• Nenhum resultado encontrado

Parte II – Efeitos do microambiente sobre adesão, crescimento e mobilidade da Xylella

4.4 Tipos de movimento das células em ambiente microfluídico

Experimentos microfluídicos têm sido extensivamente utilizados para analisar o movimento das células, e twitching motility para X. fastidiosa em condições de fluxo [16,18,20,137]. Muitos trabalhos têm explorado o transporte de células nesses microambientes

usando a X. fastidiosa subsp. fastidiosa, da estirpe Temecula, causadora da doença de Pierce em videiras. Em particular, de la Fuente et al [16,18] mostraram como a mobilidade de células individuais dependem da presença de pili; eles também observaram a influência dos pili na formação do biofilme, bem como na sua forma. Em nosso trabalho propomos uma aproximação complementar para X. fastidiosa subsp. pauca, estirpe 11399. Contrariamente aos estudos microfluídicos já realizados [16,18], nós não observamos o efeito dos pili que, em nosso caso, estão provavelmente cobertos pela deposição de EPS [13].

Para investigar o tipo de movimento das células utilizamos uma taxa de fluxo constante (Q = 0,05 µL/min), que produz um baixo valor de tensão de cisalhamento em cada canal, τ = 1 dyn/cm2. Estas condições experimentais não suficientes para remover as células da superfície bruscamente, de acordo com nosso estudo. O tempo inicial de cultivo celular no microcanal, antes de iniciar o fluxo na bomba de seringa, foi de 48hs, para garantir um número razoável de células para análise.

Verificamos a presença de basicamente dois tipos distintos de movimento das células bacterianas. Um deles é de translação, onde as células simplesmente migram de uma região do canal para outra (Figura 4.13), e outro é de oscilação em torno de um polo fixo (Figura 4.14).

Para analisar o movimento de translação das células, utilizamos os microcanais com e sem tratamento de superfície. Foram feitos em torno de 60 vídeos/dispositivo ao longo dos microcanais em um plano focal um pouco acima do plano do vidro, para que fosse possível acompanhar o movimento das células livres. Cada vídeo era composto por 15 frames, capturados num intervalo de 0,34 segundos cada. No tratamento dos vídeos utilizamos a ferramenta do software ImageJ, Manual Tracking, que permitia mapear a trajetória das células previamente escolhidas. A Figura 4.13, mostra o movimento de translação das células em um microcanal submetido a tratamento de superfície com a adesina XadA1. O vídeo foi tomado 2 horas após o fluxo de meio de cultura ter sido ligado (tempo total de cultivo 50 hs). Os frames extraídos a partir deste vídeo possibilitam ver a trajetória de algumas células: em (a) o instante inicial, onde as células começam a ser monitoradas; (b) e (c) mostram diferentes estágios das trajetórias percorridas para cada célula na direção do fluxo de meio de cultura (linhas coloridas na imagem), para 3 e 6 segundos após o início da medida. Posteriormente, utilizamos os dados obtidos com este rastreamento para calcular a velocidade média das células em cada microcanal.

Figura 4.13 – Frames extraídos de um vídeo ilustrando o movimento de translação de células no microcanal funcionalizado com XadA1. Em (a) primeiro frame extraído (instante inicial do movimento); (b) 00:03 segundos após primeiro frame; e em (c) 00:06 segundos após primeiro frame capturado.

O processo de colonização e migração da X.fastidiosa no xilema da planta ainda não é completamente definido, porém alguns trabalhos citam a presença de estruturas dentro do xilema da planta, que poderiam facilitar ou impedir o movimento das células ao longo e entre os vasos [5,9,12]. Poderíamos associar o movimento de translação visto em nossos resultados no microcanal, para as células livres, como parte do processo de migração da bactéria nos vasos que permitem este tipo de movimento.

Foram utilizados os mesmos recursos descritos acima, para analisar o movimento oscilatório das células. A Figura 4.13 apresenta frames extraídos de um vídeo feito num microcanal sem tratamento de superfície, com tempo de cultivo celular de 39hs em condições de fluxo. A Figura 4.14 ilustra células únicas aderidas no microcanal. Neste caso, a maior parte das células na imagem mantém suas posições fixas na janela de observação, embora algumas delas apresentem o movimento oscilatório (destacadas por círculo branco). Em (a) temos o instante inicial onde ainda não houve oscilação, já em (b) vemos linhas de trajetória produzidas pelo movimento oscilatório, nos pontos de cores azul e magenta.

Figura 4.14 - Movimento de oscilação em torno de um polo fixo, para amostra no microcanal controle. A região marcada com um círculo branco ilustra polos que se movem em relação ao polo fixo. Em (a) é ilustrado o instante inicial onde ainda não houve oscilação, e em (b) têm-se linhas de trajetória produzidas pelo movimento oscilatório.

