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Após o golpe de 1964, o PCB realizou o seu 6º Congresso, em dezembro de 1967, e aprovou uma resolução política na qual era apontado, como tática, que só através do movimento de massas era possível isolar e derrotar a ditadura e conquistar um governo amplamente representativo das forças anti-ditadura. A situação política brasileira provocava tensão em alguns grupos no interior do partido. As divergências se acirravam. Alguns grupos apostavam na necessidade do uso de armas para enfrentar os militares e preconizam a criação de um foco guerrilheiro e a adoção de uma plataforma socialista revolucionária. Neste ano esses grupos foram expulsos ou saíram do partido e organizaram pequenos partidos para pôr em prática suas concepções políticas, o que os levou à luta armada (A QUEDA..., 2008).

As resoluções aprovadas ressaltaram que a tarefa tática imediata seria a luta contra a ditadura, a fim de derrotá-la e conquistar as liberdades democráticas, unindo, para isso, a classe operária e as demais forças patrióticas e democráticas. Do ponto de vista estratégico, as resoluções assinalaram que a Revolução Brasileira, naquela etapa, deveria liquidar os dois obstáculos históricos que se opunham ao processo da nação: o domínio imperialista e o monopólio da terra. A Revolução é entendida como nacional e democrática.

No ano de 1968 é realizado o 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna, estado de São Paulo. Durante o evento a entidade foi efetivamente dizimada com a prisão estimada entre 800 e 1.000 estudantes ali presentes. Dali em diante, surgiu uma nova UNE, com vínculos estreitos com a

Organización Continental Latinoamericana de Estudiantes (OCLAE), sediada em Havana, e com uma linha política favorecendo a revolução armada – isto em uma época em que os “cautelosos remanescentes do PCB exerciam uma influência muito pequena” (CHILCOTE, 1982, p. 241).

A partir de 1968, o PCB começou a por em prática as Resoluções do 6º Congresso objetivando a formação de uma ampla frente democrática que unisse todos os setores de oposição à ditadura. Nesse período, apesar da repressão policial, os comunistas se dedicavam a um lento, paciente e duro trabalho de massa nas empresas, nos sindicatos, nos bairros e nas universidades. Em 1974 o PCB participou de forma destacada da campanha eleitoral com o MDB, mas sofreu novos e duros golpes por parte dos órgãos de repressão, com um grande número de militantes e dirigentes presos, torturados e assassinados. Vários membros do Comitê Central foram seqüestrados e mortos e a Direção foi obrigada a se deslocar para o exílio. Assim como em 1974, no ano de 1978 as forças anti-ditatoriais tiveram um bom resultado eleitoral por meio do MDB, e o movimento democrático conseguiu provocar um amplo debate em torno dos problemas nacionais.

Seguindo o direcionamento do partido, a relação entre as massas e seus representantes deveria ser facilitada pelos princípios do “centralismo democrático” e da “direção coletiva”. O centralismo democrático garantia o debate livre e aberto em todos os níveis do PCB. As posições políticas e diretrizes a serem seguidas deviam ser determinadas pela alta direção depois de discutidas pela maioria.

Naquele ano, no Espírito Santo os estudantes ainda não eram ligados a partidos políticos, mas alguns já apresentavam tendências ligadas ao velho Partidão (PCB), enquanto outra parte recebia influências de movimentos ligados à esquerda da Igreja, grupos de esquerda do campo e grupos trotskistas. O chamado “Comitê de Reconstrução do DCE” recebia estudantes de todas as influências

Mas, porque esta penetração do PCB na universidade? Para garantir a formação de uma elite. Na concepção leninista, o partido não deveria incluir toda a classe operária, mas apenas a vanguarda ou a parcela esclarecida do proletariado durante o período da ditadura burguesa. Assim o partido se tornaria uma espécie de elite dotada de conhecimento não assimilável pelo operário médio, e estaria

explicitamente organizado em uma estrutura centralizada e rigidamente disciplinada, o que garantiria a coordenação e o controle do proletariado (CHILCOTE, 1982, p.180).

