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DIMENSÃO OBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

2 DIREITO ENQUANTO CIÊNCIA E DIREITO ENQUANTO OBJETO:

7.4 DIMENSÃO OBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Historicamente, os direitos fundamentais, no início do Constitucionalismo moderno, com a doutrina liberal, constituíam-se no Estado não intervencionista da esfera privada do cidadão, de acordo com o pensamento econômico fisiocrata francês de deixar fazer, deixar passar.

Porém, com o advento do Estado social, conforme já foi exposto na secção anterior, o Estado passou a ter uma atitude ao mesmo tempo negativa, de respeitos aos direitos individuais (status negativus); e positiva, de promoção dos direitos coletivos.

Atualmente, com os direitos fundamentais já na quarta geração, tornou-se muito mais exigível a presença do Estado em todos os níveis de atuação da esfera pública, isto é, além dos mecanismos jurídicos, notadamente o de interpretação axiológica da Constituição, que tem como corolário a interpretação conforme a Constituição e o consequente controle de constitucionalidade difuso e concentrado, e a inclusão de artigos e princípios locais nas legislações ordinárias; há outros, de cunho administrativo, como a criação de instituições pública, apoio a institutos (de natureza privada - como é o caso das ONGs); tudo com o objetivo final de respeito a 250 Idem, ibidem, p. 524. 251 Idem, ibidem, p. 525. 252

Importante lembrar que a teoria da dimensão objetiva dos direitos fundamentais tem suas raízes na doutrina alemã a partir do Constitucionalismo de Weimar, com ênfase maior depois da Segunda Guerra Mundial.

esses direitos. Portanto, neste contexto, Daniel Sarmento assim expõe sobre o assunto:

Deveras, os direitos fundamentais no constitucionalismo liberal eram visualizados exclusivamente a partir de uma perspectiva subjetiva, pois cuidava-se apenas de identificar quais pretensões o indivíduo poderia exigir do Estado em razão de um direito positivado na sua ordem jurídica. Sem desprezar este papel dos direitos fundamentais, que não perdeu a sua essencialidade na teoria contemporânea, a doutrina vai agora desvelar-se uma outra faceta de tais direitos, que virá para agregar-lhesnovos efeitos e virtualidades: trata-se da chamada dimensão objetiva dos direitos fundamentais.

[...]

A dimensão objetiva dos direitos fundamentais liga-se ao reconhecimento de que tais direitos, além de imporem certas prestações aos poderes estatais, consagram também os valores mais importantes em uma comunidade política, constituindo, como afirmou Konrad Hesse, ‘as bases da ordem jurídica da coletividade’. Nesta linha, quando se afirma a existência desta dimensão objetiva pretende-se, como registrou Vieira de Andrade ‘ fazer ver que os direitos fundamentais não podem ser pensados apenas do ponto de vista dos indivíduos, enquanto faculdades ou poderes de que estes são titulares, antes valem juridicamente, também do ponto de vista da comunidade, como valores ou fins que esta se propõe a prosseguir’.253

Nesse sentido, os valores nucleares de uma Ordem Jurídica democrática, que se consubstancia nos direitos fundamentais, passam a exigir condições materiais mínimas para realização desses direitos, que são de responsabilidade do Estado, como preceitua a dimensão objetiva dos direitos fundamentais.

Conforme essa doutrina, existem duas importantes consequências:

7.4.1 Eficácia Irradiante

Entende-se por eficácia irradiante o poder de penetração que os direitos fundamentais ensejam em todo o ordenamento jurídico, condicionando a interpretação das leis pelos três poderes, tendo os princípios hermenêuticos constitucionais funções eficazes neste sentido.

A eficácia irradiante, porém, é bem mais ambiciosa, pois ela não se restringe a atuar somente quando há uma violação dos princípios constitucionais, notadamente dos direitos fundamentais, já que os princípios são os principais

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veículos desses direitos, mas, também, quando da prática de quaisquer atos jurídicos, quer sejam de Direito Público quer de Direito Privado, havendo uma humanização da Ordem Jurídica. Pois, não cabe mais hoje em dia uma interpretação da Ordem Jurídica divorciada da Moral, como propôs Kant, em que o Direito cuida do mundo exterior do homem e a Moral do mundo interior.

7.4.2 Deveres de Proteção

O dever de proteção dos direitos fundamentais por parte do Estado traduz-se, hoje, na mais destacada função que este ente público tem que exercitar na sociedade.254 Pode-se dizer, de acordo com a dimensão objetiva dos direitos fundamentais, que é direito subjetivo do povo brasileiro exigir do Estado, quando este for ausente, com ou sem culpa, uma atuação mais ativa no sentido de proteger, promover e incentivar programas públicos e privados que visem à efetivação dos direitos fundamentais em todas as suas gerações. Portanto, quando os direitos dos moradores das cidades brasileiras de transitar livremente pelas ruas sem serem roubados ou mortos; de enviar seus filhos para as escolas sem correr o risco de serem atingidos por balas perdidas; de ter um atendimento adequado em hospitais públicos e privados; de não existir toques de recolher por parte dos traficantes de drogas nas favelas; quando tudo isso e muitas outras violações de direitos ainda continuarem existindo e impedindo o exercício pleno da cidadania, é direito de todos exigir uma atuação ativa do Estado para dar cumprimento ao dever de proteção.

Para concluir, Daniel Sarmento assevera que a dimensão objetiva dos direitos fundamentais prende-se ao reconhecimento de que neles estão contidos os valores mais importantes de uma comunidade política, que penetram no Ordenamento Jurídico através dos princípios constitucionais. Estes valores tornam-se vetores que guiam todos os setores do Estado no sentido de que é preciso agir concretamente para proteger os direitos fundamentais de ameaças e agressões, quer essas violações partam do próprio Estado quer do setor privado.255

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CHEVALLIER, Jacques. O Estado Pós-Moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009. 255

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HERMENÊUTICA

FILOSÓFICA:

DA

PREPARAÇÃO