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CAPÍTULO 4 – DESCRIÇÃO DO PERCURSO DE PESQUISA: DA ORIGEM DA IDEIA à

4.2 Dos objetivos e justificativas à busca por respostas

De acordo com Rodriguez (2014, p. 148), a pesquisa deve partir da “análise crítica do produzido a respeito do objeto estudado, com base na própria experiência do pesquisador como sujeito histórico e social”. Ainda segunda a autora, esse primeiro momento proporciona aproximações de caráter teórico que apontam direções a percorrer no processo investigativo.

Nesse sentido, com o objetivo de descrever e analisar as percepções e os usos dos resultados das avaliações externas em larga escala pelas escolas de EF da RMEC e compreender suas relações com a política de AIP quanto às aproximações e/ou se distanciamentos dos princípios da responsabilização participativa, começamos a pesquisa pelo levantamento das produções relacionadas às avaliações externa em larga escala (ARCAS, 2009; RAVITCH, 2013; SCHNEIDER, 2013; MENEGÃO, 2016, dentre outras), bem como pela análise do ato normativo da política de AIP (RESOLUÇÃO 05/2008) e das teses que analisam a sua construção e implementação (BETINI, 2009; MENDES, 2011).

Com esse estudo, conhecemos um pouco mais sobre as repercussões das avaliações externas na organização do trabalho pedagógico e sobre a experiência de AIP na RMEC; o que nos possibilitou iniciar o “contato com o objeto e suas relações com o meio no qual está inserido” (RODRIGUEZ, 2014, p. 148).

A princípio, estabelecemos contato com os quatro membros da Assessoria de AIP, atuantes entre os anos de 2008 a 2014, uma vez que, além de auxiliar no processo de implementação da AIP e no trabalho realizado pelas CPAs, competia à assessoria coordenar e acompanhar a aplicação das avaliações externas em larga escala e, ainda, socializar os resultados com as escolas da rede103. Nesse momento, com o intuito de identificar as ações desenvolvidas e suas relações com a política de AIP, fizemos uso da entrevista semiestruturada. De acordo com Triviños (1987, p. 127), a entrevista semiestruturada é uma técnica que “parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que interessam à pesquisa” e, ainda, proporciona um “amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que recebem as respostas do informante”.

O roteiro de entrevista104 foi construído de forma a permitir a flexibilização da conversa e a lógica do encaminhamento das questões seguiu o princípio de estruturação em que as perguntas estão direcionadas “do mais geral para o mais específico, do menos delicado, menos pessoal, para o mais delicado, mais pessoal” (GÜNTHER, 2003, p. 13). Durante a entrevista, em alguns casos, os questionamentos elaborados foram adaptados ou, até mesmo, novas perguntas foram acrescentadas, de modo a contemplar os objetivos propostos para cada questão. Além das entrevistas, fizemos uso dos documentos, produzidos pela referida assessoria, que poderiam nos auxiliar no entendimento acerca das ações realizadas105.

Com a constituição do Núcleo de Avaliação, em abril de 2015, formado por duas CPs da RMEC, optamos por acompanhar as reuniões realizadas no período de desenvolvimento da pesquisa106 e entrevistamos uma das CPs para conhecer as novas ações efetuadas tanto quanto à política de AIP como em relação à avaliações externas em larga escala. Assim como nas demais entrevistas, após leitura e assinatura do Termo de Consentimento e Livre Esclarecimento (TCLE), o depoimento foi gravado seguindo o mesmo roteiro utilizado com os membros da assessoria anterior. As cinco entrevistas (integrantes da

103 As funções da Assessoria de AIP foram apresentadas em um evento interno da PMC, realizado em 30 de abril

de 2010. O material utilizado nesse evento nos foi fornecido pela referida assessoria em 2014.

104 O roteiro da entrevista consta no Anexo A.

105 Mais adiante, traremos detalhes sobre esses documentos. 106 Mais adiante, traremos outras informações sobre essas reuniões.

Assessoria de AIP e CP do Núcleo de Avaliação) foram transcritas na íntegra e submetidas à análise de conteúdo107 (BARDIN, 1977).

Na intenção de contemplar as múltiplas determinações implicadas à realidade concreta investigada, elaboramos um instrumento composto por itens na escala Likert, a partir das informações até então encontradas. Elegemos essa técnica, uma vez que procurávamos construir uma métrica sobre a percepção e a utilização dos resultados das avaliações externas pelas escolas de EF da RMEC e, posteriormente, significá-la segundo a realidade vivenciada pelas instituições, estabelecendo relações com a AIP108.

O referido instrumento109 foi destinado aos OPs e professores das escolas de EF da RMEC. Os primeiros foram selecionados por serem os articuladores da CPA (RESOLUÇÃO 05/2008) e por acompanharem os plano de ensino dos professores e os processos de avaliação discente (DECRETO 18.424/2014). Já os professores foram escolhidos uma vez que são responsáveis por avaliar e reorganizar periodicamente o trabalho pedagógico, bem como participar da AIP, com o objetivo de reavaliar e replanejar o seu trabalho a partir dos resultados obtidos (DECRETO 18.424/2014).

