• Nenhum resultado encontrado

ELEMENTOS DO CALÇADO E RELAÇÃO COM OS PÉS

No documento Ebook Design novos horizontes (páginas 78-86)

O calçado é um produto que faz interface com o pé humano, por- tanto, seu desenvolvimento deve ser baseado a partir de parâmetros anatômicos, antropométricos e biomecânicos das extremidades infe- riores. Além destes três aspectos, o design do modelo contribui bas- tante para a completa satisfação do usuário.

Para a confecção adequada de um calçado é necessário desen- volver uma fôrma podal a partir dos parâmetros ergonômicos.

A fôrma do calçado é a réplica do pé humano. De acordo com Ventura, et al. (2011) ela auxilia no dimensionamento das peças que compõem o calçado, serve de base para montagem e acabamento do calçado e determina o formato do calçado.

Para o desenvolvimento da fôrma correta é imprescindível a reali- zação da antropometria (medidas dos pés como comprimento, largura e circunferências das articulações). No entanto, as medidas precisam

neste sentido foram realizadas por pesquisadores (CHAMBERS, et al., 2011; MENIN, et al., 2009; MANFIO, 1995; LACERDA, et al., 1984). De acordo com Chambers, et al. (2011), a idade, a obesidade e o gênero podem ter um impacto significativo na antropometria principalmente nas pessoas com 65 anos ou mais.

Ventura, et al. (2011), explana a possibilidade de uma pessoa ter a circunferência idêntica a de outra pessoa, porém, ter o formato dife- rente, portanto, apesar das medidas serem iguais, um pé terá um calce melhor que outro. O critério para aprovação de uma fôrma deve ser o calce (relação entre anatomia e antropometria), e não somente medidas antropométricas.

De acordo com os autores supracitados, uma fôrma de calçados tem a função de proporcionar a conformação e o alinhamento dos materiais, servindo de base para o dimensionamento e montagem das peças do mesmo. Segundo Schimidt (2007), para oferecer um calce adequado, todos os modelos de calçado devem respeitar alguns pontos importantes. Estes fundamentos, orientações são apresentados através de uma metodologia denominada Linhas Básicas. O desenvolvimento da fôrma é imprescindível para o pla- nejamento e a confecção dos demais elementos do calçado. Para uma boa compreensão no processo de modelagem e confecção do calçado é importante conhecer as partes que compõem o calçado. Neste trabalho será explanada a classificação das partes do calçado elaborada por Vargas (2011):

• Cabedal (ou corte): Parte superior do calçado que pode ser dividida em gáspea, como a parte frontal, lateral e de traseira. • Couraça (testeira): Elemento disposto entre o forro e a gáspea.

Este é responsável por dar forma ao calçado, além de manter o formato durante o uso.

• Contraforte: Item que se encontra entre o forro e o avesso do cabedal na calcanheira (parte traseira na zona de calcanhar). A sua contribuição é dar sustentação a parte de trás, proporcio- nando um bom calce. Os sapatos abertos atrás, não necessita de este elemento.

• Forro: Cobertura interna do calçado. É introduzido sobre cabedal e também na palmilha de montagem. No avesso do sapato protege o calcanhar de deslizar ao caminhar e do con- tato direto com o contraforte. O avesso não pode apresentar saliências muito proeminentes para não causar lesão ao pé. • Sistema de fecho ou aperto: Existe uma ampla variedade de

os diferentes tipos pode-se destacar: atacador (cadarço), fecho de contato (velcro), fecho de correr (zíper) de metal ou plástico, fecho de pressão e fecho de fivela.

• Enfeites: com finalidade estética os enfeites agregam valor ao produto. Podem ser de metais, plástico, pedra, acrílico, tecido, entre outros.

• Sola e solado: A sola é parte do calçado que fica em contato com o solo. Enquanto o solado é a reunião de partes de um calçado sobre a qual se apoia o pé, a sola é o que apresenta o contato direto com chão. É de grande importância que este elemento seja resistente à humidade e deslizamento.

