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1.7 Entender o Serviço Social como profissão e saber disciplinar

1.7.3 Dimensões teórico-metodológica, técnico-operativa e ético-política do Serviço

“A teoria da correlação de forças apresenta-se por fim, como uma chave de leitura adequada para o entendimento do Serviço Social contemporâneo, uma vez que integra o macro e o micro, que tem em conta o poder dos diferentes agentes presentes nas relações sociais e que joga com o conflito como uma potencialidade para a acção.” (Amaro, 2009b: 17).

No bojo desta teoria está o requisito de que o Serviço Social não é neutro. O Serviço Social é uma área de conhecimento que assume os interesses dos mais vulneráveis, estando do seu lado na luta por um ideal de equidade e justiça social, numa perspectiva de fortalecimento, capacitação e empowerment dos indivíduos na relação com as estruturas sociais opressoras. Podemos afirmar que a teoria da correlação de forças procura estabelecer pontes que articulem características da visão estruturalista e subjectivista do mundo social. O mesmo será afirmar que, de acordo com o ponto da estrutura social em que o indivíduo se situe, assim o registo pende mais para a regulação ou o mais para o conflito, sendo certo que “(…) cada indivíduo tem inscritos no seu interior elementos da estrutura que lhe sobrevém e existem na exterioridade estrutural elementos da sua individualidade” (Amaro, 2008: 76). A plenitude do campo do Serviço Social desenvolve-se na intersecção entre a direcção dos direitos humanos e da justiça social, dimensão individual e colectiva, situando-se no local, entre actor e estrutura como fortalecimento da correlação de forças, contrariando os desequilíbrios do poder e considerando os diferentes interesses em presença (Amaro, 2012).

1.7.3 Dimensões teórico-metodológica, técnico-operativa e ético-política do Serviço Social

“O agir dos assistentes sociais organiza-se por referência a um conjunto complexo e dinâmico de parâmetros de ordem conceptual, analítica e operativa.” (Andrade, 2001: 165). Apesar de considerarmos a indissociabilidade entre as dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa do Serviço Social, recorremos à proposta de Santos et al. (2012) que analisam a profissão do Serviço Social em três dimensões: i) teórico- metodológica; ii) técnico- operativa; iii) ético-política.

i) A dimensão teórico-metodológica

A dimensão teórico-metodológica integra a noção de multidisciplinaridade e do ecletismo da teoria em Serviço Social como sendo a melhor forma de analisar a complexidade do real. Payne (2002b) argumenta que esta abordagem por si só não explica como intervir nessa

realidade. Esta é uma questão “problemática, pois em Serviço Social falamos de conhecimento e teorias que sejam úteis para compreender a acção e para agir «na acção», modificar a realidade – intervenção social.” (Carvalho, 2016a: 18) e nem todas têm essas características.

Por vezes é complexo entender o que é teoria e o que é conhecimento. Em Serviço social é importante que não se confunda conhecimento com teoria (Carvalho, 2016a).

Também Fook (2014) sustenta que o conhecimento em Serviço Social pode ser visto como “factual” (como por exemplo o conhecimento de determinada legislação), mas quando funciona para influenciar ou nortear a prática, pode ter uma função próxima da da teoria. Neste sentido, para o autor a prática é mais do que o conjunto de acções. Ela integra não apenas as acções, mas também toda a situação, as percepções sobre a mesma, o pensamento que está latente aos seus actos, o estado emocional e as reacções. Por outro lado, há diversas formas de compreender os diferentes tipos de teorias, bem como as suas diferentes funções (ibidem).

Assim, sustenta que os assistentes sociais na sua prática podem integrar/assumir as teorias de forma diferenciada, designadamente: i) a teoria como autoridade – teoria superior a mim; ii) a teoria como estando fora de mim – teoria externa à prática, fora do contexto; iii) a teoria como uma auto-definição – dentro de mim (ibidem).

Nas duas primeiras situações os assistentes sociais podem encarar a teoria com um estatuto de algo inatingível, e considerando que cabe aos académicos ou a autores “iluminados” (vivos ou já falecidos), sumidades que estão acima da sua experiência e conhecimento, ou mesmo desligados da realidade actual. Na terceira situação (teoria como auto-definição), o assistente social assume a integração da teoria na análise da prática profissional e vice-versa. Contudo, o processo de construção da teoria é, nesta situação, mais difícil de concretizar pelos profissionais devido aos paradoxos da intervenção.

