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Parte III – Modificações na forma de agregados devido a introdução de molécula sinalizadora

5. Discussão Geral dos resultados obtidos

Nossos resultados permitem inferir possíveis explicações para a maneira como ocorre a adesão da X.fastidiosa em seus estágios iniciais, além da forma como pode ocorrer dispersão de células, agregados e biofilmes nos vasos do xilema.

O ciclo de vida completo de X.fastidiosa subsp. pauca foi estudado por Janissen et al. [13]. Estes autores relataram uma variação espacial-temporal da composição de EPS ao longo dos diferentes estágios de adesão. Nosso estudo sobre as propriedades mecânicas do sistema EPS/células nos estágios iniciais de adesão pode ser correlacionado também com uma variação espacial-temporal dos tipos de EPS. Verificamos redução nos valores de stiffness à medida que o tempo de crescimento era aumentado. Poderíamos sugerir a caracterização de propriedades elásticas como forma de acompanhar a evolução do cultivo bacteriano.

Janissen et al. [13] também mostraram que a adesão bacteriana começa na região polar, onde o EPS se acumula primeiro. Eles também demonstraram que toda a estrutura do biofilme está ancorada à superfície apenas por um número relativamente pequeno de células, lembrando as células originais irreversivelmente ligadas, e que a região polar da célula apresenta uma assinatura elétrica diferente quando comparada com o corpo bacteriano, o que foi interpretado como variação na composição do EPS. Caracterizando as propriedades elásticas do polo e corpo bacteriano para a amostra cultivada durante 2 dias, observamos diferenças na topografia e nos valores de stiffness; estes últimos são mais baixos na região polar do que no corpo bacteriano. Este resultado indica que eventuais alterações na composição de EPS proporcionam um material mais macio e mais flexível nos polos. Este resultado é consistente com as observações microfluídicas ex-vivo, em que as células aderidas por um único polo oscilam em torno de um eixo centrado no polo fixo sob condições simulando o fluxo do xilema. O menor valor de stiffness na região polar do sistema EPS/célula deve ser capaz de suportar deformações ao mesmo tempo em que aumenta as forças de aderência [53].

O movimento coordenado de um aglomerado ancorado à superfície por algumas células verticais foi também observado por Prasana et al. [54], usando sensores de força de nanofios. Uma maior flexibilidade do material que ancora as células que mantêm o biofilme poderia assim proporcionar a resposta adequada às tensões de cisalhamento presentes sob o fluxo de xilema e durante a sucção de insetos para transmissão de vector. De fato, a análise da distribuição de

stiffness mostra que valores menores são observados para tempos de crescimento mais longos. Assim, podemos ter o início da formação LB-EPS [13, 137], particularmente no centro das estruturas maiores. A redução do stiffness é esperada neste caso, uma vez que o LB-EPS está geralmente associado ao EPS slime na literatura de biofilme, devido ao caráter macio da matriz [137]. Por outro lado, um corpo de bactéria mais duro, tal como observado para amostras cultivadas durante dois dias, pode ser devido a uma maior contribuição elástica do envelope de células bacterianas gram-negativas. A camada de EPS imediatamente envolvendo o corpo celular deve ser muito fina, de acordo com nossas medições AFM e Raman. O cenário sugerido pelos nossos resultados é consistente com a observação da remoção de uma grande massa do biofilme em resposta a tensões de cisalhamento, induzida pelo fluxo de meio PW em dispositivos microfluídicos (Figura 4.23). Corpos celulares mais rígidos podem ser mais facilmente removidos de uma matriz mais macia quando existem diferenças de pressão.

Além do EPS excretado pelas células, adesinas afimbriais também podem interferir no processo de adesão à superfície. Caserta et al. [58] observaram que a adesina XadA1 para X.fastidiosa da estirpe citros apresenta alta expressão durante toda a formação do biofilme, inclusive em estágios iniciais, indicando o envolvimento desta proteína tanto na adesão célula- superfície quanto na adesão célula-célula. Sahoo et al. [54] identificaram a distribuição espacial da adesina XadA1 nos cultivos da X.fastidiosa e mediram a força de adesão associada a sua presença, imobilizada na superfície.

Em nossos estudos, utilizamos dispositivos microfluídicos tratados quimicamente com esta adesina. Identificamos um expressivo aumento na densidade celular na presença de XadA1, se comparado a superfície sem tratamento. Além disso, verificamos que as células aderidas à superfície dos microcanais tratados com XadA1 eram mais dificilmente removidas do que às aderidas ao vidro sem tratamento. Complementando esta caracterização quantificamos a componente horizontal da força de adesão associada a esta adesina presente na superfície, e verificamos que a força de adesão era 2 vezes maior na superfície com XadA1. Comparando nossas medidas de força de adesão com as obtidas por Sahoo et al. [54], verificamos que esta seguia a mesma tendência de proporcionalidade (força de adesão na superfície com XadA1 cerca de 2 vezes maior que na superfície sem tratamento), apesar de estarmos medindo diferentes componentes da força. Podemos inferir de nossos resultados que a XadA1 tem papel importante na adesão bacteriana e manutenção no número de células nos cultivos.

Como informação adicional aos estudos de superfícies tratadas para cultivo bacteriano, utilizamos uma celulose sintética, simulando a composição química dos vasos do xilema (majoritariamente composto por celulose). Neste caso somente fizemos algumas observações qualitativas quanto a densidade de células e velocidade de células livres no canal, devido a problemas na reprodutibilidade do experimento.

A grande contribuição de nossos estudos em ambiente microfluídico, utilizando dispositivos de PDMS/vidro em relação ao que é visto na literatura (conforme discutimos nos capítulos 2 e 4), vem do fato de termos introduzido uma nova metodologia experimental que simulava um ambiente mais comparável aos vasos do xilema, devido as dimensões dos nossos microcanais e alteração química de superfície.

Outro ponto original deste trabalho quanto aos dispositivos microfluídicos foi o desenvolvimento de uma nova instrumentação. Construímos dispositivos impressos em material biocompatível (PLA), possuindo microcanais comunicantes via membrana permeável, para cultivo bacteriano e subsequente inserção de molécula sinalizadora de quórum em regime de fluxo convectivo-difusivo. Foi realizado apenas um estudo preliminar da molécula sinalizadora da X.fastidiosa que ataca espécies citros (DSF-citros) sobre a densidade e forma de pequenos agregados em cultivos bacterianos com pouco tempo de crescimento. Contudo, observamos que a presença destas moléculas no cultivo bacteriano aumenta a densidade celular e altera a forma de pequenos agregados, apesar de valores semelhantes da dimensão fractal obtidos.

Em resumo nossos resultados mostram-se relevantes para o entendimento das estratégias utilizadas pela X.fastidiosa nos processos de adesão e crescimento celular. Sugerem também um possível mecanismo de dispersão de células e agregados nos vasos do xilema, pela modulação das propriedades elásticas do conjunto célula/EPS.