direção do procedimento encontra-se vinculado a exercer os seus poderes discricionários no sentido de estruturar o procedimento administrativo visando a busca da melhor solução ou daquela que se revele mais adequada, idónea e justa ao fim decisório em causa.

Notas:

a) O erro no procedimento: uma falsa representação da adequação do procedimento ao propósito, o escolher o procedimento que não é o mais idóneo.

b) Desvio de poder no procedimento: significa que se alcança um propósito que não é permitido através da instrumentalização do procedimento. Por exemplo, imagine-se que por lei não é permitido o despedimento de funcionários públicos; se eu não despedir, mas extinguir o serviço, com o propósito de pôr termo aos contratos de trabalho subjacentes, estou a utilizar um procedimento para alcançar um fim que é diferente do previsto pela lei.

3. Princípio do Inquisitório- art. 58º CPA

A distinção entre a função administrativa e a função jurisdicional é que a função administrativa toma a iniciativa, não tem como característica a passividade. Ao contrário dos juízes, que apenas decidem os casos que lhes são submetidos, a Administração caracteriza-se pela possibilidade de não aguardar pela participação dos administrados, pode ela mesma desencadear diligências para apurar a factos, cujo conhecimento seja necessário e adequado à tomada de decisão. Não tem de aguardar pelo que se chama princípio do dispositivo. Para além disto, pode ainda recorrer a todos os meios de prova admitidos em Direito.

O princípio do inquisitório, reforçando a centralidade das estruturas administrativas na instrução (fase de apuramento de factos), confere-lhes uma dupla competência:

a) Poder de definir o início do procedimento e/ou de dirigir a sua tramitação- dimensão formal do princípio do inquisitório;

b) Poder de conhecer, selecionar, valorar e ponderar o material instrutório apurado- dimensão material do princípio do inquisitório.

Limites deste princípio:

a) A intervenção do órgão instrutor tem de se mostrar idónea e adequada face ao propósito da sua atuação, não podendo revelar-se excessiva (art. 58º CPA), nem violadora dos limites decorrentes do art. 117º/2 CPA;

b) A intervenção deve conformar-se com o propósito de um procedimento justo, visando a tomada de uma decisão legal e dentro de um prazo razoável- art. 115º/1;

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c) Salvo tratando-se de factos notórios (art. 115º/2 CPA) ou daqueles cujo responsável do procedimento tenha conhecimento em virtude do exercício das suas funções (art. 115º/3), não pode o instrutor substituir-se aos interessados na prova de factos que estes tenham alegado- art. 116º/1;

d) No âmbito de procedimentos desencadeados pelos cidadãos, a intervenção decisória da Administração apenas pode incidir sobre coisa diferente ou mais ampla do que a pedida se existirem motivos de interesse público justificativos- art. 13º/3 CPA.

A distinção entre a função administrativa e jurisdicional é relevante ao nível dos concursos públicos académicos: os membros do júri devem estar limitados às informações que os candidatos apresentam (princípio do dispositivo), ou devem utilizar conhecimentos que têm sobre os candidatos mas que eles omitiram nos CV (princípio do inquisitório). Ex: normalmente os regulamentos destes concursos dizem que compete ao candidato dizer as 5 obras que devem ser avaliadas: o júri pode autonomamente tomar em consideração outras obras que o candidato não mencionou?

Por um lado, isto pode beneficiar o candidato, na medida em que este era distraído e se esqueceu de mencionar obras de que é autor. Mas por outro lado, pode haver contrainteressados, que vêm defender que o candidato não deve ser avaliado por aquilo que não apresentou.

Assim, se o júri tomar em consideração uma obra que o candidato não mencionou e alguém decide que isso não é válido, isso irá viciar a decisão final. Como resolver? O elemento probatório é, portanto, o alicerce de qualquer decisão administrativa. Todas as decisões administrativas são baseadas numa realidade factual. E como se faz a prova? O art. 115º CPA dispõe que em Direito Administrativo são admissíveis todos os meios de prova permitidos pelo Direito. Quem formula a acusação é que tem de provar que a outra pessoa cometeu determinada infração, sendo que a pessoa que está a ser acusada tem direito a refutar as ditas provas e a provar a sua inocência.

A própria Administração, como dispõe o art. 117º, pode solicitar provas. E há ainda ónus, como dispõe o art. 116º.

Livre convicção do decisor- não basta utilizar os meios de prova, é também necessário a apreciação da prova, que está sujeita ao princípio da livre apreciação:

i. O decisor administrativo pode apreciar livremente a admissibilidade e o valor em concreto das provas recolhidas, tendo em consideração a sua atendibilidade e a sua concludência face às circunstâncias, assim como pode, à luz do seu próprio critério, conferir prevalência a uma prova em detrimento de outra;

ii. Há aqui um apelo à íntima convicção do decisor, alicerçada no material probatório recolhido, numa valoração racional e crítica, à luz de regras de lógica, de máximas de experiência e do saber científico, num propósito de alcançar a verdade material.

Convém referir que nem todos os meios de prova têm o mesmo peso, daí que o decisor possa apreciar livremente- liberdade probatória- através de um juízo de ponderação na apreciação dos dados sempre tendo como fim o encontrar uma decisão justa.

Note-se que a livre apreciação da prova não se reconduz à discricionariedade administrativa:

a. Não há aqui qualquer escolha entre duas ou mais soluções legalmente possíveis, antes existe um juízo que envolve uma operação intelectual de natureza subjetivo-valorativa ou técnico-valorativa;

b. Fala-se, neste contexto, em “liberdade probatória”, que se mostra um conceito operativo em toda a atuação administrativa: trata-se de uma “liberdade de apreciação e fixação de factos”, sem envolver

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“a escolha de uma entre várias decisões possíveis”, mas antes vinculada a escolher a solução justa, segundo o prudente juízo do decisor;

c. A liberdade probatória, sem ser uma verdadeira liberdade, reconduz-se a uma ponderação valorativa probatória a cargo da Administração Pública.