Voltemos ao ano de 1976 para entender quais elementos influenciaram a formação do grupo objeto desse estudo. O ano em questão representou um marco para o movimento estudantil na Universidade Federal do Espírito Santo. Nele foram iniciadas as discussões entre alunos de diferentes cursos com o objetivo de reorganizar o movimento e a conseqüente reabertura do DCE (FIGURA 2). A primeira eleição foi realizada na retomada do Centro Biomédico, representado pelo curso de medicina da Universidade. As chapas concorrentes eram a “Questão de Ordem”, aliada dos movimentos de esquerda, e a chapa “Argumento”, que viria a se tornar precursora do “Movimento do Ócio”9, de perfil anarquista. No Centro Biomédico surgiu o primeiro grupo de discussão com influências políticas, oriundas do Estado de São Paulo. Neste mesmo ano havia surgido o primeiro DA Livre10 da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Em termos de mobilização estudantil, São Paulo era o que havia de mais avançado à época. Independente das diversas propostas, um desejo semelhante unia os grupos existentes na UFES: a reabertura do DCE, fato que se consolidaria somente em 1979.

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O Ócio era um movimento político e cultural dos estudantes da UFES que fez oposição durante alguns anos ao grupo objeto do estudo. Sempre de maneira irreverente, o Ócio pregava a discussão livre e ironizava a organização, disciplina e as posições consideradas de “direita” do grupo que viria a formar a presidência do DCE.

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DA Livre era uma proposta dos setores radicais do movimento estudantil que consideravam a estrutura dos DAs oficias uma concessão da ditadura, já que foram autorizados pelo MEC. Em 1976, o movimento estudantil reconstrói o DCE-Livre da USP, batizado “Alexandre Vanucchi Leme”, em homenagem ao estudante de Geologia daquela universidade assassinado pela ditadura em 1973.

Figura 2. Movimento em favor da Reabertura do DCE na UFES em 1978 Fonte: Borgo, 1995, p. 181

Antes da realização do primeiro Congresso da UNE - após o início do Regime Militar - os estudantes organizaram o IV Encontro Nacional dos Estudantes no Estado de São Paulo, onde compareceram 500 delegados de 14 diferentes estados. Neste encontro decidiram por apoiar os candidatos do MDB às eleições de novembro de 1978, com programas populares, e realizar o Congresso de Reconstrução da UNE em Salvador no ano seguinte (ROMAGNOLI; GONÇALVES, 1979, p. 34).

O 31º Congresso Nacional da UNE somente viria a ser declarado instalado em 29 de maio de 1979 por um de seus ex-presidentes - José Serra (63/64) - no Centro de Convenções na cidade de Salvador. O Congresso contou com a participação de dez mil pessoas, representando um milhão e trezentos mil estudantes universitários brasileiros.

Figura 3. Dez mil pessoas participaram do Congresso de Salvador em 79 Fonte: Romagnoli e Gonçalves, 1979, p. 44

Sessenta e quatro estudantes capixabas participaram do Congresso (FIGURA 3), considerado ilegal pelo governo, que instalou várias barreiras policiais ao longo das vias de acesso ao Estado da Bahia (ROMAGNOLI; GONÇALVES, 1979, p. 55). Segundo entrevista da diretoria provisória da UNE em 1979 o encontro representava a volta da discussão política aberta nas universidades.

Realizamos um Congresso amplo e democrático, o mais representativo de toda a história da UNE. Todos os estudantes, independente de suas idéias e convicções políticas, puderam apresentar suas propostas e discuti-las com os colegas em assembléias, congressos internos e votações em urna, realizadas na maioria das faculdades do país. Uma lição prática de democracia, a democracia que há tantos anos é negada ao povo brasileiro (ROMAGNOLI; GONÇALVES, 1979, p. 5).

No Congresso da UNE em Salvador tiveram início as tendências do Movimento Estudantil. Uma delas é chamada de “Unidade”, com pessoas ligadas ao Partido Comunista Brasileiro. A chapa concorrente era formada por pessoas do grupo de estruturação do Partido dos Trabalhadores, que se encontrava em período de germinação. Havia também as tendências “Convergência Socialista”, “Liberdade e Luta” (LIBELU), a “Centelha” e a “Caminhando”, com influência do PC do B.

A partir da repercussão do encontro os alunos da UFES tomaram conhecimento de que havia um grupo de estudantes organizado através de uma tendência chamada UNIDADE. Nas reuniões semanais dos membros do grupo em questão eram discutidas ações que viriam a ser realizadas na universidade e na sociedade. Desde

o início este grupo se preocupava em manter diálogo e mobilização fora dos muros da Universidade, para dar amplitude às suas ações.

