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3. ANÁLISE DO PNAES A PARTIR DO CONTEXTO POLÍTICO E ECONÔMICO

3.2 Base teórico-ideológica do programa

3.2.1 Desenvolvimentismo

Há aproximadamente uma década, especificamente no final do primeiro mandato do presidente Lula, surge uma discussão, na seara da economia ligada ao governo, sobre a necessidade de uma proposta novo desenvolvimentista para assegurar o crescimento econômico com distribuição de renda. Esse momento coincide com o período de aumento dos investimentos públicos na rede federal de educação profissional, com evidente expansão da rede pelo país10. A defesa de uma perspectiva de desenvolvimento também coincide com a definição de princípios e objetivos para os Institutos Federais, dentre eles, voltados para a promoção do desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional.

Tal coincidência, contudo, é concebida aqui não como obra do acaso, mas como um fenômeno revelador de perspectivas que estão por trás das ações do Estado. Pretende-se, portanto, resgatar conceitualmente a proposta novo desenvolvimentista, a fim de compreendê- la a partir de suas origens teóricas e históricas, para tanto, faz-se necessário iniciar com uma discussão sobre desenvolvimentismo e novo desenvolvimentismo, tendo em vista compreender tais conceitos. Posteriormente são tecidas críticas ao segundo, baseado na literatura.

Em primeiro lugar, a preocupação com o desenvolvimento origina-se no contexto do capitalismo monopolista que, nos grandes centros, se tornou um estágio mais complexo e avançado do capitalismo mundial no século XX e a reiteração da subordinação econômica dos países periféricos. Nos anos que sucederam a Segunda Guerra Mundial, a relação centro- periferia passou a ser objeto de maior atenção dos recém criados organismos internacionais que, pelo contexto de Guerra Fria, passaram a fomentar um debate sobre o desenvolvimento das nações periféricas, incluindo a América Latina. Assim, “forma-se um consenso desenvolvimentista que recebeu apoio, inclusive, das políticas implementadas pelos organismos internacionais, como foi o caso da Organização das Nações Unidas e de seus diversos órgãos internos” (MATTEI, 2011, p. 9). Nesse ínterim, ganha relevo na Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), uma das comissões regionais da ONU, o estudo de pesquisadores estruturalistas que se empenharam em construir uma estratégia nacional- desenvolvimentista, uma proposta que previa basicamente a intervenção do Estado como propulsor do desenvolvimento, como grande agente econômico e social nos países latino- americanos, caracterizados como economias periféricas e dependentes do sistema imperialista.

O nacional-desenvolvimentismo sustentava-se teoricamente em análises acerca da formação social e econômica brasileira. Tais estudos buscam explicar a condição de dependência do país e remetem à colonização brasileira, tipicamente voltada para a exploração das riquezas naturais, em contraposição ao modelo construído na região norte da América, que deu origem a colônias de povoamento. Assim, analisa-se que o Brasil foi integrado à ordem mundial a partir da exploração agrícola em larga escala, com base no latifúndio monocultural e no trabalho escravo, o que garantiu a transferência de excedente para o exterior e a ausência de uma mão de obra assalariada que demandasse a generalização de um mercado de consumo. O país tardou a formar o seu mercado interno, inexpressivo ou quase inexistente durante o período colonial, em que a renda interna concentrava-se nas mãos de senhores de engenho, na fase açucareira. Durante o ciclo do açúcar, o mercado interno formou-se de maneira subsidiária e periférica, principalmente através da atividade pecuária, responsável pelo processo de interiorização na ocupação do espaço brasileiro. Esta perspectiva é defendida por Celso Furtado, que atribuiu o motivo do atraso na formação do mercado interno à eclosão tardia da industrialização no país, que ocorreu somente com a crise da economia cafeeira. Para o autor (FURTADO, 2005, p.83), embora na fase mineradora existissem as circunstâncias propícias ao desenvolvimento de atividades ligadas ao mercado

interno, uma vez estabelecidos os centros urbanos, apenas se desenvolveram atividades manufatureiras em etapa subsequente.

Florestan Fernandes (2006) aprofunda reflexões sobre a formação do mercado interno brasileiro em seu estudo sobre a formação e desenvolvimento do capitalismo no Brasil a partir da análise da “revolução burguesa”. Sobre esse aspecto, afirma que no Brasil “configurou-se, estrutural e funcionalmente, uma situação de mercado em que preponderavam as conexões econômicas com o exterior e em que as conexões econômicas com a vida econômica interna possuíam escassa importância estrutural e dinâmica” (FERNANDES, 2006, p. 110). Assim, a partir de uma economia que produzia para fora e consumia de fora, o país constituiu um “mercado interno nuclearmente heteronômico” (FERNANDES, 2006, p. 111). Isso porque a formação econômica brasileira ocorreu nos moldes de um “capitalismo dependente”, posto que incorporada de forma dependente às economias centrais (FERNANDES, 2006, p. 113).

