• Nenhum resultado encontrado

2. INCLUSÃO E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM COMPROMISSO COM A

2.2 DIFICULDADES DA ESCOLA NA IMPLEMENTAÇÃO DA INCLUSÃO

Observando o cotidiano da escola, ouvindo alunos e professores percebo que a instituição escolar está fundamentada numa racionalidade normativa que ignora as

subjetividades, a cultura e o modo como nós humanos nos organizamos na sociedade, constituímos nossa percepção de mundo e, em conseqüência aprendemos.

É no grupo social do qual o sujeito humano faz parte que este tece suas percepções de mundo, é nele que socialmente constrói sua linguagem, sua identidade e o sentimento de pertencimento a esse grupo, fazendo sua inscrição na cultura. Também aprende o sentimento de valoração de acordo com os padrões do grupo e em interação dá significado às suas vivências que vão constituindo-se num banco de dados objetivos e subjetivos ao qual se reporta no dia-a-dia e que alicerçam a sua aprendizagem e o constituem como sujeito. É a experiência vivenciada no grupo que está na base da construção e produção do conhecimento como aborda Marques (2006, p. 21):

À base da experiência do gênero humano se inserem os sujeitos em seu mundo da vida e o reconstroem ao nele se relacionarem entre si e com suas objetivações de maneira ainda não tematizadas, isto é, não fraccionada pelas abstrações discursivas, pano-de-fundo e suporte, no entanto, por elas suposto. Coloca-se, assim, o mundo da vida como anterioridade primeira, onde se alicerçam as aprendizagens e se efetivam e onde radica, em sua unidade, o processo de socialização/individuação e da singularização do sujeito.

A escola é a porta de entrada para a socialização e para o conhecimento formal e científico e este, cada vez mais, é visto como a melhor herança que se pode deixar às futuras gerações. Em meio às incertezas do mundo atual ainda é o conhecimento que diferencia os sujeitos na competitividade do mercado, o que sugere que o processo de educação seja permanente. Este é, também o entendimento de inclusão social e escolar.

Segundo Delors (2001) para dar resposta ao conjunto das suas finalidades, a educação deve organizar-se em torno de quatro aprendizagens fundamentais que, ao longo da vida, serão de algum modo para cada sujeito os pilares do conhecimento: “Aprender a conhecer”, isto é, adquirir os instrumentos da cooperação; “Aprender a fazer”, para poder agir sobre o meio envolvente; “Aprender a viver juntos”, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas e, finalmente, “Aprender a ser”, via essencial que integra as três precedentes. Para Delors (2001) estas quatro vias do saber constituem apenas uma, dado que existem entre elas múltiplos pontos de contato, de relacionamento, de permuta.

Outra corrente do pensamento contemporâneo aponta a emoção como parte integrada no processo educativo. Conforme Maturana (2005) – “o que move o organismo vivo

é a emoção, não somente a razão”. Contudo, nunca realmente entendemos as manifestações de emoção e, portanto, não sabemos como interpelá-la, na escola. Por vezes a concebemos muito mais ou muito menos como indisciplina, desinteresse, e a transferimos para disciplinas como artes, e outras das ciências humanas, ou ainda para atividades extracurriculares. Em contraponto com o que diz:

Dizer que a razão caracteriza o humano é um antolho, porque nos deixa cegos frente à emoção [...]. Quer dizer, ao nos declararmos seres racionais vivemos uma cultura que desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção,que constitui nosso viver humano, e não nos damos conta de que todo sistema racional tem um fundamento emocional (MATURANA, 2005, p. 15).

Reporto-me as anotações feitas em meu diário de campo, relembrando cenas de uma aula que assisti ao lado do campo da escola em que os alunos trabalhavam noções relativas ao sistema solar. Não me detive em questionar o professor sobre o conteúdo que estavam trabalhando, mas percebi a empolgação dos alunos ao anotarem a medida da sombra dos corpos refletidos no chão e o dialogo que era produzido a partir de tal fato. Nesta aula havia envolvimento, atenção, interesse, alegria, emoção, interação, os alunos e o professor estavam em harmonia com a temática e a metodologia da aula, cena prazerosa de se ver.

Também ilustro com o relato de uma professora de inglês que propôs aos alunos um jogo para o qual usou como tabuleiro um painel feito com papel pardo no qual escreveu expressões em inglês. Ao mencionar as mesmas em português as equipes que em menos tempo identificassem no painel ganhariam ponto, tamanha a euforia e participação da turma que a única preocupação da professora foi com o “barulho produtivo” gerado em aula que perpassava para os corredores. Afora isso somente dados positivos da tentativa feliz de inovação na metodologia da aula.

