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Apesar de a Educação Biocêntrica, inicialmente, não ter sido uma das referências teóricas desta tese, ela se fez presente como uma das referências teóricas da metodologia da Formação de Educadores para a Cidadania, do qual participei. Sendo assim, foi necessário o aprofundamento em seus princípios na busca pela compreensão da prática desenvolvida e como forma de complementar o relato da experiência vivida e sistematizada de docência e pesquisa.

Seus criadores foram Ruth Cavalcante e Cézar Wagner Góis, a partir da experiência prática de integração da Educação Dialógica, de Paulo Freire, do Pensamento Complexo, de Edgar Morin, e da proposta de Biodanza e do diálogo com seu criador Rolando Toro (2005a).

Para Toro, Biodanza é:

Sistema de integração humana, de renovação orgânica, de reeducação afetiva e de reaprendizagem das funções originais da vida. A sua metodologia consiste em induzir vivências integradoras por meio da música, do canto, do movimento e de situações de encontro em grupo. (TORO, 2005a, p. 33)

Toro complementa sua definição sobre Biodanza ao dizer que a concebeu como “a poética do encontro humano, como um modo diferente de se relacionar em um mundo extremamente solitário [...] busca o encontro, a alegria de olharmos a olhos contentes de se encontrarem” (TORO, 2010). Tem o objetivo também de mudança da estrutura de estilo de vida, por meio de um despertar de uma nova sensibilidade frente a vida, “cada pessoa deve chegar a ‘dançar sua vida’”. (TORO, 1991, p. 12) e de mudança social, rumo a uma transmutação de valores, ou seja, “os valores antivida devem ser substituídos por valores pró-vida” (TORO, 1991, p. 13).

De acordo com Cavalcante (2014), o princípio antropocêntrico da ciência que guiou grandes avanços, também permitiu ao ser humano se sentir poderoso o suficiente para destruir a natureza e o outro ser que considerava inferior. Ela cita o cientista chileno Rolando Toro Araneda, que fez outra proposta de um novo princípio: Princípio Biocêntrico, trazendo para o centro a vida como um todo, em todas as suas manifestações: a natureza como um todo, a água, o ar, os animais, o cosmos e o ser humano também, ou seja, tudo passa a ter um valor extremo e com a possibilidade extrema de celebrar a vida (CAVALCANTE, 2011a).

A partir dessa mudança de postura, de atitudes, Cavalcante (2014) propõe uma pergunta, antes de realizarmos qualquer ação em nossas vidas: O que eu estou fazendo neste momento está gerando vida? Rolando Toro, por meio de trabalho com o Princípio Biocêntrico, propôs a metodologia da Biodanza, que hoje já tem mais de 40 anos. De acordo com Cavalcante (2014), a Biodanza é “um sistema de desenvolvimento humano que através de vivências ontológicas, ou seja, de desenvolvimento do ser, pode ocorrer essa transformação e, em geral, ocorre”.

Para Toro (2005a), o Princípio Biocêntrico, sendo o elemento que estrutura a teoria da Biodanza, tem “referência imediata à vida” (TORO, 2005a, p. 50), “coloca seu interesse em um universo compreendido como um sistema vivo” e “é um ponto de partida para estruturar as novas percepções e as novas ciências do futuro relativas à existência: atribuição de prioridade ao ser vivo” (TORO, 2005a, p. 51).

Cavalcante comenta que percebeu que era possível gerar outras formas de aplicação desse princípio, o concebe como um grande rio com várias vertentes (CAVALCANTE, 2011a, s/p). A partir da experiência na área de Educação no Ceará, nos mais diferentes níveis – Educação infantil, Educação inclusiva, Educação de adultos e Educação popular – agregou o Princípio Biocêntrico a essas experiências educacionais, desde 1986. Cavalcante apresenta a Educação Biocêntrica como:

uma proposta pedagógica que busca, através do diálogo (Freire, Rogers) do movimento-dança e da Vivência Biocêntrica (Toro), facilitar um processo educativo voltado para uma vida mais saudável, assim como para a construção do conhecimento crítico e integrado com a realidade. Incorpora dimensões éticas e dialógicas, em uma visão na qual a pessoa é considerada como um ser inteiro, que pensa, sente, fala e age em cooperação com os outros (CAVALCANTE, 2006, p. 24).