Utilizamos um histograma (Figura 4.15b) para analisar os deslocamentos dos polos das células, marcados por pontos coloridos. Estes deslocamentos representam o quanto a célula se

moveu de um ponto ri até o ponto rj, sendo 𝑟𝑖 = √(𝑥𝑖2+ 𝑦𝑖2). A trajetória de cada região polar consistia de 15 pares (x,y); a partir deles calculamos os ri’s e posteriormente a diferença entre cada ponto e o seu vizinho para obter os pontos do histograma. Vale salientar que ao converter a imagem em escala de pixels para micrômetros, obtivemos uma resolução de 6,9pixels/µm, o que nos dá uma razão x/y (calibração de eixos) de 0,1µm. Desta forma nossas medidas de deslocamento estão muito próximas da resolução da medida. Verificamos que muitas células possuem deslocamentos insignificantes, correspondendo a polos fixos; outras apresentam uma grande dispersão com maiores valores de deslocamento, que classificamos como regiões de polos livres. Estas células, que possuem uma extremidade presa por um polo e outra livre para oscilar, correspondem as células aderidas verticalmente reportadas por Janissen et al [13].

Figura 4.15 - (a) Imagem WFM de uma seção no meio de um microcanal controle após 39hs de tempo de crescimento, (b) histograma mostrando o deslocamento dos polos, marcados por pontos coloridos com inset para direção de deslocamento destes polos.

Na seção 4.2 caracterizamos as propriedades mecânicas do sistema célula/EPS, onde verificamos que os valores de stiffness eram mais baixos na região polar da célula, quando comparados ao corpo bacteriano. Relacionando este resultado com as observações de movimento oscilatório da célula em microambiente, podemos sugerir que o movimento oscilatório de células aderidas verticalmente é facilitado devido a presença de um material mais mole (flexível) na região de interface polo fixo da célula/superfície.

4.5 Efeito da funcionalização da superfície sobre a velocidade das células

livres (movimento de translação) ao longo do tempo

Ainda investigando o movimento das células, nos concentramos em verificar o comportamento das células livres nos microcanais à medida que o meio de cultura fluía. Utilizamos a ferramenta de rastreamento de partículas, Manual Tracking (ImageJ), para obter as velocidades das células em cada dispositivo microfluídico. Foram analisadas as trajetórias de cerca de 20 bactérias em cada intervalo de tempo, para cada dispositivo microfluídico (controle, CMC, XadA1); para verificar se havia um padrão nos valores velocidades, tomamos o valor médio de velocidade em cada caso. Realizamos a primeira medição, tempo 0 hs, no instante em que iniciamos a passagem de meio de cultura no microcanal; a segunda 2 hs após o início das medidas em condições de fluxo; a terceira 14 hs depois do início e a última medição foi feita 20 hs depois, para que pudéssemos verificar o padrão de velocidades após a variação

de densidade bacteriana causada pelo fluxo de meio de cultura. A tabela abaixo resume o comportamento das células livres na janela de observação.

Tabela 1 – Resumo dos valores médios de velocidade obtidos para cada dispositivo microfluídico em função do tempo de observação, e disposição espacial das células em relação à superfície para tempos maiores de observação.

Tempo Controle CMC XadA1

0-2h Velocidade cresce

com o tempo; valores no intervalo:

15-90µm/s

Velocidade cresce com o tempo; valores no intervalo: 1-32µm/s

Velocidade decresce

com o tempo; valores no intervalo:

15-1µm/s t > 2h Não há mais células

livres se deslocando; as células encontram- se aderidas de forma horizontal e vertical em relação à superfície.

Não há mais células livres se deslocando.

Todas as células encontram-

se aderidas de forma

horizontal em relação à superfície.

Algumas células ainda

se deslocando com

baixa velocidade,

tipicamente ~ 1µm/s; e a maioria fixas pela região

polar ou aderidas

completamente à

superfície.

Vimos que tanto no caso do dispositivo controle quanto do CMC as velocidades das células crescem ao longo do intervalo de tempo que vai do instante inicial até as primeiras 2 horas de fluxo. No caso do CMC observamos valores de velocidade um pouco mais baixos. Já o dispositivo com XadA1 na superfície novamente possuí um comportamento atípico. Inicialmente são encontrados valores de velocidade das células semelhantes ao caso controle, porém este valor cai consideravelmente ao longo das 2 horas de observação (15 µm/s →1 µm/s). Neste caso a proteína se comporta como um agente redutor de movimento das células, e estas se movem com velocidade mais baixa.

Para maiores intervalos da janela de observação verificamos o desaparecimento de células livres no controle, restando apenas as aderidas completamente à superfície (horizontalmente) e as que estão aderidas pela região polar e apresentam unicamente o movimento oscilatório da extremidade livre, discutido na seção 4.4. No dispositivo funcionalizado com CMC, todas as células do microcanal estavam completamente aderidas a superfície após 4 hs.

O dispositivo com XadA1 na superfície foi o único no qual ainda conseguimos observar movimento de translação para maiores tempos de observação, apesar das velocidades apresentarem valores muito baixos ~ 1 µm/s. Isto pode estar associado a densidade bacteriana continuar aumentando, conforme visto na Figura 4.12, onde as “células filhas” não teriam aderido ainda completamente a superfície e por isso teriam um certo valor de velocidade.

(B) – Fluxo variável

4.6 Remoção de células únicas da superfície do microcanal provocadas por