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2. INCLUSÃO E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM COMPROMISSO COM A

2.1 QUANDO O (IN)VISÍVEL DA EXCLUSÃO NOS SALTA AOS OLHOS

Pensar em ex/incluídos remete lembrar aqueles cuja matrícula foi garantida - pois a democratização do acesso à educação é fator positivo em nosso sistema, porém nem sempre no seu percurso escolar estes sujeitos apropriam-se dos conhecimentos básicos para garantir o acesso aos bens sociais e ao mercado de trabalho.

Os resultados apontados, nesta pesquisa, exigem uma leitura mais minuciosa e aprofundada da questão acesso versus qualidade na permanência. A oferta de matrículas aumentou nos últimos anos e, juntamente com ela, a heterogeneidade escolar (cultural, de classe, de gênero, étnica, religiosa...), porém o processo didático pedagógico continuou sendo basicamente o mesmo, ou seja, os procedimentos pedagógicos permanecem pautados numa visão homogênea, linear e unificada dos processos de ensinar e aprender. No entanto, segundo Demo (2002):

A face não linear da aprendizagem é particularmente notória em sua politicidade, porque agrega a dinâmica das relações de poder e coloca na berlinda o processo de formação do sujeito capaz de história própria. Como são irreversíveis os fenômenos históricos, essa mesma propriedade aplica-se a aprendizagem, porque não é somente histórica, como, sobretudo é o expediente central para se poder fazer história (DEMO, 2002, p. 137).

Cabe então aos professores perceberem que cada aluno é diferente em suas expectativas e manifestações e, portanto, apresentam ritmos e resultados diferentes de aprendizagem. Cada um elabora estilo próprio de produzir saberes, e num currículo homogêneo alguns não encontram espaço para se desenvolver, sendo excluídos através da não aprendizagem e conseqüente reprovação.

Estar em sala de aula e não encontrar sentido para sua presença neste espaço faz com que o aluno busque atitudes de descaso com os conteúdos apresentados, com os trabalhos sugeridos pelo professor e até mesmo indisciplina. As aulas, na maioria das vezes, seguem um ritual rotineiro, com uma metodologia que pouco diversificada, que pouco valoriza a diversidade existente. Para Goodlad (1984, p. 231):

Nós não vemos em nossas descrições (das atividades de sala de aula)... Muitas oportunidades para os alunos se envolverem no conhecimento podendo empregar sua gama completa de capacidades intelectuais. E nos perguntamos sobre o que é assimilado por alunos que ficam sentados, escutando, ou realizando exercícios relativamente repetitivos ano após ano.Parte do cérebro, conhecida como o cérebro de Magoun, é estimulada pela novidade. Não me parece provável que os alunos que passam doze anos nas escolas que estudamos experenciem muita novidade. Será que parte do cérebro apenas dorme então? (apud ARMSTRONG, 2001, p. 59).

Refletindo sobre o exposto, me reporto aos alunos que dizem: a aula não tem graça, já sei tudo o que vai acontecer, vamos abrir o livro, ler um capítulo, e responder as atividades, ou então copiar texto e questionário do quadro, bom que tem educação física aí pegamos a bola e jogamos à vontade (DIÁRIO DE CAMPO, abril, 2007).

Normalmente, são estes os alunos citados pelos professores nos intervalos como sendo os desinteressados pela aula, distraídos, rebeldes, indisciplinados. Então eu pergunto: como repensar um currículo que oportunize a real inclusão e oportunidade de aprender a todos? Quais os objetivos a desenvolver nos alunos através de aulas pouco planejadas que nem mesmo o professor está estimulado para dar? Como atender aos anseios desta diversidade presente na sala de aula?

A realidade vivenciada no cotidiano da escola é bastante angustiante, como coordenação pedagógica faço ouvidos a professores e alunos e por vezes nos sentimos imobilizados frente a situações que a realidade apresenta.

Para ilustrar o sentimento vivenciado pelo profissional docente da escola pesquisada trago a fala da professora 01, (17 anos de magistério):

Em 2007, na sala de aula, vejo muita dificuldade de 5ª a 8ª série, mas nos outros níveis não é diferente, essa questão de buscar conhecimento não é interessante, eles (alunos) não querem saber algo além do que está acontecendo ao seu redor. Só querem saber do seu mundinho [...].

Professora 02, (oito anos de magistério), abordando sobre os índices de reprovação assim se manifesta sobre o não aprender:

[...] penso que a gente não motiva ninguém, acho que os alunos não aprendem porque não estudam, eles não são alunos como nós éramos, tínhamos interesse. Eles não tem interesse, não se preocupam com o estudo, não participam como deveriam e acabam não indo bem.

