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0 Introdução geral

2 Moses Mendelssohn como Natan

2.2 Jerusalém esclarecida (1783)

2.2.1 Parte I: O ataque contra a autoridade eclesiástica e estatal

2.2.1.6 Direitos perfeitos e imperfeitos

O autor de Jerusalém se vale então da distinção entre direitos perfeitos e imperfeitos, segundo o qual o Estado possuiria o direito perfeito por deter o poder de coerção a despeito da consciência moral do cidadão, enquanto o direito eclesiástico seria imperfeito por carecer desse poder e depender do conhecimento e consciência daquele que deve cumprir o dever.

“Hier zeigt sich also schon ein wesentlicher Unterschied zwischen Staat und Religion. Der Staat gebietet und zwinget; die Religion belehrt und überredet; der Staat ertheilt Gesetze, die Religion Gebote. Der Staat hat physische Gewalt und bedient sich derselben, wo es nöthig ist; die Macht der Religion ist Liebe und Wohlthun. Jener giebt den Ungehorsamen auf, und stößt ihn aus; diese nimmt ihn in ihren Schoos, und sucht ihn noch in dem letzten Augenblicke seines gegenwärtigen Lebens, nicht ganz ohne Nutzen, zu belehren, oder doch wenigstens zu trösten. Mit einem Worte: die bürgerliche Gesellschaft kann, als moralische Person, Zwangsrechte haben, und hat diese auch durch den gesellschaftlichen Vertrag würklich erhalten. Die religiöse Gesellschaft macht keinen Anspruch auf Zwangsrecht und kann durch alle Verträge in der Welt kein Zwangsrecht erhalten. Der Staat besitzet vollkommene, die Kirche blos unvollkommene Rechte.”79 Mendelssohn, Jerusalem, p. 43

2.2.1.7 A teoria dos direitos, deveres e contratos

Para dar maior força a seu argumento, o “Sócrates alemão” se propõe então a fazer uma exposição técnica de sua posição em termos do direito natural corrente. Principalmente no que se refere à separação entre moral e direito, ele se aproxima mais da tradição de Wolff e Pufendorf do que a de Thomasius. Por isso, sua posição é mais unitária e não prevê o descolamento entre moral e direito.

Nesta parte, Mendelssohn define os conceitos fundamentais de sua compreensão do direito natural e explica como se dá a passagem do estado de natureza para o estabelecimento de relações contratuais. Partimos, portanto, de uma descrição do “estado de natureza”.

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“Aqui já se mostra uma diferença essencial entre o Estado e a Religião. O Estado comanda e compele; a Religião ensina e convence; o Estado emite leis, a Religião mandamentos. O Estado tem poder físico e o utiliza onde necessário; o poder da Religião é amor e beneficência. O Estado abandona o indivíduo desobediente e o expulsa; a Religião o recebe em seu regaço e procura instruí-lo, ou pelo menos consolá-lo, até os últimos instantes de sua vida terrena, não de todo em vão. Em uma palavra: a sociedade civil, enquanto pessoa moral, pode ter o direito à coerção e obteve esse direito através do contrato social em modo arbitrário. A sociedade religiosa não tem pretensão ao direito à coerção e não pode obtê-lo por qualquer contrato no mundo. O Estado possui direitos perfeitos, a Igreja direitos meramente imperfeitos.”

Um direito seria uma capacidade moral de usar meios (bens) para alcançar a própria felicidade. A moralidade de um direito seria determinada pelas regras de “sabedoria e bondade”. Um dever seria uma necessidade moral de fazer algo de acordo com essas regras. É claro que estas regras de “sabedoria e bondade” não podem se contradizer, de modo que, se há um direito, haverá um dever correspondente e vice versa.

A justiça seria a combinação de sabedoria e bondade. As regras sábias e boas acima mencionadas, que fundamentariam os direitos e deveres, seriam então as leis de justiça, que, por sua vez, seriam perfeitas ou imperfeitas. No direito perfeito (compulsório ou externo), todas as condições para que o predicado pertença ao sujeito estão investidas no detentor do direito. Neste caso, este pode exigir o cumprimento do dever compulsório sem restrições e através da coerção legal. No direito imperfeito (petição ou interno), o cumprimento do dever depende do conhecimento e da consciência moral do indivíduo sob essa obrigação, de modo que a coerção não é legal. O dever imperfeito seria um dever de consciência, de execução voluntária ou facultativa. Mendelssohn considera que, no estado de natureza, todos os direitos entre os indivíduos sejam imperfeitos, com algumas exceções que veremos a seguir.