A partir de suas experiências com a Educação Dialógica e Libertadora junto com Paulo Freire, propôs agregar metodologicamente e também conceitualmente a Educação Dialógica ao Princípio Biocêntrico, em busca de facilitar o diálogo entre as pessoas por meio dos círculos de cultura onde “a partir de um tema gerador as pessoas refletem sobre sua vida [...] sobre conteúdos teóricos, sobre possibilidades de ação” (CAVALCANTE, 2011a, s/p). Cavalcante também percebe os círculos de cultura como uma possibilidade para “fortalecimento dos vínculos e a conexão da teia de relações. É a vida sendo sacralizada através do diálogo amoroso” (CAVALCANTE, 2008, p. 99). Ao longo de sua experiência com este instrumento

metodológico, a autora comenta que foi criando outras formas de aplicação, mas sem comprometer suas origens.

Uma das dimensões sobre este instrumento metodológico, que Cavalcante destaca, é o diálogo vivo, ou seja, “o diálogo envolve a consciência, emergindo do pensamento, sentimentos e conclusões formuladas que dão suporte à cultura de um grupo ou forma de estar com cada um” (CAVALCANTE, 2008, p. 100), no qual as pessoas participantes “passam a atuar, sentir e pensar como sujeitos e permitir que outras pessoas que os rodeiam também sejam sujeitos críticos de sua própria história” (CAVALCANTE, 2008, p. 102).

Tanto na Biodanza quanto na Educação Biocêntrica, também se desenvolve o diálogo profundo chamado de intimidade verbal que:

exige o reconhecimento entre duas ou mais pessoas, exige uma postura de abertura para o mundo e para si mesmo, implicando troca, partilha, construção da relação mediada pela realidade. O diálogo também aparece como eixo central do processo de ensino-aprendizagem particularmente na Educação Biocêntrica que lida com a construção do conhecimento e o desenvolvimento da inteligência afetiva que segundo Toro ‘é a capacidade de resolver problemas da vida com a vida’. (CAVALCANTE, 2008, p. 101) Abrindo-se à linguagem poética, a força da palavra tem o seu espaço de cuidado, de atenção ao outro, de valorização de cada um que participa, seja na consigna que precedem e preparam um movimento-dança (vivência), no momento de intimidade verbal, ou mesmo nos círculos de cultura, ou seja, “a linguagem poética surge espontaneamente gerada pela e gerando intimidade envolvendo as pessoas no mistério do outro, estabelecendo um pacto com palavras simples, autênticas, diretas como uma extensão de vida na vida” (CAVALCANTE, 2008, p. 102-103).

Cavalcante conceitua a prática do círculo de cultura, baseada na proposta de Educação Libertadora de Paulo Freire, como o tempo e espaço onde ocorrem a conscientização da realidade e o processo de aprendizagem a partir “de uma nova- velha palavra (palavra geradora) ou assunto (tema gerador). É, portanto, um espaço de interação pessoal para a aprendizagem individual e coletiva, construindo-se a realidade problematizada através de um princípio democrático de participação” (CAVALCANTE, 2008, p. 104).

Ainda de acordo com Cavalcante (2008), o círculo é uma forma que não tem início nem fim, contribui para as ideias circularem, todos se veem, é um espaço para a expressão do ser de todos, de cada um que participa. É um espaço de fala qualificada e

de escuta ativa, onde podem ocorrer mudanças, por ser reflexivo e participativo. Ali, “o ser é reconhecido como individualidade dentro do coletivo” (CAVALCANTE, 2008, p. 105). Para tanto, é necessário um clima de confiança, respeito mútuo e descontração, até mesmo do silêncio participativo do outro. A cultura faz referência à “realidade pessoal de cada indivíduo, é o resultado do trabalho do homem/mulher, do seu esforço criador e recriador” (CAVALCANTE, 2008, p. 124).

