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Efeito de moduladores do GSH na citotoxicidade da GA

+ Homogeneização Absorvância λ = 595 nm

4.2. Efeito de moduladores do GSH na citotoxicidade da GA

Neste trabalho, foram usadas duas abordagens para a modulação do status de GSH. Em primeiro lugar, foi estudado o efeito da deplecção de GSH endógeno por utilização do BSO, um inibidor efectivo da síntese de GSH, precedido pela avaliação do efeito de GSH exógeno adicionado ao meio de cultura. Enquanto o pré-tratamento das células com BSO efectivamente reduz o teor endógeno de GSH (Dethmers and Meister, 1981), o co-tratamento com xenobiótico e GSH resulta num efeito essencialmente extracelular, uma vez que este composto não entra facilmente nas células (Meister, 1988; Halliwell and Whiteman, 2004).

4.2.1. Efeito da deplecção de glutationo

O BSO inibe o primeiro passo da síntese do glutationo, mais precisamente inibe selectivamente a γ-glutamilcisteina sintetase (GCS) (Griffith and Meister, 1979), cuja função é ligar o ácido glutâmico à cisteína durante a formação do tripéptido (glutationo), inibindo assim a síntese de GSH. A função do BSO nos estudos toxicológicos mecanísticos é o de exacerbar a toxicidade, sempre que o GSH tiver um papel activo no mecanismo de acção tóxica do composto.

No protocolo experimental adoptado, as células MCF10A foram incubadas com 100 µM de BSO por um período que corresponde aproximadamente à duração de um ciclo celular (24h). Esta concentração de BSO provou deplectar o GSH em células de mamíferos (Oliveira et al., 2009). Outros autores, utilizando concentrações ainda menores de BSO (25 µM), também referiram reduções marcantes nos níveis de GSH numa linha celular tumoral de mama (MCF7) (Mans et al., 1992). No presente trabalho, o inibidor referido, na concentração de 100 µM, apresentou uma viabilidade celular na

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ordem dos controlos negativos (~ 97%), mostrando uma citotoxicidade negligenciável para esta concentração.

Adicionalmente, observou-se que a viabilidade celular apresentada para a concentração de GA de 1 mM, na ordem dos 62% face aos controlos, foi marcadamente reduzida pelo pré-tratamento de 24h com BSO, para valores de cerca de 11% (Figura 10), sendo este decréscimo significativo (Ρ<0,001).

Figura 10. Efeito do BSO (100 µM; pré-tratamento de 24h) na potenciação do efeito citotóxico da glicidamida (GA 1 mM; 24h de incubação), medido através do decréscimo da viabilidade celular de células MCF10A. Os resultados apresentados correspondem à média aritmética ± desvio padrão de três experiências independentes (n=3) (∗∗∗Ρ<0,001 quando comparado com células tratadas com GA na ausência de BSO).

Vários estudos têm demonstrado o potencial de sensibilização resultante da deplecção de GSH para a toxicidade dos agentes físicos e químicos (Shan et al., 1990). No que se refere particularmente à AA ou GA, existem poucos trabalhos focando a sua toxicidade em culturas de células empobrecidas de GSH. Park et al. (2002) relataram um aumento da transformação morfológica das células de embrião de hamster sírio induzido pela AA na presença de BSO. Recentemente, outros autores descreveram um aumento da citotoxicidade da AA em células HepG2 (Jiang et al., 2007) e células V79 (Oliveira et al., 2009) pré-tratadas com BSO, de uma forma dose-dependente. Mais ainda, Oliveira et al. (2009) referem que a deplecção de GSH por intermédio de BSO reforça as lesões do DNA nas células V79, em particular, reflectindo-se num aumento

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da frequência de células aberrantes. Um estudo anterior já tinha mostrado que a destoxificação por GSH não era apenas importante para a AA, mas parecia desempenhar algum papel na genotoxicidade da GA nas mesmas células (Puppel et al., 2005).

Os resultados do presente estudo mostraram que a deplecção de GSH diminui significativamente a viabilidade das células tratadas com GA, apoiando o papel de GSH endógeno na mitigação dos efeitos tóxicos provocados por este agente. O facto de existir um aumento da toxicidade da GA nas células pré-tratadas com BSO significa que, de algum modo, o GSH intracelular é crítico para a toxicidade da GA.

O GSH está presente nas células de mamíferos em concentrações na ordem do milimolar (0,1-10 mM) (Meister, 1988). As células MCF10A estão descritas como contendo níveis de GSH na ordem dos 13,1 a 35,3 nmol/106 células (Reiners Jrª et al., 2000). Este composto desempenha vários papéis cruciais, incluindo entre outros, os de conjugação de compostos electrofílicos e desintoxicação de produtos gerados pelo stress oxidativo (Wu et al., 2004). Ambas as funções de GSH podem realmente ser importantes para a mitigação da toxicidade da AA num cenário de exposição in vivo. De facto, além da possibilidade de a AA ser indutora de stress oxidativo (Jiang et al., 2007; Zhang et al., 2009), este composto é eficientemente conjugado com o glutationo reduzido (GSH) (Friedman, 2003; Besaratinia and Pfeifer, 2007).