A propriedade natural do indivíduo seria composta de três partes: (a) suas capacidades, (b) os produtos de seu trabalho, e (c) os bens da natureza apropriados nesses produtos através do seu trabalho. Não haveria uma propriedade comum dos bens da natureza, pois isto só seria possível com os bens produzidos por ela própria, sem o trabalho humano. Por isso, a propriedade não seria apenas convencional, mas dependeria das capacidades e do trabalho individual.

O autor de Jerusalém introduz então o conceito de beneficência, que pode ser passiva ou ativa, e que seria indispensável para a felicidade e o aperfeiçoamento através da assistência mútua. A partir do momento em que o indivíduo passa a ter um excedente dispensável para o consumo próprio, ele melhora sua própria existência ao ser benevolente. Isso criaria um dever (imperfeito) de ajudar o próximo, correspondendo a isso, porém, também o direito de ser ajudado em caso de necessidade. Assim, no “estado de natureza”, os indivíduos teriam direitos e deveres imperfeitos de usufruto dos bens alheios que fossem dispensáveis à sobrevivência imediata. A propriedade

natural incluiria assim todos os bens (capacidades, frutos, etc.), e esta teria um uso, em parte para o próprio indivíduo, mas também um uso benevolente ou social.

No “estado de natureza”, todos os direitos e deveres seriam imperfeitos. Deste modo, ficaria a cargo do indivíduo decidir quanto, quando e com quem praticar a dita beneficência. Ninguém poderia coagir o indivíduo a ajudar o próximo. O sacrifício de bens próprios precisaria ser voluntário. A única exceção a isso seriam os deveres e direitos de omissão, entre os quais Mendelssohn menciona o direito à vida, integridade física e indenização.

A relação natural entre pais e filhos seria também marcada por deveres e direitos imperfeitos. Até que adquirissem o uso livre da razão, as crianças não teriam direitos de independência perante os pais. Caberia, porém, então aos pais o dever de educar os filhos para que pudessem alcançar a maioridade e tomar decisões racionais em casos de conflitos de interesses. O herói inspirador de Natan, o sábio considera que este dever de educar os filhos seria imperfeito (de consciência) também, embora ele reconheça que o matrimônio criaria entre os pais o dever recíproco e perfeito (compulsório) de cuidar das crianças. Assim, o casamento seria um contrato tácito visando a reprodução que estabeleceria direitos e deveres compulsórios entre os cônjuges. A partir do dever de educar, Mendelssohn deriva o dever de formar um lar comum para possibilitar a vida familiar.

A liberdade natural do indivíduo no estado de natureza seria, portanto, essa independência de deveres compulsórios para com o próximo. Mas a realização da beneficência conduziria ao estabelecimento de relações contratuais para que a transferência de propriedade nela implícita pudesse se tornar efetiva. Ao transferir uma parte dos seus bens dispensáveis para um próximo, é necessário que essa decisão do indivíduo adquira força e efetividade legal, criando direitos perfeitos. Após a transferência de propriedade, o doador perderia seu direito perfeito ao que deu, e passaria a ter apenas um direito imperfeito a ele em caso de necessidade. Por seu lado, o beneficiado deixaria de ter apenas um direito imperfeito ao bem do outro e passaria a ser proprietário desse bem, tendo um direito perfeito a ele.

Para que esta transferência de propriedade fosse possível, seria indispensável uma declaração de vontade explícita e inequívoca do proprietário. Este ato de doação é

denominado pelo autor de Jerusalém de “promessa” que, sendo aceita pelo beneficiado, estabeleceria um contrato. Assim, o contrato seria a cessão de uma parte, e a aceitação de uma outra parte, do direito de decidir conflitos referentes a bens dispensáveis da parte cedente. O contrato estabeleceria direitos e deveres compulsórios que não poderiam ser revertidos sem quebra, e cujo respeito poderia ser imposto à força.

Um contrato válido consistiria então para Mendelssohn em cinco etapas. (1) No primeiro momento, o indivíduo X possuiria uma propriedade.

(2) No segundo momento, esta propriedade não lhe seria indispensável à sobrevivência, podendo ser portanto cedida em ato beneficente ao próximo.

