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Princípios Constitucionais Jurídicos da Proporcionalidade e da

2 DIREITO ENQUANTO CIÊNCIA E DIREITO ENQUANTO OBJETO:

6.2 CLASSIFICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

6.2.3 Princípios Constitucionais Jurídicos da Proporcionalidade e da

Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade172 são supraprincípios normativos que são aplicados quando da interpretação e aplicação dos demais

171

princípios constitucionais, e quando da análise de decisões administrativas irrazoáveis.173

6.2.3.1 Princípio da Proporcionalidade

Para Germana Moraes (1999), o princípio da proporcionalidade surgiu no Ordenamento Jurídico alemão basicamente de formulações jurisprudenciais e doutrinárias, inicialmente no âmbito de Direito Administrativo – limitação do poder de polícia  para, em seguida, também ser empregado no âmbito constitucional. 174

Esse princípio, continua Germana Moraes, já está bastante difundido na maior parte dos Estados-membros da Comunidade Europeia. Com suas próprias palavras:

Na verdade, o critério da proporcionalidade tem sido usado com freqüência como parâmetro de controle da atuação administrativa pelos Tribunais Constitucionais e Administrativos da maior parte dos Estados membros da Comunidade Européia, bem como pelos órgãos comunitários – Tribunais de Justiça das Comunidades Européias e Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Em alguns países, como sucede nos germânicos – Alemanha, Suíça, Áustria e Países Baixos, está consagrado no direito objetivo, ora na Constituição, ora na lei, e na jurisprudência como um dos princípios fundamentais do Direito Público. De igual modo sucede nos países do Sul – Portugal, Espanha e Itália, muito embora nesses dois últimos com utilização jurisprudencial mais limitada ao campo de aplicação do Direito Comunitário. Em outros países, como na França, na Bélgica e na Grécia, o critério da proporcionalidade é aplicado no Direito Administrativo, de forma implícita, sem que a jurisprudência nem a lei o consagrem formalmente como princípio geral da proporcionalidade.

172

Para Humberto Ávila (op. cit, p. 81-83), esses princípios são denominados postulados normativos aplicativos. Para ele, tanto um como outro são metanormas que estabelecem a estrutura de aplicação dos princípios e das regras jurídicas.

173Para Germana Moraes (Op. cit., 1999, p. 124): “O princípio da razoabilidade, em sentido estrito, em função do qual na seqüência da orientação britânica, consideram-se irrazoáveis aquelas decisões que nenhuma autoridade de bom senso teria podido tomar, levando-se em conta os standards e a regra do consenso identifica-se em parte com a noção de boa-fé contida no princípio da moralidade administrativa, no ponto em que significa a expectativa de comportamento normal do agente público, semelhante ao do homem comum, sincero, honesto e leal, em quem se possa confiar e consentâneo com os valores sociais daquele momento histórico”.

174A ideia de proporção, proporcionalidade, indica o justo equilíbrio das partes na existência do todo, estando contida no sentido comum da razão. Daí dizer-se ser razoável aquilo que atende ao equilíbrio das partes. O que é proporcional, portanto, é razoável (por isso advir, no entendimento de alguns juristas, a compreensão de ser os mesmos o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade). Na verdade, distinções há e residem na origem, formação e empregabilidade de cada um. No tocante ao princípio da proporcionalidade, ele não é um conceito novo para o Direito e sempre esteve atrelado à própria ideia de justiça, presente em diversos institutos jurídicos como da legítima defesa, da sanção penal, entre outros. No Direito alemão, a preocupação em evitar excessos do poder de polícia e o uso proporcional de sua força quando em confronto com o particular, levou o Direito Administrativo daquele país a elaborar uma sólida doutrina em torno desse princípio, não demorando muito para que ele fosse elevado a status constitucional.