Este autor presenta como forma de superação desta dificuldade, que o assistente social resista a formas simplistas e populares de caracterizar a teoria e a prática, e que assuma como importante a experiência prática como holística, isto é, uma prática que integre os seguintes elementos: i) teorias e valores (pressupostos e argumentos); ii) percepções (cognição e sentimentos) e acções; iii) contexto e significado/interpretações. É na dinâmica de todos estes elementos que se pode viver e teorizar a experiência, sem a fragmentar, incorporando na teoria perspectivas múltiplas (ibidem).

Payne (2002b) identifica três tipos de teorias em uso no Serviço Social:

i) teorias específicas, que fornecem ideias e técnicas que podem ser usadas no Serviço Social, mas que não são necessariamente Serviço Social (por exemplo, a teoria da comunicação ou a teoria da vinculação);

ii) teorias “em perspectiva”, que são sobretudo formas de entendimento do mundo e da acção (por exemplo, a perspectiva humanista ou a radical);

iii) teorias de aplicação, que proporcionam tanto ideias gerais aplicáveis como técnicas específicas (por exemplo, abordagem centrada nas tarefas, empowerment e

advocacy).

Andrade (2001: 165) afirma que

“(…) consoante o paradigma, a matriz teórica e a visão de mundo que forem tomados como suporte da prática, bem como o contexto global, institucional e situacional em que se inscreve a prática profissional, assim se conforma e se torna diverso o agir do assistente social.”

Desta forma, o papel da teoria no Serviço Social é, para Amaro (2008: 65) o de “orientar, procurar e construir conhecimentos conduzidos crítica e reflexivamente”, ajudando o profissional a explicar e avaliar situações com vista à intervenção. Tal acepção permite-nos afirmar que o que distingue a prática de senso comum de uma prática profissional é precisamente o uso racional e sistemático da teoria associada a uma metodologia e a uma finalidade controlada. Trevithick (2013) propõe um quadro de referência para o Serviço Social, tomando por base a integração teórico-prática. Para esta autora existem vários tipos de conhecimento que podem ser mobilizados na intervenção, através de determinado tipo de competências do profissional. Este quadro de referência integra o pensamento crítico, a análise e reflexão crítica/reflexividade e a relação como componente central no Serviço Social.

Payne (2002b) concebe o Serviço Social como um conjunto complexo de conhecimentos, teorias, filosofias, ideologias de várias correntes de pensamento e faz apelo ao eclectismo e à multidisciplinaridade. Também Beckett (2006) sublinha a necessidade de o assistente social pensar eclecticamente, uma vez que uma só teoria dificilmente permite a compreensão de contextos tão diversos e complexos.

O processo de ajuda desenvolvido pelo Serviço Social é mormente orientado e condicionado por dois factores: o sistema de serviços e as teorias de referência (Ponticelli, 1994). Juntamente com a teorização da praxis, as teorias de referência contribuem para a elaboração

dos modelos operativos do Serviço Social, ou seja, dos esquemas de referência conceptuais que orientam a aplicação de instrumentos pelos assistentes sociais.

“A produção de modelos teóricos para a prática do Serviço Social é um processo dinâmico, que se desenrola lentamente no tempo, através do esforço de integração de conceitos das ciências sociais nas generalizações extraídas da experiência. Este é, pois, um processo dinâmico (e em permanente transformação) pois está sujeito à evolução teórica das ciências sociais e às variações dos problemas sociais, do sistema organizado de respostas e linhas (ideológicas) de política social” (Ponticelli, 1994: 26)

Segundo Banks (2001) a perspectiva que predomina na actualidade é a que defende que o Serviço Social não conseguirá atingir uma base de conhecimento unitária e específica, nem tal é essencial para a profissão. Para a autora, é importante integrar os ganhos advindos da aceitação da diversidade do saber profissional em sintonia com a multiplicidade de práticas e objectivos do Serviço Social. Não deixa de advertir, contudo para os riscos desta fragmentação poder fragilizar a visão do que é comum ao Serviço Social, deixando o flanco demasiado exposto aos avanços tecnocráticos e managerialistas (ibidem).

