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DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) À LEI 12.010/08/09: SUBSIDIANDO MUDANÇAS

A Vida em Abrigo: um estudo sobre práticas sócio-educativas entre educadores e crianças abrigadas

1.7 MEDIDAS LEGAIS RELATIVAS AO ABRIGAMENTO

1.8. DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) À LEI 12.010/08/09: SUBSIDIANDO MUDANÇAS

As benesses do Estatuto da Criança rapidamente se expandiram pelos estados brasileiros, uns com mais, outros com menos intensidade. Uma sucessão de mobilizações sociais, novas leis e portarias surgiram - de cunho federal, estadual e municipal – como também a criação e assentamento de órgãos públicos afiançados a distintas secretarias, entre elas, a da Educação, para atender aos direitos da criança e do adolescente.

Na impossibilidade de registrar todos esses movimentos sociais, centro-me principalmente os que ocorreram em São Paulo.

Após a criação da Secretaria do Menor do Estado de São Paulo, em junho de 1987, um acontecimento significativo mobilizou a sociedade civil: o SOS Criança. Este órgão funcionava por 24 horas ininterruptas, servindo como uma central de triagem e encaminhamento de situações que requeriam o abrigamento de crianças e adolescentes. Em sequência, as crianças eram encaminhadas para as ‘casas de retaguarda’, subsidiadas pela Secretaria do Menor e por instituições

conveniadas ou particulares. Oportuniza-se o surgimento e expansão de novas “Casa-lares”, “Abrigos-Casas”, famílias substitutas, embora com poucos subsídios financeiros por parte do Estado.

Em 1992, a FEBEM-SP foi incorporada à Secretaria do Menor do Estado, que, de certa forma, “assumiu o desafio de construir uma proposta educacional que de fato alterasse profundamente a modalidade de atendimento dos grandes complexos” (Maricondi, 1997, p.16). Cinco das unidades FEBEMs em todo o Estado acabaram por se transformar em mega complexos, abrigando mil, trezentos e oitenta (1.380) internos em cada uma das suas unidades somando-se a um número de seis mil e novecentos (6.900) em sua totalidade.

A Unidade Sampaio Viana era uma das menores – com a capacidade de quatrocentas e cinqüenta (450) crianças -, por se tratar de um centro de triagem e encaminhamento, ou local de transição, desde que as crianças recolhidas eram encaminhadas para outros locais.

Com a aprovação do ECA, a FUNABEM foi substituída pela Fundação Centro Brasileiro da Infância e da Adolescência – FCBIA -; mas esta foi extinta em janeiro de 1995, junto com a Fundação Legião Brasileira de Assistência – LBA. O Governo Federal cria, então, o ProgramaComunidade Solidária, voltado a assistir a população infanto-juvenil.

Aos poucos, procuraram-se restringir as ações das FEBEMs, caracterizadas por regime de internamento, no Estado de São Paulo. Devido a rebeliões ocorridas, denúncias de maus tratos, atos de violência ou torturas sofridas pelos internos e demais pessoas envolvidas no interior desses complexos, tais fatos culminaram na desativação gradativa de suas unidades. O Complexo do Tatuapé foi um dos primeiros a ser desativado seguido pelo complexo da Imigrantes.

Com a extinção gradativa das FEBEMs, crianças e adolescentes passaram a ser encaminhadas para “Casas de Convivência” - projeto elaborado pela Secretaria do “Menor” em parceria com instituições particulares conveniadas pelo Governo do Estado de São Paulo. Este Projeto é largamente discutido por

Maricondi, M.A. (1997), na obra de sua autoria Falando de Abrigo: cinco anos de experiência do Projeto Casas de Convivência.

Esse novo sistema estruturou-se em modelo familiar, que compreendia o acolhimento de crianças e adolescentes em casas inseridas na malha urbana. Sua primeira etapa de implementação ocorreu em outubro de 1992. A filosofia das Casas de Convivência buscou avançar para além do assistencialismo, voltando- se para a criação de condições mais favoráveis ao desenvolvimento de crianças e adolescentes. A instituição abriu-se à sociedade e a processos educativos mais amplos, reconhecendo o direito de seus abrigados ao convívio social, possibilitando que os meninos e meninas se utilizassem de recursos comunitários como escolas, bibliotecas públicas, centros culturais e esportivos, áreas de lazer, postos de saúde, além de serem atendidos por profissionais contratados advindos de diversas áreas.