O ideal é que a verdade procedimental seja igual à verdade real, mas nem sempre isso acontece. Podem dar-se como provados factos que não ocorreram e dar-dar-se como não provados factos que realmente aconteceram. Cada vez há mais problemas no Estado Preventivo, aquele que antecipa riscos, que procura antecipadamente combater os danos e perigos que antecipa. O princípio da precaução conduz a que muitas vezes, ante a natureza perigosa ou potencialmente perigosa de determinada conduta, tenham de se tomar medidas. Ex: riscos para a saúde decorrentes de determinado tipo de medicamentos; não é preciso que se prove que o medicamento provocou um determinado dano para que seja retirado do mercado.

Inversão do ónus- a Administração não terá o ónus de provar que aquela atuação é perigosa, podendo atuar

como medida de precaução. Devolve para os interessados o ónus a demonstrar que assim não sucede.

4. Princípio da Colaboração- art. 11º CPA

A colaboração procedimental entre todos os intervenientes, visando obter, dentro de um propósito de brevidade e eficácia, a decisão final, podendo falar-se no procedimento como uma “comunidade de trabalho”, desdobra-se em três mecanismos de colaboração :

- Colaboração da Administração com os particulares- art. 60º e 11º; - Colaboração dos particulares com a Administração- art. 60º; Três deveres:

1. Dever de legalidade- a intervenção procedimental dos interessados insere-se num contexto de “obtenção de decisões legais e justas”, motivo pelo qual não deverão formular pretensões ilegais ou contrárias à justiça.

2. Dever de veracidade- os particulares só devem colaborar com base na veracidade e devem promover o esclarecimento dos factos e a descoberta da verdade.

3. Dever de eficiência- os interessados estão obrigados a não requerer diligências inúteis ou recorrer a expedientes dilatórios, visando que a instrução e a decisão ocorram num prazo razoável.

- Colaboração entre os órgãos da Administração- art. 66º.

5. Princípio da Preferência pela Utilização dos Meios Eletrónicos- art. 61º CPA

A instrução dos procedimentos deve ser feita, preferencialmente, através de meios eletrónicos, visando um aumento das garantias, uma melhor acessibilidade, mais eficiência e maior celeridade.

Não pode levar a uma situação de desigualdade entre quem domina os meios eletrónicos e quem não domina.

6. Princípio da Participação dos Interessados- art. 267º CRP

É expressão de um modelo democrático de Administração Pública alicerçado na cidadania administrativa e traduz uma exigência do procedimento regulamentar e também dos atos administrativos, sendo essa

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participação garantida nos contratos através da sua sujeição a procedimentos administrativos concursais. Concretiza princípios constitucionais. Esta participação pode ser individual (uma ou várias pessoas individualmente consideradas) ou coletiva (associações, ex: ordem dos advogados).

A participação é uma manifestação de colaboração, pode ser uma expressão do direito ao contraditório (sendo aqui um direito fundamental).

A participação procedimental dos interessados assume ainda a natureza de princípio geral do agir administrativo, sujeitando a conduta da Administração a um duplo dever:

a) O dever de colaborar no sentido de garantir uma efetiva participação aos interessados: prestando informações, apoiando e estimulando as iniciativas, sugestões e informações dos particulares; b) O dever de audiência prévia (art. 12º CPA), envolvendo a obrigação de ponderar os interesses e a

factualidade que os interessados “transportam” para o procedimento, à luz da prossecução do interesse público e das coordenadas de um procedimento equitativo.

7. Princípio da Boa Administração- art. 5º CPA

Boa administração tanto pode ser quanto a uma boa decisão final- vertente substantiva da administração- ou quanto ao caminho- vertente procedimental da administração.

A boa administração encontra-se hoje, por força do art. 41º Carta dos Direitos Fundamentais da UE, subjetivada, falando-se num “direito a uma boa administração”, o qual envolve a noção de procedimento equitativo:

i) Postula uma dimensão procedimental do agir administrativo que garanta o direito fundamental a um procedimento equitativo;

ii) Uma conduta procedimental atentatória da boa administração, sendo passível de lesar os princípios da equidade, imparcialidade, celeridade, contraditório, fundamentação, transparência e publicidade, pode bem consubstanciar-se numa simultânea violação de direitos fundamentais.

Concretiza-se em:

o Desburocratização- simplicidade e simplificação de atos e de trâmites procedimentais; o Eficiência- ótima utilização dos meios, uma maximização dos resultados;

o Economicidade- exige o mínimo de custos e o máximo de vantagens; o Celeridade- apelo à razoabilidade de prazos de decisão;

o Aproximação dos serviços às populações.

Art. 77º a 81º- mecanismos que visam reunir os órgãos decisores ad hoc nas conferências procedimentais.

8. Princípio da Decisão- art. 13º/1 CPA

Toda a pretensão que for dirigida à Administração merece uma resposta. É uma consequência do princípio da participação: não teria utilidade se todos pudessemos participar e a Administração olhasse para o lado. Alicerça-se numa postura de respeito administrativo pelos seus interlocutores, expressão do entendimento de que se está perante cidadãos e não súbditos ou simples administrados.

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Corresponde a um direito fundamental de todos os cidadãos, que resulta do art. 268º/6 da CRP e implicitamente do 52º/1 CRP.

Tipos de decisão que podem existir:

i. Decisão de rejeição liminar ou indeferimento liminar- a Administração nem olha para o conteúdo do que se pede, nem se vai pronunciar sobre o que é pedido. Ex: quando um pedido de revisão é apresentado extemporaneamente ou quando o pedido formulado por A relativamente a saber as notas de B.

ii. Solicitar o aperfeiçoamento- antes de apreciar o conteúdo pedido, solicita a legitimidade de tal pedido.

iii. Pronuncia-se sobre o conteúdo do pedido, deferindo ou indeferindo o pedido.

Há ainda casos em que o pedido foi feito a órgão incompetente, sendo que a AP deve informar o requerente que remeteu o pedido para o órgão competente; e casos em que há um dever de informar que não existe o dever de decidir (art. 13º/2).

O direito a obter uma resposta da Administração Pública tem sempre como referência um prazo razoável de decisão:

a) Um atraso injustificado de resposta equivale a uma recusa de decisão;

b) A exigência de que as decisões administrativas sejam proferidas num prazo razoável é hoje, por força do art. 41º CDFUE, um direito fundamental.