No círculo de cultura, a palavra é um símbolo representativo do universo vocabular do grupo participante, elas são as sínteses do grupo sobre sua realidade. Para Cavalcante (2008, p. 106) são carregadas de “expressão sócio-político-cultural e emocional”. São geradoras de crescimento, de reflexão e de aprendizagem, trazem à tona situações significativas da vida coletiva, dão ênfase às emoções que estão contidas nelas, “traduzem o mundo vivido do educando. São palavras que multiplicam, porque estando plenas de sentido têm forte significação do ponto de vista da emocionalidade” (CAVALCANTE, 2008, p. 109).

A partir de sua experiência com Educação Biocêntrica, Cavalcante (2008, p. 114-118) enumera as variadas formas de realização do círculo de cultura com diferentes objetivos, por exemplo: (1) Encontros temáticos; (2) Circulo de qualificação do relato; (3) Roda concêntrica de diálogo; (4) Figuras temáticas (fotolinguagem); (5) Grupos Interativos; (6) Círculo de afirmação da palavra; (7) Palavra geradora elaborada pelo(a) facilitador(a); (8) Roda de história de vida; e (9) Aquecimento para expressão verbal.

Mais especificamente sobre o Pensamento Complexo de Edgar Morin, a autora Cavalcante comenta que esta perspectiva propõe uma reflexão mais aprofundada sobre a vida e a ideia da Transdisciplinaridade, ou seja, “nós não só juntamos todos os aspectos da vida e do pensamento humano, mas nós transitamos por esse pensamento, através do conceito de Transdisciplinaridade de Morin.” (CAVALCANTE, 2011a, s/p).

A Transdisciplinaridade foi mencionada pela primeira vez por Piaget como uma dimensão interna da forma como o pensamento se expressa no mundo e nas pessoas tendo como referência não apenas o intelecto, mas passando pela percepção e sensação. Uma maneira de ver, sentir, estudar e construir ciências.

Estar ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e principalmente além de qualquer disciplina. É o fim do pensamento que dividia as ciências (humanas, exatas, biológicas, e da informação) entre a objetividade e a subjetividade. É uma postura, uma

atitude do humano perante o conhecimento, o pensamento e o mundo. Abarca diversos âmbitos da aprendizagem e do desenvolvimento humano e social tanto na Educação formal, nos seus diversos níveis de escolaridade, quanto na Educação informal, nas organizações, comunidades e movimentos sociais.

A Transdisciplinaridade, por não ser uma matéria nem um método, faz um casamento perfeito com a Educação Biocêntrica, que tem como objetivo primordial desenvolver a Inteligência Afetiva que levará a pessoa a uma nova consciência com profundas conseqüências éticas que só se fazem possíveis com o fortalecimento da identidade. (CAVALCANTE, 2006, p. 15) Cavalcante (2014, s/p) explica que a Educação Biocêntrica não é uma novidade, mas é um “resgate da vida, como já deveria ter sido feita”. Sendo assim, sistematizaram o método da Educação Biocêntrica como: reflexivo, dialógico e vivencial. Complementa que:

Reflexivo, através do Pensamento Complexo de Edgar Morin. Dialógico, nessa troca amorosa, de reconhecimento da presença do outro, de reconhecimento do saber de cada um. E o vivencial do Rolando Toro, que tudo tem que dar um sentido à vida. Então, para nós, é a síntese do desenvolvimento e da aprendizagem da Educação Biocêntrica, ela tem que ser a apreensão do significado daquilo que eu estou aprendendo, tem que ser a construção desse sentido também. E também a aplicação do que foi aprendido [...].