Dessa forma, o Brasil tornou-se rentável para a expansão do mercado internacional, desde que sua dependência política e econômica se situava na relação colônia-metrópole, até a sua subordinação no estágio capitalista, em que a acumulação do excedente passou a se concentrar no processo de industrialização e nas relações de trabalho assalariadas, enquanto permanecia ainda como um país de economia agroexportadora fundada na monocultura, cujo valor agregado é inferior àquele de natureza manufatureira que precisava ser importado, resultando então na transferência de excedentes para o mercado internacional. Nas palavras de Leda Paulani:

Num período que abrange desde a época do exclusivo metropolitano até o início do século XX, o Brasil vai funcionar como alavanca da acumulação no Centro, singrando ao sabor de um processo determinado desde fora, em tempos de consolidação e afirmação do modo capitalista de produção. (...) Os produtos agrícolas e matérias-primas aqui produzidos garantiam o sucesso da acumulação capitalista nos países centrais e mantinham a natureza heterônoma da economia brasileira (PAULANI, 2012a, p. 91).

Essa situação de dependência econômica do país em relação aos grandes centros capitalistas é ainda concebida por Celso Furtado como uma resultante da tardia industrialização brasileira, que somente se iniciou a partir dos anos 1930, em decorrência da crise econômica mundial e da crise da economia agroexportadora brasileira, compreendido por Furtado (2005) como deslocamento do centro dinâmico da economia brasileira.

Assim como a segunda metade do século XIX se caracteriza pela transformação de uma economia escravista de grandes plantações em um sistema econômico baseado no trabalho assalariado, a primeira metade do século XX está marcada pela

progressiva emergência de um sistema cujo principal centro dinâmico é o mercado interno (FURTADO, 2005, p. 228).

Assim, a industrialização seria para o autor o verdadeiro motor para a transformação da base econômica voltada para um mercado interno, bem como condição para o desenvolvimento da nação e superação da subordinação econômica ao imperialismo internacional. Os idealizadores do nacional-desenvolvimentismo defendiam o modelo de substituição de importações que consistia, basicamente, em diminuir a importação de produtos industrializados através de sua produção nacional, tendo o Estado assumido o papel de “grande incentivador desse modelo, ao disponibilizar a rede de infraestrutura básica, bem como viabilizar os financiamentos necessários ao processo de industrialização” (MATTEI, 2011, p. 9).

Segundo Castelo (2012a), os defensores do projeto desenvolvimentista almejavam um conjunto de reformas protagonizadas por uma burguesia nacional estimulada pelo Estado.

Defendiam reformas típicas das revoluções democrático-burguesas, como a agrária, a tributária, a consolidação de leis trabalhistas (especialmente dos trabalhadores rurais), o direito ao sufrágio universal, a livre organização classista e um conjunto de políticas econômicas para a geração de emprego e aumento da massa salarial (CASTELO, 2012a, p. 622).

O projeto de desenvolvimento conduzido a partir dos anos 1930, contudo, manteve a subordinação imperialista e as antigas estruturas coloniais. Segundo Paulani (2012a), inaugura a inserção da economia brasileira no movimento mundial de acumulação a partir de um processo de modernização favorável à industrialização voltada para o mercado interno de consumo, contudo determinado pelas necessidades e imperativos do capital de fora que sofria com o problema da sobreacumulação. Segundo Castelo (2012a, p. 619), operou-se por meio da articulação de um novo bloco no poder liderado por Vargas, com uma aliança entre o Estado e uma burguesia nacional emergente, sem romper totalmente com as antigas classes dominantes latifundiárias, forjando um desenvolvimento desigual e combinado.

Para Castelo (2012a, p. 620), o auge desse desenvolvimentismo ocorreu nos anos 1950 a 1960, durante o governo do presidente Juscelino Kubitschek, com o desembarque das multinacionais que investiram nos setores de bens de consumo duráveis, o início da construção do setor de bens de capital e da indústria de base. Assim, na prática, promoveu a fusão de um novo bloco no poder formado por burguesias internacionais, burguesia brasileira e Estado. Ainda, segundo o autor, o projeto nacional desenvolvimentista esbarrou de fato no

golpe de 1964, quando as reformas democráticas foram então duramente reprimidas (CASTELO, 2012a, p. 622).

