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Capítulo

4. Habilitações diversas: Projeto de Multimídia; Projeto de Interfaces; Projeto de Comunicação Digital; dentre outras.

4.3 Ensino da teoria e prática

O ser humano é um transformador nato e sente necessidade de transformar o mundo e a si mesmo. Para isso, age conhecendo do mesmo modo que se conhece agindo. “O conhecimento humano em seu conjunto integra-se na dupla e infinita tarefa do homem de transformar a natureza exterior e a sua própria natureza” (VÁZQUEZ apud FONTOURA, 2001, p.169). O resultado da ação transformadora é algo material, objetivo e real, cuja existência não mais depende do processo que o gerou. Em outras palavras, o objeto criado, adquire vida independente da atividade subjetiva que o criou. Neste sentido, a atividade prática é real, objetiva ou material.

Conforme descrito por Fontoura (2001), a práxis pode mudar de acordo com a matéria-prima sobre a qual se exerce a ação, podendo ser uma práxis produtiva, uma práxis artística, uma práxis científica, uma práxis social e uma práxis política.

1. A práxis produtiva é fundamental, pois através dela o ser humano produz o mundo humano ou humanizado de objetos que satisfazem suas necessidade e que só podem ser produzidos na medida que concretizam finalidades ou projetos humanos.

2. A práxis artística se diferencia da práxis produtiva, pois não atende uma necessidade prático-utilitária, mas uma necessidade geral humana de expressão e objetivação. É também essencial, pois eleva a capacidade humana de se exprimir e objetivar. Como toda práxis humana, a arte se situa na esfera da ação, da transformação de uma matéria que perderá a sua forma original para adotar uma outra nova: a exigida pela necessidade humana que o objeto criado ou produzido há de satisfazer.

3. A práxis científica primordialmente satisfaz necessidades da investigação teórica e da comprovação de hipóteses. A sua finalidade imediata, enquanto atividade experimental é teórica, mas não deixa de ser uma práxis.

4. A práxis social existe na medida em que a atividade prática humana toma como objeto grupos ou classes sociais, inclusive a sociedade como um todo. Pode ser entendida como a atividade de grupos ou classes sociais que leva a transformar a organização da sociedade, ou realizar certas mudanças mediante a atividade do Estado - neste caso, a práxis social converte-se em práxis política.

Podemos afirmar que as atividades de design são atividades eminentemente humanas, são práxis produtivas, cuja finalidade é transformar matérias em produtos, conformadas a partir de necessidades humanas. Ao transformar a matéria, o designer age sobre ela, no sentido de lhe plasmar finalidades ou projetos humanos.

Além das atividades práticas, existem também aquelas que pela sua natureza são chamadas de atividades teóricas. Segundo Vázquez (apud Fontoura, 2001), as atividades

teóricas, não podem por si, ser consideradas como uma forma de práxis, pois apesar de transformar percepções, representações ou conceitos, e criar um tipo peculiar de produto – hipóteses, teorias, leis, etc. –, em nenhum caso transforma a realidade. Nelas não são cumpridas as condições da práxis em relação à matéria-prima, à atividade e ao resultado no processo prático. Falta às atividades teóricas o aspecto material e objetivo da práxis.

Por outro lado, as atividades teóricas só existem por e em relação com a prática, já que nela encontram os seus fundamentos, suas finalidade e seu critério de verdade. Existe entre ambas uma relação dialética, ou seja, ao mesmo tempo em que a consciência – teoria – é determinada pelo modo como o ser humano produz a sua existência, a ação humana – prática – é consciente, ou melhor, ela é refletida, pensada, projetada. Assim, pode-se dizer que a práxis é uma relação dialética entre a teoria e a prática, conforme visto na Figura 9.

Figura 9 - Relação dialética entre a teoria e a prática. Fonte: (FONTOURA, 2001, p.171)

O resultado da atividade de design é quase sempre um produto obtido pela ação ou conjunto de ações realizadas sobre a matéria, processo, no qual houve uma intervenção anterior da sua consciência que antecipou o resultado e prefigurou a sua finalidade – atender uma necessidade humana.

