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3 DESINDUSTRIALIZAÇÃO EM DEBATE NO BRASIL

3.2 DESINDUSTRIALIZAÇÃO: O CONCEITO E O DEBATE INTERNACIONAL

3.3.2 Desindustrialização pela ótica do valor adicionado

Parte fulcral do debate brasileiro recente sobre desindustrialização, como já mencionado, tem versado sobre a questão da dinâmica da participação do produto industrial na economia brasileira. Com efeito, a maior parte da literatura tem recorrido à longa série disponibilizada pelo IBGE, cuja disposição apresenta a participação do valor adicionado da indústria no PIB a preços básicos (ou valores correntes) desde o início da apuração das Contas Nacionais, em 1947. O uso de uma série estatística tão longa, naturalmente, traz dificuldades de natureza metodológica.

Como observam Bonelli e Pessoa (2010, p. 15), duas revisões efetuadas pelo IBGE, uma entre 1989 e 1990, e a outra entre 1994 e 1995, ao não terem os seus efeitos corrigidos, por extrapolação, na série pregressa, tornam a leitura desta, sem as devidas correções, um exercício enganoso. Marcadamente, a série original – a linha azul no Gráfico 6 – indica que, em valores correntes, tendo chegado a representar quase 36% do PIB nacional em 1985, o valor adicionado da manufatura no PIB reduz-se a pouco menos de 15% em 1997; uma queda de impressionantes 21 pontos percentuais em 12 anos. Destarte, o procedimento corretivo sugerido por Bonelli e Pessoa (2010) dá origem à série encadeada corrigida, equalizando as descontinuidades pontuadas pelas revisões do IBGE.

Ainda assim, em 2015, uma nova revisão23 da metodologia das Contas Nacionais pelo IBGE torna necessária uma segunda rodada de correções, novamente a partir do procedimento sugerido por Bonelli e Pessoa (2010), para permitir encadear e extrapolar as novas informações incorporadas na atualização metodológica das Contas Nacionais ao período precedente. A linha vermelha no Gráfico 6 já imbui essa atualização. Para o período que vai de 2000 a 2014, o novo encadeamento a partir da Nota Técnica do DEPECON/FIESP (2015, p. 10) é detalhado no Gráfico 7.

Gráfico 7 – Evolução da Participação da Indústria de Transformação no PIB (%) – séries original e corrigida (1947-2013)

Fonte: DEPECON-FIESP (2015, p. 10) a partir das Contas Nacionais do IBGE.

A sério corrigida mostra que, a valores correntes, do topo alcançado em 1985, com 21,6% e portanto ao final do grande ciclo industrializante que marcou a economia nacional desde os anos 1930, a participação da indústria de transformação no PIB reduz-se para o mínimo da década de 1990, de 14,8% em 1997, um declínio considerável de 6,8 pontos percentuais no período, ainda que muito inferior ao que a série original permitia vislumbrar. Os anos que seguem até 2004 são de recuperação da participação relativa da manufatura,

23 Tendo 2010 como referência, as principais informações incorporadas são: utilização da Classificação

Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) 2.0; pesquisas periódicas, como POF 2008/9, Censo Agropecuário 2006, Censo Demográfico de 2010 e preparação para o Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares (SIPD); Imposto de Renda Pessoa Física e Jurídica; pesquisas especiais, como Pesquisa de Consumo Intermediário 2010, Pesquisa sobre margem de comércio e transporte; atualização das matrizes de imposto; mudança na composição da Formação Bruta de Capital Físico (FBCF), com a inclusão dos gastos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), gastos com softwares e despesas com exploração e avaliação mineral e; a realocação dos valores sedes das empresas e holdings da Indústria para Serviços.

com o novo topo na década de 2000 alcançando 17,9%, nível a partir do qual caí consistentemente nos nove anos seguintes, alcançando apenas 11,5% em 2013 (ver Gráfico 7)24, valor efetivamente inferior ao começo da longa série do IBGE, de 11,9% em 1947.

Gráfico 8 – Evolução da Participação recente da Indústria de Transformação no PIB (%) – séries original e corrigida, ambas em valores correntes (2010-2014)

Fonte: DEPECON-FIESP (2015, p. 8) a partir das Contas Nacionais do IBGE.

Por sua vez, o Gráfico 8, tomado de Bonelli e Pessoa (2010, p. 17) apresenta a evolução da participação relativa do valor adicionado pela manufatura no PIB nacional, no período até 2007, quando medido a valores constantes de 2008. O gráfico permite observar as fases de aceleração e desaceleração da atividade industrial frente ao produto agregado (PIB real a custo de fatores ou preços básicos). Como discutido previamente, a perda relativa da manufatura, quando medida a valores constantes, é uma dinâmica identificada reiteradamente pela literatura especializada no tema, justamente por envolver uma mudança nos preços relativos dos bens manufaturados em benefício de outros setores, notadamente serviços. A partir dessa métrica, o movimento de perda da participação relativa da indústria no Brasil teria começado ainda na década de 1970, pontualmente no topo, em 1973 e 1976, quando taxas de 21% são registradas, com um movimento de declínio que se aprofunda até os anos 1990, ainda que continue, com reversões cíclicas pontuais, até 2008, quando atinge

24 A partir de DEPECON/FIESP (2015), o ano de 2014 no Gráfico 7 é construído a partir dos dados trimestrais,

participação de 15,6%, ou seja, 5,5% a menos que do que nos pontos de auge três décadas atrás.

Gráfico 9 – Evolução da Participação da Indústria de Transformação no PIB (%) – preços constantes de 2008 (1947-2007)

Fonte: Bonelli e Pessoa (2010, p. 17) a partir de IPEADATA.

Morceiro (2012, p. 72) oferece um quadro mais detalhado para o movimento a preços constantes entre 1996 e 2011. O Gráfico 9 apresenta a evolução da participação relativa da indústria no PIB com valores encadeados a preços básicos de 1995 – após a revisão do IBGE portanto. Nesse caso, também há evidências de que, a partir de 2004, há um processo de desindustrialização, embora de menor intensidade do que aquele medido em termos de moeda corrente. Entre 2004 e 2011, a participação da manufatura na economia total, em valores constantes, diminui aproximadamente dois pontos percentuais, passando de 17,5% para 15,5%. Ademais, no triênio 2009-2011, a partir da médica móvel, é possível observar que a participação relativa da indústria de transformação foi cerca de dois pontos percentuais inferior ao ano de 1998. Esse ano, notadamente, foi o pior momento para a indústria brasileira em termos de proporção do emprego e valor adicionado na economia.

Gráfico 10 – Evolução da Participação da Indústria de Transformação no PIB (%) – preços constantes de 1995 (1996-2011)

Fonte: Morceiro (2012, p. 72) a partir das Contas Nacionais Trimestrais do IBGE.

Destarte, como primeira aproximação, de 2004 até o terceiro trimestre de 2011, nota- se um movimento contínuo de perda relativa da indústria de transformação no PIB quando medido a valores constantes, dinâmica outrossim já captada pelas séries a valores correntes. Pontualmente, de 2009 em diante, quando os efeitos da crise global de 2008 efetivamente alcançam o país, a indústria nacional, que na média móvel em quatro períodos até então orbitava os 17% de participação relativa quando medido a valores constantes de 1995, reduz-se para um patamar perto dos 15%, indicando uma nova rodada de dificuldades em se fazer recuperar, movimento que se aprofunda no começo da nova década.