Detalha que os espaços de aprendizagem não são somente os espaços formais, como escolas e universidades, mas sim “qualquer espaço social é espaço de aprendizagem” (CAVALCANTE, 2014, s/p), por exemplo, como o meio organizacional, nas instituições, nas organizações não governamentais (ONGs), nos movimentos sociais e nas comunidades.

Explica que o viés fundamental dessas propostas metodológicas é o desenvolvimento da inteligência afetiva, por meio dos vínculos (comigo mesmo, com o outro e com a totalidade) e da potencialização dos nossos sentimentos. Os vínculos são criados por meio dos rituais de vínculos e de aprendizagens, que são “momentos intensos, cheios de significados, profundos, que criamos através de uma ambiência de aprendizagem e de desenvolvimento” (CAVALCANTE, 2014, s/p). São maneiras de “voltar a ritualizar a vida, pois os vínculos se fortalecem através de vínculos”, que hoje se encontra tão mecanizada, na qual seguimos padrões que mecanizam a nossa forma de estar no mundo. E lança as seguintes reflexões: Como eu estou ritualizando a minha vida? Na minha relação a dois, o que é que eu faço para ritualizar a minha relação com os meus filhos? Com meu amado? Com a minha amada? Com o mundo que me envolve? Que rituais eu crio? Comenta que as tradições já tinham vários ritos, que as

expressões religiosas possuem e nos convida a termos rituais no nosso dia a dia (CAVALCANTE, 2011a, s/p).

A autora detalha que o estudo da inteligência vem sendo desenvolvido desde Pinet, Piaget, Goleman, Gardner, mas por meio da visão de Rolando Toro compreende que “se não temos uma base afetiva, nós nos tornamos ignorante de todos. Não adianta eu ter uma inteligência cognitiva privilegiada se eu não tenho uma base afetiva. [...] Então nós trabalhamos no desenvolvimento da inteligência afetiva, através do aprofundamento dos vínculos” (CAVALCANTE, 2011a, s/p). Segue explicando que não trabalhamos apenas com as emoções, mas sim com a relação afetiva, com o afeto, pois ele envolve compromisso com a própria vida, com a vida do outro, com a vida do planeta, com a vida do mundo como um todo.

Cavalcante comenta sobre a diferença entre inteligência emocional, de Goleman, e inteligência afetiva, de Toro:

[...] enquanto a primeira é um exercício para aprender a ter controle sobre as emoções e depende da percepção de cada um, a segunda vai na história vital, nas células, dando condições de perceber a relação com a vida [...] A nossa ação no mundo é impulsionada pela nossa necessidade de afeto, de carinho, de beleza, ligados à inteligência afetiva. [...] a Educação Biocêntrica pretende despertar a afetividade nas pessoas, ampliando sua percepção e expandindo sua consciência ética. [...] Desenvolver a inteligência afetiva vai no sentido do desdobramento de uma consciência afetiva. É o ponto de partida para a evolução integrada de todas as formas de inteligência. [...] Cria capacidade afetiva de estabelecer conexões com a vida, relaciona a identidade pessoal com a identidade do universo.” (CAVALCANTE, 2007, p. 59-63)

Cavalcante (2014) exemplifica os tipos de vínculo da seguinte maneira: (1) vínculo comigo mesmo: Por que eu faço essas escolhas na vida? Quem sou eu? Por que eu estou aqui?; (2) vínculo com o outro: desde aquele outro que eu escolho para fazer parte da minha vida, por exemplo, meu par, meus filhos, meus alunos, ou qualquer um outro; (3) vínculo com a totalidade: a totalidade pode ser representada pelo núcleo familiar, grupos de trabalho, sociedade com a qual nos comprometemos socialmente, o cosmos, o sagrado, o divino. Complementa com perguntas como: Em eue mundo eu estou? Que mundo é esse? Qual é o meu papel nesse mundo?, pois “eu sou um ser no mundo, que faço parte dele, mas eu sou um ser do mundo, que o transformo”, então, comenta que a Educação Biocêntrica tem um profundo compromisso com a transformação da realidade, que “hoje é tão antivida como a nossa” (CAVALCANTE, 2011a, s/p).