É precisamente para diminuir esse risco que Soulet (2003) acentua a necessidade de se pensar ou teorizar a prática profissional no contexto actual de incerteza, clarificando o agir neste contexto de instabilidade estrutural, de fluidez, numa ausência de normas estáveis ou claras, o que cria angústias e dúvidas em relação à legitimidade do agir e da autoridade profissional. Neste contexto de evolução e de mudança rápida, o conhecimento codificado também pode limitar a flexibilidade e a criatividade dos profissionais. Segundo este autor as características do agir num contexto de incerteza incluem: i) a construção simultânea dos fins e dos recursos durante a acção; ii) a fundação das formas e princípios de legitimidade no decurso da acção; iii) a desmultiplicação do actor na acção; iv) a validação mútua das acções desenvolvidas; v) e a mobilização de uma temporalidade não linear.

O Serviço Social tem na sua essência várias vertentes, já anteriormente analisadas, não necessariamente incompatíveis entre si. Se considerarmos um contínuo entre o pessoal e colectivo versus institucional e estrutural, e outro entre conservador e regulador versus transformador e emancipador, vemos que o Serviço Social não pode ser, por definição, só pessoal ou só colectivo, ou institucional, pois podemos constatar vários posicionamentos, que vão do mais terapêutico/individualizado, ao mais centrado na mudança e na transformação social. Segundo Payne (2002b; 2006), podemos identificar três visões ou pilares do Serviço Social, que representam diferentes formas de compreender a sua natureza: i) as visões reflexivas-terapêuticas, que procuram o bem-estar dos indivíduos, grupos e comunidades, com propósitos terapêuticos, de crescimento e realização pessoal. Os

problemas são vistos essencialmente como emocionais e relacionais, tendo o Serviço Social o papel de potenciar nos indivíduos o seu desenvolvimento pessoal e humano, trabalhando as estruturas sociais para que esse desenvolvimento seja possível;

ii) as visões socialistas-colectivistas, cuja intenção é essencialmente transformativa: defende a transformação da sociedade, uma acção social colectiva para melhorar os problemas das pessoas e das comunidades, sobretudo as mais pobres, oprimidas e desfavorecidas (os problemas fundam-se nas estruturas e na organização social, concretamente nas suas injustiças). Neste enquadramento, a prática do assistente social consiste numa acção de correcção desses problemas e injustiças e de capacitação dos indivíduos, emancipando-os para que possam conquistar poder sobre as suas próprias vidas e transformar o sistema instituído para criação de instituições de usufruto colectivo40;

iii) as visões individualistas-reformistas, nas quais a ordem social existente é aceite, preconizam o Serviço Social como um sistema prestador de serviços de assistência tendo em consideração as necessidades das pessoas e comunidades, sem intenção de mudança social, embora não a descartando totalmente. O enfoque está na resolução dos problemas práticos das pessoas, através da melhoria dos serviços para que estes respondam às suas necessidades. Tal significa uma visão que situa a causa dos problemas no indivíduo, cabendo ao assistente social ajudá-lo a encontrar vias de resolução, adaptação e ajustamento à realidade vigente.

Face à complexidade destas abordagens, podemos dizer que a perspectiva terapêutica (de cariz reflexivo-terapêutico) e a perspectiva transformacional (de cariz socialista-colectivista) estão centradas na mudança e no desenvolvimento social e a perspectiva da ordem social, de cariz “individualista-reformista”, está mais comprometida com a resolução de problemas individuais numa lógica de manutenção e reequilíbrio das pessoas em situação de vulnerabilidade, através de serviços.

Payne (2002b) adverte que o Serviço Social não é apenas cada uma das visões propostas em exclusivo, mas as três em simultâneo, complementando-se, o que implica que cada objecto de intervenção possa ser trabalhado a partir de elementos desses três pilares. Esta posição do autor sublinha a perspectiva holística e integrada que se requer para o Serviço Social, que não se situe só na manutenção da ordem, na satisfação das necessidades, ou a reabilitação/tratamento dos utentes, nem só na mudança social. Trata-se de uma lógica

combinatória entre uma intervenção enraizada institucionalmente e preocupada com a melhoria das relações interpessoais, sem descurar a dimensão transformacional, numa perspectiva crítica.