Como fora citado o período de emergência e auge do desenvolvimentismo na história brasileira, cabe ressaltar que o adormecimento das bandeiras nacionalistas e desenvolvimentistas está relacionado à nova ordem do capitalismo mundial emergente a partir dos anos 1970, que consagrou uma nova fase de dependência econômica sob as marcas da interdependência entre os mercados, da especulação financeira e do imperativo neoliberal (já abordado em seção anterior). Segundo Paulani (2012a), a partir de 1970, a emergência do regime de acumulação financeira mundial passou a encontrar no Brasil a demanda por empréstimos, dando início a uma nova fase na inserção da economia brasileira a partir do início do seu processo de financeirização. As consequências da inserção brasileira no capitalismo mundial durante as décadas de 1970 e 1980 foram o aumento da dívida externa e elevadíssima inflação. “O Brasil era o retrato de uma economia periférica já industrializada, vitimada pela marcha acelerada da financeirização do capitalismo em nível mundial” (PAULANI, 2012a, p. 92).

Paulani (2012b) considera que o Brasil tornou-se uma das maiores vítimas do processo de financeirização mundial, que alterou profundamente a relação entre produção e finança, sendo que a segunda passou a dominar o processo de acumulação, submetendo a primeira. A autora explica seu posicionamento da seguinte forma:

Como os investimentos do II PND tinham se tornado possíveis graças ao endividamento externo em contratos estabelecidos a taxas flutuantes, a brutal elevação dos juros internacionais ao final dos anos 1970, patrocinada pelo banco central norte-americano num golpe destinado a resgatar a posição hegemônica do dólar, atingiu em cheio a economia brasileira, minando qualquer possibilidade de uma definitiva ascensão do país ao grupo das nações desenvolvidas (PAULANI, 2012b, p. 2).

Nos anos 1990, a partir dos ditames neoliberais, a economia brasileira então se consolida como potência financeira emergente. Nesse momento a preocupação central da política econômica do governo, durante a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, era a garantia da estabilização monetária e o controle da dívida. Para tanto, as providências tomadas foram: securitização dos débitos e abertura financeira da economia brasileira, com a retirada gradativa dos controles que obstaculizavam o livre fluxo internacional de capitais. Tais medidas possibilitaram o retorno de capitais ao país e o acúmulo de reservas, uma das

bases de sustentação do Plano Real (PAULANI, 2012a, p. 92). Nesse mesmo sentido, outras medidas também foram tomadas:

Concessão de isenções tributárias a ganhos financeiros de não residentes, alterações legais para dar mais garantias aos direitos dos credores do estado, e uma reforma previdenciária para cortar gastos públicos e abrir o mercado previdenciário ao capital privado. Em paralelo, mas tudo contribuindo para o mesmo resultado, adotou-se uma política monetária de elevadíssimos juros reais e um controle fiscal bastante rígido (buscando gerar polpudos superávits primários) e deslanchou-se o processo de privatizações (PAULANI, 2012a, p. 92).

Tais medidas tomadas pelo governo “foram vendidas como necessárias para modernizar institucionalmente a economia brasileira e viabilizar sua inserção na nova economia globalizada”, porém seu fundamento era “colocar o Brasil no circuito da valorização financeira” com absorção de poupança externa necessária à manutenção da sobrevalorização da nova moeda (PAULANI, 2012a, p. 93).

Essa realidade colocada para o país consiste em uma expressão de um movimento mais amplo que impelia medidas para as políticas econômicas dos países latino-americanos a partir do Consenso de Washington.

Em essência, as medidas do Consenso representaram a vitória político-cultural da burguesia rentista e prepararam o terreno para a inserção da América Latina na etapa contemporânea do imperialismo, na qual a região se torna uma plataforma de valorização dos capitais estrangeiros por meio de compras e expropriações maciças de bens públicos e da especulação financeira (CASTELO, 2012a, p. 623).

Assim, a conjuntura brasileira nos anos 1990 era de um país cuja agenda política girava em torno da estabilização financeira e de ajuste fiscal, mais que do crescimento econômico propriamente dito. Os maiores impactos dessa conjuntura recaíram sobre as políticas sociais, tendo em vista o prevalecimento de uma visão de que Estado deveria se limitar ao controle da política econômica e adotar reformas que visassem o enxugamento da máquina, através de privatização e cortes de gastos públicos. Os efeitos da nova ordem atingiram incisivamente as classes sociais desprivilegiadas, a partir do aumento do desemprego e da precarização do trabalho, bem como da perda de direitos sociais derivados de reformas nas leis trabalhistas e da privatização da saúde, previdência e educação (CASTELO, 2012a, p. 623).

Além dessas perdas, o país tornou-se vulnerável à economia externa e obteve baixas taxas de crescimento do PIB durante os dois mandatos do presidente Fernando Henrique. É então que esses desdobramentos do neoliberalismo apontam para um desgaste de suas

premissas que, somado à crença nas possibilidades de mudanças direcionada ao governo do Partido dos Trabalhadores em ascensão, serviram de motivo para o ressurgimento do debate, entre alguns economistas, sobre um projeto desenvolvimentista requalificado pelo prefixo novo. Entretanto, o Governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva do PT manteve o compromisso com o Fundo Monetário Internacional (FMI), declarado na “Carta ao Povo Brasileiro” em 2002, em meio ao processo eleitoral. Além disso, seu primeiro mandato presidencial passou a adotar a mesma política econômica do governo anterior, o que serviu como alvo de críticas por parte de economistas de diferentes correntes teóricas, segundo Morais e Saad-Filho (2011, p. 508).

Durante esse período, então, foram sistematizadas as primeiras propostas, de inspiração keynesiana e estruturalista, para o novo desenvolvimentismo como estratégia para o crescimento e desenvolvimento do país. As primeiras publicações foram de Bresser-Pereira em 2004 ao jornal Folha de São Paulo, um artigo intitulado “O novo desenvolvimentismo”; e o livro “Novo desenvolvimentismo” publicado em 2005, por autoria de Sicsú, Paula e Michel.

Segundo Mollo e Fonseca (2013, p. 234), os autores novo desenvolvimentistas, dos quais citam os precursores Bresser-Pereira e Sicsú et al, defendem uma atualização do projeto desenvolvimentista adaptada às novas condições macroeconômicas, não mais centrada na “balança comercial”, mas na “conta de capitais”. Dessa forma, Mollo e Fonseca (2013) defendem tais proposições como herdeiras da mesma causa desenvolvimentista, embora situadas em novo contexto, o qual exige novas estratégias.

Mollo e Fonseca, apoiados em Bielschowsky, conceituam desenvolvimentismo da seguinte forma:

“Ideologia de transformação da sociedade brasileira” assentada em um projeto econômico voltado à industrialização como via de superação da pobreza e do subdesenvolvimento, sob o entendimento de que esta não adviria pela espontaneidade das forças de mercado, ou seja, seria indispensável a atuação do estado como indutor, como agente planejador do desenvolvimento e/ou investidor direto (BIELSCHOWSKY, 1988, p. 7 apud MOLLO; FONSECA, 2013, p. 223). Assim, destaca-se a centralidade do papel do Estado associado ao processo de industrialização como alavancas para um desenvolvimento nacional. Esta concepção de Estado, segundo Mollo e Fonseca (2013, p. 224), se distancia da visão da ortodoxia neoliberal, para a qual “o papel que o estado pode ter para impulsionar o desenvolvimento econômico é limitado e discutível, porque, em primeiro lugar, o crescimento é algo que depende de iniciativas privadas”. Apoiados em Bresser-Pereira (2006 apud MOLLO;

FONSECA, 2013, p. 225), os autores apontam que, em contraposição à ortodoxia, a discussão acerca da importância do papel do Estado como interventor na sociedade possui raízes teóricas heterodoxas, ora vinculada ao marxismo, a macroeconomia keynesiana ou a teoria estruturalista. Entretanto, a “ideologia de transformação da sociedade brasileira” encontrou suas bases teóricas nessas duas últimas correntes.

Para os proponentes do novo desenvolvimentismo, uma questão central é a existência de um Estado forte para administrar o mercado. Portanto, manifestam-se em oposição à ortodoxia neoliberal (para a qual o mercado é autorregulado e o Estado deve ser mínimo) e, ainda, ao nacional-desenvolvimentismo (que impingia ao Estado funções excessivas, inclusive como produtor industrial). Assim, na estratégia “novo desenvolvimentista”, o Estado possui um papel de destaque, porém com funções voltadas à regulação da economia em prol do desenvolvimento. Nessa direção, Mattei aponta:

Para o novo desenvolvimentismo, no atual estágio produtivo não faz mais sentido a existência de um “Estado-empresário”. Isto não quer dizer que esteja sendo defendida por esse grupo a ideologia do “Estado Mínimo”, ao contrário propõe-se o seu fortalecimento nos campos político, regulatório e administrativo (MATTEI, 2011, p. 10).