• Palmilha de Montagem: responsável pela fixação do corte após montagem, manutenção do formato da superfície da planta do pé, tem a função também de absorção e remoção do suor. A palmilha de montagem reproduz a planta da forma, com reforço na parte do “enfranque” (zonas laterias interior e exterior que vai da linha de dedos à linha de salto) e do calcanhar.

• Alma: Componente de metal encaixado na sola para propor- cionar a estabilidade dos saltos altos e impedir deformação da planta de fabricação.

• Salto: Parte inferior do calçado. Podem apresentar as mais diversas alturas, materiais e formas. Os tipos mais comuns são produzidos em madeira e polietileno. Ele é formado por uma elevação na parte posterior do sapato, onde se localiza o calcanhar. Este elemento é responsável por receber as cargas transmitidas durante o movimento de marcha, ou por postura estática aos calcanhares. A fixação deste elemento no calçado ocorre entre o solado e a parte superior do salto. Como o seu objetivo principal é acomodar o calcanhar, a sua área tende a ser proporcional às dimensões desta região do pé.

• Tacão: é afixado na parte de baixo do salto, com o objetivo de evitar escorregamento, além do desgaste devido ao impacto no ato de caminhar. Ele define a área de apoio no solo para a região do calcanhar.

• Biqueira: É a região responsável por acomodar os dedos no interior do calçado. Dependendo do modelo, o estilo de biqueira pode ser modificada, chegando até mesmo ser reti- rada a sua extremidade como nos caso das sandálias e nos modelos peep toe. Segundo Rossi (2000), as biqueiras podem ser classificadas como: crescente, oval, circular, quadrada,

• Palmilha interna: Parte do calçado que fica em maior con- tado com o pé e proporciona conforto e melhor acabamento, muitas vezes chegam a ser acolchoadas. É fundamental que todas estas estruturas estejam ergonomicamente calculadas para garantir o equilíbrio e conforto dos pés, mas tudo isso poderá ser comprometido em termos de conforto, se todas as partes não forem convenientemente montadas para uma combinação perfeita do produto final.

A Figura 1 ilustra os componentes de um calçado.

Figura 1. Componentes de um calçado.

Fonte: Elaborado pelos Autores

Para que todos esses elementos sejam adequados ao seu res- pectivo usuário é bom relacionar o modelo a ser desenvolvido com a distribuição de pressão e do formato do pé. A distribuição do peso do corpo e da ação da gravidade sobre o pé ocorre em três regiões: retropé (região posterior do pé), mediopé (região intermediária do pé) e antepé (região anterior do pé). A maneira e a quantidade de pressão que será distribuída nessas regiões durante a caminhada está estrita- mente relacionada a composição anatômica determinadas por fatores internos do organismo (estruturas óssea, articular, muscular, vascular e neuronal) e externos (calçados utilizados).

O pé humano é constituído de 26 ossos de formatos irregulares, 30 articulações sinoviais, mais de 100 ligamentos e 30 músculos. Esta estrutura está dividida em três regiões: retropé (tálus e calcâneo), mediopé (navicular, cuneiformes e cubóide) e antepé (metatarsais e falanges). Os ossos tarsais e metatarsais formam os três arcos podais, dois deles se apresentam de forma longitudinal (arco longitudinal

lateral, ALL; e arco longitudinal medial, ALM) e um de forma transversa (arco transverso, AT) ao pé (HAMILL e KNUTZEN, 2012).

De acordo com Pinto (2006), com a senescência, os pés sofrem modificações: alargam-se e perdem o coxim plantar. Associado a isso, há o aumento de peso, que pode resultar no comprometimento de estruturas ósseas e ligamentos, levando ao desequilíbrio muscular e, por fim, às doenças podológicas que quando associadas às sistêmicas como diabetes mellitus, doença vascular periférica e neuropatia perifé- rica, reduzem o desempenho da marcha ou, até mesmo, o ato de ficar em pé.

De acordo com Berwanger, et al. (2011), os pés podem ser classi- ficados à partir de dois aspectos: primeiro em função do comprimento dos dedos e segundo em função da formação do arco plantar.

