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2.5 Conhecendo o campo empírico: o terceiro setor

2.5.2 Entendendo a dinâmica de sua gestão

Embora nos últimos anos tenha ocorrido significativo aumento no número de estudos voltados ao terceiro setor, percebe-se que ainda há uma carência por abordagens específicas adequadas as particularidades deste tipo de organizações (COELHO, 2002).

Até meados da década de 70 a administração não era uma palavra muito usual no terceiro setor, pois era vista como elemento do mundo dos negócios, não sendo adequada às organizações voltadas para valores mais substantivos (HUDSON,1999). Entretanto, a atual efervescência do setor vem alterando este ponto de vista.

Falconer (1999) relata que nas décadas de setenta e oitenta os maiores desafios das organizações do terceiro setor eram a sobrevivência em um ambiente político hostil e a conquista de reconhecimento público para suas causas, como o ambientalismo e a defesa de direitos. Entretanto, a partir dos anos noventa, a legitimidade do setor parece advir da sua competência em agir de forma eficiente e eficaz na prestação de serviços (FALCONER, 1999).

Na opinião de Salamon (1998) as instituições do terceiro setor são também organizações que enfrentam desafios no âmbito da administração e do controle institucional, necessitando mostrar sua capacidade e competência.

Conforme cita o autor (SALAMON, 1998, p. 11):

[....] gestores das organizações do Terceiro Setor terão de dar mais atenção ao treinamento e à assistência técnica e aqueles que contribuem com essas organizações deverão ir além da filantropia apenas para sentir bem consigo

mesmo (feel-good philanthropy) e do financiamento de projetos de curto prazo, para o suporte institucional de longo prazo. O Terceiro setor claramente atingiu a maturidade no cenário global, mas agora deve encontrar formas de fortalecer sua capacidade institucional e contribuir mais significativamente para a solução de problemas maiores – sem perder sua base popular e capacidade de mudança.

Assim, as organizações sem fins lucrativos, mesmo em meio às razões substantivas (valores) de existência que determinam um modo específico de ser e agir, se deparam com o desafio de se auto-sustentarem e se desenvolverem. Além disso, a eficácia e a eficiência destas organizações pode ser encarada como uma forma de legitimar a ação do terceiro setor perante a sociedade.

A questão da eficiência e eficácia de resultados como o principal desafio das organizações da sociedade civil é fundamentalmente diferente do passado recente, quando a simples existência de uma organização ou a validade da causa defendida eram suficientes para justificar uma doação de recursos, sem maiores exigências quanto os resultados produzidos (FALCONER, 1999). Porém, no cenário atual, a administração adquire maior importância com a adoção do discurso empresarial de resultados, o que segundo Falconer (1999) é uma manifestação visível de um processo gradual de transformação pela qual vêm passando os atores organizacionais do campo do desenvolvimento social em todo o mundo - ONGs, fundações, entidades multilaterais de desenvolvimento e mesmo o Estado.

O autor chama atenção para o fato de que a Administração seja percebida como um “elixir milagroso” para todos as dificuldades que afligem o campo do terceiro setor. Na opinião de Falconer (1999), a Administração pode oferecer auxílios importantes no que concerne à eficiência dos recursos organizacionais e eficácia nos resultados. Contudo, há problemas em níveis macro, tais como políticas públicas e os problemas sociais pelos quais as organizações existem que exigem uma dinâmica diversa do mundo empresarial.

Para Costa Júnior (1998) administrar uma organização sem fins lucrativos é diferente de uma empresa privada ou uma empresa pública, pois se trata de uma forma de gestão particular, sendo importante o melhor entendimento sobre o Terceiro Setor e as diferenças entre ele e os dois outros setores da sociedade.

Há diferenças importantes entre a iniciativa empresarial e o terceiro setor que impedem que as práticas administrativas sejam simplesmente transpostas. As diferentes naturezas que permeiam estas organizações precisam ser compreendidas, adotando-se teorias adequadas às suas necessidades (HUDSON, 1999). Chama-se atenção para dois pontos.