(3) No terceiro momento, Y teria um direito imperfeito a este excedente e poderia apresentar uma petição ou pedido, mas não uma exigência a X. Caberia a X decidir livremente dar algo a Y ou não. X não pode ser forçado a doar, pois tem o direito perfeito sobre sua propriedade natural.

(4) No quarto momento, X se vale desse direito perfeito, decide-se a favor de Y e lhe comunica isto de modo explícito e inequívoco, comprometendo-se assim através de uma promessa.

(5) No quinto momento, Y aceita a oferta de X, e também indica seu acordo de modo explícito e inequívoco. Deste modo, ocorreria a transferência de propriedade.

Seria através de contratos deste tipo que os seres humanos teriam saído do “estado natural” e passado para o “estado civilizado”. As relações de propriedade adquiririam assim uma maior estabilidade. Mesmo as relações sexuais levariam ao estabelecimento de contratos matrimoniais.

2.2.1.8 Aplicação ao problema Igreja-Estado

Tendo explicado assim sua teoria dos direitos e do contrato, o pai do Haskalá passará então à aplicação destes conceitos para analisar o problema da relação entre Igreja e Estado no que concerne os atos e as convicções dos cidadãos.

O Estado resultaria do gradual estabelecimento de relações contratuais como visto acima, chegando ao ponto em que o indivíduo renunciaria à sua independência do estado de natureza para tornar os direitos imperfeitos em perfeitos através de leis positivas. O Estado se configuraria então como uma pessoa moral encarregada de

tomar as decisões distributivas e adquiriria um direito perfeito sobre as ações e propriedade dos cidadãos. Para garantir o cumprimento dos deveres compulsórios, o Estado pode se valer da força, a despeito da vontade do cidadão.

A Igreja não teria, ao contrário, nenhum direito compulsório desse tipo sobre os cidadãos. Nossa relação com Jahvé não seria uma de beneficência mútua. Moshe mi- Dessau reclama que o paralelo entre os deveres entre os homens e os deveres do homem para com Jahvé teria sido exagerada e que seria a origem das pretensões, para ele abomináveis, da Igreja Católica. Seu ódio fica explícito no trecho abaixo, onde ele lança acusações não substanciadas contra a Igreja que vão desde hipocrisia e misantropia até perseguição e violência.

“Aus dieser Quelle flossen alle ungerechte Anmaßungen, die sich sogenannte Diener der Religion, unter dem Namen der Kirche, von je her erlaubt. Alle Gewaltthätigkeit und Verfolgung, die sie ausgeübt, aller Zwist und Zwiespalt, Meuterey und Aufruhr, die sie angezettelt haben, und alle Uebel, die von jeher unter dem Scheine der Religion, von ihren grimmigsten Feinden, von Heucheley und Menschenfeindschaft, ausgeübt worden, sind einzig und allein Früchte dieser armseligen Sophisterey; eines vorgespiegelten Conflickts zwischen Gott und Menschen, Rechten der Gottheit und Rechten des Menschen.”80 Mendelssohn, Jerusalem, p. 57.

A estratégia mendelssohniana é de, em um primeiro momento, considerar todos os deveres como sendo obrigações para com Jahvé. No entanto, esse dever é apenas o de amor, não de beneficência. Por isso, não haveria motivo para dar algo à Igreja, nem teria esta o direito de exigir bens para si. Levando isto às últimas consequências, e antecipando a destruição da Igreja e a futura aquisição de seus bens na Revolução Francesa,81 Mendelssohn nega a ela até mesmo o direito de propriedade e bens. Não haveria contrato humano possível, escreve ele, que desse direito à Igreja de possuir

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“É desta fonte que fluem todas as pretensões injustas às quais os assim chamados servidores da religião, em nome da Igreja, desde sempre se permitem. Toda a violência e perseguição que praticaram, toda discórdia e contenda, motim e tumulto que provocaram, e todos os males, que desde sempre foram perpetrados sob a aparência da religião pelos seus inimigos mais ferozes, a hipocrisia e a misantropia, são exclusivamente frutos dessa mísera sofística; um conflito ilusório entre Deus e o homem, entre os direitos divinos e os direitos humanos.”

