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2.4 AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

2.4.1 Demandas Tecnológicas para uma Agricultura Sustentável no Brasil

O significado da palavra ‘tecnologia’, como o de ‘ciência’, mudou consideravelmente no decorrer dos séculos. O termo grego original technologia, derivado de techne (‘arte’), significava um discurso sobre artes. No século XVII, quando começou a ser usado em língua inglesa, significava uma discussão sistemática sobre as artes aplicadas, ou seja, os ofícios, e, aos poucos, passou a designar os próprios ofícios. A partir do século XX, esse significado foi ainda mais ampliado, passando a incluir não apenas as ferramentas e máquinas como também métodos e técnicas não materiais, ou seja, a aplicação sistemática de

qualquer uma dessas técnicas. Atualmente, a maior parte das definições de tecnologia dão ênfase à relação desta com a ciência. (CAPRA 2002).

Para Castells (apud Capra, 2002, p.104), “tecnologia é o conjunto de instrumentos, regras e procedimentos através dos quais o conhecimento científico é aplicado de maneira reprodutível a uma determinada tarefa”. Capra (2002) salienta que a tecnologia é muito mais antiga do que a ciência. Suas origens remontam ao próprio alvorecer da espécie humana à época em que a linguagem, a consciência reflexiva e a capacidade de construir utensílios evoluíram juntas. Com efeito, a tecnologia é uma das características que definem a natureza humana, tendo moldado de modo decisivo as sucessivas eras de civilização. Identificam-se, desse modo, os grandes períodos da civilização humana: Idade da Pedra, Idade do Bronze, Idade do Ferro, a Era Industrial e a Era da Informática. A partir da Revolução Industrial, começam a se ouvir críticas mais severas sobre as influências, nem sempre benéficas, da tecnologia sobre a vida e a cultura do ser humano.

Para Bazzo (1998, p.156), a tecnologia simboliza uma grande complexidade e, para tentar defini-la, há a necessidade de considerar que:

a) A tecnologia tem relação com a ciência, com a técnica e com a sociedade;

b) A tecnologia integra elementos materiais – ferramentas, máquinas, equipamentos – e não materiais – saber fazer, conhecimentos, informações, organização, comunicação e relações interpessoais; c) A tecnologia tem relações com fatores econômicos, políticos e culturais;

d) A evolução da tecnologia é inseparável das estruturas sociais e econômicas de uma determinada sociedade.

Por essas considerações, o autor propõe uma análise de tecnologia isenta de neutralidade, citando Winner (1987 p.27): “a construção de um sistema tecnológico que envolve seres humanos como parte do seu funcionamento requer uma reconstrução dos papéis

e relações sociais”. Para o autor, a tecnologia não é um empreendimento autônomo com vida própria nem tampouco um instrumento neutro que possa ser facilmente modificado e utilizado para as necessidades e interesses de plantão. É antes um empreendimento complexo que tem lugar em contextos específicos configurados e também é configuradora de valores humanos que se refletem nas instituições culturais, políticas e econômicas.

Schumacker (apud Ehlers, 1999) preconiza que o progresso tecnológico e a especialização não deveriam determinar os objetivos da humanidade. Ao contrário, o desenvolvimento tecnológico nos países deve buscar novos métodos de produção e novos padrões de consumo que impeçam a autodestruição, criando um novo estilo de vida planejado para ser permanente. Ainda segundo o mesmo autor, deve ser desenvolvido e utilizado tecnologias apropriadas para as diferentes realidades de cada país ou região, sendo suficientemente baratos, de modo a possibilitar sua utilização pelas populações de baixa renda.

Para Khatounian (2001), a adoção da agricultura sustentável gera demandas tecnológicas sobre os agricultores e técnicos ainda mentalmente presos à dependência dos agroquímicos. Isto porque a agricultura ecologicamente correta não utiliza insumos de um pacote tecnológico pronto, mas é intensiva no uso de um outro produto intangível, o conhecimento. Tecnologicamente, os sistemas orgânicos costumam apresentar elementos recuperados de bons exemplos do passado, combinados com procedimentos de ponta em termos de manejo de microrganismos, controle fitossanitário, variedades, máquinas e insumos ecologicamente corretos. Segundo o mesmo autor, existem inúmeras escolas que tratam do tema da agricultura ecologicamente correta, surgidas em vários países, incorporando elementos da cultura de onde emergiram ao seu corpo filosófico e prático. Assim, temos: a Biodinâmica, na Alemanha; a Orgânica, na Inglaterra; a Natural, no Japão; a Biológica, na França; a Alternativa, nos EUA; a Agroecológica, na América Latina; a

Permacultura, na Austrália. Todas são designadas oficialmente por ‘agricultura orgânica’ em relação ao conjunto de suas propostas para a sustentabilidade agrícola.

A agricultura orgânica também se caracteriza pela valorização da agricultura como modo de vida, no qual os fatores econômicos não são os mais importantes. Não se busca resolver o problema global de alimentação das populações em grande escala, mas prover as necessidades de pequenos grupos sociais. Diferentemente da agricultura tradicional, aplicam as técnicas agrícolas não-poluentes que se harmonizem com os ecossistemas locais e que conservem a fertilidade dos solos sem agredir a microvida. (GUIVANT, 1995).

Para Graziano (1999), a questão principal não é tecnológica, mas sim política. Antes de saber qual tecnologia adotar, é preciso decidir que sociedade se quer construir. Na medida em que a desigualdade entre países e povos é a verdadeira causa estrutural da fome, qualquer método que implique em aumentar a produção de alimentos, aprofundando esta desigualdade, está destinado ao fracasso em reduzir a fome, pois, ao contrário, somente as tecnologias que tenham efeitos positivos na distribuição de riqueza, ingressos e recursos podem reduzir verdadeiramente a fome.

No caso do Brasil, são três os aspectos do atual modelo agrícola que se contrapõe à preservação da biodiversidade, a tendência à monocultura, o uso intensivo de agroquímicos e o desaparecimento dos sistemas tradicionais de produção agropecuária. A recuperação desses saberes e o apoio técnico à pequena propriedade são fundamentais para a construção de uma agricultora em bases sustentáveis. De acordo com a EMBRAPA, é necessário gerar técnicas de observação, instalar sistemas de coleta de dados, construir modelos explanatórios e interpretativos. É um mundo de ciência a construir, talvez um paradigma a gerar. As tecnologias de produção que despontam como favoritas para a redução da degradação ambiental baseiam-se em integração e manejo de sistemas. Sua

pesquisa permite o aproveitamento de conhecimentos anteriormente elaborados, mas requer combinação e coordenação dos mesmos, assim como identificação e complementação dos aspectos insatisfatórios ou desconhecidos. A indispensável abordagem sistêmica exige mais disciplina lógico-científica do que parece à primeira vista, complementada por conhecimentos estatísticos e processamento de dados inventivos e pioneiros.

2.5 O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA –