2. INSTRUMENTOS PARA A SUSTENTABILIDADE DA GESTÃO E
2.1. Desenvolvimento sustentável e a sua evolução
Será suficiente recordar que a Terra é finita para salientar a evidência de que o
crescimento de tudo quanto é físico, incluindo a população humana, os automóveis ou as
fábricas, não se pode processar indefinidamente. A forma como as populações vivem,
trabalham, atuam, relacionam e se organizam para satisfazer as necessidades e, em geral,
como se comportam como membros da sociedade, gera impactes sociais, ambientais e/ou
económicos.
De facto o homem não faz desaparecer os recursos. Utiliza-os e devolve-os, e essa
utilização inicia-se numa fonte ou origem e termina inevitavelmente num depósito ou destino
final. É este o ciclo completo que deve ser considerado, não só do ponto de vista ambiental,
mas também do ponto de vista socioeconómico e jurídico. Os limites ao crescimento são,
portanto, limites à capacidade do planeta fornecer esses fluxos de recursos e de energia, e à
capacidade dos destinos finais absorverem a poluição e os resíduos.
Todos os projetos de desenvolvimento urbano ou oferta de serviços implicam
modificações, as quais podem afetar mais do que o espaço físico. Essas mudanças podem ser
concebidas positivamente, para minimizar os seus impactes, ou podem ser ignoradas,
deixando que o meio alterado (físico e social) siga o seu percurso, normalmente num processo
de degradação cada vez mais acelerado. A forma atual de entender a gestão ambiental remete
ao conjunto de ações preventivas e paliativas para minimizar os efeitos ambientais da
atividade humana. A gestão ambiental é antes de tudo a gestão do comportamento humano,
tanto fora como dentro das organizações, permitindo um melhor conhecimento das várias
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A preocupação da comunidade internacional com os limites do desenvolvimento do
planeta data da década de 60, quando iniciaram as discussões sobre os riscos da degradação
do ambiente. A publicação em 1962, da obra de Rachel Carson “Primavera Silenciosa”, onde
descreve vários problemas ambientais que até ao momento tinham sido ignorados, veio
despertar as comunidades para a intervenção do Homem no ambiente, a tentativa de controlar
o mundo natural que o rodeia e as consequências deste facto (Liddle, 1994). Em 1968 foi
publicada a obra “A Tragédia dos Comuns” (Hardin, 1968) a qual também veio contribuir
para a consciencialização da importância do ambiente e impulsionar a comunidade
internacional para a tomada de medidas (Colby, 1991 e UNEP, 2002). Os altos níveis de
poluição e de degradação ambiental decorrentes de um processo predatório de
industrialização, comprometedor do ambiente e da saúde, foram alguns dos mais
significativos problemas que, em 1968, levaram o governo da Suécia a propor à organização
das Nações Unidas (ONU) a realização de uma conferência internacional para discutir esses
problemas e sugerir princípios de solução (Pelicioni, 1998).
Em 1971, o relatório “Limites do Crescimento” encomendado pelo Clube de Roma, e
coordenado por Dennis Meadows (Meadows, et al., 1972) substanciou esta necessidade,
prevendo de uma forma alarmista, que mantendo o ritmo de crescimento vigente, verificar-se-
ia um esgotamento de alimentos e outros recursos naturais e um consequente declínio da
população ainda no século XXI. Em 1972 foi realizada na Suécia a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, mais conhecida como Conferência de Estocolmo,
considerada a conferência “mãe” do ambiente, pois, pela primeira vez debateram-se, a uma
escala planetária entre os 113 países e 250 Organizações Não Governamentais (ONG), as
questões ambientais, despoletando um alerta para os problemas ecológicos associados ao
desenvolvimento económico (Adede, 1995). Cria-se nesta conferência o Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), e a partir deste evento, surge em 1973 formulado
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tipo de desenvolvimento desejado (Barberi, 2000), posteriormente consolidado em 1976 por
Ignacy Sachs com a proposição de seis princípios básicos: (i) satisfação das necessidades
básicas; (ii) solidariedade com as gerações futuras; (iii) participação da população envolvida;
(iv) preservação dos recursos naturais e do meio ambiente; (v) elaboração de um sistema
social que garantisse emprego, segurança social e respeito a outras culturas; e (vi) programas
de educação. Esta teoria referia-se principalmente às regiões subdesenvolvidas, envolvendo
uma crítica à sociedade industrial. Foram os debates em torno do eco desenvolvimento que
abriram espaço ao conceito de desenvolvimento sustentável (UNEP, 2002).
O conceito de sustentabilidade alcançou reconhecimento internacional por via do
relatório da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações
Unidas, conhecido como Relatório Brundtland, publicado em 1987, intitulado Our Common
Future (WCED, 1987). Neste documento, o desenvolvimento sustentável é concebido como
aquele que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações
futuras satisfazerem as suas próprias necessidades, definição hoje universalmente aceite.
Em 1989 cria-se o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (PIAC),
constituído por três grupos de trabalho, orientados para a avaliação das alterações climáticas
nomeadamente referente à camada do ozono, impactes ambientais e socioeconómicos e
respostas estratégicas (UNEP, 2002). O PIAC contribuiu assim para a consciencialização do
público nesta matéria, alertando-o para os efeitos do aquecimento global.
Vinte anos após a conferência de Estocolmo, foi realizada em 1992, no Rio de Janeiro a
maior conferência da história, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (CNUMAD) - United Nations Conference on Environment and
Development também conhecida por Eco-92, Cúpula, Cimeira da Terra, com participação dos
principais líderes de mais de cem nações. O seu objetivo principal era conciliar o
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A Eco-92 consagrou o conceito de desenvolvimento sustentável e contribuiu para a mais
ampla consciencialização de que os danos ao ambiente eram maioritariamente da
responsabilidade dos países desenvolvidos. Reconheceu-se, ao mesmo tempo, a necessidade
dos países em desenvolvimento receberem apoio financeiro e tecnológico para avançarem na
direção do desenvolvimento sustentável, de forma a equilibrar, por um lado, a economia e a
sociedade e, por outro, manter o estado dos ecossistemas (Brunckhorst, 1998). Foram
adotadas políticas de eficiência económica e melhoria ambiental, destacando-se a Agenda 21.
Trata-se de um plano global de ação estratégico para ser posto em prática por todos os
governos com convenções sobre as mudanças climáticas, a diversidade biológica e a
desertificação que propõe o exame dos padrões insustentáveis de produção e consumo e o
desenvolvimento de políticas e estratégias nacionais de estímulo a mudanças nos padrões
insustentáveis de consumo (UN, 1992). A Agenda 21 dá ênfase: (i) à minimização da geração
de resíduos; (ii) à maximização da reutilização e reciclagem de resíduos com um enfoque
ambiental; (iii) ao estímulo ao tratamento dos resíduos de modo ambientalmente adequado;
(iv) à deposição dos resíduos de modo ambientalmente adequado; e (v) à universalização da
cobertura dos serviços de resíduos.
É assim neste contexto, que a separação e a reciclagem das matérias-primas depois de
usadas constituem passos no sentido da sustentabilidade, reduzindo as quantidades de
matérias-primas necessárias e os volumes de resíduos a conduzir a destino final. A
reutilização é ainda mais eficaz na prossecução deste objetivo, pois evita as operações de
prefabrico (UNSD, 1992). Consequentemente, facilmente se compreende a importância que
assume, em termos de política de gestão de resíduos, o chamado princípio dos 3R (reduzir,
reutilizar, reciclar), consagrado no 5.º Programa de Ação em matéria de ambiente da UE.
Em 1995 decorreu a Cimeira de Copenhaga, onde a UE formulou os três pilares da
sustentabilidade: o progresso sócio-cultural e o desempenho ambiental, ambos aliados ao
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em 1997, que deu origem ao Protocolo de Quioto, no qual a maioria das nações concordou em
reduzir as emissões de gases estufa que intensificam o chamado efeito de estufa, em pelo
menos 5% em relação aos valores de 1990.
Em 1997, cinco anos após a cimeira do Rio de Janeiro, decorreu em Nova Iorque a
Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas para avaliar o grau de
implementação dos programas de ação contidos na Agenda 21, na qual os vários Estados
assumiram o compromisso de preparar Estratégias Nacionais para a implementação da
Agenda 21, e assim contribuir para se alcançar o desenvolvimento sustentável.
A entrada num novo milénio fomentou o empenho para o desenvolvimento e aplicação de
políticas. Em 2000, realizou-se em Nova Iorque a Cimeira do Milénio, com publicação da
Declaração do Milénio a partir da qual foram estabelecidos os Objetivos do Milénio,
compreendendo metas a serem cumpridas tendo em conta oito grandes objetivos (UNDP,
s.d.):
1. Erradicar a pobreza extrema e a fome;
2. Alcançar a educação primária universal;
3. Promover a igualdade do género e capacitar as mulheres;
4. Reduzir a mortalidade infantil;
5. Melhorar a saúde materna;
6. Combater o HIV/SIDA, a malária e outras doenças;
7. Assegurar a sustentabilidade ambiental;
8. Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento;
Destacam-se os objetivos referentes à sustentabilidade ambiental e ao desenvolvimento
de uma parceria global para o desenvolvimento.
Em 2001 é publicada a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes
(POP), onde se definiram medidas de controlo para doze substâncias químicas, alertando para
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de Avaliação, onde as estimativas do aquecimento global aumentaram (UNEP, 2002) e a
Estratégia Comunitária para o Desenvolvimento Sustentável é aprovada pelo Conselho
Europeu em Gotemburgo (2001).
Dez anos após a Eco-92, a ONU realizou a Conferência das Nações Unidas sobre
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo (África do Sul), a chamada
Rio+10 ou Conferência de Joanesburgo, cujo principal objetivo seria rever as metas propostas
pela Agenda 21 e direcionar as realizações às áreas mais carenciadas. Porém, o evento tomou
outra direção, voltado para debater quase que exclusivamente os problemas de cunho social.
Foi acordado o tratamento equilibrado e de uma forma integrada dos três pilares do
Desenvolvimento Sustentável e definido um plano de ação de onde se destaca, entre outros, o
combate à pobreza e a gestão dos recursos naturais (Canotilho et. al., 1998 e MCOTA, 2002).
Também é de referir que, em 2004, a Comissão das Comunidades Europeias (CCE)
apresentou uma Comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu, Building Our Common
Future, onde foram definidos os grandes objetivos das Políticas da União para o período
2007-2013, nomeadamente, o desenvolvimento sustentável, a cidadania europeia e a projeção
da Europa como parceiro global (CCE, 2004).
Em Portugal, em julho de 2004, foi apresentada ao Conselho de Ministros a Estratégia
Nacional de Desenvolvimento Sustentável (ENDS) que contém as linhas a investir em
Portugal num horizonte que se estende até 2015, bem como o seu respetivo plano de
implementação, o que coincide com o início da década internacional para o desenvolvimento
sustentável (Mota et al., 2004). Para avaliar o grau de sucesso do plano de implementação da
ENDS, foi desenvolvido um sistema de indicadores-chave, o qual se baseia nos indicadores de
sustentabilidade que têm vindo a ser definidos ao longo da última década pela UE, OCDE e
diferentes Agências das Nações Unidas (Mota et al., 2004).
Em 2007, o PIAC publica o seu Quarto Relatório de Avaliação. É de realçar a
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Climáticas (CQNUAC) e o Encontro das Partes para o Protocolo de Quioto, decorridos em
Bali, em dezembro de 2007, e de onde resultou um plano de ação. Este plano, entre outras
matérias, contém decisões que constituem as bases das negociações de uma política pós
Protocolo de Quioto, uma vez que este expira em 2012 (UNEP, 2009). Na conferência
realizada, em dezembro de 2008, em Poznan, destaca-se a criação do Fundo de Adaptação
com o propósito de financiar projetos e programas nos países em desenvolvimento,
integrantes do Protocolo de Quioto, e que são particularmente vulneráveis aos efeitos
adversos das alterações climáticas (UNFCCC, 2009). A Conferência das Partes para a
CQNUAC teve lugar em Copenhaga, em dezembro de 2009, cuja campanha de divulgação,
“Unidos para Combater as Alterações Climáticas” demonstra precisamente que todos têm de
estar envolvidos nesta causa e que, no sentido lato, a proteção do ambiente é da
responsabilidade de todos.
Para assinalar os 20 anos da Conferência do Rio´92 – Conferência das Nações Unidas
sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento teve lugar durante o período compreendido entre
20 a 22 de junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro (Brasil) a conferência RIO+20, que
teve como objetivo a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável
(UNCSD, 2012).
O ambiente tem ocupado nas últimas décadas, cada vez mais, um papel de destaque em
matéria de desenvolvimento sustentável, sendo que é crescente a conjugação de políticas
ambientais com outras áreas como o desenvolvimento económico, boas práticas de
governança, transferência de tecnologia, ciência e educação e globalização, que serve de elo
de ligação entre todos. Enquadrada na gestão ambiental e sustentabilidade, apresenta-se a
problemática relacionada com os resíduos, a qual envolve questões sociais, económicas,
políticas, ambientais e de saúde, e não pode ser ignorada nem negligenciada. O crescimento
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ligado à geração contínua de resíduos (Meyers et al., 2006). Os resíduos são, por este motivo,
uma das componentes inerentes ao crescimento económico.
O desenvolvimento de uma gestão sustentável dos sistemas de gestão de resíduos, depara-
se com um problema, que é a aceitação social do sistema pela comunidade através da
minimização dos impactes ambientais associados ao seu funcionamento, conservação dos
recursos naturais, diminuição de emissões poluentes e um custo de gestão aceitável.