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LeBon ((LeBon 1980) p. 116-117) relata sucintamente o processo: "Pendant tous ces désordres les finances ne s’amélioraient pas. Définitivement convaincue que les discours philanthropiques ne modifieraient pas leur état lamentable, voyant d’ailleurs la banqueroute menaçante, l’Assemblée décréta, le 2 novembre 1789, la confiscation des biens d’Église. Leurs revenus, y compris les dîmes prélevées sur les fidèles, étaient d’environ 200 millions et leur valeur estimée à trois milliards. Ils se trouvaient répartis entre quelques centaines de prélats, abbés de cour, etc., possédant le quart de la France. Ces biens, qualifiés désormais domaines nationaux, formèrent la garantie des assignats dont la première émission fut de 400 millions. Le public les accepta d’abord, mais ils se multiplièrent tellement sous la Convention et le Directoire qui en émirent pour 45 milliards, qu’un assignat de 100 livres finit par valoir seulement quelques sous."

algo. Inevitavelmente, a consequência prática disso seria a expropriação total dos bens eclesiásticos e a destruição física da Igreja Católica.

“Die nächste Folge aus diesen Maximen ist, wie mich dünkt, offenbar, daß die Kirche kein Recht habe auf Gut und Eigentum, keinen Anspruch auf Beytrag und Verzicht; daß ihre Gerechtsame mit den Unserigen niemals in Irrung gerathen, daß also zwischen Kirche und Bürger nie Collisionsfälle vorkommen können. Ist aber dieses, so findet auch zwischen Kirche und Bürger kein Vertrag statt; denn alle Verträge setzten Collisionsfälle voraus, die zu entscheiden sind. Wo keine unvollkommene Rechte statt haben, entstehen keine Collisionen der Ansprüche, und wo nicht Ansprüche gegen Ansprüche entschieden werden sollen, da ist Vertrag ein Unding.

Alle menschliche Verträge haben also der Kirche kein Recht auf Gut und Eigentum beylegen können, da sie ihrem Wesen nach auf keins derselben Anspruch machen, oder ein unvollkommenes Recht haben kann. ”82 Mendelssohn, Jerusalem, p. 58.

Mendelssohn pretende conceder à Igreja Católica apenas o direito de instruir, consolar, admoestar, ficando para o cidadão o dever de “um ouvido atento e um coração bem-disposto”. O poder de coerção, no entanto, seria exclusivo direito do Estado, não da Igreja. Fica aberta a questão de quem iria sustentar o clero, sendo este desprovisto de propriedade. O “Sócrates alemão” responde que o Estado deveria arcar com esses custos, e que a religião não deveria ter nada a ver com dinheiro.

Se, no referente a ações, o Estado se distinguiria da Igreja por ter o direito de coerção legal, no tocante a convicções não haveria grande diferença. Para o pai do Haskalá, nem o Estado nem a Igreja teriam direito de punir os cidadãos por suas opiniões, pois não haveria contrato que estabelecesse direitos compulsórios sobre convicções. Mendelssohn marca bastante bem a diferença entre ações, que são algo externo e passível de coerção, de convicções, que, estando no foro íntimo, não poderiam ser modificadas à força. Ele enfatiza a inutilidade de compelir as pessoas a afirmarem exteriormente crenças que no fundo não têm. Caberia ao Estado e à Igreja utilizar apenas meios persuasivos para educar os cidadãos. O uso do medo e da

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“A conclusão imediata a ser extraída dessas máximas é, como me parece, evidente, que a Igreja não tenha algum direito a bens ou propriedade, nenhuma reivindicação legítima a contribuições ou renúncias; que as suas prerrogativas nunca possam conflitar com as nossas; e que, logo, não pode nunca haver um caso de colisão de deveres entre a Igreja e os cidadãos. Mas, sendo esse o caso, não pode haver contrato entre a Igreja e os cidadãos, pois todo contrato pressupõe casos de colisão a serem decididos. Aonde não há direitos imperfeitos, não surge nenhuma colisão de reivindicações; e aonde não é preciso nenhuma decisão entre um conjunto de reivindicações e um outro, um contrato seria um absurdo. / Nenhum contrato humano pode, portanto, dar o direito da Igreja a bens e propriedade, pois, por definição, a Igreja não pode levantar nenhuma reivindicação sobre tais coisas, nem possui um direito imperfeito a elas.”

esperança teriam um efeito sobre os sentimentos, mas apenas a razão contaria. Como vimos anteriormente, o autor de Jerusalém havia já definido a tarefa da religião em termos bastante estreitos, descaracterizando-a em modo racionalista. A estratégia seria de forçar ao máximo a religião a assumir pretensões puramente racionais, que então poderiam ser facilmente questionadas e profanadas pela discussão científica.