Ainda que seja hoje considerado um princípio de estatura constitucional, a jurisprudência continua a ser a fonte mais importante do princípio da proporcionalidade nos países europeus, sendo raros os ordenamentos jurídicos nos quais se tenha positivado, quer na Constituição, quer em leis administrativas.175

O princípio da proporcionalidade176 visa instituir uma relação entre meio e fim da atividade pública para tornar possível a proibição de excesso, quando, de alguma forma, ela venha violar direitos fundamentais. Nesse sentido, faz-se uma ponderação entre os princípios envolvidos, prevalecendo no caso concreto aquele que, no momento, melhor se apresenta para otimização da norma.

Guerra Filho (2002a) considera-o “princípio dos princípios”,177

por ocupar um grau de destaque na interpretação da Constituição. Apesar de não constar formalmente na Constituição brasileira de 1988, nela está positivado implicitamente, quando declara no art. 1ocaput, ser o Brasil um Estado Democrático de Direito. Dessa forma, para que haja equilíbrio entre o Estado de Direito, que é formal, e o Estado Democrático, com respeito às desigualdades materiais, recorre-se ao princípio da proporcionalidade. Por suas próprias palavras:

O princípio construtivo e fundamental que procuramos se encontra, portanto, implícito e pressuposto na reunião entre Estado de Direito e Democracia, e sua função hermenêutica é a de hierarquizar, em situações concretas de conflito, todos os demais princípios a serem aplicados, fornecendo, assim, a unidade e consistência desejadas.178

175

(Op. cit., 1999, p. 77).

A Constituição portuguesa de 1976, no seu artigo 226º, §2o, já contempla expressamente o princípio da proporcionalidade. No caso do Brasil, este princípio está positivado implicitamente.

176 Para Bonavides (Op. cit., p.359): “[...] a vinculação do princípio da proporcionalidade ao Direito Constitucional ocorre por via dos direitos fundamentais. É aí que ele ganha extrema importância e aufere um prestígio e difusão tão larga quanto outros princípios cardeais e afins [...]”.

177

GUERRA FILHO, Willis Santiago. Op. cit., 2002a, p.185. 178

Idem, ibidem, 2002a, p. 194.

Neste sentido, é que o princípio da proporcionalidade adquire importância capital para a Teoria Material da Constituição, quando busca a efetivação dos direitos fundamentais, conforme se verá mais adiante.

Ainda com Guerra Filho (2002a, p. 195-196): “A Conclusão a que se quer chegar, então, é que o princípio máximo procurado, que por sua especialidade tanto se diferencia dos demais, acha-se expresso na já mencionada ‘máxima de proporcionalidade’. A imposição nela contida é a de que se realiza através do Direito, concretamente e cada vez melhor, o que for jurídica e faticamente possível, para obter-se a otimização no adequamento da norma, com seu dever-ser de entidade ideal, à realidade existencial humana.

“É esse equilíbrio a própria idéia de Direito, manifestado inclusive na simbologia da balança, e é a ele que se pretende chegar, com Estado de Direito e Democrático. A proporcionalidade na aplicação é o que permite a co-existência de princípios divergentes, podendo mesmo dizer-se que entre esses e ela, proporcionalidade, há uma relação de mútua implicação, já que os princípios fornecem os valores para serem sopesados, e sem isso eles não podem ser aplicados”. (grifo do autor).

Portanto, para que este princípio exerça sua função hermenêutica de hierarquização dos princípios, notadamente os direitos fundamentais, quando envolvidos em situações concretas de conflitos, ele aponta para utilização de uma tríplice manifestação de mandamento de proporcionalidade, ou proibição de excesso, também chamado de subprincípios, que a seguir são apresentados:

6.2.3.1.1 Da Adequação

A primeira decisão dos tribunais alemães nesse sentido data de 16.03.71, onde consta: “O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e exigível, para que seja atingido o seu fim almejado. O meio é adequado, quando, com seu auxílio, se pode promover o resultado desejado.”179

6.2.3.1.2 Da Exigibilidade ou Necessidade

O meio ”[...] é exigível, quando o legislador não poderia ter escolhido outro igualmente eficaz, mas que seria um meio não prejudicial ou portador de uma limitação menos perceptível a direito humano.”180

No exemplo de Jellinek, não se abatem pardais disparando canhões.

