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“O integralista típico de Santa Catarina é uma pessoa jovem em processo de ascensão social” 108. Essa afirmação do historiador René Gertz coaduna com as informações a respeito dos líderes integralistas de Joinville. Os principais nomes do partido tinham menos de 30 anos de idade. Aristides Largura foi o prefeito mais jovem da cidade, eleito aos 29 anos. Largura não era teuto-brasileiro, não havia nascido em Joinville, não entendia alemão precisando recorrer a intérpretes para se comunicar com eleitores e partidários, e talvez o que tenha sido mais surpreendente: não estava na cidade durante a conturbada campanha, tendo retornado apenas 15 dias antes da eleição.

As principais literaturas a respeito do integralismo explicam o sucesso do partido pela forte adesão dos teuto-brasileiros das colônias alemãs. René Gertz apresentou uma leitura diferenciada a respeito dessa questão, enfatizando que o grupo nazista da cidade conseguiu criar inimizade com quase todos os teuto-brasileiros. Entre os motivos estava o de realizar campanhas em favor de auxílio ao inverno alemão em escolas onde estudavam crianças pobres que também dependiam de donativos. Além disso, atacavam funcionários de empresas suspeitas de utilizar capital judeu, ou mesmo de manter relações com firmas judias na Alemanha. Os jornais noticiavam os ataques a funcionários da Empresul. O grupo nazista promovia ainda boicote a empresas com as quais os nazistas não simpatizavam, ameaçando verbalmente e de forma impressa. René Gertz apurou essas informações do relatório do cônsul alemão, que continha também informações do diretor da principal “escola alemã” de Joinville. O diretor Robert Soechting afirmava que: “os grupos locais da NSDAP em Santa Catarina são quase sem exceção, recusados tanto pelos alemães natos quanto pelos teuto-brasileiros, em parte porque os líderes falharam, em parte porque agiram sem tato”. Em Joinville, constavam no relatório apenas 22 pessoas inscritas como partidários109.

O trabalho de Giralda Seyferth, intitulado Nacionalismo e

Identidade étnica, foi citado por Gertz, que criticou a autora na medida

em que ela identifica contradições ao defender a hipótese de que a adesão dos teuto-brasileiros ao integralismo deu-se, sobretudo devido às

108 GERTZ, op. cit., 1987, p. 197.

semelhanças entre o partido brasileiro e os movimentos fascistas europeus, porém, as minimiza com argumentos refutáveis. A principal explicação de Giralda Seyferth para a adesão dos teuto-brasileiros ao integralismo foi a de que o pertencimento ao partido era uma forma de ajudar a preservação da sua identidade alemã. Isso porque os integrantes do sigma manifestavam relativa solidariedade ao Deutschtum, isto é, a preservação da identidade e cultura germânica.

O problema levantado por Gertz é que de fato houve tolerância integralista, mas existiu na mesma medida hostilidade, uma vez que se tratava de uma agremiação nacionalista brasileira. O historiador concluiu suas críticas à Giralda Seyferth questionando os motivos pelos quais os teuto-brasileiros não aderiram em massa ao Partido Republicano Catarinense, liderado pelo também descendente de alemães, Marcos Konder, caso a principal motivação fosse a luta pela preservação do Deutschtum110.

O historiador René Gertz produziu análise detalhada a respeito dos estudos sobre integralismo realizados até a publicação do seu trabalho na tentativa de compreender os fatos relacionados à explicação dominante, que prima relacionar a adesão ao integralismo pela variável étnica. Embora o autor não tenha solucionado a questão, pois encontrou fatos que apontam para negação e também para a aceitação da tese, sugeriu que o “fator étnico” não seja colocado como agente determinante. Depara-se aqui com uma tese fundamental de Gertz, qual seja, a de que o integralismo foi ideologicamente influenciado pelo nazismo, mas que isso não explica tudo satisfatoriamente, pois a razão dos teuto-brasileiros do sul do Brasil terem aderido ao integralismo se explica com base no contexto regional e “não através dos desígnios transatlânticos”111.

Se a variável étnica não é suficiente, ela pode em parte ajudar a entender o fenômeno eleitoral que foi a vitória integralista. Não é possível perceber uma divisão na adesão ao integralismo entre teuto- brasileiros e aqueles que não se consideravam descendentes de alemães, já que encontramos sobrenomes alemães nas duas candidaturas. Entretanto, é mais perceptível uma divisão entre os próprios teuto- brasileiros, sendo possível que se tratasse de uma questão relacionada à qual camada da sociedade o cidadão pertencia para aderir ou não ao integralismo. Conforme mencionado, no jornal A Notícia há exemplos

110 Ibid., p. 128-129. 111 Ibid., p. 132.

de textos em que o empresário teuto-brasileiro era enaltecido, enquanto o colono da mesma etnia era considerado um “quisto”.

A atuação de Largura como inspetor escolar junto às áreas rurais e a aparente sensibilidade que demonstrava ter ao tratar de imigrantes e seus descendentes, já que sua própria família apresentava história semelhante, são fatores que devem ser também somados ao conjunto de condições que permitem explicar o sucesso de sua eleição. O isolamento das comunidades rurais, tema abordado no início deste capítulo, permite nos fazer supor que a agremiação partidária disposta a escutá-las e conhecê-las estaria em vantagem. É certo que, pela análise realizada, a Frente Única não foi essa agremiação. A insatisfação com a política tradicional também ficou evidente ao longo deste capítulo, visto que os jornais recorrentemente cobravam mudanças de postura dos representantes. Até mesmo o jornal A Notícia reclamava as promessas da “Revolução de 1930” ainda não postas em prática. A população em geral talvez não estivesse preocupada com as frustrações revolucionárias, mas diante da ausência de melhorias em seu cotidiano talvez estivesse disposta a apostar em algo novo. O integralismo em sua composição apresentava pessoas jovens que não pertenciam ao mundo da política e oriundas das mais variadas origens sociais. Trazia um discurso voltado às classes até então desprestigiadas, como a operária, além de propor mudanças que ultrapassavam as questões relacionadas à administração municipal. Desse modo, é possível sugerir que não há um único fator que elucide a vitória integralista, mas o conjunto de condições anteriormente descritas permitem explicar aquela eleição.