Apesar de ter atraído grande parte dos estudantes, o grupo UNIDADE era visto por muitos como de inclinações direitistas e rotulado como “reformista”. A origem do termo vem da obra “O Renegado Kautsky”11, escrita por Lênin. O notável formulador e líder da revolução russa, em determinado momento, foi contra a ditadura do proletariado. Pignaton (2006)12, membro do grupo Unidade na época, explica esta interpretação:

Depois que a gente foi ao Congresso da UNE, em 79, a hegemonia do movimento estudantil foi do Partidão. As outras tendências tinham pessoas isoladas, que falavam que o Partidão era muito moderado, não queria fazer a revolução, era reformista... Naquela época, se falasse em fazer reforma para dar mais qualidade de vida à maioria da população, você era considerado um traidor. Era uma linha muito moderada, o PT estava surgindo com toda força. Então quando nós fomos ao Congresso da UNE e voltamos, organizaram as tendências, nós já voltamos com a convergência socialista organizada (Informação verbal).

Um dos motivos da pecha de “direita” devia-se também ao fato da forte vinculação com a reitoria universitária. O grupo tinha ação conjunta com a reitoria comunitária nas mobilizações internas e com a sociedade, o que lhes rendeu também o rótulo de “pelegos”. Pignaton (2006) continua explicando estes embates com os demais grupos políticos que conviviam na Universidade.

Nós tínhamos uma vinculação importante com a reitoria comunitária, que era um parceiro importante, então nós éramos um grupo dentro daqueles conceitos clássicos de pelego... O nosso grupo, dentro da Universidade, comparado com os outros como o LIBELU, era considerado de direita. Tanto que a política dos Centros Acadêmicos não vem pela nossa mão. Elas vêm pela mão da esquerda trotskista, que entende do conceito C.A. e C.A. livre, versus os Diretórios Acadêmicos. Tem algum momento em que todos nós nos envolvemos com o tema e isso vira uma política de todos, mas ela é

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Em O Estado e a Revolução, Lênin, a partir dos textos de Marx e Engels, discute qual a atitude que os bolcheviques deveriam ter diante do Estado burguês e que tipo de Estado deveria ser construído pelos trabalhadores. Opõe-se ao modelo bolchevique depois de 1917, passando a ser conhecido como o renegado Kautsky, segundo a expressão de Lenin. Com efeito, Kautsky vai criticar no leninismo a faceta jacobino-blanquista, por ter-se forçado o processo histórico, queimando etapas, visando a construção do socialismo num país atrasado. Continua a considerar que quanto mais capitalista é um Estado, mais próximo está do socialismo. Considera também que a ditadura do proletariado deve ser conseguida através da obtenção de uma maioria parlamentar de socialistas e que a democracia direta não deve substituir e esmagar a democracia representativa

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Pignaton, 2006. Entrevista concedida em 30 de novembro de 2006, em Vitória, à Margô Devos Martin, por Fernando Pignaton. Doravante as citações Pignaton (2006) é referente à esta entrevista.

introduzida no contraditório à nossa posição. Nós éramos os reformistas (Informação verbal).

Como outros partidos, o partido comunista no Brasil tinha uma estrutura organizatória que compreendia organismos locais, intermediários e centrais. Tinha uma direção e bases, organismos auxiliares e de apoio, funções e princípios organizatórios. Como os partidos comunistas de outras partes, o partido brasileiro compunha-se de um sistema de células nos locais de trabalho, reivindicava para si a representação dos interesses da classe operária e professava o igualitarismo e a confiança nas massas. Sua ideologia postulava a crença no progresso tecnológico civilizador para a auto-reforma do regime e a tentativa de um novo partido governista, com diálogo com o governo e o complexo desafio de conter os aparelhos repressivos (CHILCOTE, 1982, p. 165).

O partido comunista tentava recrutar as massas para as suas fileiras e atinha-se a um esquema rígido de contribuições individuais, das quais dependem as finanças do partido. Ao invés de convenções, o partido comunista organizava unidades de trabalho menos exclusivas e de bases mais amplas, cuja principal função é a educação política dos quadros. Na teoria, a direção deixava de ter importância na medida em que a autoridade e o poder se distribuíam pela complicada rede de instâncias. Na prática surgiram indivíduos poderosos e tendências oligárquicas, mais como resultado das posições políticas do que da própria natureza do partido.