9. Princípio do Caso Decidido (ou Julgado) Administrativo

As decisões administrativas que põem termo ao procedimento são modificáveis ou imodificáveis? Quando a Administração decide um caso concreto, essa sua decisão que põe termo ao procedimento, não pode voltar a ser discutida, formando caso decidido administrativo; ou, pelo contrário, as decisões podem sempre ser modificadas?

Estão em causa dois princípios: o da tutela da confiança e da segurança jurídica (que apontam para a imodificabilidade) e o da melhor prossecução do interesse público (que aponta para a modificabilidade). É importante ter em conta:

1. Se a imodificabilidade da decisão se refere apenas a questões de índole procedimental ou processual, sem ter que ver com o conteúdo do ato, numa situação de impossbilidade de o ato ser impugnado, envolvendo apenas as partes desse mesmo procedimento em concreto, diz-se que estamos diante de um caso decidido formal.

2. Se a imodificabilidade da decisão diz respeito à relação material ou substantiva subjacente, incidindo sobre o conteúdo do ato, numa eficácia que extravasa o procedimento em que foi proferida, assumindo uma natureza erga omnes, deparamos com um caso decidido material.

Então, podem as decisões administrativas resistir a futuras decisões contrárias? Podem ser revogadas ou anuladas pela própria Administração? Se a resposta for não, então há imodificabilidade e caso decidido administrativo. À luz da conceção tradicional, o caso decidido ocorre sempre que, precludido o prazo para as

decisões administrativas serem objeto de impugnação, o tribunal (ou a própria Administração) deixe de as

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Para responder à questão, há uma distinção que é essencial: O ato administrativo constitui direitos ou não? Porque se constitui direitos e estes foram constituídos validamente, a regra no direito português é a sua

imodificabilidade, exceto casos de concordância do interessado.

Mas se o ato administrativo não constitui direitos, se está em causa situações de facto, e se essa situação

variar, poderá haver modificabilidade da decisão; mas se a situação de facto é invariável, reportada ao

passado e insuscetível de ser alterada no futuro, a regra é a de que a decisão administrativa é imodificável e formou caso decidido.

Por exemplo, A termina a licenciatura pela feitura da última cadeira. A feitura da última cadeira leva à licenciatura e, a partir desse momento, A tem uma situação de facto imodificável.

10. Princípio da Administração Aberta- art. 17º/1 CPA

Significa uma Administração visível e transparente. O art. 17º/1 CPA, seguindo o postulado pelo art. 268º/2 CRP, reconduz a administração aberta ao direito que os cidadãos têm de acesso aos arquivos e aos registos administrativos, assim como direito a uma cópia desses documentos, procurando inteirar-se da atividade desenvolvida pelas estruturas administrativas.

Este princípio tem limites, como a segurança, o segredo de Estado ou a investigação criminal, o sigilo fiscal e a privacidade das pessoas.

Ex: num concurso público aparecem 3 candidatos para uma vaga. Esses 3 são avaliados: pode o candidato A tomar conhecimento da avaliação de B, nomeadamente para averiguar se foi respeitada a imparcialidade? Haverá aqui um princípio de transparência?

11. Princípio da Gratuitidade do Procedimento Administrativo- art. 15º/1 CPA

Por via de regra, o procedimento administrativo é gratuito, salvo se a lei impuser o pagamento de taxas por despesas, encargos ou outros custos suportados pela Administração: esse é o alcance imediato do art. 15º/1. Noutro sentido, o mesmo artigo permite extrair a criação de um princípio geral de reserva de lei na derrogação ao postulado da gratuitidade:

i. Se não existirem leis especiais a prever o pagamento de taxas ou outras despesas decorrentes do procedimento administrativo, nenhum regulamento as poderá criar;

ii. Quaisquer atos que criem a obrigação de pagamento de uma taxa ou qualquer despesa procedimental, sem estar prevista em lei, são nulos- art. 161º/2 k).

12. Princípio do Uso da Língua Portuguesa- art. 54º CPA

O art. 54º impõe o uso da língua portuguesa, o que traduz um elemento concretizador da identidade cultural prevista na Constituição.

Se as entidades públicas impuserem, na sua relação com os cidadãos, a língua estrangeira, essa atitude é inválida e qualquer decisão administrativa dela emergente também será inválida.

Será, então, admissível que uma faculdade possa lecionar em língua inglesa uma cadeira de direito português a alunos portugueses? Claramente que não.

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Outra questão relevante é a do acordo ortográfico e se alguém poderá ser penalizado por não utilizar o acordo ortográfico.

13. Princípio da Cooperação Leal na UE- art. 19º CPA

Tendo a sua fonte no Tratado da UE, o princípio da cooperação leal vincula a Administração Pública portuguesa a relacionar-se com a Administração dos outros Estados-membros e, por identidade de razão, com a Administração da própria UE, dentro do prazo que tenha sido estabelecido ou, na sua falta, dentro do prazo razoável a uma cooperação leal.

A cooperação leal pode envolver a prestação de informações, o apresentar de propostas ou quaisquer outras formas de colaboração entre as Administrações públicas da UE e dos restantes Estados, devendo o seu conteúdo ser densificado, interpretado e integrado de harmonia com o Direito da UE.

$ Princípio Exceção do Procedimento Administrativo: o Estado de Necessidade Administrativa O princípio exceção signfica que aquilo que é a legalidade normal seja afastada por circunstâncias excecionais e imprevisíveis, passíveis de suscitar perigos, ameaças ou lesões a pessoas, bens ou instituições e que requerem a necessidade e a urgência de medidas administrativas tendentes a defender, conservar ou fazer cessar tais ameaças, sendo para tal indispensável usar uma legalidade excecional ou extraordinária- Estado de Necessidade Administrativa, art. 3º/2 CPA. Este estado tanto pode justificar a derrogação das regras procedimentais, como também pode justificar que o conteúdo das decisões seja contrário ao da legalidade normal.