O aparecimento e implementação do Programa de Casas de Convivência, segundo a autora acima citada, representou praticamente um período de transição do passado e das antigas FEBEMs às instituições de acolhimento de hoje.

A extinção dos ‘internatos’ arrastaram consigo o estigma de ‘fechar’, ‘isolar’, ‘engolfar’, ‘esconder’; nos moldes tradicionais, o abrigamento esteve atrelado aos conceitos de ‘orfanato’ ou ‘internato’ que, segundo a etimologia, significa:33

Internato: “Escola ou instituição de Assistência onde os alunos residem, fazem as refeições e recebem educação e instrução; pensionato” (p.776)

Internar: “Pôr ou colocar dentro; introduzir. Pôr em colégio, asilo, hospital. Meter-se; introduzir-se; entranhar-se; engolfar-se”.

Orfanato: “Orfandade. Asilo para órfãos. Fig. abandono, desamparo” (p.1005).

Órfão: que perdeu os pais ou um deles. Investigando sobre o termo ‘abrigo’, encontrei:

Abrigo: Lugar que abriga; refúgio, abrigadouro, cobertura, teto. Casa de assistência social onde se recolhem pobres, velhos, órfãos ou desamparados. Asilo, amparo, socorro, proteção” (p.12).

Apesar da clareza de princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – no que condiz às medidas de proteção -; e, de todas as definições e objetivos bem delimitados contidos em várias documentações que vêm surgindo nesses últimos anos, frutos de movimentos sociais significativos a favor da criança e do adolescente, poucos estudos haviam sido realizados no Estado de São Paulo. Estudos estes voltados para um melhor conhecimento, aprofundamento e análise critica desse tipo de atendimento: os serviços de acolhimento e medidas de proteção.

Se antes as medidas do Estado eram as de internamento, agora a intervenção estatal, em observância ao disposto no caput do art. 226 da Constituição Federal, “será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social da família natural, junto a qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada absoluta impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada” (Lei 12.010 de 29 de julho de 2009).

Por iniciativa da Associação dos Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – AASPTJ – e do Núcleo de estudos e Pesquisas da Criança e do Adolescente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – NECA -, foi realizado a pesquisa: ‘Por uma Política de abrigos em Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes na cidade de São Paulo’, com o objetivo de conhecer a realidade dos abrigos. Tal evento ocorreu em parceria com a Fundação Orsa e com a Secretaria de Assistência Social do Município de São Paulo. Por meio dessa pesquisa que culminou em um Seminário em agosto de 2004, foram identificados cento e noventa (190) abrigos na cidade e cento e oitenta e cinco (185) foram alvo de pesquisas. O número total de crianças nesses locais era de quatro mil, oitocentos e quarenta e sete (4.847), e foram consultados quatrocentos e onze (411) prontuários de crianças e adolescentes com a devida autorização judicial.

Neste mesmo ano de 2004 o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA -, sob a coordenadoria de Enid Rocha Silva (2004), realizou uma outra pesquisa sobre Abrigos no Território Nacional, com o objetivo de realização de um processo de reordenamento entre os quinhentos e oitenta e nove (589) abrigos identificados no Pais. Esses abrigos recebem benefícios da Rede de Serviços de Ação Continuada - Rede SAC –, subsidiada pelo Ministério de Desenvolvimento Social.

Dispondo o ECA sobre a criança e adolescente como sujeitos de direitos e responsabilidade do Estado, assegurou-lhes, indubitavelmente, o direito à Educação e Saúde. Trouxe, também, mudanças significativas, no sentido de unir e mobilizar diferentes Sistemas na realização de programas e projetos políticos pedagógicos voltados à Criança e Adolescente em caráter de prioridade absoluta. Cita-se, entre outros, o Sistema Educacional - SE (Secretarias), o Sistema Único de Saúde – SUS; Sistema de Garantia de Direitos e o Sistema Único de Assistência Social – SUAS -.

A Lei nº 12.010 de 20 de julho de 2009, que entrou em vigor a partir do dia 2 de novembro de 2009 (ver anexo II), dispondo sobre o aperfeiçoamento da sistemática na Lei nº 8.069 (ECA), reforça e redefine funções desses Sistemas,entre outras atribuições.