A classificação referente ao comprimento dos dedos mostrada na Figura 2, considera somente os três primeiros dedos e classifica de acordo com os diferentes formatos em função da longitude dos dedos, classificando em pé egípcio - o hálux (1º dedo) apresenta a maior altura entre todos e a longitude dos demais diminui em ordem decrescente; pé grego - a maior altura se encontra no segundo, seguido do primeiro dedo e o terceiro dedo é o terceiro, respectivamente - e o pé romano - o 1 e 2 º dedos apresentam a mesma altura e são os mais longos - (MANFIO, 1995).

Figura 2. Classificações dos tipos de pés conforme o comprimento dos dedos

Fonte: Elaborado pelos Autores

Além do projeto do calçado ser respaldado na classificação do comprimento dos dedos, o volume e todo o seu formato deve ser con- siderado, pois com o envelhecimento diversas deformidades podem

primeiro metatarso com a formação de uma proeminência óssea, que com o tempo fica coberta por um saco “bursal”- geralmente associado com o deslocamento do primeiro artelho - (MELO e HADDAD, 2014). As deformidades do dedo em garra e dedo em martelo as articulações ficam rígidas, inflexíveis, e os dedos ficam encurvados. Estas deformi- dades são frequentemente o resultado de distúrbios do sistema neu- romuscular (CASSELI, et al., 2003).

A classificação referente ao tipo de arco plantar pode apontar dife- rentes níveis de elevação ou falta de elevação do arco, mas, conforme a Figura 3, é comum a classificação em arco plantar alto (pé côncavo), médio (pé normal) e baixo (pé plano).

Figura 3. Classificações dos tipos de arco plantar

Fonte: Elaborado pelos Autores

O pé que possui o arco normal - neutro, tem maior probabilidade de se manter em equilíbrio e por isso, não altera o movimento de caminhar. De acordo com pesquisadores de biomecânica da marcha e de desenvolvimentos de calçados (MANFIO, 1995; GUIMARÃES, 2000; BERWANGER, et al., 2011), o pé composto pelo arco mais ele- vado torna-se mais rígido e aumenta a probabilidade de não absorver o impacto, sobrecarregando a região lateral do pé, acentuando os movi-

pé cavo ou pé supinado. O pé plano possui um arco diminuído ou nem possui arco, estas pessoas, absorvem mais os impactos, sobrecar- regando a região medial do pé, esse tipo de pisada é popularmente conhecido como pé chato ou pé pronado.

Os tipos de arco plantar são de extrema importância para o desen- volvimento da palmilha e do solado do calçado, e estes vão interferir na maneira de caminhar e nas articulações do joelho, quadril e coluna. Durante a passada de uma pessoa com a pisada neutra, o primeiro contato com o solo é feito pelo calcanhar, a seguir pela borda externa do pé, terminando com a porção anterior do pé e pelos dedos, sendo acompanhado por uma rotação interna da tíbia, com a finalidade de amortecer o impacto (GUIMARÃES, et al., 2000).

É importante destacar que no processo de modelagem o conheci- mento do formato do apoio dos pés pode influenciar não somente na parte técnica do calce como também no fator estético, por exemplo, um pé côncavo deixa a curva do pé para fora da boca do calçado, se o profissional da modelagem efetuar este ajuste, o calçado não terá o mesmo visual no pé normal (VENTURA, 2011).

Além das influências do arco plantar na dinâmica do andar o próprio salto do calçado também pode contribuir para que ocorra alterações.

Segundo Carrasco (1995), conforme se aumenta a altura do salto, altera-se a distribuição da pressão corporal nos pés e o equilíbrio, pre- judicando a segurança do caminhar. Quando o pé se apoia no chão sem salto nenhum, o calcanhar suporta uma carga de 57% do corpo e a região metatarsiana, 43%. Com o salto de 2 cm, há um equilíbrio de 50% do peso do corpo na parte anterior do pé e na parte posterior, no calcanhar.

No salto de 4 cm, o calcanhar suporta 43% do peso do corpo e o metatarso 57%. No salto de 6 cm, 75% do peso do corpo ficarão sobre a região metatarsiana e 25% sobre o calcanhar e com um salto de 10 cm ou mais, praticamente toda a carga é suportada pela região anterior do pé. Portanto, o salto juntamente com o solado tem um papel deter- minante no comportamento motor da locomoção.