Inicialmente, entendemos que era preciso abarcar os professores dos 5os e 9os anos110 do ensino fundamental, períodos avaliados pela Prova Brasil, constituinte do Ideb que, de acordo com Sordi (2011), é a base regulatória externa utilizada pela política de AIP da rede campineira. No entanto, nas entrevistas com os membros da Assessoria de AIP, identificamos que os resultados da Provinha Brasil foram/são utilizados significativamente pela SME e pelas escolas no planejamento de suas ações. De acordo com uma das entrevistadas, a Provinha Brasil, por ser anual, é constantemente empregada como diagnóstico e fonte de informação para a avaliação da prática docente e, a partir de seus resultados, ações foram/são realizadas tanto pela assessoria como pelas unidades escolares111. Por conseguinte, elegemos os professores dos 2os, 5os e 9os anos do EF como sujeitos da pesquisa.

107 Ainda neste capítulo, abordaremos como esse procedimento foi realizado.

108 Entendemos que as escolas públicas, quando olham para os resultados obtidos nas avaliações externas,

potencializam a análise ao articular à realidade escolar. Nesse sentido, procuramos fazer um exercício semelhante qualificando as medidas obtidas no instrumento que construímos a partir do contexto de cada instituição acompanhada. Entendemos que a qualificação da medida, a partir da realidade de cada instituição, é um exercício semelhante ao que, em nosso entendimento, potencializa a análise das escolas públicas quando analisam seus resultados obtidos nas avaliações externas em larga escala.

109 Ainda neste capítulo, descreveremos o processo de construção desse instrumento aplicado aos OPs e

professores das 40 escolas de ensino fundamental existentes na RMEC.

110 No caso dos 9os anos, serão sujeitos deste estudo aqueles que ministram aulas de Língua Portuguesa e

Matemática, componentes curriculares avaliados pela Prova Brasil.

111 Segue o trecho da transcrição da entrevista a que nos referimos: A Provinha Brasil já é mais do nosso controle, né? Porque o MEC só manda a prova. A gente que aplica, a gente que constrói os resultados e divulga. [...] A gente contrata uma empresa para processar. [...] Aí a própria... a OP, o supervisor tem acesso

Dos 273 sujeitos que compõem nosso universo, entre OPs e professores, conseguimos a adesão de 195, o que corresponde a 71,43% do total. Os dados obtidos com a aplicação do instrumento foram processados por meio da Análise Fatorial Exploratória – como explicitaremos adiante – e nos possibilitou encontrar a relação entre os itens do instrumento, agrupando-os em seis dimensões. Cada uma delas traz uma medida acerca das percepções e dos usos das avaliações externas em larga escala na RMEC e para cada escola representada na pesquisa112.

Por conseguinte, para dar sentido e construir significado para as informações encontradas com a aplicação do instrumento que elaboramos (GATTI, 2012), de modo a qualificar a medida produzida, sentimos necessidade de estreitar o vínculo com os atores escolares. Considerando que “a maneira como os indivíduos manifestam sua vida reflete exatamente o que eles são” (MARX; ENGELS, 1998, p. 11), dedicamo-nos a compreender “os processos da vida real” e a “ação dos indivíduos” (MARX; ENGELS, 1998, p. 21), ao acompanharmos quatro escolas da RMEC, com as quais estivemos durante, aproximadamente, dez meses113. Nesse momento, procuramos compreender os movimentos de (auto)avaliação desenvolvidos.

Para tanto, além de observar seus tempos e espaços de trabalho coletivo (Trabalho Docente Coletivo - TDC, Conselho de Classe, CPA, Reunião de Planejamento e Avaliação Institucional - RPAI), fizemos a leitura dos documentos institucionais (PPP, atas do TDC e da CPA) e realizamos entrevista semiestruturada com os OPs e um professor do 2o, um do 5o e

um do 9o ano de cada escola selecionada, totalizando 18 entrevistas. Na análise dos documentos, buscamos descrever e condensar as informações encontradas (BARDIN, 1977; TRIVIÑOS, 1987) e, para as entrevistas, utilizamos os “procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”114 (BARDIN, 1977, p. 38, grifos do original).

A Figura 2 ilustra o caminho trilhado no desenvolvimento deste estudo. Nela constam, de modo resumido, as principais escolhas feitas a fim de contemplar os objetivos

aos dados de todas as escolas. [...] Isso aqui é para a escola analisar, ter a medida para analisar e planejar,

né? Suas aulas, tal. A gente acha que... a maior parte das escolas utiliza isso para planejamento e tal, bem tranquilo [...] E, assim, nós fomos visitaracho que assim em um ano 10 escolas, 12 escolas para discutir só o resultado da Provinha (Entrevista com a Assessora Elisabete – nome fictício, grifos nossos). No próximo

capítulo, traremos detalhes sobre essas informações.

