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4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.3. Diferenciação Pedagógica

4.3.5. Diferenciação do Processo

Inclui a modificação do processo, nomeadamente o tipo de actividade, materiais e estratégias de ensino, as convicções do professor de EF relacionadas com este assunto e alguns casos práticos decorrentes da análise das aulas observadas.

O caminho que conduz o aluno pelo processo de ensino deve ser de algum modo personalizado de forma a que se sinta seguro no respectivo trajecto e consiga alcançar a aprendizagem. Obviamente que numa turma de vinte e cinco alunos não terão de coexistir vinte e cinco percursos individuais. Aquilo a que nós nos referimos quando falamos em personalização tem que ver com a mudança pontual de uma ou outra actividade e uma selecção mais criteriosa de exercícios tendo em conta as características próprias de cada aluno, de modo a facilitar a sua aprendizagem.

À semelhança do que foi analisado noutras categorias, o PEF continua a demonstrar uma postura desfasada entre o seu discurso e a sua prática, fazendo sobressair enormes incongruências. Como exemplo gostaríamos de destacar o facto do professor afirmar veemente, e por várias vezes, que não modifica a sua estrutura organizativa da unidade didáctica, situação que tivemos oportunidade de comprovar nas aulas observadas: ―eu sigo muito o que nós temos que fazer durante essa unidade didática...‖; ―raramente faço exercícios individuais para miúdos...‖; ―raramente mudo de exercício/ planificação‖; ―mesmo para não se sentirem diferentes, é tudo igual‖ (a referir- se às actividades). (PEF, Entrevista 2)

Agora vejamos o que nos diz o PEF, ainda na mesma entrevista:

―uso exercícios pondo-os mais complicados de maneira que eles consigam ter outra...portanto que as competências deles sejam mais desenvolvidas e não fiquem sempre no mesmo patamar, nunca fugindo ao que é pedido a essa turma e para o ano‖;

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―Se a turma já está toda nesse nível, tento dar mais qualquer coisa que provavelmente no ano a seguir...‖;

―Quando é assim deixo, quando vejo que são poucos e já estamos se calhar no final dessa unidade didáctica provavelmente não dou mais do que já... desta modalidade. É uma metodologia que eu tenho‖;

―Agora peço é para que eles tentem fazer coisas mais difíceis ou com grau de dificuldade maior provavelmente que será a tarefa a seguir que a turma terá no próximo ano, ou nas próximas aulas que irão fazer‖. (PEF, Entrevista 2)

Na verdade, parece-nos que o professor respeita religiosamente a sua planificação, cumprindo-a na sua integralidade sem grandes desvios de percurso. Também é certo que a planificação é um documento precioso para o professor, que o guia e orienta durante o processo de ensino-aprendizagem todavia, consideramos que ela deverá igualmente possuir um carácter aberto e flexível que permita ajustar as actividades e estratégias a todos os alunos. Mais uma vez em oposição a esta ideia, o PEF afirma: ―não vou chegar lá e pôr a fazer exercícios diferentes ou dar jogos diferentes só para aquele aluno ou para aqueles alunos‖; ―fica a fazer tudo igual, pode ser isso uma discriminação, não sei, eu acho que é uma maneira de os integrar no grupo‖. (PEF, Focus Group) Do mesmo modo que o professor não modifica as actividades e as estratégias para que a aquisição de competências seja facilitada, ou no pior dos casos, seja efectuada, também não potencia o desenvolvimento dos alunos mais avançados prescrevendo actividades mais complexas, desafiadoras e interessantes:

―basta ver no futebol, temos miúdos que praticam mais, têm mais à vontade eles pensam que conseguem fazer tudo bem portanto, estou a lembrar-me de um caso do passe e recepção, uma coisa que nós temos que fazer é passe e recepção portanto, tem parar a bola, dominar a bola, e depois passar eles normalmente fazem tudo seguidinho e até fazem bem só que volta e meia, para que a turma funcione eles basta mandar 2 ou 3 vezes, fazer um mau passe porque eles depois aplicam um bocadinho a força que a aula fica assim meia desorganizada‖;

