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Emergência de uma matriz de investigação numa abordagem qualitativa

Capítulo 6 Metodologia

6.1 Opções metodológicas

6.1.2 Emergência de uma matriz de investigação numa abordagem qualitativa

A investigação em educação deve centrar-se na dinâmica emergente da interação entre os indivíduos, os contextos e o conhecimento, uma vez que todas estas unidades analíticas estão interrelacionadas e condicionam o decorrer do processo de ensino e aprendizagem (Alves & Azevedo, 2010). Por outro lado, é consabido que a investigação qualitativa permite obter informação detalhada sobre os processos de ensino e de aprendizagem, dificilmente obtida de outra forma. Como por exemplo, através da observação detalhada e planeada e da estreita interação com os sujeitos podem estudar-se diferentes processos cognitivos (Fernandes, 1991).

O presente estudo está enquadrado pelas ideias mencionadas nos capítulos anteriores e, tal como já foi referido, pretende sustentar a seguinte tese: A articulação entre práticas de ensino, de avaliação e a participação dos alunos, em contexto de sala de aula, contribui para a melhoria do desenvolvimento do pensamento algébrico nos alunos. Consequentemente, há aspetos importantes a descrever e caracterizar nas práticas dos professores nos domínios da avaliação e do ensino, tal como na participação dos alunos. Mais especificamente, interessa caracterizar que práticas de ensino e de avaliação estão relacionadas com o desenvolvimento da participação dos alunos no âmbito da Álgebra. Neste contexto, o estudo tem como principal objetivo descrever, analisar e interpretar práticas de ensino, de avaliação e a participação dos alunos, tendo como foco o desenvolvimento do pensamento algébrico. Em consequência, será orientado pelas seguintes questões: (a) como é que se poderão caracterizar as práticas de ensino e de avaliação, no âmbito do estudo da Álgebra? (b) como é que se poderá caracterizar a participação dos alunos, nos processos pedagógicos e didáticos e nas atividades das aulas, no âmbito do estudo da Álgebra? (c) qual a relação entre as práticas de ensino e de avaliação do professor e a participação dos alunos, em contexto de sala de aula, no âmbito do estudo da Álgebra?

Tendo como referência o objetivo de investigação formulado e as questões de investigação enunciadas, torna-se relevante que uma parte significativa dos dados da investigação seja obtida no contexto real da sala de aula e através da interação e da proximidade com os alunos e o professor. Nestas condições, os dados obtidos de natureza qualitativa permitirão descrever, analisar e interpretar os fenómenos de interesse que estão associados aos objetivos e às questões orientadoras da investigação. Bogdan e Biklen (1994) afirmam que a investigação qualitativa apresenta as cinco características principais que se seguem: (i) a situação natural constitui a fonte dos dados, sendo o investigador o instrumento principal da recolha de dados; (ii) a sua primeira preocupação é descrever e só secundariamente é que surge a análise de dados; (iii) a questão fundamental é todo o processo; (iv) os dados são analisados indutivamente como se reunissem, em conjunto, todas as partes de um todo; (v) diz respeito essencialmente ao significado das coisas. As características atrás referidas mostram-se de acordo com as questões do presente estudo.

No entanto, quando se pensa em investigação qualitativa ainda surgem dúvidas sobre a sua qualidade científica, daí que num estudo desta natureza haja uma grande necessidade de se garantir uma investigação qualitativa de qualidade (Borralho, Fialho & Cid, 2015). De acordo com os autores, essa qualidade, numa boa parte, é assegurada pelos critérios de validade inerentes à investigação, daí ser fundamental que os investigadores em educação se preocupem com a questão da fiabilidade e validade dos métodos que utilizam, sejam eles de cariz quantitativo ou qualitativo (Coutinho, 2015).

Segundo Borralho, Fialho e Cid (2015) para que a validade da investigação, inúmeras vezes questionada, esteja assegurada é fundamental que se estabeleça uma matriz concetual de investigação proveniente da discussão do quadro teórico que evidencie o objetivo e as questões da investigação. Neste contexto, os autores afirmam que:

A matriz concetual de investigação deverá ser sempre um elemento de referência para a construção dos instrumentos de investigação e para a análise dos dados e qualquer instrumento a ser utilizado para a recolha de dados deve ter em consideração os objetos, e respetivas dimensões, patentes na referida matriz. Os dados recolhidos pelos diversos instrumentos, certamente de natureza distinta, terão assim informação relevante sobre as diversas dimensões relativamente a cada objeto de estudo (p.66).

