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4 METODO

4.1 Delimitando o “território”

Pesquisar a comunidade exigiu-me fazer escolhas. Quando se fala em uma comunidade temos a ideia de um todo, que envolve uma área específica e as pessoas que convivem em seu entorno. Surge, então, o primeiro questionamento: O que observar? Como fazer para conhecer um pouco mais uma comunidade em um espaço amplo, na maioria das vezes sem limites precisos? Nas ruas, nas praças? De modo aleatório, diversificando os lugares? Nesse momento pensei que era preciso ter como referência espaços onde, de certo modo, a comunidade estivesse “concentrada” ou “representada”, como os Centros Comunitários ou Associações de Bairro.

Nessas instituições há, ao mesmo tempo, participação dos moradores da comunidade, parceria com outras instituições (igreja, UBS, prefeitura), desenvolvimento de diferentes atividades, inclusive assistenciais e, o mais importante, são pontos de referência para discutir e tratar de assuntos que são de interesse da própria comunidade e, ao mesmo tempo, atuam como apoio social. Além disso, ter espaços de referência também foi necessário para solicitar permissão para a realização da pesquisa, assim como construir aberturas que tornassem possível minha aproximação e mesmo o acesso à comunidade.

A segunda escolha a ser tomada era ainda mais difícil: Qual comunidade pesquisar? Pesquisar a comunidade de São Remo, que era atendida no CSE em que desenvolvi meu trabalho de mestrado, ou buscar outra? Como escolher uma comunidade se não a conheço? Como “encontrar” uma que minimamente apresente elementos presentes na discussão conceitual contida na revisão, sem perder de vista a associação com a questão da saúde?

Foi aproximando o próprio conceito de comunidade e o trabalho em saúde que direcionei a resposta. A maioria dos autores que tratam do conceito de comunidade faz

menção ao local, ao espaço geográfico, como algo necessário para se ter uma comunidade, ainda que não seja imprescindível uma delimitação precisa. A ESF31 faz o trabalho das equipes por áreas, que são denominadas territórios, definidos com base na área total atendida pelas UBSs. Neste caminho, há um estudo e um trabalho para a determinação desses territórios. Não teria, então, comunidades escolhidas aleatoriamente, mas de acordo com critérios geográficos, socioeconômicos e também de saúde. Além disso, ter a ESF como referência foi um modo de contemplar o conhecimento e a organização que este trabalho já construiu em relação às diferentes comunidades atendidas; compreender um pouco mais sobre a dinâmica e as particularidades do trabalho em saúde junto às comunidades; e identificar espaços organizados como Centros Comunitários, Associações de Bairro, que poderiam orientar a definição da segunda fase da pesquisa.

Com base nisso, identificou-se quais UBSs do distrito Butantã tinham sua área de abrangência integralmente atendida pela ESF32, visto que algumas tinham sua área coberta ainda parcialmente. Das treze UBSs que compunham a Coordenadoria Regional de Saúde e Supervisão Técnica do Butantã (SÃO PAULO, 2009), cinco possuíam a ESF integralmente: Jardim Boa Vista, Jardim São Jorge, Vila Dalva, Jardim D’Abril e Real Parque.

Então, de acordo com as delimitações dos territórios da ESF que compõe o distrito, foi organizada a primeira etapa da pesquisa em torno dessas cinco Unidades com ESF. O próximo passo era definir quem das UBSs poderia ajudar na aproximação com as comunidades atendidas a partir do trabalho em saúde junto a elas. Neste momento, optou-se pela realização de entrevistas semiestruturadas com os profissionais que coordenavam as

31 Entre as atribuições comuns de todos os profissionais das equipes de ESF está a participação no processo de

territorialização e mapeamento da área de atuação da equipe, identificando grupos, famílias e indivíduos expostos a riscos; também a atualização contínua dessas informações; e a realização do cuidado em saúde da população envolvida, sobretudo no âmbito da Unidade de Saúde, no domicílio e nos demais espaços comunitários (escolas, associações, entre outros), quando necessário (BRASIL, 2007).

32 É preciso considerar que a ESF está em processo de expansão da área de cobertura do município, assim como

da implementação do NASF. As informações utilizadas no projeto são referentes ao momento de sua elaboração, no final do primeiro semestre de 2009, para avaliação e autorização da Supervisão Técnica do Butantã para a realização da pesquisa e, posteriormente, ser submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo. Hoje o site da Secretaria Municipal de Saúde disponibiliza um quadro onde constam oito Unidades que possuem ESF, com a ressalva de que a UBS Vila Dalva não é citada, apesar de também trabalhar com a ESF. Disponível em: <http:// www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/atencao_basica/esf/index.php?p=17783>. Acesso em: 19 jan. 2011. Já na publicação de Brentani et al (2010), constam como Unidades que fazem parte do “Projeto Região Oeste”, que representa o convênio entre da Faculdade de Medicina-USP e a Secretaria Municipal de Saúde, responsável pela provisão de ações e serviços de saúde na referida região, as UBSs Jardim Boa Vista, Jardim São Jorge, Vila Dalva, Jardim D’Abril e Paulo VI (que na época da autorização do projeto estava no início da implementação). Nesse documento é a UBS Real Parque que não é citada, pois os dados utilizados dizem respeito às Unidades que desenvolvem também atividades de ensino. Além das consultas a esses materiais, foram realizadas duas visitas à coordenação do “Projeto Região Oeste”, uma em 2009 e outra no início de 2011 para obter esclarecimentos.