Pressupostos do Estado de Necessidade Administrativa:

1. Existência de circunstâncias de facto extraordinárias- é relevante para a Administração agir e para os tribunais ajuizarem sobre a atuação da Administração, na medida em que tem obrigatoriamente de haver esta circunstancialidade extraordinária;

2. Ameaça ou efetivo perigo de dano a bens ou interesses essenciais da coletividade- ou seja, “perigo iminente e atual”;

3. Tem de se demonstrar que é indispensável- tem de se demonstrar que é urgente a atuação;

4. A intervenção administrativa só pode ser feita pelo afastar das regras procedimentais normalmente aplicadas à Administração Pública- levanta a questão: pode afastar tudo ou há limites?

Uma coisa é preterir as regras do caminho (regras procedimentais), outra coisa é preterir as regras do resultado. É a primeira que nos interessa.

A falta de qualquer um dos pressupostos determina a ausência de fundamento legal justificativo do recurso à figura do estado de necessidade administrativa e a consequente invalidade da sua invocação ou utilização como habilitação de um agir administrativo contra legem.

Há, no Estado de Necessidade, um juízo de prognose feito pela Administração Pública que envolve uma metódica ponderativa pautada pelos postulados de adequação e necessidade entre meios e fins.

O Estado de Necessidade Administrativa pode ocorrer em vários cenários:

1. Quando há estado de exceção constitucional- nestes casos, o Estado de Necessidade Administrativa é absorvido pela figura mais importante que é o Estado de Sítio ou de Emergência;

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2. Quando há um clima de grave anomalia constitucional, passível de conduzir a uma situação de estado de sítio, se que tenha existido, contudo, declaração formal nesse sentido;

3. Quando há estado de emergência económico-financeira;

4. Sem qualquer situação (declarada ou material) de estado de exceção constitucional ou de emergência financeira- fala-se aqui em estado de necessidade tout court.

O estado de necessidade procedimental habilita também a derrogação de normas jurídico-positivas de

competência, permitindo, atendendo à essencialidade dos bens ou interesses materiais em perigo, que órgãos

normalmente incompetentes se substituam aos órgãos normalmente competentes para a prática dos atos que a necessidade e a urgência impõem- substituição extraordinária.

NOTA: a Administração tem de fazer um juízo:

a) De ponderação: o grave risco de perigo ou dano justifica que se afastem as normas legais normalmente aplicáveis?

b) De prognose: ao afastar as normas legais, consegue efetivamente evitar-se o perigo? c) De adequação.

Há três limites intransponíveis:

1. O Estado de Necessidade Administrativa tem de respeitar o procedimento legalmente previsto, mesmo que não na sua totalidade;

2. Respeito pelos princípios gerais da atuação administrativa, nomeadamente o da igualdade, o da proporcionalidade, o da imparcialidade e o da boa fé;

3. Respeito pelos preceitos do CPA que concretizam esses mesmos princípios.

Toda a atuação administrativa está sujeita a controlo judicial, mesmo em casos de Estado de Necessidade Administrativa.

→ Natureza do Estado de Necessidade Administrativa: estamos perante uma legalidade alternativa. Estamos não perante uma exceção à legalidade, mas sim perante uma legalidade excecional.

Princípios Materiais do Procedimento Administrativo

Há uns que estão expressamente formulados na CRP e outros que não estão. Vamos atentar sobre os segundos.

1. Princípio da Proibição do Arbítrio

Em Direito Público, arbitrário é tudo aquilo que se revela decidido com desprezo patente e manifesto pelo Direito e pela justiça: normalmente, diz-se que a decisão arbitrária é sempre violadora do princípio da igualdade. PO discorda, afirmando que há casos em que assim não sucede. Por exemplo, estabelece-se que todos os alunos que façam prova oral sem utilizar gravata estão reprovados; se o Prof. reprovasse todos os alunos que não levassem gravata, estaria a respeitar o princípio da igualdade. Contudo, esta não deixa de ser uma decisão arbitrária, uma vez que a roupa que o aluno veste em nada tem a ver com os seus conhecimentos sobre a cadeira.

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A qualificação de uma decisão como arbitrária não exige, todavia, consciência da violação da juridicidade, sendo certo que todas as decisões arbitrárias são ilegais, mas nem todas as decisões ilegais são arbitrárias, há ainda que distinguir:

a) A arbitrariedade pode localizar-se na própria norma legal que a Administração é chamada a aplicar, falando-se aqui em arbitrariedade derivada ou consequente;

b) Ou a arbitrariedade pode ser o resultado autónomo de uma decisão administrativa, sem que as normas que a habilitam ou conformam sejam arbitrárias, falando-se agora em arbitrariedade

originária ou própria.

2. Princípio da Concorrência

A concorrência, sendo um conceito de origem económica relacionado com a livre entrada de novos agentes no mercado, a sua atomicidade ao nível da formação de preços e a transparência da informação, não circunscreve a sua operatividade ao domínio exclusivamente económico: o princípio da concorrência apela às ideias de:

o Liberdade de exercício de uma atividade;

o Não discriminação de de condições de acesso e de tratamento entre os intervenientes; o Conhecimento de toda a informação por todos os intervenientes.

Este princípio é hoje um referencial axiológico emergente da Constituição e do Direito da UE, segundo decorre do espírito do sistema de uma economia social de mercado, visando a criação e o funcionamento do mercado interno europeu.

Este princípio goza de uma operatividade que, sem se limitar ao agir administrativo nas suas relações com os cidadãos, se projeta, igualmente ao nível das relações que, regidas pelo Direito Privado, os particulares estabelecem entre si.

A defesa da concorrência visa impedir situações de vantagem injustificada entre concorrentes que se encontram numa situação lícita, proibindo condutas e impondo comportamentos à Administração Pública: proteger e promover a concorrência é hoje um interesse público a cargo da Administração.