O grupo, objeto desse estudo, começa a associar a luta estudantil à vida partidária. A filiação ao PCB, mesmo que clandestina, se deu ao longo de 1978. Segundo Wellington Coimbra, que já na faculdade era conhecido como Lelo, os estudantes chegaram a oferecer certa resistência.

Havia algumas idiossincrasias, algum desconforto na forma de tentar fazer a nossa organização se tornar partidária. Um certo voluntarismo naquela transição do circulismo para organização formal. Isso retardou um pouco.

Seguindo a tendência de descentralização das forças do partido e fortalecimento das bases o PCB do Espírito Santo se organizou e se fortaleceu. O Partidão, que estava desorganizado no Estado durante o período do Regime Militar, voltou a operar por meio dos alunos da Universidade que montavam a chapa do DCE. Pinto (2008),

que optou por não entrar na composição da chapa se tornou primeiro secretario do Comitê Estadual e continuou a orientar a estratégia política do movimento:

E nesse momento que a gente começou a ter alguma conversa com os membros do partido comunista de São Paulo e resolvemos: ‘já que o caminho é esse vamos fazer!’

Então ficou mais ou menos acordado: ‘Você não entra na chapa do DCE e nos ajuda a montar o partido’. E então, eu fui o primeiro secretário e organizador deste embrião do partido aqui. Não era o secretário geral, mas o primeiro secretário do estado fui eu. [...] Fui eu, foi o Paulo, foi o Lelo, foi o Geraldo. Foi a turma do DCE. Esta estrutura do partidão nós é que criamos. Nós fizemos e mantivemos o contato com São Paulo e com o Rio e depois de um tempo passei a receber a ‘Voz Operária’ em casa. A ‘Voz Operaria’ chegava todo embrulhadinho, a gente lia e depois passava para a turma (Informação verbal).

Durante o processo de reestruturação do Comitê Estadual, os membros do movimento estudantil tomaram conhecimento da antiga direção do partido local e entraram em contato com seus antecessores, os quais foram apelidados de “velhinhos”. Pinto (2008) narra este episódio:

Eu lembro que foi um negócio emocionante, e aí descobrimos que havia uma coisa de partido antiga. Aí nós recebemos a informação que tínhamos que fazer contato com “os velhinhos” Nós não sabíamos. Aí fomos atrás do Parafuso, o Vespasiano Meireles, que era um operário, o Clementino e do Dr. Magalhães que era um médico antigo. E nós fomos procurar este pessoal e foi emocionante porque eles choraram, eles se emocionaram e ficaram extremamente sensibilizados. A gente estava recriando o partido aqui. [...] A orientação que recebemos de fora foi: “vocês criam uma direção e acolhem a turma”. A gente falou: “Vamos criar uma direção de quatro. Dois velhos e dois novos” Então a primeira direção de quatro foi eu e Paulo e dois velhos. Só que os dois velhinhos ficaram tão felizes, tão embevecidos que o que agente queria eles estavam apoiando. Imagina: ter alguém criando o que foi a vida deles com setenta e poucos anos!! (Informação verbal).

O grupo de alunos que seguia a tendência chamada Unidade deu origem a chapa Construção presidida por Paulo Hartung, que concorreu com mais quatro chapas para diretoria do DCE. Faziam ainda parte da chapa Construção, Fernando Pignaton do curso de Medicina, como vice-presidente, e Neivaldo Bragato do curso de como tesoureiro. Eleita em 9 de novembro de 1979 com 73% votos válidos (BORGO, 1995)13, tinha como bandeira os princípios da democracia, a anistia geral, uma constituinte livre e soberana e a educação gratuita para todos. Abaixo recorte da Revista Agora (NA UFES..., 1978, p. 32):

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Figura 4. Na matéria, a chapa Construção recebeu o adjetivo de moderada

As grandes linhas de trabalho do movimento estudantil nasciam sob a orientação do partido. Subordinados aos Comitês Universitários havia as chamadas “bases”, que eram formadas por pessoas agrupadas nos cursos. De formação vertical, o partido apenas apresentava características horizontais nas grandes assembléias.