equipes de ESF de sua Unidade, com o objetivo de buscar informações sobre as comunidades e contribuir com uma visão ampliada sobre o processo do trabalho em saúde das equipes.

O critério para entrevistar os coordenadores de equipe, em detrimento do agente comunitário de saúde (ACS) ou do gerente de Unidade, por exemplo, foi a possibilidade de ter visões da comunidade de diferentes perspectivas, pois o trabalho dos coordenadores agregava: os atendimentos individuais, as visitas domiciliares e os grupos (que aconteciam na UBSs e em outros espaços do território); o conhecimento dos ACSs (que levavam até as equipes os principais problemas, os relatos das pessoas e as condições da comunidade em si); e, a organização do trabalho da equipe, que incluía os demais profissionais, a definição de estratégias, os dados dos atendimentos e do território. Perspectivas que foram notadas nos resultados das entrevistas.

A entrada no campo teve início após a aprovação da Supervisão Técnica de Saúde do Distrito Butantã e do Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria Municipal de Saúde da cidade de São Paulo (Anexo A). Nessa fase da pesquisa, os procedimentos adotados foram o contato pessoal com as gerentes das UBSs para apresentar o projeto e pedir solicitação para fazer as entrevistas. A partir daí, segui os procedimentos estabelecidos por cada Unidade. Em duas delas fui apresentada pelas gerentes a cada coordenador de equipe33. Assim, depois dos primeiros contatos, expunha o propósito da pesquisa e, posteriormente, agendava a entrevista, em dia e horário que fossem convenientes ao profissional. Em outras duas Unidades, foi solicitado pelas gerentes que eu participasse da reunião de equipe da UBS, momento em que apresentaria o projeto e conheceria os coordenadores, agendando, posteriormente, as entrevistas. Apenas em uma delas, a gerente sugeriu que os contatos e os agendamentos com os profissionais fossem feitos via correio eletrônico. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A) foi entregue antes de iniciar a entrevista, momento em que foi possível retomar o propósito da pesquisa, fazer outras explicações sobre a participação do profissional e também responder seus questionamentos.

No total foram realizadas vinte e duas entrevistas com os profissionais de saúde responsáveis34 pelas equipes ESF: Jardim São Jorge (seis profissionais com formação em Enfermagem); Jardim Boa Vista (seis profissionais com formação em Enfermagem); Vila Dalva (quatro profissionais com formação em Enfermagem); Jardim D’Abril (um profissional

33No Jardim São Jorge, por exemplo, fui apresentada durante a reunião de quatro das seis equipes da UBS.

Assim, pude ter um contato com os outros profissionais e explicar a proposta da pesquisa para eles também. No Jardim Boa Vista, além das coordenadoras de equipe, também conversei com a enfermeira da Vigilância em Saúde da Unidade, por sugestão e intermédio de uma delas.

34 Não há exigência profissional específica para a função de coordenador de equipe. Eles são definidos de acordo

com formação em Medicina, dois em Enfermagem e uma auxiliar de Enfermagem); e Real Parque (dois profissionais com formação em Medicina). Apenas um profissional não participou da pesquisa35, da UBS Vila Dalva. Além das entrevistas, foi consultado o mapeamento acerca dos equipamentos sociais de cada UBS, quando disponível. Com os dados das entrevistas e dos mapeamentos se definiu a comunidade que foi estudada. A denominação das equipes por cores seguiu o padrão das UBSs que usavam essa referência para delimitar as áreas e as respectivas equipes responsáveis.

As entrevistas seguiram um roteiro (Apêndice B) que teve como objetivo conhecer o trabalho em saúde das equipes junto às comunidades assim como buscar dados que contribuíssem para caracterizá-las, conhecê-las, por meio do olhar daqueles que de algum modo estavam mais próximos a elas. Na sistematização do roteiro, houve preocupação em não restringir as perguntas a uma caracterização dos territórios limitada ao aspecto conceitual da comunidade ou sobre as práticas corporais diretamente. A intenção foi dar abertura para que os profissionais manifestassem a sua visão, buscando os indicativos a partir da experiência do seu trabalho com a comunidade.

Esse primeiro levantamento possibilitou ter um panorama geral da ESF no trabalho em saúde com as comunidades, da caracterização dos territórios atendidos e, com base nisso, a escolha da comunidade que seria estudada.