Em termos de literatura publicada, a importância do GSH na acção tóxica da AA e GA está de alguma forma fundamentada. Ambos os compostos induziram uma deplecção de GSH, dependente da concentração e do tempo de incubação, em hepatócitos isolados de rato (Kurebayashi and Ohno, 2006) e a AA em HepG2 (Zhang

et al., 2009). No entanto, a GA reduziu 1,5 vezes mais rapidamente o conteúdo celular

de GSH nos hepatócitos do que a AA. Além disso, a deplecção de GSH foi associada com a sua maior toxicidade em relação à AA (Kurebayashi and Ohno, 2006). O que não está claro é se é a via de conjugação com GSH ou a via de stress oxidativo a interveniente na diminuição dos níveis de GSH, principalmente para o caso da GA.

4.2.2. Efeito da incubação com glutationo

Está descrito que geralmente um período de incubação com GSH pode levar apenas a aumentos discretos nos níveis de GSH intracelulares (Meister, 1988) e, portanto, este

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protocolo pode fornecer informações adicionais sobre os possíveis efeitos protectores extracelulares do GSH.

No presente estudo, o GSH foi utilizado na concentração de 1 mM e 3 mM, de acordo com os dados bibliográficos (Oliveira et al., 2009). De facto, essas concentrações mostraram conferir protecção em células V79 expostas à AA, nomeadamente 1 mM na citotoxicidade e 3 mM na indução de aberrações cromossómicas.

Nas células MCF10A os resultados relativos ao efeito protector de GSH adicionado exogenamente são apresentados na Figura 11. O GSH na concentração 1 mM diminuiu apenas ligeiramente a viabilidade das células MCF10A (~6%;·Ρ<0,05), mantendo-se na ordem de grandeza dos controlos negativos (Figura 11). No entanto, a concentração de 3 mM de GSH mostrou apresentar uma citotoxicidade maior e portanto não foi testada com a GA (dados não apresentados).

Através da análise da Figura 11 é possível verificar que ocorre um aumento da viabilidade celular entre as células que apenas estiveram expostas à GA e aquelas em que houve exposição concomitante de GA e GSH. No entanto, este efeito protector apenas teve significado estatístico para a concentração de GA mais elevada (GA 3 mM; Ρ<0,05), onde ocorreu um aumento da viabilidade celular da GA de cerca de 12% em termos absolutos. Globalmente, a presença extracelular de GSH pareceu reduzir ligeiramente o efeito citotóxico da GA, embora este apenas seja importante para a concentração mais elevada de GA em solução.

Como referido anteriormente, na abordagem seguida os níveis de GSH foram aumentados essencialmente a nível extracelular e não intracelular. De qualquer forma, era expectável que a quantidade de GA disponível para lesão tóxica diminuisse, caso ocorresse conjugação extracelular com o GSH, diminuindo assim a toxicidade da GA.

Oliveira et al. (2009) demonstraram recentemente num conjunto de experiências in

vitro na ausência de sistemas celulares, que a conjugação espontânea, não enzimática,

da AA com GSH é favorecida quando a concentração de AA é superior à concentração de GSH e é claramente dependente do tempo de incubação. Além disso, estes mesmos autores mostraram que o GSH adicionado exogenamente a células V79 pode efectivamente reduzir a citotoxicidade e a indução de aberrações cromossómicas do agente AA (Oliveira et al., 2009). Os mesmos autores possuem resultados não publicados da conjugação espontânea (in vitro) para a GA, observando-se que esta em comparação com a AA possui uma conjugação não enzimática com o GSH mais fraca.

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Figura 11. Efeito do GSH (1 mM; co-incubação de 24h) na diminuição do efeito citotóxico da

glicidamida, medido através do aumento da viabilidade celular de células MCF10A. Os resultados apresentados correspondem à média aritmética ± desvio padrão de pelo menos cinco experiências independentes (# Ρ<0,05 quando comparado com o controlo de células não expostas;∗·Ρ<0,05 quando comparado com células expostas à mesma concentração de GA na ausência de GSH).

Um estudo de procura de respostas transcricionais específicas da GA, tendo como alvo uma linhagem tumoral de mama humana (MCF7) reportou que as mudanças resultantes do tratamento com a GA se caracterizam pela indução de enzimas dos sistemas de destoxificação, vários membros do sistema do glutationo e factores antioxidantes (Clement et al., 2007). Considerando que vários factores envolvidos no sistema de GSH tinham sido induzidos, os mesmos autores testaram a consequência da GA nos níveis de GSH intracelular, descobrindo que o GSH das células MCF7 tinha sido parcialmente reduzido depois de 24h de incubação com 1 µM de GA. Para as concentrações superiores, os níveis normais de GSH foram gradualmente reconstituídos e após uma exposição a 1 mM os níveis de GSH verificaram-se mais elevados que os controlos.

Perante o efeito citoprotector do GSH nas células mamárias para a GA, a questão a que falta responder é qual ou quais das suas funções terá maior contribuição nesse mesmo efeito protector. Efectivamente, o GSH conjuga extracelularmente com a GA, mas, também é um importante antioxidante celular que funciona como um regulador bem estabelecido do estado redox intracelular, desempenhando um papel importante na protecção contra lesões por oxidantes e electrófilos reactivos em vários tecidos e linhas

# ## # * 0 20 40 60 80 100 120 Controlo GA 1mM GA 2mM GA 3mM V ia bi li da de C el ul ar ( % ) sem GSH 1mM com GSH 1mM

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celulares (Shan et al., 1990). Apesar de ter sido observada deplecção de GSH no caso da AA em associação com níveis elevados de 8-OHdG e concomitantemente com o aumento dos níveis intracelulares de ROS em células HepG2 (Zhang et al., 2009), a falta de informação de induções semelhantes no caso da GA, torna preponderante a investigação do possível envolvimento de um mecanismo de stress oxidatido para o metabolito principal da AA.