6.2.3.1.3 Princípio da Proporcionalidade em Sentido Estrito

Guerra Filho (2002a) afirma que, em sentido estrito, é um critério de aferição que se observa se houve mais vantagem do que desvantagem quando da aplicação de determinada medida administrativa.

Por fim, no momento da verificação dos critérios de adequação, exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito, deve-se seguir uma sequência lógica entre eles, observando-se primeiro se o meio é adequado, pois, caso não o seja, in limine, já será tido como excessiva a medida administrativa. Em seguida, verifica-se a necessidade do ato, ou seja, com menor prejuízo para os direitos fundamentais. Caso este requisito não seja atendido, não se passará para o último critério.

179

MORAES, Germana de Oliveira. Op. cit., 1999, p.186. 180

6.2.3.2 Princípio da Razoabilidade

Segundo, também, Germana Moraes (1999), a razoabilidade surgiu da jurisprudência dos tribunais constitucionais e administrativos britânicos.

O caso emblemático nesse sentido foi o Associated Pictures House Ltda x Wednesbury Corporation de 1948, quando, pela primeira vez, foi aplicado o teste de razoabilidade para casos judiciais.

Germana Moraes escreve:

A partir deste julgamento, formulou-se o “princípio Wednesbury”, oposto diante de decisões irrazoáveis, conhecido por teste de razoabilidade, o qual passou a ser aplicado pelos tribunais britânicos.

Os Tribunais britânicos começaram a não mais contentar-se apenas com o exame da legalidade e da regularidade do procedimento da decisão, indo mais além, para averiguar o processo de elaboração da decisão, como

rational decision-making, mediante a aplicação do teste de racionalidade.

Depois, vão mais adiante, comparando a decisão impugnada com os

accepted moral standards, isto é, com o conceito de razoável de uma

pessoa sensata, e não com o conceito de razoável do próprio juiz. Tem-se então o teste de razoabilidade.181

Por outro lado, Luís Roberto Barroso182 defende que o surgimento do princípio da razoabilidade deveu-se ao due process of law, na sua versão substantiva, in verbis:

O princípio da razoabilidade tem sua origem e desenvolvimento ligado à garantia do devido processo legal, instituto ancestral do direito anglo-saxão. De fato, sua matriz remonta à cláusula law of the land, inscrita na Magna

Charta, de 1215, documento que é reconhecido como um dos grandes

antecedentes do constitucionalismo. Modernamente, sua consagração em texto positivo se deu através das emendas 5ª e 14ª à Constituição norte- americana. A cláusula do due process of law, tornou-se uma das principais fontes da expressiva jurisprudência da Suprema Corte do Estados Unidos ao longo dos últimos dois séculos.

O princípio do devido processo legal, nos Estados Unidos, é marcado por duas grandes fases: a primeira, onde se revestiu de caráter estritamente processual (procedural due process), e uma segunda, de cunho substantivo (substantive due process), que se tornou fundamento de um criativo exercício de jurisdição constitucional. De fato, ao lado do princípio da igualdade perante a lei, essa versão substantiva do devido processo legal tornou-se importante instrumento de defesa dos direitos individuais, ensejando o controle do arbítrio do Legislativo e da discricionariedade

181

Idem, ibidem, p.80.

182

governamental. É por seu intermédio que se procede ao exame de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (rationality) das normas jurídicas e dos atos do Poder Público em geral.183

Nesse sentido, Barroso defende, também, que o princípio da razoabilidade está positivado na Constituição brasileira, no art. 5o inciso LIV, onde diz que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

Na aplicação da razoabilidade, deve-se seguir regras da lógica, coerência, inteligência, entre outras, procurando levar em conta sempre questões pertinentes ao caso in concreto, deixando de lado as não pertinentes. Tenta-se, desta maneira, evitar as decisões caprichosas, que aviltam o censo comum.

Ao final, o importante a se destacar sobre os dois princípios estudados, proporcionalidade e razoabilidade, é que ambos destinam-se a atingir o mais alto fim perseguido pelo Direito: a justiça.184