Tendo em conta o acima referido, e de acordo com o quadro teórico do presente estudo, elaborou-se a seguinte matriz de investigação (Fernandes, Borralho, Vale, Gaspar & Dias, 2011):

Quadro 5 – Matriz de Investigação

A matriz de investigação mostra claramente que os objetos deste estudo são as práticas de ensino, as práticas de avaliação e a participação dos alunos. É também possível observar através de uma breve análise à mesma (Quadro 5) as dimensões que caracterizam cada um dos objetos. Desta forma, facilmente se identificam os principais objetos de análise, que foram criados de acordo com o objetivo do estudo e as respetivas questões de investigação. Como se perceberá, esta distribuição de objetos e de dimensões constantes na matriz é, em certo sentido, artificial uma vez que as dinâmicas de sala de aula e a sua complexidade dificilmente são enquadráveis em categorias muito disjuntas,

daí a necessidade do investigador ter em consideração uma visão integrada dos mesmos. Na realidade, muitas vezes há sobreposições e interações que não podem ser traduzidas num instrumento desta natureza (Fernandes, Borralho, Vale, Gaspar & Dias, 2011; Borralho, Fialho & Cid, 2015). Todavia, esta distribuição de objetos e de dimensões foi pensada apenas para apoiar a investigadora no desenvolvimento das suas ações de recolha e sistematização da informação. Uma matriz de investigação é tão somente uma esquematização de um plano que permite orientar os investigadores no terreno e garantir que a informação recolhida é orientada para esses objetos e respetivas dimensões (Spaulding, 2008; Borralho, Fialho & Cid, 2015). No que diz respeito às dimensões utilizadas no presente estudo, é importante alertar para a dificuldade em elaborar listas exaustivas de elementos caracterizadores de cada objeto (Fernandes et al., 2011). Estas são apenas um conjunto de elementos caracterizadores dos objetos em questão, criadas com base em dois critérios: (i) os propósitos e termos de referência do estudo; e (ii) as indicações constantes na literatura (Nevo, 2006; Fernandes, Borralho, Vale, Gaspar & Dias, 2011; Borralho, Fialho & Cid, 2015).

Com base no objetivo do estudo, nas questões anteriormente referidas e tendo como referência a matriz de investigação, elaborou-se o plano de trabalhos, que integrou três fases distintas, mas fortemente interdependentes. A primeira fase denominada como fase Teórica e Conceptual teve como principal objetivo a construção do quadro teórico de referência, que se pretendeu crítico e analítico através do estudo e sistematização da literatura relevante nos domínios do ensino, da avaliação e da participação dos alunos. Como Yin (2010) refere, este é o começo de um percurso metodológico rigoroso que deve iniciar com uma revisão pormenorizada da literatura. Neste contexto, tendo em conta os objetos de análise, e porque se reconheceu que o professor é uma figura fundamental no processo de ensino, aprendizagem e avaliação, considerou-se indispensável compreender em que se baseia o seu conhecimento, e quais os mecanismos que usa e que o ajudam na sua vida profissional (Portugal & Astudillo, 2013). Além disso, considerou-se relevante fazer uma revisão pormenorizada da literatura sobre a avaliação das aprendizagens, a Álgebra e o desenvolvimento do pensamento algébrico.

A segunda fase do estudo, denominada como fase Intensiva, corresponde ao período de observação de aulas na turma envolvida, no âmbito do estudo de sequências e regularidades, funções e equações. Esta fase permitiu recolher informação detalhada sobre as ações e interações que corporizam as atividades de ensino, a participação dos alunos e a avaliação, constituindo uma oportunidade única para a compreensão de uma

variedade de relações entre os elementos já referidos. Na investigação qualitativa, esta fase do estudo é justificada pela grande preocupação com o contexto, uma vez que se considera que as ações são melhor compreendidas quando observadas no seu ambiente natural (Bogdan & Biklen, 1994). Esta ideia é reforçada por Stake (2016) quando afirma a importância de, neste tipo de estudo, se colocar “um intérprete no campo para observar os desenvolvimentos do caso, um intérprete que regista objetivamente o que está a acontecer, mas que simultaneamente examina o seu significado e redireciona a observação para aperfeiçoar ou fundamentar tais significados” (p.24). Na realidade, para um investigador qualitativo separar o ato observado do seu contexto é perder de vista o significado (Bogdan & Biklen, 1994).

A terceira e última fase, denominada de Interação Social e Reflexão, é a fase da triangulação intensiva e interpretativa dos dados através do contacto próximo com os participantes mais diretos do estudo, a fim de promover reflexões que pudessem contribuir para clarificar, interpretar e aprofundar os dados obtidos na fase anterior. A interação teve lugar em contextos mais formais (através da realização de entrevistas em grupos focais a alunos e entrevistas individuais ao professor) e numa variedade de contextos menos formais (por exemplo em conversas informais com o professor da turma). Yin (2010) salienta a importância de utilizar várias fontes de dados com o objetivo de, no final, se poderem triangular. Segundo o autor é imprescindível utilizar “múltiplas fontes de evidência, de forma que os dados convirjam de modo triangular” (p.22).