―portanto eu peço sempre, mesmo que eles já sabem fazer provavelmente eles já fizeram milhentas vezes nos treinos que eles têm lá fora é obrigatoriamente tem que parar a bola e depois passar aí, nota-se aquela chatice do tou a fazer isto mas acho que também é uma maneira de os educar porque eles estão inseridos numa turma‖. (PEF, Entrevista 2)

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Iremos pois, a partir desta altura, debruçar-nos sobre aspectos mais específicos das aulas e mais directamente relacionados com os alunos com necessidades educativas especiais.

Verificámos na primeira aula que o Bê, num jogo de Basquetebol 5x5 com uma duração de cerca de 10’, não tocou uma única vez na bola, nem fez menção para isso e ocupou uma zona central do campo, muito reduzida, deslocando-se num espaço de cerca de 2 metros quadrados. Confrontado com este facto o PEF responde da seguinte forma:

―Portanto, ele não está ali para aprender a rematar, a lançar, ou a sair a jogar minimamente, portanto é para estar mais dentro de um grupo e as regras, saber minimamente as regras, é mais nessa maneira que eu...‖ (PEF, 2ª Entrevista)

Explica também que esta é uma forma de protegê-lo de possíveis situações negativas que poderiam advir do facto dele não conseguir corresponder técnica e tacticamente às diversas situações do jogo, acabando por originar continuamente a perda de bola para a sua equipa.

―Há depois o contrário: e se ele falhasse essas bolas todas? Sei lá. Antes... vamos imaginar é o andebol que estavam a jogar. antes de fazer o remate a bola tem que passar 2 vezes por todos os elementos do grupo e aí, é obrigatório ele ter, pelo menos, 2 vezes a bola. Mas depois noutro dia aconteceu o tal caso nessas 2 vezes infelizmente ser ele a perder a bola...Portanto, a coisa depois já se calhar, a parte negativa ainda ia ser pior. E se na vez a seguir se voltasse a acontecer mas nunca me surgiu isso portanto, coloco, ele fica a jogar, o que ele sabe jogar ou não e o que a turma, o que o grupo pensa fazer e raramente acontece isso, realmente mas acontece não só com ele, acontece com as meninas que jogam mal ou que não se apressam‖.

(PEF, Entrevista 2)

Efectivamente, os objectivos inicialmente traçados pelo núcleo de educação especial foram nesse sentido, mas um professor, como profissional da Educação Física, não deverá promover hábitos de uma prática regular de actividade física, ensinando-lhes a este nível, os aspectos técnicos, tácticos e físicos elementares de uma determinada modalidade? No seguimento desta ideia, pensamos que seria oportuno o professor condicionar as regras do jogo formal, obrigando de certa forma, a uma participação mais activa por parte dos

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alunos com NEE. Poderia, por exemplo incluir as seguintes regras: (1) passar a bola por todos os elementos da equipa (uma, duas ou três vezes) antes de lançarem ao cesto; (2) nomeá-los para repôr a bola em jogo, quer após as faltas, quer após bola fora; (3) lançar ao cesto de forma alternada, isto é, em cada dois lançamentos, eles teriam de efectuar um; (4) impedir a marcação individual a esses alunos. Estas representam apenas algumas sugestões que não implicam directamente na dinâmica e prestação do grupo e que podem potenciar o desenvolvimento técnico-táctico dos alunos com incapacidades. Relativamente à zona de acção do Bê, pensamos que foi privilegiada pelo facto do jogo decorrer sobretudo próximo dos cestos, o que torna a zona central menos “povoada” e, consequentemente menos propícia aos choques e ao confronto físico. Similarmente pudemos constatar que, o Bê evitou o contacto com um dos seus colegas de grupo quando, por exemplo, corriam para apanhar uma bola que se lhes tinha escapado. Acerca deste assunto, o PEF discordou: ―não, porque lembro-me perfeitamente em basket que, quando ele tinha que ir buscar a bola e às vezes era pedido isso, ele, carga dava.‖ (Entrevista 2)