Sempre que está em causa a atribuição pela Administração de um bem que é escasso, porque não é apto à satisfação da generalidade, a Administração deve exigir concorrência entre os potenciais interessados, deve abrir um procedimento concursal, para garantir que todos têm condições idênticas de acesso. Este procedimento exige:

✓ Publicidade;

✓ Igualdade de oportunidades no acesso dos cidadãos; ✓ Proibição de obstáculos à livre concorrência;

✓ Proibição de favorecimento indevido ou de preferência discriminatória entre concorrentes; ✓ Uma avaliação com base na concorrência pelo mérito;

✓ Proibição genérica de alteração das propostas; ✓ Acesso dos interessados à informação.

A concorrência passa também por limitações à margem de autonomia decisória em serem concedidos auxílios que, direta ou indiretamente, falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou

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certas produções, assim como se encontra vedada a utilização de instrumentos fiscais tendentes a favorecer ou proteger produtos nacionais face a produtos similares provenientes de outros Estados-membros da UE.

3. Princípio da Ponderação

Numa Administração pautada por critérios decisórios alicerçados em princípios, num cenário crescente de normatividade principialista, tendo de gerir interesses pretensivos e opositivos num contexto de escassez de recursos, a ponderação surge como metodologia procedimental de decisão e conteúdo ou resultado decisório final.

A ponderação pode ocorrer, assim, em dois momentos:

1. Uma metodologia decisória- um caminho para decidir. Isto porque há necessidade de se articularem diversas normas, de pôr estas normas a testemunhar sobre um determinado caso.

2. Conteúdo ou resultado final da decisão- hoje há uma estrutura multinível no âmbito da atuação do poder. O fundamento do princípio da ponderação decorre da natureza compromissória das normas constitucionais e da sua aplicação, assim como das normas internacionais e do Direito da União Europeia.

Noutro sentido, pode dizer-se que o princípio da ponderação se alicerça nos princípios da juridicidade e da proteção da confiança ao nível das legítimas expectativas, havendo até quem fale em “princípio da justa ponderação”.

Três ideias em relação à ponderação, que traduzem vicissitudes na ponderação:

a) Recusa de ponderação- há uma norma que, expressa ou implicitamente, impõe a ponderação, mas a Administração recusa a ponderação. Se a Administração se recusa a ponderar, incorre em violação da lei.

b) Erro sobre a ponderação- pode ser dois tipos de erro: (i) a Administração pensa que não tem de ponderar, mas tem; (ii) erro sobre o conteúdo da ponderação: pensa que tem de ponderar A com B, mas tem de ponderar B com C.

c) Omissão de ponderar- a Administração nem se apercebe que tem de ponderar, não há uma violação direta. Pura e simplesmente, a Administração nem tem consciência de que tinha de ponderar. Neste caso, há uma violação omissiva da lei.

Em qualquer uma destas hipóteses, a decisão administrativa encontra-se viciada, sendo passível de controlo administrativo e judicial o procedimento de ponderação e o resultado da ponderação.

Duas dimensões da ponderação:

a) A ponderação pode ser feita pelo próprio legislador- ex: o art. 163º/5: o ato é anulável mas deixa de se produzir efeito anulatório. É o legislador que faz a ponderação, a Administração apenas tem de cumprir.

b) A ponderação pode ser feita pela própria Administração- ex: art. 162º/3: possibilidade de, em certos casos de atos nulos, a Administração reconhecer alguns efeitos. Aqui a ponderação é remetida pelo legislador para ponderação Administrativa.

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18 4. Princípio da Atendibilidade da Situação Factual

A factualidade, além de possuir uma intrínseca função genética de novas pautas paramétricas de conduta (ex: o costume, o uso, o precedente) – incluindo de fontes formais da legalidade jurídico-positiva, por captação de impulsos sociais -, ajuda sempre a interpretar e aplicar as normas jurídicas, assim como a compreender as instituições jurídicas: a dinâmica dos factos, fazendo emergir verdadeiras “imposições fáticas”, molda também o Direito Administrativo e, em especial, o procedimento administrativo.

Todo o agir administrativo assenta numa determinada factualidade, projeta efeitos sobre situações de facto e torna-se, ele próprio (o agir), um facto:

a) A factualidade subjacente à atuação administrativa configura-se, juridicamente, como pressuposto do seu agir, tenha como referência factos passados ou presentes ou envolva ainda um juízo de prognose relativamente a factos futuros;

b) As situações factuais sofrem os efeitos das ações ou das omissões administrativas, tenham estas uma natureza jurídica ou material;

c) Toda a ação ou omissão administrativa é sempre, em si e por si, um facto integrante do mundo da factualidade jurídica.

A atendibilidade das situações de facto como fundamento do agir administrativo justifica a atenção que a OJ confere à fase da instrução dos procedimentos (arts. 115º a 120º), num propósito de recolha e prova dos factos e interesses habilitantes da preparação configurativa do conteúdo de uma decisão a tomar.

São, portanto, as circunstâncias de facto que estão na base da decisão administrativa.

o Alteração de circunstâncias de facto- pode conduzir a uma modificação da disciplina jurídica de uma situação.

o Erro nos pressupostos- tenho uma determinada configuração da realidade, mas essa configuração é uma falsa representação da realidade. Vai viciar a decisão.

o Projeção dos próprios factos no conteúdo da decisão- os factos podem funcionar como parâmetro da decisão. Ex: o princípio da igualdade- só sei se uma decisão viola o princípio da igualdade se comparar duas situações factuais; arbitrariedade- só sei se uma decisão é arbitrária consoante a situação factual à qual a arbitrariedade é aplicada; precedente- só sei se há precedente se analisar a factualidade subjacente a cada uma das decisões.

Uma incompleta recolha dos elementos factuais ou uma deficiente ponderação dos factos relevantes, levantando dúvidas sobre os próprios pressupostos de facto de uma determinada conduta administrativa, atinge o núcleo do princípio da imparcialidade, levando à sua invalidade.

A atendibilidade das situações de facto como parâmetro decisório habilita a ter em consideração o seguinte: a) Os precedentes administrativos relativamente à decisão de situações concretas (presentes ou futuras)

factualmente idênticas e no âmbito da vigência do mesmo quadro normativo;

b) A relevância dos postulados da adequação, necessidade e razoabilidade na conformação da decisão faz-se à luz da situação de facto subjacente;

c) A vinculação material ao princípio da boa administração atende aos potenciais efeitos da decisão a adotar, num juízo de prognose, face à realidade factual envolvida.