Por meio desse trabalho com os vínculos, Cavalcante (2014) compreende que “a Educação Biocêntrica leva à transformação de si mesmo, através de uma vivência ontológica, mas agregamos uma vivência epistemológica” entendida como “construção do conhecimento na própria vivência”, partindo da vivência à consciência (CAVALCANTE, 2006).

É uma forma de prática da inversão epistemológica proposta por Toro (2005a, p. 30), ou seja, na qual seguimos das vivências aos significados, “os exercícios são destinados primordialmente a induzir vivências e, somente depois, caberá à consciência registrar e denotar estados internos”, a partir da descrição das vivências pessoais.

Em minha compreensão, na Educação Biocêntrica, a construção de conhecimento parte da vivência de cada um, mas não termina nela. Necessariamente, abre espaços à reflexão e ao diálogo, em falas qualificadas e escutas ativas, também para a integração do conhecimento que cada um traz consigo e para o diálogo com as ideias de outros estudiosos, não no sentido de que eles estejam mais certos do que nós, participantes, mas no sentido de agregar outros saberes (científicos ou não), outras visões sobre os temas que estão sendo trabalhados.

A diferença entre a vivência na Biodanza (ontológica) e a vivência na proposta da Educação Biocêntrica (epistemológica) é detalhada por Cavalcante (2011a, s/p) da seguinte forma:

Na Biodanza eu não preciso saber porque eu estou dançando daquele jeito. A vivência, ela é em si [...] não precisa de explicações. Mas na Educação, não. Na Educação, eu preciso produzir conhecimento, eu preciso trabalhar com disciplinas determinadas. Como eu vou fazer isso só na vivência? Não tem condição. Então, eu me apoio na reflexão teórica de Edgar Morin para aprofundar esses aspectos da construção do conhecimento e da produção do conhecimento científico. [...] Por que Paulo Freire diz que não existem sábios absolutos e ignorantes absolutos. Existem saberes diferentes, então nós trocamos esses saberes. Todos nós.

Toro (2005b) defende que é muito importante o contexto teórico, o aporte da neurociência, por exemplo. Vê a teoria como “a chave mestra para entrar nos ambientes acadêmicos, porque esta linguagem é a que o sistema entende” (TORO, 2005b, p. 51). Além disso, percebe que há a abertura da ciência à dança, ao movimento, sempre que explicamos o que ocorre. Apesar de reconhecer a

importância da teoria como ‘infraestrutura’, ele enfatiza a prioridade à vivência corporal e emocional na Biodanza.

Cavalcante enfatiza a necessidade de se ter clareza das convergências metodológicas e das diferenças de caminhos entre Biodanza e Educação Biocêntrica. Explica que na Biodanza é necessário que se tenha, metodologicamente, um grupo estruturado, embora se possa trabalhar também em organizações e em outros espaços. Mas a compreensão, via Educação Biocêntrica, é que “todos os espaços sociais são espaços de aprendizagem e desenvolvimento. Então, isso pressupõe uma metodologia para esses espaços [...] de aprendizagem mais abertos”. Ela percebe a Biodanza como mediadora, porque usa conceitualmente o seu modelo teórico19 e parte de seus exercícios e músicas, mas os integra com outras abordagens afins, como a Educação Dialógica e o Pensamento Complexo. Comenta que, inspirada na linha da Criatividade da Biodanza e da abertura de Paulo Freire de (re)criação a partir de sua proposta metodológica, a Educação Biocêntrica recria vivências, recria o círculo de cultura, não no sentido de adaptação, mas de “adequação às necessidades de cada grupo onde nós trabalhamos” (CAVALCANTE, 2011b, s/p).

