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No ano de 1940, Kolb esteve na então capital federal em duas oportunidades, sendo que na segunda vez permaneceu lá entre os meses de agosto a dezembro. Embora as viagens do padre fossem registradas em atas, nem sempre os motivos eram explicitados. Contudo, sua ausência era constantemente mencionada nas reuniões, que nessas ocasiões apresentavam conteúdo enxuto e um número de participantes menor que o habitual163. Mesmo que o motivo não fosse elucidado completamente, ocorria uma espécie de ritual antes das viagens e em seu retorno. Ao se afastar, o padre deixava uma série de recomendações aos membros da diretoria que deveriam ser repassadas por eles aos demais associados. Geralmente as recomendações diziam respeito a questões do cotidiano circulista, como a cobrança de maior empenho em determinada atividade ou a conquista de um maior número de sócios. Deixando uma mensagem que era ao mesmo tempo de cobrança e de estímulo, o padre prometia melhorias:

O Sr. Diretor falou de outros melhoramentos e empreendimentos a serem feitos brevemente, como: o aumento do salão, o cinema, etc. Disse que se começamos do nada e hoje somos bastante, e que virá visitas ilustres visitar este Círculo de Operários. Espera que todos compreendam e na sua volta verá o que fizeram durante sua próxima estadia no Rio de Janeiro. Espera finalmente que quando voltar haja um número maior de sócios e que para isso todos os associados deveriam trabalhar para o engrandecimento do Círculo164. (Grifos meus) Ao retornar, o padre costumava apresentar a obtenção de novas doações financeiras, geralmente sem especificar valores. Esse foi o caso

163 Ata do Círculo Operário de Joinville, ago/dez. 1940. 164 Ata do Círculo Operário de Joinville, ago. 1940, p.78.

de uma viagem feita em 1944. Ao retornar, Kolb expôs em linhas gerais o saldo de sua ida à capital federal, mencionando ter recebido quantias em dinheiro, segundo o padre, diretamente do gabinete do presidente da república. Aquele valor seria utilizado para a aquisição de um terreno localizado nas proximidades do Círculo onde seria construída uma capela. Na mesma viagem, o padre afirmou ter obtido do “grande amigo do Círculo”, Filinto Müeller, a promessa sobre a construção de cem casas para operários165.

Poucos dias depois de comemorar o compromisso firmado no Rio de Janeiro sobre a construção das casas, o padre se queixou em assembleia sobre a urgência no despejo de inquilinos residentes em habitações pertencentes ao Círculo. O padre afirmou que a medida extrema era necessária, uma vez que os moradores haviam ignorado o aviso para se retirar das casas e, por isso, pareciam estar “zombando do diretor do Círculo”, pois se tratava de pessoas associadas. Quanto aos motivos do esvaziamento das residências, foi citado apenas que se devia à necessidade de “melhoramentos indispensáveis ao prosseguimento da boa marcha das obras de assistência social do Círculo”166.

O compromisso firmado com Filinto Müeller não foi o primeiro projeto do COJ para construção de casas populares. Um dos sonhos de Kolb era construir uma vila operária. Fazia parte do audacioso projeto a construção da vila nas proximidades da sede do Círculo, incluindo maternidade e hospital operários, orfanato e abrigo para idosos. A vila operária no modelo em que sonhava o padre não foi concretizada, porém, o Círculo possuía um conjunto de casas populares, cujo número nem mesmo a atual diretoria soube apontar, destinada à locação para associados.

Aproximadamente sete anos antes da promessa de Filinto Müeller, o padre tentou dar início ao projeto da vila, fazendo, inclusive, o lançamento da pedra fundamental do que chamou de “Casa do Operariado Joinvilense”. Um dos primeiros doadores desse projeto foi o então governador de São Paulo, Armando de Salles Oliveira. O padre também recebeu doação para aquela obra do governador gaúcho, Flores da Cunha. O governador catarinense, Nereu Ramos, por sua vez, não doou naquele momento, mas se comprometeu a ajudar no futuro.

Imediatamente após a divulgação das doações, padre Kolb iniciou uma intensa campanha a favor da candidatura de Salles à

165 Ata do Círculo Operário de Joinville, ago. 1944. 166 Ibid.

presidência da república, vinculando sua imagem à do governador paulista. Em nota publicada no Jornal de Joinville, o padre negou que influenciasse politicamente seus associados ou que pedisse a eles votos, no entanto, afirmou que “daria seu voto conscientemente e prazerosamente” ao candidato Salles Oliveira167. A campanha de Kolb não se restringiu a Joinville, pois o padre também acompanhou o governador em visita ao Paraná. Com o apoio de Plácido Olimpio de Oliveira, ex-prefeito joinvilense e então deputado estadual, Kolb organizou um comício público pró-Salles em Joinville168. Como se sabe, as eleições foram canceladas devido ao golpe de estado perpetrado por Getúlio Vargas, em 1937, que originou o chamado Estado Novo.

O movimento circulista, levando em conta as disposições contidas nas encíclicas papais, enumerou, enumerou e classificou os problemas sociais que deveriam ser defendidos prioritariamente, sendo que a questão da habitação operária foi eleita a mais importante e preocupante. Segundo os circulistas, era inviável construir uma sociedade ordenada sem que esse problema fosse resolvido169. Para a igreja católica, no lar são formadas as virtudes do ser humano, portanto, a habitação operária representava uma solução social e moral. Essa era mais uma questão que distinguia a atuação da igreja da ação de grupos de esquerda, como o Partido Comunista Brasileiro (PCB), que, conforme apontou Nabil Bonduki, não defendia a necessidade da casa própria para o trabalhador170. Além disso, como destacou Jessie J. de V. Souza, o problema da habitação articulava-se com a questão do lazer operário, sendo necessária uma ação permanente dirigida às massas populares para despertar-lhes o gosto pela casa, fixar o trabalhador em sua residência e fazer com que ocupasse seu tempo livre na dedicação ao lar, no cultivo da horta, etc.171.

167 Casa do Operariado Joinvilense. Jornal de Joinville, 12 ago. 1937, p. 1. 168 KOLB, Alberto. Histórico do Círculo através da imprensa. Caderno 1. 169

SOUZA, op. cit., 2002, p. 228-230.

170 BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil: arquitetura moderna, lei do

inquilinato e difusão da casa própria. São Paulo. Estação Liberdade, 1998, p. 88-106.