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19 5. Princípio da Sustentabilidade

Este princípio diz-nos que o agir administrativo, apesar de ter como referencial decisório e de produção de efeitos o tempo presente, nunca pode deixar de ponderar, à luz de um juízo de prognose, os efeitos no futuro e, num propósito de acautelar as gerações futuras, deve ter o seu conteúdo ajustado em conformidade- aqui se expressa a designada administração de preservação ou administração preventiva.

É a consequência do desenvolvimento científico e tecnológico que permite antecipar factos futuros; e do valor jurídico-constitucional que têm hoje as gerações futuras: a preservação intergeracional dos recursos, por um lado, e o princípio do desenvolvimento, por outro, equacionam a projeção dos efeitos no futuro.

Subjacente ao princípio da sustentabilidade está uma afirmação de responsabilidade administrativa direcionada para o futuro, falando-se em justiça intergeracional ou princípio material de quidade intergeracional.

Haverá violação do princípio da sustentabilidade, por omissão, desde logo se a Administração não proceder a qualquer ponderação sobre os efeitos previsíveis de uma sua conduta em termos de preservação intergeracional de recursos, alheando-se da existência de tais interesses ou, tendo consciência da sua presença, recusar-lhes qualquer relevância ponderativa.

Mostra-se mesmo possível formular um postulado de necessidade justificativa de qualquer retrocesso quanto ao nível de proteção já alcançado, retirando-se ao decisor (legislador e administrativo) a discricionariedade ou liberdade conformadora de conteúdos de decisão em sentido diminuidor da proteção existente, vinculando qualquer reversibilidade de soluções a uma justificação pautada pelas vertentes do princípio da proporcionalidade.

A sustentabilidade das decisões administrativas pode ser um problema:

o Originário- a sustentabilidade serve de pressuposto aferidor da viabilidade e, nesse sentido, da própria legalidade das decisões administrativas a adotar;

o Superveniente- um novo juízo de sustentabilidade decorrente de novos conhecimentos técnicos e científicos pode habilitar a revogação de decisões tomadas à luz de um diferente pressuposto de sustentabilidade- art. 167º/2 c).

6. Princípio da Precaução

Parte da verificação da seguinte realidade: a sociedade atual é uma sociedade de múltiplos riscos e, por isso, a Administração deve, no âmbito de um Estado interventivo e social, agir no sentido de prevenir, atenuar os riscos. O valor segurança ganha hoje um relevo que era insuspeito há 20 ou 30 anos atrás.

A segurança determina que a Administração, perante situações de risco, não possa ficar parada- proíbe a omissão:

 Na área da saúde pública;

 Na área da alimentação- saber se determinado alimento tem ou não toxinas que possam prejudicar a saúde conduz a que a Administração proíba a importação deste ou daquele bem;

 A preocupação com os medicamentos- basta ter uma suspeita de que a utilização de determinado medicamente tem determinado efeito secundário prejudicial, para que deva suspender a importação ou até a comercialização do medicamento.

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O princípio da precaução mostra-se, assim, passível de ser formulado nos seguintes termos: sempre que existam riscos potenciais ou efetivos passíveis de lesar interesses da coletividade, a Administração Pública encontra-se adstrita a adotar as medidas apropriadas ou adequadas a evitar ou minorar os seus possíveis efeitos.

Se a Administração não acautelar o princípio da precaução e daí resultarem danos, é a própria Administração que irá suportar esses danos.

Assim, temos assistido a uma transição do Estado Social para o Estado Preventivo. A Administração passa a ter um dever novo: o de prever e antecipar riscos.

As providências administrativas fundadas no princípio da precaução comportam diversas particularidades: a) São medidas administrativas que se podem basear em condições de incerteza, sem que sejam

inteiramente evidentes as relações entre a situação potencialmente de risco, a sua configuração exata e os seus efeitos danosos a prevenir;

b) Poderá mesmo não existir conhecimento suficiente ou consenso na comunidade científica sobre os fenómenos geradores de risco e os seus potenciais ou previsíveis efeitos danosos;

c) Dominadas pela prudência, estas decisões administrativas devem alicerçar-se nos conhecimentos científicos e técnicos que se encontrem disponíveis à data ou, no limite, naqueles que mereçam maior reconhecimento atual pela comunidade científica e técnica. Compreende-se, assim, que a superveniência de melhores conhecimentos gere a revogabilidade de tais decisões.

Quais são as consequências procedimentais?

Inversão do ónus da prova- quem alega um facto, compete-lhe a prova desse facto. Contudo, pode ocorrer

que nestas áreas de preocupação se inverta o ónus da prova porque é possível a presunção de certas condutas como condutas que envolvem o risco de gerar danos que, em nome do interesse público, importa evitar. Ex: basta a dúvida quanto a um efeito secundário de um medicamento que possa ser nocivo para que se possa impedir a circulação desse medicamento: passará a caber ao comerciante desse medicamento ilidir essa presunção. Outro ex: quem viaja para a Síria, goza da presunção de que vai para lá não para fazer coisas boas, mas para pôr em causa a segurança nacional.

7. Princípio (material) da Boa Administração

Independentemente da sua projeção procedimental, a dimensão material ou substancial do princípio da boa administração diz-nos que o conteúdo das decisões administrativas não se basta com uma qualquer prossecução do interesse público, antes exige uma conduta eficiente, dotada de economicidade, revelando-se apta a alcançar a melhor solução, à luz de uma prosrevelando-secução ótima do interesrevelando-se público.

A boa administração, determinando a subordinação do agir administrativo a pautas normativas extrajurídicas, numa aproximação metodológica da gestão dos recursos públicos aos critérios de gestão de empresas privadas, envolve dois diferentes juízos avaliativos, em dois momentos distintos:

i) Pressupõe um relacionamento entre os objetivos fixados, os meios usados e os resultados esperados, num juízo a priori sobre o mérito das medidas a adotar, que, socorrendo-se dos postulados da adequação ou do balanço custos/vantagens, usa a proporcionalidade ao serviço da boa administração; j) Acarreta, agora num juízo a posteriori, um confronto entre os objetivos iniciais, os meios usados e os resultados alcançados pelas soluções decisórias adotadas, podendo as decisões e os efeitos da sua execução mostrar-se desproporcionadas (por desadequação, inutilidade, excesso ou defeito) e, neste sentido, o seu mérito ser atentatório da boa administração.

