• Nenhum resultado encontrado

2 O NEXO EVOLUCIONÁRIO INSTITUCIONALISTA

2.2 A ABORDAGEM EVOLUCIONÁRIA DA TRADIÇÃO INSTITUCIONALISTA

2.2.2 Uma nota sobre a Nova Economia Institucional (NEI)

Com o ocaso do institucionalismo americano original, principalmente a partir da morte de Commons em 1945, uma confluência de autores passa a tratar das questões institucionais em economia em termos metodologicamente mais convencionais, ainda que teoricamente mais amplos que a análise neoclássica. De fato, uma série de estudos nas áreas da teoria da firma, economia dos direitos de propriedade, economia do trabalho e organização industrial, passam a dar substância a um novo corpo de conhecimento que viria a se conformar, principalmente dos anos 1960 em diante, na chamada Nova Economia Institucional (NEI), vertente de resto hoje bastante influente e crescentemente incorporada à ortodoxia em economia. Os principais autores associados a essa corrente são Ronald Coase, Oliver Williamson e Douglas North.

Os economistas da NEI compartilham com o Antigo Institucionalismo a percepção de que as instituições importam e que uma teoria econômica deve ser capaz de analisá-las, ainda que se afastem fundamentalmente da economia institucional vebleniana, invocando antes Commons como uma importante referência. Outrossim, o adjetivo temporal ‘novo’ é utilizado para demarcar explicitamente o campo em contraposição ao ‘velho’ institucionalismo (HODGSON, 1998). Efetivamente, o trabalho clássico de Ronald Coase, The Nature of the Firm (1937), considerado a obra fundadora da NEI e de forte influência de Commons, adianta a ideia nuclear de que as transações, bem como o custo de efetivá-las – os chamados custos de transação –, definem diferente arranjos institucionais de organização econômica, em que a firma emerge como um ambiente capaz de dirimir e operacionalizar esses custos. Notadamente, o arranjo autárquico (ou hierárquico) no interior das firmas, em contraposição ao modo não centralizado de transações no mercado, advém da tipificação já adiantada por Commons nos seus trabalhos (WILLIAMSON, 2000).

Na formatação da Teoria dos Custos de Transação (TCT), uma das âncoras teóricas da NEI e cuja contribuição de Williamson é fundamental, a racionalidade limitada, o comportamento oportunista e a especificidade dos ativos são os principais elementos a explicar os custos e incertezas de transacionar (WILLIAMSON, 1993). Nesses termos, a NEI avança ao alargar o espaço econômico de investigação, incluindo os custos próprios de transação, indo além portanto dos custos de produção (ou transformação) que formatam o conjunto de escolhas analisados pela economia neoclássica. De fato, a NEI organiza-se a partir da crítica de que o programa neoclássico toma as instituições como dadas (HODGSON, 1993), generalizando também o comportamento auto interessado (ainda que não plenamente racional) às situações em que as regras contratuais são elas mesmas sujeitas à ação oportunista e portanto não tomadas como dadas e garantidoras do comportamento previsto (ARGYROUS; SETH, 1996). É nesse sentido que a NEI envolve uma microteoria alternativa, ainda que integrável à ortodoxia, focando na análise dos custos de transação dos direitos de propriedade, contratos e organizações (RUTHERFORD, 2001). Justamente por não romper com o individualismo metodológico, trabalhando com indivíduos que são dados e parcialmente racionais – afastando-se marcadamente da noção evolucionária vebleniana –, a NEI torna-se compatível com o programa neoclássico (HODGSON, 1993)

Nessa conformação teórica, as instituições tornam-se entidades sociais e econômicas a reduzir a incerteza e os custos de transação; tornam-se regras formais e informais que limitam a ação e o comportamento humano, formatando as possibilidades da atividade (e

mudança) econômica. Nesta longa passagem North (1991, p. 97) sintetiza o sentido da conformação e mudança institucional nos termos da NEI:

Institutions are the humanly devised constraints that structure political, economic and social interactions. They consist of both informal constraints (sanctions, taboos, customs, traditions and codes of conduct), and formal rules (constitutions, laws, property rights) Throughout history, institutions have been devised by human beings to create order and reduce uncertainty in exchange. Together with the standard constraints of economics they define the choice set and therefore determine transaction and production costs and hence the profitability and feasibility of engaging in economic activity. They evolve incrementally, connecting the past with present and the future; history in consequence is largely a story of institutional evolution in which the history performance of economies can only be understood as part of a sequential story. Institutions provide the incentive structure of an economy; as that structure evolve, it shapes the direction of economic change towards growth, stagnation, or decline (NORTH, 1991, p. 97).

Notadamente, North enfatiza uma noção de cumulatividade, sequencialidade e dependência de trajetória bastante próxima do Antigo Institucionalismo Americano, ainda que seja não evolucionário no sentido de ser teleológico. Não há uma causação cega, com novas práticas, hábitos e variantes sendo continuamente selecionadas como no marco evolucionário darwinista vebleniano, mas antes um sentido de desenvolvimento propositado de instituições e governanças, de um “bom” ambiente institucional e de “boas” políticas, ao que a literatura associada à NEI imbui uma noção de otimalidade e trajetórias eficientes (CONCEIÇÃO, 2008).

Em outros termos, Williamson (2000) apresenta um diagrama já consagrado (Figura 2) que, nos seus múltiplos níveis, indica as relações de conformação e de feedback que caracterizam os processos de mudança institucional, bem como indica metodologicamente como a NEI expande o campo de pesquisa em economia. As setas descendentes indicam as relações de restrição que um nível superior implica sobre o nível imediatamente abaixo; as setas pontilhadas, por sua vez, indicam movimentos de feedback do nível inferior para o imediatamente acima.

Nota-se que o primeiro nível (L1), de embeddedness, onde estão as instituições informais, as tradições e os costumes, refere-se ao ambiente propriamente evolucionária na medida em que o surgir de novos elementos é não propositado, majoritariamente não calculado e espontâneo; “given these evolutionary origins, they are ‘adopted’ and therefore display a great deal of inertia” (WILLIAMSON, 2000, p. 597).

Os níveis L2 e L3 representam a metáfora de instituições como ‘regras do jogo’, de entidades propositadamente desenhadas (usualmente na sua expressão legal e formal) e que respondem a alguma sentido de otimalidade. O segundo nível (L2) se refere ao ambiente institucional de fato, de regras formais; enquanto o terceiro nível (L3) envolve o ‘jogo’ per se, com a governança alinhando as estruturas de gestão com as transações. O quarto nível (L4) seria o mundo neoclássico padrão, de otimização na margem e de alocação contínua dos recursos. Notadamente, cada um desses níveis responderia a dinâmicas temporais de mudança com cadências diferentes, em que a cumulatividade opera de forma mais ou menos intensa.

Destarte, conquanto revoque o fundamento evolucionário vebleniano, não rompendo portanto metodologicamente com o neoclassicismo e enfatizando antes noções de otimalidade e equilíbrio e não de conflito e causação cumulativa cega, a NEI comunga do institucionalismo original – principalmente com Douglas North – a noção de que a história importa e que as trajetórias institucionais são múltiplas e diferenciadas (CONCEIÇÃO, 2008).

Figura 2 – Economia das Instituições

Fon te: Williamson (2000, p. 597).