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Uma visão panorâmica da presença da escrita na escola

8.1 Disponibilidade: a escrita na escola

Se a escola modificou-se ao longo do tempo, como os pais das crianças colaboradoras desta pesquisa mencionaram (Ver capítulo 6), principalmente pela disponibilidadede materiais escritos, acredita-se que atualmente as crianças estabeleçam maior interação com a escrita porque a escola também favorece o acesso a ela.

Na escola da comunidade havia disponibilidade da escrita. Identificamos que a escrita estava nas paredes, nos livros, nos quadros de avisos, nos armários, nas gavetas, nos cadernos de plano, no caderno dos alunos, nos cadernos de ponto e outros. O Quadro 6, a seguir, mostra a escrita no ambiente escolar. O Quadro 6 foi organizado da seguinte forma: na primeira coluna apresentamos a escrita, ou seja, o gênero textual disponível no espaço escolar; na segunda o assunto e a localização (suporte)50; na terceira uma foto do artefato e na quarta indicamos seus respectivos destinatários.

49 A pala a aç o est se do usada o o efe ia ao ue as pessoas esta a faze do ou ealiza do

conjuntamente, e para dar destaque ao foco da atividade que estava sendo desenvolvida ou à temática abordada pelos participantes.

50 Estamos usando os conceitos de gênero textual e suporte conforme a denominação de Marcuschi (2008).

Gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas (p.155). O suporte desses gêneros é o locus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto (p.174).

Quadro 6 - Escrita encontrada na escola

Escrita (Gênero)

Assunto/Localização Foto Destinatários da

escrita

CARTAZ Cartaz de boas-vindas aos alunos na porta da sala.

Professores, crianças.

TABELA Escala de tarefas para as auxiliares, cardápio e avisos no quadro de avisos da cantina. Auxiliares de serviços gerais, Coordenadora, professores.

DESENHOS Trabalhos dos alunos sobre o carnaval, na parede da sala de aula.

Crianças, professora.

ASSINATURA Caderno de controle da

frequência dos

profissionais da escola na

mesa da Secretaria. Profissionais da escola.

ESTÓRIA Livros de literatura infantil

na estante da biblioteca. Alunos,

professores, pais, Coordenadora.

AVISOS Aviso de venda de cachorro-quente na parede do corredor da escola. (Recado de morador da comunidade.) Profissionais da escola, alunos.

TABELA Quadro de distribuição dos times de futebol da comunidade na parede do corredor da escola. (Recado

de moradores da comunidade.) Profissionais da escola, alunos. PALAVRAS CLANDESTINAS

Escrita das crianças na parede da sala de aula

(nomes, números,

palavrões, palavras).

Alunos.

Fonte: Pesquisa de campo, 2012.

O cartaz foi o tipo de escrita que anunciou muitos eventos, durante 2012, tanto na escola quanto na comunidade. Esses cartazes eram elaborados tanto pelos professores quanto pelos alunos. Dentro da escola, os cartazes serviam para dar boas-vindas aos alunos, para sintetizar uma matéria estudada, mas também podiam servir para registrar uma mensagem para os professores ou para as crianças e pais. Na sala de aula, tanto os cartazes como o painel de exposição dos trabalhos das crianças eram afixados na parede (Quadro 6). Eles eram confeccionados pelos alunos, principalmente para lembrar uma data comemorativa ou pa a ilust a u o teúdo estudado, o o ali e taç o , o dia da o s i ia eg a, o dia do meio ambiente e outros. Os alunos de ambos os turnos observavam com atenção os cartazes afixados na parede da sala de aula. Já na comunidade, os cartazes serviam para as campanhas de prevenção, mas também como convite para festas de aniversários (um exemplo foi um cartaz de aniversário de 15 anos de moradora da comunidade exposto na escola e na igreja no primeiro semestre de 2012).

A tabela era outra escrita muito utilizada e que organizava uma série de eventos: o cardápio da merenda, a distribuição de tarefas para a limpeza da escola, a relação dos jogadores para os times de futebol, a escala de alunos e horários para a aula de reforço e outros. O livro de ponto era um material mais restrito aos funcionários e à coordenadora da escola e ficava em uma mesa na Secretaria. Já os livros de literatura podiam ser solicitados pelos alunos, professores ou pais.

O gênero aviso era o mais utilizado pela escola para entrar em contato com os pais: avisos para reuniões, sobre os recessos e festas na escola. Já as mensagens para profissionais da escola eram afixadas nos quadros de avisos dentro da Secretaria e na cantina. Moradores da comunidade também se utilizavam dos avisos como forma de comunicar ou divulgar serviços - por exemplo, anúncio de venda de cachorro-quente, de picolé, provavelmente estendendo a experiência de comunicação aprendida na escola para a vida local ou vice-versa. Outro tipo de escrita que estava presente na parede da escola eram registros feitos pelos alunos. Muitos se esforçavam para ler o que estava escrito: nomes, números e palavrões (Quadro 6). Esses últimos eram expressões clandestinas. Não presenciei nenhum dos momentos em que foram registrados, obviamente, porque quem os fazia não queria ser identificado.

Na escola da Comunidade Jacarandá, o acervo bibliográfico não estava em um lugar específico denominado biblioteca. A biblioteca funcionava no mesmo espaço da Secretaria e sala de professores. O empréstimo do acervo era feito pela coordenadora da escola e o interesse pelos mesmos se limitava a um número muito pequeno de professores e alunos. A escola recebeu nos últimos anos várias obras do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)51, tanto para compor a biblioteca do aluno quanto a do professor. Isto indica que somente a presença física desses artefatos escritos não garante o acesso à escrita. Como nos lembra Kalman (2004), é necessário verificar como as pessoas interagem com esses textos, que usos elas fazem deles e para quais propósitos.

Observando o conteúdo das comunicações feitas através do espaço da escola, percebe-se a importância dela na inter-relação das famílias da comunidade. Diversas

51O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) tem por princípio subsidiar o trabalho pedagógico dos professores por meio da distribuição de coleções de livros didáticos aos alunos da Educação Básica. Disponível em:<http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=668id=12391option=com_contentview=article>. Acesso em: 10 out. 2014.

comunicações endereçadas a todos eram feitas através desse espaço, como uma central de divulgação eficiente, tendo as crianças como agentes da distribuição das informações.

Essas primeiras percepções da disponibilidade da escrita no contexto da escola foram ampliadas com as observações na sala de aula, permitindo assim organizar um arcabouço significativo de eventos de letramento que possibilitaram a compreensão das interações que ocorriam em torno da escrita no cotidiano da turma. Na próxima seção, descrevemos e analisamos os padrões de interação em torno da escrita na turma objeto da pesquisa.