112 Como explicaremos adiante, em algumas dessas escolas nem todos os professores responderam ao

instrumento.

113 Mais à frente apresentaremos os critérios adotados na seleção de tais escolas. 114 Ainda neste capítulo, especificaremos como a análise foi realizada.

propostos.

Figura 2 - Caminho trilhado para desenvolvimento do estudo

Fonte: elaborado pela pesquisadora.

No percurso de pesquisa apresentado, buscamos contemplar a técnica da triangulação na coleta de dados. Conforme explica Triviños (1987), a triangulação abrange “a máxima amplitude na descrição, explicação e compreensão do foco em estudo”, já que é “impossível conceber a existência isolada de um fenômeno social, sem raízes históricas, sem significados culturais e sem vinculações estreitas e essenciais com uma macrorrealidade social” (TRIVIÑOS, 1987, p. 138). Segundo o autor, tal técnica se constitui a partir dos seguintes elementos:

• Processos e produtos elaborados pelo pesquisador, averiguando as percepções dos sujeitos a partir de entrevistas e/ou questionários, bem como seus comportamentos e ações, encontradas através da observação livre ou dirigida (TRIVIÑOS, 1987). Em nosso estudo, tal aspecto relaciona-se ao instrumento que elaboramos, destinado aos OPs e professores dos 2os, 5os e 9os anos das 40 escolas de EF da RMEC. Refere-se, ainda, às entrevistas realizadas com os membros da Assessoria da AIP (quatro entrevistas), com uma das CPs do Núcleo de Avaliação (uma entrevista) e com os OPs e professores das escolas que acompanhamos (18 entrevistas); e à observação dos tempos e espaços coletivos das quatro escolas

Estudo teórico: avaliações externas e AIP na RMEC (teses e resoluções) Entrevista Assessoria de AIP e análise dos documentos produzidos Entrevista c/ CP do Núcleo de Avaliação e observação das reuniões realizadas Instrumento (construção de métrica) p/ OPs e profs. (2o, 5o, e 9o ano) da RMEC Seleção de 4 escolas da RMEC: observação, análise de documentos (PPP e atas) e entrevistas (OPs, profs. 2o, 5o e 9o ano)

selecionadas e das reuniões promovidas pelo Núcleo de Avaliação.

• Elementos produzidos pelo meio, representados por documentos, internos e externos, voltados à vida da instituição e sua comunidade. Instrumentos legais, como leis, decretos, pareceres, resoluções, regulamentos, regimentos, etc.; instrumentos oficiais, ou seja, diretrizes, propostas, memorandos, atas de reuniões, políticas de ação, históricos escolares, etc.; informações quantitativas sobre a escola ou sobre o sistema escolar; e fotografias (TRIVIÑOS, 1987). Quanto a esse elemento da triangulação, ao longo da pesquisa, fizemos uso dos instrumentos legais da RMEC (Projeto Avaliação Institucional Participativa: Uma Alternativa para a Educação Básica de Qualidade da Rede Municipal de Ensino de Campinas e Fundação Municipal para Educação Comunitária/2007; Resolução 05/2008, Avaliação Institucional Participativa e os Indicadores de Qualidade da Educação Fundamental/2014) e dos instrumentos internos e oficiais das escolas acompanhadas (PPP, atas das reuniões de TDC, CPA, RPAI).

• Processos e produtos originados pela estrutura socioeconômica e cultural do

macro organismo social no qual está inserido o sujeito, ou seja, “aos modos de produção (escravagismo, capitalismo, socialismo), às forças e relações de

produção, à propriedade dos meios de produção e às classes sociais (burguesia, média [pequena burguesia] — e operária)” (TRIVIÑOS, 1987, p. 139). O que significa, em outras palavras,

[…] desmistificar a suposta independência dos fenômenos e relacioná-los com o processo de produção material da vida social, significa [ainda] compreender que os dados empíricos são derivados de algo que atende a determinações históricas e sociais que foram constituídas através da práxis humana e que dela são produtos (PEREIRA, 2016, p. 45).

Nesse sentido, ao contemplarmos os achados proporcionados pelo percurso ora descrito, procuramos abarcar a escola e as avaliações que nela incidem em sua conjuntura, considerando que as relações que aí se estabelecem tem “suas raízes nas condições materiais de existência, em suas totalidades” (MARX, 2008, p. 49). Assim, buscamos relacionar os dados obtidos, o contexto das escolas e o movimento histórico da RMEC, sem perder de vista as políticas avaliativas de nível nacional que, como já mencionamos em capítulos anteriores, estão implicadas com as demandas do sistema produtivo.

Nas próximas seções, continuaremos a descrever o caminho desenvolvido ao longo desta pesquisa. Traremos informações sobre a construção e aplicação do instrumento, os critérios de seleção das escolas e o processamento dos dados.