Quando o assunto era captar apoio junto aos estudantes os principais canais utilizados no Espírito Santo eram: o jornal clandestino "A Voz Operária", elemento chave na divulgação, forte canal de comunicação com os operários que também era distribuído na Universidade e um documento chamado "DCE Denuncia". Além do trabalho de cooptação existia um esquema de distribuição de informações chamado

circulismo. O advogado Stein (2006)14 narra como era feita a cooptação dos estudantes e como funcionava o circulismo:

O centro era uma pessoa já com discussão acumulada pelos líderes anteriores, já incorporando visão política, os aspectos teóricos de organização social, organização política. O objetivo era trazer então novos estudantes para essa discussão, em torno dessa visão. Outros grupos políticos na Universidade também faziam isso, não ligados ao PCB, e acabaram sendo oposição a nós lá dentro, indo se alinhar a outras forças. Essa ‘partidarização’ existia e eu acredito, com certo escrúpulo, no sentido de não ser o partido em si o centro da atração para atrair as pessoas: ‘venha ser comunista’. O foco partidário não era esse, mas, ‘venha discutir a realidade brasileira, participe da sua transformação’ (Informação verbal) .

De acordo com os integrantes do grupo que dirigiu o DCE na UFES em 1979 existiam dentro da Universidade mais de 200 pessoas que participavam de um Grupo de Estudo, como veremos mais adiante, e faziam o circulismo, mas nem todas eram do Partidão.

O PCB foi se organizando a partir da nova formação e o Comitê Estadual passou a contar também com os estudantes Idelberto Muniz, Lelo Coimbra e o professor da UFES Izildo Leite. O Comitê Universitário era formado por Robson Leite, Fernando Pignaton, Ernesto Negris e Anselmo Tozi.

A intenção inicial do partido era crescer o máximo possível horizontalmente, tornando-se, gradativamente, mais seletivo. De acordo com Pignaton (2006), “[...] nós não fazíamos seleção de massas, queríamos formação de quadros, no velho estilo bolchevique mesmo. Então, eram pessoas que tinham dedicação quase religiosa”. Não era difícil entrar, e sim encontrar quem aceitasse tamanha dedicação. Ainda segundo Pignaton (2006) a dedicação dos membros do movimento estudantil ligados ao Partidão os diferenciava dos demais:

Naquela época nós tínhamos um compromisso com o social maior que o compromisso com a gente. A gente dedicava a vida... aquilo era 24 horas por dia. Nós fazíamos reuniões secretas. Tinha que pegar pessoas de kombi, de carro, botar a venda nos olhos e levar para os lugares. As convenções estaduais do Partidão eram num sítio do meu pai em Domingos Martins. Todo mundo saía vendado, o carro rodava, rodava, era tudo clandestino. Acho que foi em 1978. Essa reunião lá em Domingos Martins mesmo - que foi um Congresso Estadual do PCB - foi feita dessa maneira.

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Stein, 2006. Entrevista concedida em 7 de dezembro de 2006, em Vitória, à Margô Devos Martin, por Stanislau Kostka Stein. Doravante as citações Stein (2006) é referente à esta entrevista.

Os caras que achavam que a revolução era a guerrilha, uma insurreição popular, se dedicavam a isso a vida inteira, o dia inteiro, estudavam o que dava! Eu acho que a trupe do Partidão desenvolveu, pela militância política, uma atividade intelectual de estudos de textos e debates que também era usada na área acadêmica que, sinceramente, nos colocou entre os melhores alunos das escolas (Informação verbal).

Segundo Chilcote (1982, p. 206), o militante comunista no Brasil, como em outras partes, devota-se inteiramente à vida do partido. Ele militava em sua célula, discutia com seus companheiros as questões importantes trazidas na imprensa do partido, prestava serviços ao partido e à suas organizações auxiliares. Mesmo a vida privada e familiar do militante era incorporada à vida partidária, já que o partido não organizava apenas o trabalho, mas também os esportes, as diversões, o lazer e as atividades culturais. O militante comunista era dotado também de um arcabouço de idéias, uma filosofia política, uma filosofia global: uma explicação sistemática do universo, um conjunto de valores e um sentimento de fé.

Porém os membros do grupo do DCE não concentravam as suas atividades dentro dos muros da Universidade. Pelo fato do PCB ser formado por diversos