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A aferição da boa administração assenta, em qualquer caso, num juízo ponderativo que usa o princípio da proporcionalidade como instrumento determinativo da diligência ou acerto do mérito da conduta administrativa, em termos de eficiência e economicidade das soluções.

A violação do princípio da boa administração, desde que aferida à luz dos postulados da proporcionalidade, determinando decisões administrativas carecidas de mérito, mostra-se passível de controlo judicial.

O mérito tornou-se, assim, indiretamente, por força da boa administração, uma questão de legalidade. Contudo, essa intervenção dos tribunais, sempre feita no respeito pela separação de poderes, nunca pode envolver o exercício de um poder judicial substitutivo da esfera decisória reservada à Administração Pública.

8. Princípio da Moralidade Administrativa

Significa, em primeiro lugar, que a Administração não pode adotar condutas violadoras dos bons costumes, enquanto expressão de um princípio geral de direito ou de moralidade pública. Significa a vinculação da Administração à honestidade e à seriedade, incluindo o dever de respeitar a palavra dada, honrando as promessas feitas; a submissão da Administração a uma ética de serviço público, incluindo o dever de lealdade. A violação de pautas de honestidade e seriedade do agir administrativo, sendo passível de assumir relevância criminal por vantagem indevida que envolveu a favor do funcionário público ou, em alternativa, pelo prejuízo que comportou para o erário público, consubstancia uma situação de improbidade administrativa: a violação do princípio da moralidade administrativa gera a invalidade da conduta decisória da Administração e sujeita o respetivo funcionário a responsabilidade disciplinar.

CURIOSIDADE: Por força do princípio da proporcionalidade, o titular de um órgão não pode nomear familiares

seus para o auxiliarem no seu cargo. Ora, o Brasil e outros países desenvolveram um mecanismo em que o pai 1 combina com o pai 2 que este (1) nomeia o filho 2 e que o pai 2 nomeia o filho 1. Apesar de não violar a lei, viola uma norma de moralidade administrativa.

Traição administrativa- tem duas figuras:

a) Agente provocador- aquele que se infiltra numa organização criminosa, não para praticar os atos, mas para instigar essa prática, para apanhar essas pessoas que estariam dispostas a praticar o ato; b) Radares nas estradas sem prévia indicação de que há radar- situações em que há controlo da

velocidade, sem que, previamente, os automobilistas tenham conhecimento desse facto. Há uma violação por parte do próprio Estado de uma norma de ética.

9. Princípio (material) do Estado de Necessidade Administrativa

O princípio material do estado de necessidade administrativa configura-se como vertente ou dimensão setorial do princípio geral do estado de necessidade administrativa: comunga com a vertente procedimental o mesmo conceito e a mesma natureza, residindo a diferença na circunstância de o princípio material do estado de necessidade administrativa, em vez de incidir sosbre os aspetos formais relativos ao procedimento e à competência, dizer respeito ao conteúdo ou objeto material das decisões.

Em que termos é que o estado de necessidade administrativa pode justificar o conteúdo de decisões que sejam decisões que, em cenários habituais, seriam decisões inválidas. Até que ponto é que o estado de necessidade administrativa permite que, decisões que normalmente são inválidas, possam ser aplicadas em nome desse mesmo estado de necessidade administrativa.

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O art. 163º/5, que diz que não se produz o efeito anulatório, mesmo que o ato seja anulável, permite extrair que, se em situações de normalidade, é possível a prática de um ato anulável que não produza efeitos anulatórios, por maioria de razão, em estado de necessidade administrativa, podem-se praticar atos anuláveis. E, indo mais longe, será que é possível, em estado de necessidade administrativa, praticar atos nulos? PO- sim, mas com quatro limites:

a) Existência de ponderosas razões de necessidade- apelo ao princípio da proporcionalidade;

b) Respeito pela proporcionalidade no conteúdo da decisão- a proporcionalidade quer nos pressupostos quer no conteúdo da decisão;

c) Nunca é possível violar o art. 19º/6 e 7 da CRP, porque são situações que nem em estado de exceção constitucional podem ser beliscados e, por maioria de razão, também não o poderão ser em situação de estado de necessidade administrativa

d) Submissão a controlo judicial e, de todos os danos que resultem da atuação em estado de necessidade administrativa haverá sempre responsabilidade civil da Administração Pública. E, à luz da CRP, esta responsabilidade civil da Administração é solidária entre a pessoa coletiva e o titular do órgão.

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Formas de Atividade Administrativa e Procedimento

◊ Voluntariedade da Conduta

Se é certo que, normalmente, a Administração tem ou desenvolve uma conduta voluntária, também é verdade que o Direito Administrativo permite observar que nem todos os efeitos jurídicos resultam de uma conduta voluntária da Administração, que a atividade administrativa se pode assumir como um puro facto:

1. Meros factos jurídicos- traduzem acontecimentos ou circunstâncias independentes da vontade que, apesar de não corresponderem a um querer administrativo, podem produzir efeitos que determinem um agir administrativo- por exemplo, o decurso do tempo: a anulabilidade consolida-se na OJ se não for destruída num determinado prazo; decorrido esse prazo, tudo se passa como se fosse válido. Este é um efeito administrativo que não está dependente da vontade da Administração.

2. Factos jurídicos objetivos- a conduta administrativa, sendo sempre uma conduta voluntária, pode ter na sua origem factos alheios a qualquer atuação humana e, neste sentido, involuntárias. Por exemplo, efeitos administrativos de inundações ou de crise financeira externa.

3. Fattispecie de elementos de facto- a atuação administrativa poderá ser desencadeada não por um único facto, mas antes por uma pluralidade ou um concurso de factos entre si relacionados por uma norma jurídica.

