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4 APRESENTAÇÃO DOS DADOS

4.4 Discussão dos Resultados

4.4.2 Dilemas vivenciados pelos professores municipais no processo ensino-aprendizagem

Entre os docentes entrevistados apenas um apresenta resistência ao utilizar o tablet. Esta falta de interesse não é em manusear o aparelho, mas pela forma como a política pública está funcionando, com os alunos tendo acesso contínuo ao equipamento. Destarte, o professor precisa “competir” pela atenção do aluno com o tablet. Teixeira (2010) defende o reconhecimento do professor como um profissional que precisa de apoio e condições para a vivência dessa cultura e para a manutenção da fluência tecnocontextual, em momentos de formação continuada, de acesso amplo e irrestrito às tecnologias e de condições financeiras para a reciclagem profissional.

Para a docente esta é uma “disputa” desleal, porém, se ele modificar sua metodologia de ensino observando o tablet como uma ferramenta auxiliar e não como concorrente, todo o contexto de aprendizagem terá uma nova significação. Brandão e Moura (2013) contam que muitos alunos chegam à escola desmotivados porque não sabem por que estão ali. O papel do professor é dar sentido ao estudar, transformando o obrigatório em prazeroso, transformando informação em conhecimento uma vez que o bom professor é aquele que consegue fazer o aluno pensar profundamente enquanto ele fala e por isso, a sua aula é um desafio onde os alunos cansam e “não dormem”. (FREIRE, 1996). Dessa maneira, Pretto (2010) explica que com as tecnologias em sala de aula, o professor tem um papel de liderança acadêmica e, em conjunto com os alunos, produzir novos produtos, culturas e conhecimentos.

A visão dos professores entrevistados é que o tablet não deveria permanecer em tempo integral com os alunos, porque ele prejudica a aprendizagem; os estudantes priorizam o tempo para manusear o aparelho ao invés de estudar os conteúdos formais recomendados. Os docentes foram convencidos disso pela diretora, que ressaltou ser a única solução para resolver os problemas de disciplina e aprendizagem dos alunos. Nesse sentido, Brandão e Moura (2013) narram que o uso das tecnologias da informação e comunicação no ambiente escolar precisa ser visto pelos professores, não como uma ameaça a sua forma de ensinar, mas como um aliado para a promoção do aprendizado. Porém, não esquecendo que o professor é quem determina o conteúdo, mas cada aluno, como sujeito de aprendizagens tem o seu caminho para poder assimilá-lo e o uso de tecnologia em sala de aula estimula e desafia os alunos a serem mais curiosos (FREIRE, 1996) porque as TICs trabalham com o sensível, o concreto e a imagem em movimento que integrados em um sistema comunicacional causam um forte impacto emocional o que facilita o entendimento das pessoas (MORAN, 2006).

Outro aspecto que ficou evidente é que o conceito de aprendizagem colaborativa não permeia as propostas pedagógicas. A informação é passada aos estudantes verticalmente, que atuam de forma passiva ao que é dito pelo professor que assume o papel de “dono” do saber e esta incompetência profissional desqualifica a autoridade do professor (FREIRE, 1996). Essa é a realidade de parte das escolas brasileiras, o que é narrado por Pinto e Pretto (2015). Os autores explicam que as pessoas não estão acostumadas a atuar de forma colaborativa, e ainda impera a lógica da hierarquia vertical, com delegação plena de poderes a representantes.

É imperativa a ruptura deste paradigma porque professores e alunos podem construir o conhecimento em conjunto sem que o docente perca o domínio sobre a turma, ou o papel de líder. Martins e Teixeira (2015) corroboram que com a ajuda da tecnologia, os discentes e docentes podem construir o saber juntos. O processo de pesquisa que permite e incentiva a criatividade ao se trabalhar com situações-problema é reservado a poucos indivíduos e o uso de tecnologia em sala de aula estimula e desafia os alunos a serem mais curiosos (FREIRE, 1996).

Não é possível esquecer que o professor precisa ser preparado. Brandão no início da informatização das escolas em 1995, afirmou que é essencial a preparação docente e esta deve ocorrer imprescindivelmente antes da aquisição dos equipamentos de informática. O autor explica ainda que a introdução de informática na educação deve levar em conta que para os professores não é fácil modificar esquemas mentais e métodos de trabalho que estão consolidados em um adulto.