O primeiro deles se refere à necessidade de ter clareza das especificidades de gestão existentes entre a ambiente dos negócios e as organizações sem fins lucrativos. O segundo aspecto diz respeito a compreensão de que a atuação no setor sem fim lucrativos também exige resultados efetivos, a fim de que a ação se torne realmente transformadora das condições sociais (LIMA, 2003).

Outro aspecto que cabe ressaltar diz respeito as suas fontes de financiamento. Embora não possuam fins lucrativos isto não exime a responsabilidade destas organizações buscarem recursos para financiar suas atividades. Além disso, devido ao grande crescimento do setor nas últimas décadas a competição por recurso tem sido acirrada influenciando na profissionalização do setor (SALAMON, 1998).

Na percepção de Salamon (1998) atualmente este é um dos grandes desafios para as organizações que compõem o terceiro setor, pois é preciso vencer o desafio da eficiência, mostrando-se a capacidade e competência da organização (SALAMON, 1998). Na visão de Tenório (1997) isto acarreta impactos na estrutura organizacional e formas de controle.

Entre as fontes de recursos principais das organizações do terceiro setor estão os fundos públicos, a geração de receita própria através da venda de produtos e serviços, taxas (mensalidades) de seus associados e doações de empresas ou indivíduos (FALCONER E VILELA 2001; HUDSON 1999).

Hudson (1999) associa que, dependendo do tipo de fonte principal de financiamento, a organização terá maior ou menor liberdade estratégica para decidir onde aplicar os seus recursos, quais projetos investir, para qual público, entre outros. O autor exemplifica que em uma organização que sobrevive por doações há maior abertura para definir as atividades que se deseja exercer. Em contrapartida, uma organização dependente de subsídios de empresas, do governo ou financiada por contratos, pode sofrer maiores restrições na aplicação dos recursos. Isto porque a coalizão dominante destas instituições pode influenciar as decisões organizacionais, predeterminando a alocação de seus recursos, explica o autor.

Em um ensaio teórico a respeito do terceiro setor, Falconer (1999) elencou quatro principais necessidades de desenvolvimento de gestão que podem ser generalizadas para todo o setor. Uma delas diz respeito à capacidade de transparência na gestão e na apresentação de resultados aos seus financiadores - a stakeholder accountability. No Brasil, nem todas as organizações cultivavam tal valor (FALCONER, 1999), pois havia muita corrupção na obtenção e aplicação dos recursos (FERNANDES, 1997). Entretanto, na disputa por recursos públicos e privados, a capacidade de demonstrar posições claras e resultados concretos será o

destaque destas organizações. Na opinião de Fernandes (1997), a transparência nas finanças e nas realizações é um dos elementos que dá um caráter diferente às organizações da sociedade civil e e sobre a qual é preciso afirmar-se e desenvolver-se.

A sustentabilidade, definida pelo autor como a capacidade de obter recursos financeiros, humanos e materiais, é um outro desafio para a gestão do terceiro setor, o que coaduna com a opinião de outros especialistas da área, tais como Salamon (1998) e Coelho (2002).

A qualidade dos serviços constitui um terceiro desafio para o setor (FALCONER, 1999). No passado, o caráter assistencial das organizações filantrópicas sustentou um longo período de resistências às práticas gerenciais. Entretanto, com cidadãos cada vez mais conscientes dos seus direitos, foi introduzida a necessidade do uso eficiente dos recursos e a avaliação adequada do que deve ser priorizado em função do que o público precisa e dos recursos disponíveis (FALCONER, 1999).

Como quarto desafio, Falconer (1999) cita a capacidade de articulação. As organizações do terceiro não podem atuar de forma desarticulada se pretendem contribuir para o solucionamento dos problemas sociais e isto se concretiza por meio da formação de alianças, de parcerias, de redes e coalizões (FALCONER, 1999).

Para o autor, as quatro dimensões - stakeholder accountability, sustentabilidade, qualidade dos serviços e a capacidade de articulação são essenciais para o desenvolvimento de um terceiro setor capaz de relacionar com a sociedade civil e com outras instituições, promovendo os valores efetivos à sociedade e assim fazer frente aos problemas públicos.