A relevância da vontade da Administração depende sempre da sua exteriorização. Sem a sua exteriorização, sem que a vontade seja declarada, estamos diante de condutas que nunca nasceram para o Direito- em vez de um ato, temos um “não-ato”, enquanto ausência ou falta de manifestação exterior de uma vontade. Por exemplo, no desvio de poder, o motivo determinante da conduta não é exteriorizado. Mas é precisamente pelo motivo da pessoa na sua conduta que se afirma se ela está ou não em desvio de poder.

Como se apura a relevância da intenção? Através da prova.

A intervenção da vontade pode dar origem, por efeito da distribuição da competência, a atos simples ou, em alternativa, a atos complexos:

- Os atos simples traduzem a expressão da vontade de uma única estrutura decisória, enquanto os atos

complexos conjugam a intervenção participativa decisória de duas ou mais estruturas orgânicas, numa

articulação integrativa entre vontades concorrentes de diferentes titulares de um poder decisório partilhado; - Nos atos complexos, a intervenção participativa dos titulares do poder decisório pode fazer-se numa posição de igualdade (ex: situações de coautoria) ou, em sentido diferente, numa posição de desigualdade, sendo que uma delas é determinante e a outra (ou outras) assume natureza condicionante ou formal (ex: a intervenção do PR em decretos de competência do Governo).

As decisões administrativas podem ter:

1. Uma ou algumas pessoas determinadas- o ato da Administração pode dirigir-se a uma ou várias pessoas determinadas ou determináveis, envolvendo uma situação concreta, gozando, por isso, de uma eficácia subjetiva individual ou inter partes, dizendo-se que estamos diante de um ato não normativo.

2. Uma pluralidade de pessoas indetermináveis- o ato da Administração pode ter como destinatários uma pluralidade indeterminável de pessoas, assumindo generalidade, gozando de uma eficácia erga omnes, caso em que deparamos com um ato normativo.

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Nem sempre a vontade administrativa é suficiente para produzir todos os efeitos desejados:

a) A atuação administrativa pode carecer da intervenção, da colaboração da vontade dos cidadãos, assuma esta uma natureza propulsora (ex: pretensão formulada pelo interessado), consentida (ex: aceitação de nomeação) ou coconstitutiva (ex: celebração de um contrato).

b) Poderá mesmo ocorrer que, ante a ausência de acordo ou de vontade concordante dos cidadãos, a Administração tenha de recorrer aos tribunais para fazer vingar os efeitos decorrentes da sua vontade; c) A transformação da realidade física ou social não se basta com a simples emissão de atos jurídicos, exigindo ainda atuações físicas ou materiais que, agindo sobre as situações fáticas da vida, implementam no terreno a vontade decisória administrativa- por exemplo, não basta dizer que a construção ilegal tem de ser demolida, é necessário que efetivamente se proceda a essa demolição.

Apesar de toda a conduta administrativa se alicerçar sempre numa norma habilitante e conformadora do seu agir, verifica-se diversidade de formas de desenvolvimento de uma tal atividade:

❖ A tradicional centralidade da figura do ato administrativo nunca pode conduzir a uma identificação redutora desta forma de agir com toda a atividade desenvolvida pela Administração Pública: o ato administrativo não esgota as formas que podem revestir a conduta administrativa;

❖ Nem toda a atividade resultante da Administração Pública se reconduz à prática de atos jurídicos: a par da atuação jurídica, também pode ser exercida uma atividade sem caráter jurídico;

❖ Por outro lado, nem toda a atividade jurídica se rege materialmente, em termos exclusivos, pelo Direito Público: o Direito Administrativo não tem o monopólio regulador do agir administrativo, nem os demais ramos juspublicísticos- há formas da atividade administrativa regidas pelo Direito Privado.

A própria inércia administrativa, numa situação de inatividade perante as suas responsabilidades determinadas pela juridicidade, mostra-se também passível de assumir significado jurídico e relevância procedimental.

Há condutas de facto que são juridicamente relevantes. Há condutas que traduzem comportamentos, declarações negociais implícitas- comportamentos factuas concludentes.

Por outro lado, existem condutas de facto que são juridicamente irrelevantes: por exemplo, as palavras de circunstância num ato oficial.

$ Formas da Atividade Administrativa Jurídico-Pública:

Circunscrevendo-se a análise às formas de atividade administrativa jurídica pública, verifica-se que estamos diante de um agir administrativo que se consubstancia na produção de efeitos jurídicos e cuja essência reguladora se encontra sujeita a um regime substantivo de Direito Público.

Temos, portanto, dois requisitos:

1. Produção atos jurídicos- sejam manifestações de vontade ou manifestações de ciência, desde que aptas a produzir efeitos de Direito.

Referências

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Indeferimento tácito Quando não queria dar o que lhe era pedido, o melhor era não dizer nada Deste modo, o particular não podia ir a tribunal impugnar Se, no final de um determinado prazo, a Efeito preclusivo da competência quando um decide, os outros deixam de poder decidir sobre aquela matéria, dizendo-se que fica “prevenida a jurisdição”, determinando qualquer posterior intervenção A invalidade da declaração de vontade ferida de erro na sua formação tem sempre a anulabilidade como desvalor jurídico. De facto – são as realidades do mundo da factualidade que, captadas intelectualmente pelo decisor administrativo, nos termos de uma norma legal, são tomadas como fundamento direto do agir A participação dialógica, alicerçada numa concretização de mecanismos de diálogo entre a Administração e os destinatários das suas decisões, fazendo estes contribuir com a sua visão do Decurso do tempo Atos administrativos constitutivos – todos aqueles que introduzem alterações na OJ As alterações podem ser introduzidas por: Os atos constitutivos de direitos só podem ser anulados no prazo de um ano a contar da respetiva emissão – art 168º/2 Mas há alguns que estão sujeitos a um prazo de 5 anos: quando se verificam Procedimento de recurso gracioso (da nova intervenção da AP sobre uma matéria sobre a qual já se pronunciou ou não o fez e deveria tê-lo feito) – arts 184º e ss: Responsabilidade civil da Administração Pública Quem gera um dano constitui-se no dever de o reparar.

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