Porém, não basta inserir as tecnologias, de acordo com Pretto (2010), a juventude se apropriou das tecnologias e as transformou em um meio de expressão de ideias e de manifestação da pluralidade e de cidadania. Além do acesso à tecnologia é preciso compreender a importância de sua apropriação crítica e criativa, consciência do seu potencial na dinâmica social e proporcionar formação docente adequada para que a sua inserção na educação tenha resultados satisfatórios (MARCON; TEIXEIRA, 2011).

O conhecimento que os jovens têm sobre tecnologia não deve amedrontar os professores. Os docentes precisam entender que não há competição com os alunos e que não existe constrangimento em saber menos do que os estudantes sobre determinados aplicativos. Uma professora entrevistada, notoriamente a que mais utiliza o tablet em sala de aula, informou que solicita ajuda aos alunos quando tem alguma dificuldade com o aparelho.

Para a diretora, isso é constrangedor, porém, o aprendizado originado pela troca de experiência entre professor e aluno é salutar. O estudante só consegue ajudar a professora porque tem acesso a esta informação, porém, o simples acesso à informação não gera

conhecimento. Destarte, o papel do professor ainda é fundamental na construção do conhecimento. Nesse sentido, Brandão et al (2004) explicam que o acesso à informação, amplamente disponível graças às novas tecnologias não acarreta desenvolvimento intelectual, já que o conhecimento ocorre a partir da sistematização das informações disponíveis.

4.4.3 Contexto Social Familiar dos estudantes

Todos os responsáveis entrevistados afirmam dominar a tecnologia, mas na verdade eles possuem conhecimento básico de uso das ferramentas. Os professores, por sua vez, também não estão completamente preparados para trabalhar com tecnologia; entretanto, além de formação didático-pedagógica adequada é imprescindível que os docentes manipulem o equipamento, explorem, para descobrir suas potencialidades. Não adianta vir um profissional ministrar um curso se eles não praticam o que foi apresentado.

A constatação da diretora de que os alunos têm acesso à tecnologia e internet foi confirmada pelos pais. Os responsáveis confirmaram que todas as casas possuem ao menos um computador, tablet ou notebook bem como acesso à rede mundial de computadores. Além disso, o município disponibiliza um telecentro comunitário e uma sala de inclusão digital na casa de cultura da cidade. Nestes locais, os jovens, assim como toda a comunidade, têm a possibilidade de conectarem-se à internet para estudar, trabalhar ou para lazer.

Dessa maneira se evidencia que o acesso a tecnologias e à internet não está mais restrito apenas às classes ricas (FREIRE, 1996; PRETTO, 2010). Em outra obra em parceria com Claudio Pinto, Nelson Pretto (2015) narra que a ampliação do acesso a tecnologia às classes, C, D e E é atribuída muitas vezes a implantação de telecentros e infocentros, além da conexão de escolas públicas à rede. Para os autores, a democratização do acesso à internet é peça-chave para que a população possa ter a possibilidade de organizar-se de modo horizontal. A partir disso as TICs modificaram a forma de comunicação das pessoas bem como a formação de laços sociais (MORAN, 2006; VIVANCO, 2015).

Tal contexto remete as classes de investimento escolar relacionadas por Bourdieu (2011) no capítulo 2. Em Doutor Maurício Cardoso encontra-se as classes popular, média e elite. Por ser um município pequeno, estas classes sociais são diferentes e não existe uma diferença muito significativa entre os grupos familiares. A classe média possui como característica ter apenas menos filhos. A elite cultural não é encontrada na cidade, apenas a econômica a qual faz exigências mínimas em busca da certificação para entrar no mercado de trabalho. O município não possui grandes indústrias, dessa maneira, a preocupação da maioria

das famílias é garantir aos filhos a conclusão do ensino médio. Com este nível, os estudantes podem trabalhar no comércio local ou prestação de serviços atuando como aprendizes bem como auxiliar as famílias que tem como atividade principal a agricultura. A figura 17 apresenta as classes de investimento escolar encontradas em Doutor Maurício Cardoso.

Figura 17 – Classes de investimento escolar em Doutor Maurício Cardoso.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2016, com base em Bourdieu 2011.