Dominelli (2009) sugere uma tipologia relativamente próxima desta, mas dando maior ênfase às funções predominantes da intervenção. Assim, para esta autora existem três abordagens:

i) uma abordagem da manutenção, mais próxima do Serviço Social convencional, preocupada com a melhoria da adaptação e funcionalidade dos indivíduos, sendo a ajuda prestada definida por critérios burocráticos (idêntica à visão individualista- reformista de Payne (2002b)).;

ii) uma abordagem terapêutica, centrada na capacitação e na melhoria da situação dos indivíduos através da sua própria acção (idêntica à visão reflexiva-terapêutica de Payne (ibidem));

iii) e uma abordagem emancipatória, que procura a mudança social, através de um Serviço Social radical, que visa a mudança do indivíduo e do meio, assente na luta pela justiça social enquanto valor e fundamento do Serviço Social (idêntica à visão socialista-colectivista de Payne (ibidem)).

Nesta discussão da dimensão teórico-metodológica do Serviço Social, não podemos deixar de problematizar também o que é a metodologia no Serviço Social.

“A metodologia subscreve sempre uma opção teórica, mais ou menos consciente.” (Pena, 2012: 79). No Serviço Social não existe um só método específico, variando em função dos objectivos e dos contextos de acção. Tal como refere Ander-Egg (1995: 129), “um método não é uma receita mágica (…). É mais parecido com uma caixa de ferramentas, da qual pega-se a que serve para cada caso e cada momento”. Neste sentido, defende este autor que os métodos de intervenção não podem ser aplicados de forma automática e descontextualizada, mas sim sujeitos a uma reflexão profissional crítica, numa dialéctica método/realidade social/acção. Por outro lado, todos os métodos de intervenção em Serviço Social são uma redução de uma realidade muito mais complexa, que se vai construindo gradualmente.

“Daí que o método que realmente irá ser aplicado não pode ser formulado/realizado, a não ser no próprio processo de acção. É por isso que podemos afirmar que toda a metodologia de trabalho social é, na sua aplicação e em última instância, uma metodologia emergente. Isto é, a partir de linhas gerais de acção próprias de um método

de intervenção social, o que realmente se faz vai surgindo e se concretizando à medida que as actividades se desenvolvem” (Ander-Egg, 1995: 130).

“O procedimento metodológico representa o elemento central constante do processo de teorização da prática, a partir do qual se pode avançar para a elaboração de modelos teóricos que sirvam de referência à operatividade concreta. É também o elemento que garante a unidade dos diferentes tipos de intervenção, de acordo com as características dos utentes e do objecto de intervenção do Serviço Social. Com efeito, [é possível utilizar] (...) o mesmo procedimento metodológico tanto no processo de ajuda individual, como nas actividades com grupos (...), ou na acção de promoção da participação comunitária.” (Ponticelli, 1994: 32-33)

O método em Serviço Social pode ser entendido como um procedimento sistemático, organizado e científico e enquanto estratégia de abordagem das situações sociais. É como um caminho analítico e sintético em direcção ao objecto de intervenção pelo conhecer e transformar, visando a garantia de uma prática ordenada e sistemática que responda de forma adequada aos problemas sociais. Deste modo, consubstancia-se como um caminho para a investigação sobre essa prática, permitindo a (re)definição de um corpo teórico próprio (Núncio, 2010).

ii) A dimensão técnico-operativa

A dimensão técnico-operativa representa a face mais visível da profissão, aquela pela qual é mais conhecida, ou seja, como profissão de intervenção, formação e investigação. Representa o conjunto de acções e procedimentos adoptados pelos assistentes sociais visando a concessão de uma determinada finalidade e dos objectivos de acção (Santos et al., 2012). Esta dimensão técnico-operativa expressa uma determinada teoria, um método, uma posição política e ética (C. dos Santos, 2013) e é constituída pelos seguintes elementos: i) estratégias e tácticas definidas para orientar a intervenção; ii) os instrumentos, técnicas e habilidades utilizadas pelo assistente social; iii) o conhecimento procedimental necessário para a operacionalização dos diferentes recursos técnico-operacionais; iv) a orientação teórico-metodológica e ético-política dos profissionais (Santos et al., 2012).

Segundo a FIAS, em 2014, esta dimensão prática do Serviço Social abrange uma diversidade de actividades, incluindo várias formas de abordagem e aconselhamento: intervenção com pequenos grupos e trabalho comunitário; elaboração de políticas, análise, defesa e intervenções políticas (APSS, 2016).