Em ambas as situações não houve manifestação de indisciplina, recusa em participar, monotonia, apatia, ambos, professores e alunos saíram da aula satisfeitos, vivenciaram bons momentos em aula, todos participaram ao seu modo, e sentiram-se felizes. A aula foi “dez” diziam os alunos, fatos assim me fazem acreditar que as mudanças são possíveis. Sobre a organização das atividades de aprendizagem Pozo (2002) diz:

Não há recursos didáticos bons ou maus, mas adequados ou inadequados aos fins perseguidos. A instrução deve se basear num equilíbrio entre o que se tem de aprender, a forma como se aprende e as atividades práticas planejadas para promover essa aprendizagem. Ou seja, a aprendizagem é um sistema complexo

composto por três subsistemas que interagem entre si: os resultados da aprendizagem (o que se aprende), os processos (como se aprende) e as condições práticas ( em que se aprende) (POZO, 2002, p. 66).

Ao separarmos a emoção, da lógica e da razão na sala de aula, estamos velando e validando a exclusão no dia-a-dia da escola presente nas entrelinhas do contexto, pois é impossível separar a emoção das outras atividades importantes da vida. Se considerarmos que a emoção é a força que nos move diariamente de forma igual ou superior à razão, poderemos entender ou questionar, a extrema formalidade dos nossos currículos. Aprendizagem requer envolvimento, envolvimento requer emoção. Ilustro novamente, fazendo uso do referencial emocional e sua importância: “Quer dizer todo o sistema racional tem um fundamento emocional. Pertencemos, no entanto, a uma cultura quer dá ao racional uma validade transcendente, e ao que provém de nossas emoções, um caráter arbitrário” (MATURANA, 2005, p. 52).

Rotinas escolares aliadas à realização mecânica de atividades desconstituídas de afeto e de desejo, produzem lacunas no nosso desenvolvimento e acabam excluindo os alunos da escola ou da aprendizagem escolar, porque as práticas pedagógicas não são exatamente as respostas aos seus desejos como aprendentes.

O desejo do aluno é latente no que tange a ser desafiado e chamado a produzir de maneira dinâmica, em aulas criativas e prazerosas. Há um referencial positivo em relação a isso, porém, ainda há uma resistência grande por parte do professor e não compete a este trabalho apontar as razões de tal fato, porém, é pertinente levantar o questionamento frente aos resultados negativos da aprendizagem escolar e a necessidade de um repensar e reavaliar os meios e fins usados na pratica pedagógica.

Será que os alunos conseguem perceber o quanto aprenderam no momento em que tentam decorar e reproduzir em testes e provas os conteúdos da aula? Ainda vivemos rotinas muito mecânicas, massificadoras e meramente reprodutivas no que tange a avaliação da aprendizagem. A nota, o somatório de pontos e os cálculos de médias ainda são o instrumento mais usado para medir/expressar o sucesso ou insucesso do aluno.

Na análise do Relatório da Progressão Parcial (ANEXOS B) percebe-se que a descrição feita pela professora refere-se às tarefas ofertadas como instrumentos de

recuperação ao aluno e não ao efetivo alcance dos objetivos de aprendizagem não atingidos no ano anterior: Isso pode ser percebido na seguinte descrição:

O aluno apresentou dificuldades de aprendizagem, não faz o tema, não estuda, não demonstrou interesse durante o ano letivo.

Marques (2006) destaca:

Exige-se uma revolução do olhar que permita reconhecer a carga cognitiva que existe no todo da vida cotidiana,’mescla confusa de razões e interesses’, só acessível, além da lucidez do espírito, á originalidade e á paixão pela causa humana, ao entusiasmo que Kant postula, na interpretação de Weil, como atividade hermenêutica (PERINE,1897, p. 68). Faz-se necessário uma coexistência no pluralismo e na empatia que estabeleça um vaivém contínuo entre as intra- subjetividades e as intersubjetividades (2006, p. 153).

Entendemos a escola como espaço aberto a todos, indistintamente e por isso, as diferenças devem ser respeitadas. Não apenas as diferenças constituídas pelas deficiências físicas ou mentais, mas sim toda e qualquer diferença individual e é necessário destacar que somos todos diferentes uns dos outros o que constitui a diversidade que deveria ser concebida como fonte de possibilidade e não como fator complicador da inclusão no social e na escola como parte importante desse social.

Ao referir-me a diferença reporto-me as palavras de Demo (2002) quando diz que:

Cada indivíduo é ao mesmo tempo, igual e diferente. É igual porque na linhagem biológica é um membro a mais dentro de sua identidade dinâmica.É diferente, porque desenvolve personalidade própria e irrepetível Os modos de ser e sobretudo de vir a ser são sempre similares e muito diferentes (DEMO, 2002, p. 135).

Um dos grandes desafios no nosso tempo se constitui na convivência com o outro que é sempre diverso de nós mesmos. Essa dificuldade acabou provocando o que na atualidade percebemos como uma crise de sentido e de teorias paradigmáticas.

A emergência de um paradigma educacional que oportunize uma reforma curricular, cujos resultados diminuam os índices negativos de aproveitamento, também será pautada no decorrer deste trabalho, em capítulo específico.

2.3 O SUJEITO APRENDIZ NOS DIFERENTES ESPAÇOS/TEMPO DE