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1.5. Acrilamida como provável cancerígeno humano

1.5.1.3. Ensaios citogenéticos

Em células de mamífero in vitro, a AA induziu trocas entre cromátides-irmãs (SCE) e aberrações cromossómicas (CAs) estruturais, bem como poliploidia e aneuploidia, em células de hamster chinês V79 em concentrações na faixa do milimolar (Tsuda et al., 1993; Martins et al., 2007). In vivo, as alterações cromossómicas foram igualmente reportadas com testes positivos em células da medula óssea de ratinho, mas negativos em espermatogónias (Adler et al., 1988).

A exposição in vitro à AA também mostrou ser clastogénica no ensaio do micronúcleo (MN) e apresentou quebras do DNA (ensaio do cometa) em células de hepatoma humano G2 (HepG2) com concentrações ≥ a 0,625 mM de AA (Jiang et al., 2007). No entanto, as induções significativas de MN apenas foram encontradas para concentrações de AA > 5 mM e > 10 mM em células de sangue humano (Baum et al., 2005) e em células linfoblastóides humanas TK6 (Koyama et al., 2006), respectivamente. Outros autores também verificaram a indução de lesões do DNA de células V79 e células epiteliais intestinais humanas (Caco-2) para concentrações de AA de 6 mM, concomitantemente com a ausência de quebras no DNA em hepotócitos primários de rato (Puppel et al., 2005).

Recentemente, um estudo in vitro (Hansen et al., 2010) mostrou que a GA em concentrações na ordem dos milimolares, ao contrário da AA, induziu níveis significativos de lesões do DNA (quebras e sítios álcali-lábeis) em células testiculares de ratinho e em linfócitos do sangue periférico de ratinho e humanos. Do mesmo modo, outros estudos in vitro de comparação da genotoxicidade da AA e GA, nas mesmas condições experimentais, sugeriram que a GA é cerca de duas vezes mais clastogénica que a AA na indução de CAs e claramente mais citotóxica (Martins et al., 2007). O metabolito reactivo induziu resultados significativos de células micronucleadas com concentrações ≥ 0,5 mM em células linfoblastóides humanas TK6 (Koyama et al., 2006) e com concentrações superiores a 1 mM em células de sangue humano (Baum et

al., 2005), indicando uma acção clastogénica da GA em doses 5 a 20 vezes mais baixas

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maior potencial mutagénico da GA em relação à AA, não só por aumentos significativos de lesões do DNA em doses mais baixas como também pela obtenção de resultados positivos em todos os sistemas de linhas celulares testados (Puppel et al., 2005; Koyama et al., 2006; Hansen et al., 2010).

Da mesma forma, as avaliações da lesão cromossómica em roedores expostos à AA e à GA têm classificado o metabolito como o factor genotóxico preponderante da AA (Paulsson et al., 2003). Vários estudos observaram aumentos de células micronucleadas no sangue periférico (Cao et al., 1993; Paulsson et al., 2002; Manjanatha et al., 2006) e na medula óssea de ratinhos (Adler et al., 1988) mas não em ratos (Paulsson et al., 2002; Mei et al., 2010), quando administrados com AA. Um estudo com roedores expostos a GA demonstrou um aumento dose-dependente de micronúcleos em células de ratinho (Paulsson et al., 2003). Segundo os autores, as diferenças de genotoxicidade nos estudos realizados entre as espécies de roedores pode estar directamente relacionada com o maior metabolismo da AA em GA no ratinho (Sumner et al., 1997). Contudo, o resultado principal deste estudo foi a constatação de que a exposição a GA induziu uma frequência de micronúcleos no ratinho por unidade de dose de GA in vivo muito semelhante à obtida num estudo prévio (Paulsson et al., 2002), no qual os animais foram tratados com AA (GA como metabolito). Esta igualdade de potência da GA, de que a dose in vivo é estabelecida quer pela injecção de GA, quer pela GA produzida pelo metabolismo da AA, suporta a ideia de que a GA é predominantemente o factor genotóxico da AA.

Adicionalmente, estudos com ratinhos CYP2E1 (-/-) também fornecem fortes evidências acerca do papel da GA na genotoxicidade da AA em células germinativas (Ghanayem et al., 2005b) e em células somáticas (Ghanayem et al., 2005c). Aumentos significativos relacionados com a dose de AA em eritrócitos micronucleados e lesões no DNA de células somáticas (fígado, pulmão) foram induzidos em ratos do tipo selvagem, mas não nos ratos CYP2E1 (-/-) (Ghanayem et al., 2005c). Consistentemente, em células germinativas masculinas foram observados aumentos de mutações letais dominantes no conteúdo uterino de fêmeas acasaladas com machos tratados com AA do tipo selvagem, mas não com machos CYP2E1 (-/-). Claramente, a lesão genética em células somáticas e germinativas dos ratinhos tratados com AA foi dependente da metabolização desta pelo CYP2E1 a GA (Ghanayem et al., 2005b; Ghanayem et al., 2005c).

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Evidências de lesão e reparação de DNA induzidas pela AA foram encontradas em

Bacillus subtilis (Tsuda et al., 1993) e síntese de DNA não programada (UDS) em

espermátides de ratos in vivo e in vitro (Butterworth et al., 1992). No entanto, este composto não produziu ou produziu apenas ligeiros aumentos, respectivamente, na UDS em hepatócitos de rato e em células epiteliais mamárias humanas (HMEC). Em contraste, a GA induziu uma forte resposta de UDS nas mesmas células. A indução de reparação de DNA pela GA não só confirmou o potencial genotóxico deste metabolito como sugeriu as células mamárias como um alvo para a actividade deste composto cancerígeno nos seres humanos (Butterworth et al., 1992). Recentemente, foi também sugerida uma maior susceptibilidade dos linfócitos humanos para lesões do DNA induzidas pela GA, em comparação com dois outros tipos de células de ratinho (Hansen

et al., 2010).

No geral, nos ensaios de citogenética ambas AA e GA têm demonstrado ser clastogénicas, mas o metabolito reactivo mostrou conter um maior potencial de indução de CAs, células micronucleadas e indução de quebras no DNA (Butterworth et al., 1992; Koyama et al., 2006; Martins et al., 2007). Um dos pontos que falta elucidar é se a clastogenicidade verificada está directamente relacionada com a interacção entre estes compostos e o DNA. Como referido anteriormente, a AA per se possui uma baixa reactividade com o DNA in vitro, mas após metabolização foram observados vários aductos específicos de DNA com base na GA (Besaratinia and Pfeifer, 2007).