O envelhecimento promove algumas modificações em diversos segmentos anatômicos, no sistema musculoesquelético ocorre alte- rações estruturais nos pés e estas, podem modificar as pressões plantares. Segundo Garrowl, et al. (2000), 80% da população idosa apresenta algum tipo de problema com os pés. Existe uma preva- lência alta de dor no pé em idosos. De Castro, et al. (2010), aponta que mais de 60% das queixas de dor nos pés está associada aos calçados,

sendo as maiores associações entre calçados inadequados e dor nos pés reportada pelas mulheres idosas.

Os idosos tendem a ter pés mais pronados com menor amplitude de movimento do tornozelo e a primeira articulação metatarsofalan- geana, apresentam maior prevalência de deformidades nos dedos e fraqueza da musculatura flexora e extensora dos pés, além da redução de sensibilidade. Esse quadro pode potencializar ainda mais as altera- ções de distribuição da pressão plantar (SCOTT, et al., 2007). Diversos autores alertam que as alterações de pressões aliadas as demais consequências decorrentes do envelhecimento interferem na instabi- lidade postural, aumentando o risco de quedas favorecendo a incapa- cidade funcional e diminuindo a qualidade de vida (MENS, et al., 2001). De acordo com Mens, Morris e Lord (2006) os padrões de distri- buição plantar sofrem influências de variáveis como a velocidade da marcha, a cadência e o comprimento do passo, bem como o peso corporal. Estes pesquisadores avaliaram a fase de balanço da marcha e encontraram relações moderadas entre o equilíbrio e capacidade funcional e enfatizaram que idosos com deformidades moderadas ou graves apresentam maior probabilidade de cair que idosos sem defor- midades nos pés.

Enquanto Mickle, et al. (2011), investigaram a relação das fases da marcha na fase de apoio e o equilíbrio em idosos com e sem deformi- dades, e não encontraram diferenças significativas entre eles na fase da marcha, no entanto, houve relação entre deformidades e aumento de pressão no antepé, que por ventura poderia interferir no descon- forto, a funcionalidade e a estabilidade em atividades complexas ou desafiadoras. Portanto, os estudos não são evidentes quanto a relação de deformidades e o ciclo completo da marcha (fases de apoio e balanço), visto que, embora muitas pesquisas já foram realizadas, mas com procedimentos metodológicos diferenciados.

De acordo com Menant, et al. (2009), as pessoas idosas sofrem muito com quedas por perda de equilíbrio que podem estar relacio- nadas com as superfícies irregulares ou pelo uso de sapatos inade- quados. Como dispõem de uma maior dificuldade em manter o equilíbrio ao caminhar do que jovens e adultos adotam um padrão de marcha mais lento, reduzindo o comprimento do passo e são mais conservadores. Ainda assim para que o risco de sofrerem algum des- lize seja reduzido é ideal o uso de calçados que aumentem a estabili- dade postural.

Passos (2014) o calçado deve ser projetado para melhorar o rendimento de um indivíduo, mantendo o conforto, a segurança, a saúde dos pés ou, ainda, ser projetado para suprir uma possível deficiência, atuando como um objeto de correção para proporcionar conforto, segurança e saúde que nele se apresentam ausentes. Para tanto, é oportuno além de ter conhecimento sobre as condições anatômicas (formatos, deformidades, nível de mobilidade entre outros) e de saúde entender o comportamento dos movimentos básicos dos pés durante a marcha, o designer também deve ter em mente os outros movimentos que os pés são capazes de executar, em estado de marcha, durante atividade específica, ou com o corpo estático (movimentando somente os pés).

As principais características dos calçados para idosos se refere à altura do salto, materiais e amortecimento da sola, altura do contra- forte e palmilhas proprioceptivas.

CARACTERÍSTICAS DE CALÇADOS ESPECÍFICOS

No documento Ebook Design novos horizontes (páginas 78-86)