A antipatia extrema de Mendelssohn pela Igreja fica manifesta mais uma vez quando ele irá então responder à questão sobre que tipo de governo ela teria, dado que não pode fazer nada senão pregar e ensinar. Ele afirma simplesmente que a Igreja não devia ter governo algum, ficando na mão daqueles com maior habilidade retórica.

“Was wird also der Kirche für eine Regierungsform anzurathen seyn? – keine! – Wer soll entscheiden, wenn in Religionssachen Streitigkeiten entstehen? – Wem Gott die Fähigkeit gegeben, zu überzeugen.”83 Mendelssohn, Jerusalem, p. 61.

O pai do Haskalá admite que algumas doutrinas, como o ateísmo e o epicurismo, seriam nocivas à ordem pública e que o Estado não deveria permitir sua difusão. Mas ele sugere que o Estado deva fazer isso à distância e com “sábia moderação”, evitando ingerências em disputas que deveriam ser decididas através de argumentos racionais.84

O ativismo do autor de Jerusalém fica também evidente ao discutir a questão dos juramentos solenes (Eidschwüre), que seriam requeridos para certos cargos no Estado. Argumentando que os juramentos não gerariam deveres para com o Estado, pois tratariam de convicções íntimas que não podem ser comandadas, o reformador judeu acusa os gentios de hipocrisia. 85 Por um lado, os judeus seriam excluídos, pois não levariam a sério os juramentos. Por outro lado, haveria muitos professores, sacerdotes e altos funcionários descrentes dos princípios pelos quais fizeram julgamentos.

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“Que forma de governo se torna recomendável à Igreja? Nenhuma! Quem deve ser o árbitro, quando surgirem disputas sobre questões religiosas? Aquele a quem Deus deu a habilidade de convencer os outros.”

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Isto nos remete, de novo, à sugestão, pelo menos implícita, de Koselleck (p. 13) sobre a falta de limites para a crítica moralista no Iluminismo. Tudo depende de como se quer interpretar essas admissões, por parte de Mendelssohn, do perigo da crítica desenfreada, enquanto ele se reserva o direito não só de exercê-la, mas de estipular os limites da censura estatal.

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Como é sabido, ao discutir a religião civil em Du contrat social, Rousseau havia tomado uma posição radicalmente oposta, chegando a propor o banimento para os céticos, por serem antisociais, e a pena de morte para quem se comportasse como um descrente nos dogmas pelos quais jurara: “Il y a donc une profession de foi purement civile don til appartient au souverain de fixer les articles, non pás précisement comme dogmes de religion, mais comme sentiments de sociabilité, sans lequels il est impossible d’être bon citoyen ni sujet fidèle. Sans pouvoir obliger personne à les croire, il peut bannir, non comme impie, mais comme insociable, comme incapable d’aimer sincèrement les lois, la justice, et d’immoler au besoin sa vie à son devoir. Que si quelqu’un, aprés avoir reconnu publiquement ces mêmes dogmes, se conduit comme ne les croyant pas, qu’il soit puni de mort; il a commis lê plus grand dês crimes, il a menti devant les lois.” (p. 167).

Mendelssohn confessa ter sentimentos misantrópicos ao considerar este problema, mas, em modo muito reminiscente ao Natan de Lessing, pede a Jahvé que os afaste.

“Aber um der Menschlichkeit willen! Bedenket den Erfolg, den diese Einrichtung bisher unter den gesittesten Menschenkindern gehabt hat. Zählet die Männer alle, die eure Lehrstühle und eure Kanzeln besteigen, und so manchen Satz, den sie bey der Uebernehmung ihres Amts beschworen, in Zweifel ziehen; die Bischöffe alle, die im Oberhause sitzen; die wahrhaftig großen Männer alle, die in England Amt und Würden bekleiden, und jene 39 Artikel, die sie beschworen, nicht mehr so unbedingt annehmen, als sie ihnen vorgelegt worden; Zählet sie, und saget alsdenn noch, man könne meiner unterdrückten Nation keine bürgerliche Freyheit einräumen, weil so viele unter ihnen die Eide gering achteteten! – Ach! Gott bewahre mein Herz vor menschenfeindlichen Gedanken ! Sie könnten bey dieser traurigen Betrachtung gar leicht über Hand nehmen.

Nein! Aus Achtung für die Menschheit, bin ich vielmehr überredet, alle