Relacionado ou não com esta situação, verificámos que também no jogo da apanhada, na primeira aula, o Bê manteve-se a um canto do espaço de jogo, isolado dos colegas e intervindo muito pouco. Num jogo onde lhe é solicitada permanentemente a corrida, o Bê ficou 2 a 3 minutos parado, sem que ninguém o apanhasse, passando inclusivamente à margem da atenção do professor. Confrontado com esta situação, o PEF responde:

―Só passados esses 2 ou 3 minutos é que eu tinha reparado que ele não tinha corrido, não estava a correr‖. Não foi para ele ser apanhado logo, reparei que ele não...‖ (PEF; Entrevista 2)

Continua atribuindo a responsabilidade deste facto ao aluno, justificando que é a sua maneira de ser:

―é, mas eu lembro-me perfeitamente agora no final do andebol, pedia constantemente para ele ir defender e atacar e...mas eu acho que é a maneira de ser dele. Eu não posso...‖;

―ele é um menino especial. Especial de uma maneira, porque tem a maneira dele de pensar nas coisas, de estar, neste caso a jogar portanto o futebol, que

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ele adora, faz a mesma coisa, gosta muito mas, volta e meia, faz um, repõe a bola na linha lateral mas não faz mais do que isso... e o que ele gosta de fazer é jogar futebol‖;

―agora a maneira dele própria ou não se gosta muito de se cansar, entre aspas, não é?‖. (PEF, Entrevista 2)

Como possível solução para este problema, o PEF não aponta nenhuma estratégia:

―não resulta, por muito que eu ache que insistisse, que às vezes insisto, ele continua na mesma, pode correr mais um bocadinho mas a seguir já está parado noutro local, mas é a característica do miúdo, acho eu‖. (PEF,

Entrevista 2)

No que respeita às adaptações efectuadas nas actividades, o PEF refere que o Bê não necessita delas uma vez que realiza todas as competências propostas: ―No Bê quase tudo é sempre,sempre o que os outros faziam, porque ele tem essa disponibilidade física‖; ―(...) o Bê faz tudo o que os outros...‖; ―Porque ele a nível motor é bom e melhor que muitas meninas e alguns rapazes porque ele tem mesmo disponibilidade...‖ (PEF, 2ª Entrevista).

Por outro lado, no caso específico do Jota, já há necessidade de se realizar algumas adaptações:

―O Jota não, o Jota algumas coisas que tive que adaptar, no lançamento, o...agora no andebol o passe‖ (PEF, Entrevista 2)

Um dos exemplos destacados pelo professor de EF foi o da alteração do modo como o Jota passava e recebia a bola:

―É fazer sempre o mesmo tipo de passe que ele não consegue passar a bola lá para o fundo portanto tem de ser, se está a fazer com um colega tem que ser perto. O agarrar ele, com uma mão não consegue, que tentassem e dizia, às vezes dizia isso aos miúdos para passarem a bola assim a pingar de maneira que encaixasse para ele conseguir‖. (PEF, Entrevista 2)

Uma outra forma de diferenciar inclui igualmente, a utilização de materiais diversificados, diferentes, adaptados às realidades de cada aluno. Com a incapacidade que o Jota apresenta na sua mão, poderia ser mais vantajoso para aluno manipular uma bola mais leve e macia, em detrimento da bola de Basquetebol, salvaguardando assim a sua integridade ao nível da extremidade do membro incapacitado. No entanto, isso não aconteceu, dado que o professor utiliza os mesmos materiais com todos:

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―depende na modalidade mas normalmente é sempre com o mesmo material‖; ―A parte por exemplo da ginástica, uns estão a fazer uma coisa, se for esse o caso e outros estão a fazer outra e depois trocam. Mas normalmente é com o mesmo material. É uma questão de planificação de aula‖. (PEF, Entrevista 2)