Como parte das estratégias metodológicas, além dos círculos de culturas e dos rituais de vínculos, também se trabalha com a história de vida das pessoas (CAVALCANTE, 2011a), ou seja, com o que a pessoa viveu, com o que ela traz. A proposta não é evidenciar particularmente a pessoa, mas “quando cada um de nós conta a sua própria história de vida, traz o contexto da história onde os fatos aconteceram, traz a visão de mundo daquela época, traz toda uma explicação temporal” (CAVALCANTE, 2011b, s/p).

Além da proposta de vivência de Rolando Toro, a Educação Biocêntrica tem outras propostas de vivências, que se baseiam também na “dança, no encontro humano e na vivência em si que vem disso”, por exemplo, a meditação, a visualização criativa, a arte-identidade. (CAVALCANTE, 2011a, s/p). Ela percebe que a principal contribuição da Educação Biocêntrica para a Educação é o conceito da corporeidade, ou seja, “nós temos um corpo que é a nossa presença no mundo. A nossa identidade se expressa também pela nossa corporeidade. Então meu corpo expressa toda a minha história de vida.” (CAVALCANTE, 2011a, s/p).

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Saberes teóricos da Biodanza

Em seguida, serão abordados alguns saberes teóricos da Biodanza, conforme sistematizados por Rolando Toro (1991; 2005a). Aqui não pretendo realizar um aprofundamento teórico exaustivo, apenas abordarei os pontos que me auxiliaram na compreensão de alguns elementos citados nos saberes teóricos da Educação Biocêntrica, conforme apresentados anteriormente.

Modelo teórico da Biodanza

A partir da compreensão de que, por meio de um modelo científico, ou seja, uma “imagem construída pelo investigador para operar sobre um sistema da realidade (TORO, 1991, p. 168), mantendo uma “firme coerência com ela” (TORO, 1991, p. 171), também “permite, portanto, descobrir relações novas e formular interrogações que jamais poderíamos fazer se só observássemos os fatos” (TORO, 1991, p. 168). A simples vista, então Toro propõe um modelo teórico da Biodanza. Para ele, é “um modelo do ‘homem cósmico’. Aborda o ser humano em sua dimensão biológica, psicológica e, justamente, cósmica. ‘A questão sobre o ser’ pode, assim, obter resposta apenas dentro de uma visão do homem como ‘ser no mundo’, ou seja, como criatura cósmica. O modelo teórico não considera o indivíduo isolado, mas, sim, em completa conexão com o ‘todo’” (TORO, 2005a, p. 72).

Em entrevista, realizada em 2005, Toro (2005a) comenta que a Biodanza, seu modelo teórico, se apoia em ciências tradicionais acadêmicas como Psicologia, Antropologia, Fisiologia, Etologia, que são ciências do homem e “não são criações imaginárias e mágicas”, apesar de ele achar que as ciências, ditas, alternativas podem fazer bem. A Biodanza inclui o corpo nos processos de transformação e de conhecimento.

Esse modelo “se articula ao longo de dois eixos colocados dentro de uma espiral”. Essa espiral “representa a abertura do modelo aos processos universais de gestação da vida” (TORO, 2005a, p. 74). O eixo vertical é o eixo estável, que parte do potencial genético, localizado no polo inferior vertical, em busca da integração. No eixo horizontal se encontra o continuum identidade-regressão, que é pulsante. Compreende que a integração e o desenvolvimento evolutivo ocorrem na “medida

em que os potenciais genéticos encontram opções para se expressar através da existência” (TORO, 1991a, p. 174).

Sendo assim, ele reagrupou essas potencialidades em cinco grandes grupos que denominou “linhas de vivência”, ou seja, “se desenvolvem em uma espiral em torno do eixo vertical do modelo, e suas interações formam uma trama por meio da qual se expressa o potencial genético (2005a, p. 74)”, que são como “canais por onde fluem os