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Como fez parte da reconstrução da matriz pedagógica-pesquisadora, a partir da vivência em um projeto real transdisciplinar e do estudo aprofundado das teorias da Complexidade e da Transdisciplinaridade, compreendo que tanto a metodologia de formação e de pesquisa quanto as aprendizagens voltadas à docência e à pesquisa foram elaboradas a partir da reflexão e do conhecimento (SCHÖN, 1995; 2000) sobre as ações de docência e de pesquisa vividas.

De acordo com o autor Donald Schön (1995; 2000), o processo de reflexão- na-ação não exige palavras, pois ocorre enquanto realizamos a ação em si, ao estarmos atentos ao que fazemos, ou ao que o outro faz, ao refletirmos sobre esse fato e procurar entender o que aconteceu. A partir dessa reflexão, reformulamos o problema, suscitado pela situação, e depois realizamos novas ações e experiências para testarmos os resultados dessas novas ideias. Raramente os momentos reflexão-na-ação são tão claros, um em relação ao outro, como a descrição possa sugerir. Uma característica importante da reflexão-na-ação é a sua “imediata significação para a ação” (SCHÖN, 2000, p. 34), ou seja,

[...] podemos refletir no meio da ação, sem interrompê-la. Em um presente- da-ação, um período de tempo variável com o contexto durante o qual ainda se pode interferir na situação em desenvolvimento, nosso pensar serve para dar uma nova forma ao que estamos fazendo, enquanto ainda fazemos. Eu diria, em casos como este, que refletimos-na-ação. (SCHÖN, 2000, p. 32) Apesar da distinção dos processos de reflexão-na-ação e conhecer-na-ação poder parecer sutil e os dois podem ser desenvolvidos sem que precisemos dizer o que estamos fazendo. O autor define como conhecer-na-ação os “tipos de conhecimento que revelamos em nossas ações inteligentes” (SCHÖN, 2000, p. 31) – nas quais são contínuas ações de ajustes, de detecção e correção de erros –, em situações de performances físicas, como andar de bicicleta, e de operações privadas, como a análise instantânea de uma folha de balanço. Revelamos o ato de conhecer na ação, na “execução capacitada e espontânea da performance” (SCHÖN, 2000, p. 31), mas somos incapazes de, neste tipo de atividade complexa, torná-la verbalmente explícita.

Claro que podemos, por meio da observação e da reflexão sobre as nossas ações, fazer “uma descrição do saber tácito que está implícito nelas” (SCHÖN, 2000, p. 31). Mesmo assim, “nossas descrições do ato de conhecer-na-ação são sempre construções” (SCHÖN, 2000, p. 31 – grifos do autor), pois o processo de conhecer- na-ação é dinâmico e nossas descrições, construções teóricas, fatos, procedimentos são estáticos. Sendo assim, “conhecer sugere a qualidade dinâmica de conhecer- na-ação, a qual, quando descrevemos, convertemos em conhecimento-na-ação” (SCHÖN, 2000, p. 32 – grifos do autor).

Já o processo de refletir sobre a ação ou sobre o processo de reflexão-na-ação já é uma ação, uma observação, uma descrição e, por isso, exige o uso de palavras (SCHÖN, 1995). Esse processo de refletir sobre a reflexão-na-ação anterior dá início a um diálogo de pensar e perceber como posso fazer para ser um profissional mais habilidoso, por exemplo (SCHÖN, 2000). No caso da relação de ensino e de aprendizagem, essa prática reflexiva implica um tipo de aprender que envolve diálogo de palavras e de desempenho entre professores e alunos (SCHÖN, 1995).

O autor ressalta ainda que para o desenvolvimento dessa prática reflexiva é importante que haja espaço e seja integrado ao contexto institucional, no caso de uma escola, como o autor comenta (SCHÖN, 1995), e eu acrescento que esta abertura e integração devam acontecer na universidade também, seja na graduação

quanto na pós-graduação. Nesse sentido, percebo esse tipo de abertura na pós- graduação em nível de doutorado.

Entretanto, autores como Selma Pimenta e Evandro Ghedin (2012) tecem considerações e alertas sobre às restrições em relação a esse conceito de professor reflexivo devido às limitadas condições de trabalho dos professores nas escolas. Comentam que o problema não é da perspectiva teórica em si e compreendem como positivo que se invista na formação de professores e profissionais que sejam capazes de produzir conhecimentos, de participar de decisões e de “compreender e analisar as práticas educativas, situadas em contextos, coloca os professores e as escolas em condições de apontar (sic) perspectivas de superação dos problemas” (PIMENTA; GHEDIN, 2012, p. 8). Além conforme conclui Pimenta (2012) devemos valorizar a profissão docente, os saberes dos professores e o trabalho coletivo e compreender que o professor pode ser pesquisador da própria prática.

Porém, destacam a realidade dos professores e das escolas nas quais se tornam um exercício desumano exigir que professores e profissionais da Educação sejam obrigatoriamente profissionais reflexivos, atribuindo a eles a responsabilidade de criação de soluções para os problemas da Educação Brasileira. De maneira sintética, fruto das pesquisas realizadas pelos autores e seus grupos de pesquisa, descrevem a seguinte realidade:

Sem dúvida a precariedade com que certos governos insistem em manter os professores e as escolas, com baixos salários, obrigando-os a exercer atividades em várias escolas, com turmas numerosas, premindo as escolas a realizar aprovações automáticas, com indicadores de ensino que falseiam a realidade para avaliadores externos, atrelando alguma promoção dos professores aos resultados dos seus alunos nessas avaliações, trabalham na contramão de qualquer valorização dos professores como intelectuais críticos e reflexivos e qualquer condição de trabalho coletivo. (PIMENTA; GHEDIN, 2012, p. 8)

Pimenta destaca algumas críticas quanto à perspectiva do profissional reflexivo, fruto de pesquisas empíricas realizadas, como por exemplo: “o individualismo da reflexão, a ausência de critérios externos potenciadores de uma reflexão crítica, a excessiva (e mesmo exclusiva) ênfase nas práticas, a inviabilidade da investigação nos espaços escolares e a restrição desta neste contexto” (PIMENTA, 2012, p. 51). Além das críticas, a autora aponta algumas possibilidades de superação desses limites identificados, das quais destaco: (1) passar da dimensão individual da reflexão para o seu caráter público e ético; (2) construção de conhecimento pelos

professores da análise crítica teórica das suas práticas e da ressignificação das teorias a partir das práticas; (3) a realização da pesquisa no espaço escolar, com o desenvolvimento de uma cultura escolar de problematização das práticas em diálogo com pesquisadores da universidade; (3) desenvolvimento profissional ser fruto da combinação entre formação inicial, exercício profissional e formação continuada.