Percebe-se, ouvindo os professores, que há uma tendência em redimir-se do compromisso com a aprendizagem do aluno, impondo-lhe toda a responsabilidade pelo seu fracasso, não se permitindo uma auto-análise sobre uma possível parcela de contribuição no fato de os alunos estarem apresentando dificuldade e desinteresse em aprender. Sei o quanto é difícil para o professor vivenciar o todo que envolve seu cotidiano, sobretudo no que diz respeito à questão financeira que, não há como negar, é fator de influência. No entanto, é nosso compromisso fazer acontecer a aprendizagem na escola. Para tanto, o aluno precisa da parceria do professor, interagir e dialogar com ele e, em muitos casos, se comprova essa possibilidade. Nos conselhos de classe, há os relatos de resultados positivos em alguns componentes curriculares, nos quais os professores investem em uma prática docente dinâmica e inovadora, os alunos demonstram entusiasmo e os resultados são positivos. Como explicar o fato do mesmo aluno ser muito bom em matemática e insuficiente em química? Em uma mesma realidade as situações apresentam diferenciações contrastantes, de difícil entendimento, visto que teoricamente as finalidades sejam semelhantes, o objetivo maior é o sucesso nos resultados da aprendizagem.

Analisemos algumas falas de alunos e professores durante conselhos de classe. (anotação em DIÁRIO DE CAMPO, maio, 2007).

Nós achamos que as aulas poderiam ser diferentes, ter coisas novas, o professor é bom, mas a gente queria que às vezes a aula fosse mais animada, com dinâmicas (ALUNO).

“Tem aulas que a gente entende, a profe explica com calma e de jeitos diferentes, ela ajuda quem não entende” (ALUNO).

“A gente gosta da aula da profe que é alegre e desperta a nossa vontade de entender a matéria, que faz a gente ter interesse pelo conteúdo” (ALUNO).

O que falta para os alunos é mostrar vontade de aprender, interesse pela aula, parece estarem só de corpo presente, é só na hora das provas que se preocupam com os conteúdos, ou quando ficam com nota vermelha que vem atrás de nós pedindo trabalhos para compensar (PROFESSOR).

“O que vocês precisam entender é que esses conteúdos são importantes, alguns são base para os anos seguintes e se não aprenderem agora depois vai fazer falta, tem que se dedicar mais e estudar em casa” (PROFESSOR).

“Não sei mais o que fazer nas aulas, as vezes parece que estou falando pras paredes, tento de tudo e não consigo prender a atenção dos alunos” (PROFESSOR).

Percebo um distanciamento entre as falas dos alunos e professores, parecem relatos de espaços distintos, embora não o sejam. Há expectativas de ambas as partes que não são correspondidas, talvez se faça necessário um entendimento com uso do diálogo, exercitando a capacidade de ouvir, falar, interagir, conversando e não apenas um falando e outro ouvindo na maioria das vezes o professor falando os conteúdos e o aluno tentando ouvir (ou não). Isso parece algo tão simples e óbvio, mas tem sido difícil de implementar. Seria pertinente uma reflexão de ambos sobre o que diz Marques (1999):

[...] Junto à exigência de serem corretamente entendidos, ambos, falante e ouvinte, assumem o compromisso da igualdade de condições em que possa cada um falar, ouvir, concordar, discernir, propor um assunto ou mudá-lo, iniciar ou suspender uma discussão. Conversar, então, é isso: falar, escutar e ser escutado (1999, p. 29).

A linguagem é fenômeno próprio do ser vivo e, conforme Maturana (2005, p. 59), podemos dizer que as pessoas estão na linguagem quando as descrevemos em situação de um “pôr-se de acordo”. Talvez esse movimento é que se faça ausente no fazer pedagógico entre professor e aluno.

A linguagem se constitui quando se incorpora ao viver, quando produz mudanças estruturais nos envolvidos, e assim conseqüentemente também ocorre a aprendizagem. O

aprender tem a ver com nossas interações e também com nossa história de vida, esses elementos precisam fazer parte do contexto de análise, tanto dos professores quanto dos alunos. É provável que assim pudéssemos ouvir relatos e falas diferentes das presentes neste trabalho.

Professor 03, (17 anos de magistério):

Não é geral, tem bons alunos mesmo com a conjuntura que estamos vivendo, mas digo que são somente uns 20% do total de alunos. Esses poucos que querem aprender são prejudicados pela maioria que não tá nem aí, que não querem nada com nada e atrapalham a aula o tempo todo. Como resolver isto? Estamos buscando, cada dia vejo colegas tentando resolver estas questões de como fazer querer aprender, mas está bem difícil atualmente.

Percebe-se uma constante interrogação acerca da questão do aprender dos alunos nas falas dos professores. Essa constatação encontra eco durante os conselhos de classe, onde essa temática é analisada somente pelos resultados (notas) alcançados ao longo dos semestres letivos. É necessário destacar uma “culpabilização” apontada sempre nas ações dos alunos. A causa do fracasso é centrada no aluno, sendo que uma análise mais profunda sobre a realidade, normalmente não é feita.

Chamou minha atenção este fato: “[...] alunos que não aprendem e professores que não sabem como ensinar de maneira satisfatória”. Neste sentido, fui instigada a buscar subsídios teóricos sobre a questão da aprendizagem, buscando entender como ela acontece e como podemos, enquanto educadores, contribuir para que a mesma se efetive na educação escolar.

Afirmamos ser a socialização e a aprendizagem as molas mestras da ação escolar, porém os resultados não têm apontado referenciais satisfatórios para esta ação. Trago a contribuição de Maturana (2005, p. 29) que diz que “educar se constitui no processo em que a criança ou adulto convive com o outro, e ao conviver com o outro, se transforma espontaneamente”.