Yolanda Guerra (2012: 40) afirma que “(…) a dimensão técnico-operativa vela que a dimensão político-ideológica da profissão (…) não é neutra: ela está travejada pela dimensão ético-política e esta, por sua vez, encontra-se aportada em fundamentos teóricos (…)”

“É na realização da dimensão técnico-operativa da profissão que o assistente social legitima e constrói uma determinada cultura, um ethos profissional. É através da mesma que o assistente social articula um conjunto de saberes, recriando-lhes, dando-lhes uma forma peculiar, e constrói um «fazer» que é socialmente produzido e culturalmente compartilhado ao tempo em que os vários actos teleológicos dos profissionais resultam na criação/renovação de novos modos de ser desta cultura.” (Y. Guerra, 2012: 42, itálico da autora)

“(…) a definição sobre o que e como fazer tem que ser articulada ao porque fazer (significado social (…), ao para que fazer (indicando as finalidades/teleologia do sujeito profissional) e ao com o que fazer (com que meios, recursos e através de que mediações (...)”(ibidem: 43, itálicos da autora).

Neste sentido, é impensável uma discussão metodológica sem uma reflexão teórica que lhe dê suporte.

As acções expressam, então, as concepções teórico-metodológica e ético-política do assistente social, mesmo que ele não tenha noção das suas concepções e dos seus valores (C. dos Santos, 2013).

O Serviço Social, ao assumir o compromisso com a defesa intransigente dos direitos humanos, com a ampliação da cidadania, com a qualidade dos serviços, com a luta em favor da equidade e da justiça social, tem de privilegiar a utilização de instrumentos de carácter democrático, colectivo, menos burocrático, sempre em sintonia com a realidade na qual desenvolve a sua intervenção (ibidem). É precisamente por isso que Sarmento (2013) defende que o estudo, pesquisa e sistematização acerca dos instrumentos e técnicas em Serviço Social não são uma mera afirmação tecnicista de profissionais que prescindem de referenciais teóricos críticos e procuram formas de aplicação teórica. Por outro lado, reforça o autor, que não há lugar para a neutralidade nesta discussão e definição de instrumentos e técnicas no exercício do assistente social, assim como não faz sentido a crítica ao estereótipo dos profissionais que procuram apenas aplicar técnicas no seu trabalho, como se elas fossem destituídas de sentido e interesses, sejam eles quais forem.

iii) A dimensão ético-política

A dimensão ético-política é de particular importância no Serviço Social, tendo em conta o seu compromisso matricial com a democracia, com os direitos humanos e com a justiça social (Carvalho, 2016a). Neste sentido, podemos afirmar que os princípios éticos, a par das referências teórico-conceptuais alicerçam a prática profissional do assistente social.

“Numa sociedade altamente contraditória, o Serviço Social é desafiado a empoderar os cidadãos e as organizações através de um humanismo crítico e reflexivo, centrado nas pessoas, tendo como referência os direitos humanos.” (ibidem: 2)

Neste ponto, faz-nos sentido convocar a tradicional discussão em torno da regulação vs emancipação no Serviço Social. Esta discussão é assente na questão de saber se o assistente social trabalha para as forças dominadoras da sociedade, contribuindo para a reprodução da dominação, ou se num sentido oposto, é uma real acção emancipadora e libertadora dos indivíduos, defendendo e promovendo os direitos humanos e o desenvolvimento social (individual e colectivamente).

Aqui coloca-se a questão de saber se, apesar de o discurso dominante no Serviço Social se assumir como emancipador por essência e controlador por necessidade, ele não é, inexoravelmente ambas as coisas, ou seja, regulador e emancipador. Segundo Pinto (2011: 82):

“(…) parece-nos que a grande questão será saber qual das faces é preponderante em cada momento e contexto socio-histórico. Neste sentido, é fundamental que os profissionais do Serviço Social reconheçam esta «dupla personalidade» da sua actividade, e consigam reflectir nas suas implicações.”

Esta dimensão do Serviço Social sublinha a dimensão axiológica e não apenas a dimensão tecnicista, o que encontra respaldo na perspectiva de Netto (1992) sobre o Serviço Social enquanto projecto ético-político inscrita num dado projecto societário.

Netto (1999) define um projecto societário como um projecto que apresenta e promove uma certa imagem desejada para a sociedade, com base em determinados valores e privilegiando certos meios de intervenção de carácter marxista e orientado para a mudança na estrutura da sociedade. Por outro lado, este projecto também preconiza o compromisso pela competência