Portanto, seriam esses os papeis do Estado na visão novo desenvolvimentista, diferente da realidade vigente durante o nacional-desenvolvimentismo, em que “as empresas privadas nacionais praticamente tiveram um papel secundário na industrialização do país” (MATTEI, 2011, p. 10). Ao contrário, no novo desenvolvimentismo o Estado seria o “responsável pela criação de oportunidades de investimento lucrativo para os empresários no quadro de uma estratégia nacional de desenvolvimento” (BRESSER-PEREIRA, 2010, p. 7). Ainda na visão de Bresser-Pereira (2010, p. 23), “enquanto que no nacional- desenvolvimentismo o Estado tinha como tarefa completar a acumulação primitiva de capital e promover a revolução industrial, no novo desenvolvimentismo o papel do Estado diminui e o do mercado aumenta”.

O novo desenvolvimentismo alega a importância da intervenção estatal, diferente do modelo empresarial e protecionista vigente no velho desenvolvimentismo que, diga-se de passagem, é criticado tomando-se por base as experiências históricas de governos brasileiros reconhecidos como desenvolvimentista. Alguns pontos criticados nesse antigo modelo: a inflação era tolerável, as medidas econômicas voltavam-se para a infraestrutura, investimento direto no setor produtivo, substituição de importações, industrialização e protecionismo, mas

sem avanço tecnológico competitivo. Além disso, havia um discurso nos governos antidemocráticos de que seria necessário que primeiramente o “bolo” crescesse para que depois fosse distribuído, ou seja, não havia naquele modelo a pretensão de melhorar as condições de vida da população através do acesso ao emprego e aumento da renda. Esse aspecto da distribuição da renda também estava ausente na política neoliberal dos anos 1990 cujo papel do Estado era reduzido à política econômica, especialmente voltada para a estabilidade monetária.

De maneira enfática, Mollo e Fonseca (2013) apresentam a diferença fundamental entre os desenvolvimentismos (velho ou novo) e a ortodoxia neoliberal.

A estratégia ortodoxa responsabiliza o mercado pelo desenvolvimento, enquanto a desenvolvimentista vê o estado sempre necessário, embora propondo, regulamentando e intervindo de forma diferente conforme a conjuntura, as necessidades específicas e o projeto nacional desejado pelo país (MOLLO; FONSECA, 2013, p. 234).

Ainda nessa linha de se contrapor ao neoliberalismo, quando os autores novos desenvolvimentistas se referem ao modelo de política econômica mais adequado, indicam:

As políticas econômicas decorrentes da perspectiva novo-desenvolvimentista não se satisfariam, portanto, apenas com a “estabilidade monetária”, objetivo maior das políticas neoliberais. Ao invés disso, seu objetivo é a “estabilidade macroeconômica”. (...) Esses objetivos só podem ser alcançados por políticas com objetivos múltiplos e pela complementaridade entre as políticas monetária, fiscal, cambial e salarial (MORAIS; SAAD-FILHO, 2011, p. 513-514).

Além da adoção dessa política “macroeconômica” centrada no tripé metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário, a partir de 2006, o governo Lula passou a adotar novas iniciativas e políticas, “estabelecendo-se, dali em diante então, a política econômica híbrida que caracterizou esse governo até 2010” (MORAIS; SAAD-FILHO, 2011, p. 509). Estas medidas as quais os autores se referem como responsáveis pelo caráter híbrido da política econômica, na verdade, estão relacionadas à redução da desigualdade de distribuição de renda, por intermédio do aumento de recursos dos programas de transferência de renda e elevação do salário mínimo, bem como o aumento do investimento público em recuperação ao papel do Estado no planejamento do crescimento de longo prazo (MORAIS; SAAD- FILHO, 2011, p. 517). Estas medidas, embora não estivessem explícitas na proposta do grupo neoestruturalista vinculado a Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, liderado por Bresser- Pereira, são admitidas tendo em vista que, “no longo prazo, supondo-se progresso técnico

neutro, o aumento dos salários à mesma taxa do aumento da produtividade é compatível com a manutenção da taxa de lucro no nível satisfatório para os empresários investirem” (BRESSER-PEREIRA, 2010, p. 8).

A necessidade de medidas voltadas à distribuição de renda como parte do projeto novo