Gui Bonsiepe (1997) em seu artigo ‘Teoria projetual – para que?’, reflete justamente sobre a relação da teoria e prática do design. De acordo com o autor, a teoria pressupõe a existência do objeto da reflexão. A prática sempre tem prioridade quando posta em relação com a teoria que, à primeira vista, sempre chega tarde demais. Examinada mais a fundo, essa interpretação é errônea, pois a teoria impregna toda a prática.

Nesse corpo-a-corpo e na tentativa de dar maior ou menor importância aos conceitos, Bonsiepe argumenta, teoria e prática são domínios distintos, e seria errado estabelecer uma correspondência mútua inequívoca:

[...] Uma atitude de indiferença em relação à teoria justifica-se quando ela dá – justificadamente ou não – a impressão de querer manipular a prática. Uma prática projetual guiada pela teoria iluminada ofereceria um espetáculo esquisito, assim como

uma teoria levada ao reboco pela prática. Seria um mal-entendido esperar que a teoria possa fornecer recomendações concretas para a atuação profissional, como se ela tivesse uma caixa de ferramentas metodológicas ou truques profissionais. Por sua vez, a teoria se perderia numa ambição vazia se pretendesse influenciar diretamente a prática. Tais intentos exporiam as contradições entre intencionalidade e know-how operacional. Projetos não podem ser concretizados no meio lingüístico-intencional. As boas ‘idéias’ no design não valem nada, o que vale é o projeto implementado (BONSIEPE, 1997, p.179). Conforme Bonsiepe, para que evitemos mal-entendidos, devemos enfatizar que as habilidades constituem uma condição necessária para o projeto, porém não suficiente. E concluindo, o autor propõe:

Confrontamo-nos com o desafio de um novo enfoque do ensino do design. Durante 80 anos predominou a ênfase na formação de habilidades, embora esporadicamente tenha havido contribuições importantes antecipando-se ao desenvolvimento futuro. Passo a passo, de maneira não espetacular, passaremos da pré-história para a história real do design. O ensino do design, incluindo a pesquisa e a formação teórica pode agora – após interlúdios retrô – recomeçar sob a perspectiva da modernidade radical do século 21 (BONSIEPE, 1997, p.188).

O designer inglês Nigel Whiteley (1998) comenta que cada vez mais se percebe uma maior aproximação entre a teoria e prática. “A erosão da distinção entre teoria e prática é sintomática de um desmoronamento maior das fronteiras que separavam disciplinas, áreas de conhecimento e metodologias científicas”, (WHITELEY, 1998, p.63). Para o autor, a diferença entre a teoria e prática se confundiu tanto que a relação entre esses dois pólos se aproxima mais de um espectro que de uma dicotomia simples.

[...] em um modelo de fusão que pressupõe uma almagamação em que as duas coisas perdem totalmente as suas especificidades e viram a mesma coisa, e por outro lado, em um modelo de ‘contínuo’ que admite a inter-relação e interdisciplinaridade – incluindo-se a interpenetração entre teoria e prática – mas que admite também a existência de diferenças importantes e até mesmo a separação propriamente dita nos dois extremos do contínuo. Essas distinções são importantes. A interpenetração não equivale à amalgamação e, no caso dos designers, ainda existem habilidades que só podem ser adquiridas na prática da oficina e outras que têm a sua origem nos ensinamentos teóricos e na sala de aula. Uma sociedade sofisticada precisa de designers sofisticados, os quais devem ser bem informados e capazes de uma reflexão crítica, além se serem criativos em matéria de projeto. Diferentes aptidões imbuídas de qualidade e conhecimento diferenciados surgem a partir de maneiras diferentes de pensar e agir. É preciso atingir uma maior coerência entre as diversas partes da formação, a fim de permitir que as diversas qualidades e aptidões se complementem – e, até mesmo, se confrontem – de forma construtiva. A existência de habilidades de diferentes tipos deveria engendrar um senso de completitude e de compreensão na busca da interdisciplinaridade e não um senso de confusão, incoerência ou desconfiança (WHITELEY, 1998, p.63).

4.4 Interfaces do Projeto em Design com áreas do