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2 ENTRE ALGUNS ELEMENTOS APARENTES E ESSENCIAIS

No documento Anais completos (páginas 34-36)

Para refletirmos acerca da gestão democrática na escola pública, tomamos a eleição de diretores como um dos arranjos institucionais com potencial para realçar uma lógica que difere da que corrobora a democracia capitalista e limitada. Há um relativo consenso entre os que se debruçam sobre o tema – Dourado (2006), Mendonça (2001), Paro (2000), entre outros –, de que a eleição direta constitui um recurso significativo para o processo democrático, que pode somar-se às condições de contraponto aos mecanismos que, ao servirem à lógica capitalista, alteram para menos a democracia e a participação popular na construção da realidade democrática. Importa, pois, entender a eleição não somente como recurso formal, mas essencial a outro projeto de educação.

Nesse sentido, consideramos que as bases normativas também nos oferecem algumas manifestações acerca da noção de gestão democrática e da eleição de diretores. Assim, estamos em um nível de realidade, isto é, trata-se da aparência do objeto investigado, segundo comentara Kosik (1976). Ao partirmos desse nível, apresentamos a incidência da eleição em cada uma das mesorregiões geográficas de Santa Catarina, tanto na condição de princípio, quanto de mecanismo, conforme o Gráfico 1. Por princípio, entendemos ideia-força que embasa políticas, projetos e, inclusive, sujeitos da sociedade, Um mecanismo, por sua vez, diz respeito a uma via para materializar o princípio.

Gráfico 1 – Percentuais de registros da eleição para diretores de escola em sistemas municipais de ensino, enquanto princípio de gestão democrática e mecanismo de participação – mesorregiões de Santa Catarina

Fonte: Legislação municipal examinada (2017).

De acordo com a Constituição Federal de 1988, os municípios foram elevados à condição de entes federados, e, por meio de seus sistemas de ensino, foram incumbidos da tarefa de definir normas da gestão democrática do ensino público, na educação básica, conforme suas peculiaridades. Em vista dessa incumbência, nossa hipótese é a de que democratizar a gestão da escola requer um projeto de educação, cujo horizonte seja também um projeto de sociedade. Do contrário, por mais que se tenha em vista a gestão democrática enquanto processo, ela corre o risco de tornar-se funcional ao sistema capitalista, pois este não condiz com mudanças estruturais, mas, sim, com

ajustes que, em consonância com as ideias de Marx e Engels (2017), podem revolucionar as relações de produção em favor da existência da burguesia.

Enquanto uma leitura da aparência da gestão democrática e, mais especificamente, da eleição de diretores, apuramos que a incidência dela, seja princípio e/ou mecanismo, não é significativa no universo dos sistemas municipais de ensino das diferentes mesorregiões catarinenses. Com base no Gráfico 1, na condição de princípio, o maior percentual figura em sistemas municipais de ensino da mesorregião da Grande Florianópolis, embora, enquanto mecanismo, o destaque recaia sobre a mesorregião Serrana. Isso nos desperta suspeitas quanto ao valor creditado a esse recurso para a democratização da gestão do ensino público nos municípios pesquisados. Ao menos pelo plano formal-institucional, a eleição parece assumir significados e lugares distintos nas propostas de gestão local.

Quanto a uma leitura da essência do tema e do objeto em questão, isto é, de elementos que constituem a aparência, mas não estão visíveis em primeiro momento, referimos alguns resultados obtidos mediante entrevista com sujeitos de uma escola da mesorregião Serrana, tendo em conta o papel da eleição e os sentidos que atribuem à sua prática.2 O Quadro 1 equivale a um exercício de

síntese desses resultados.

Quadro 1 – Caracterização do papel da eleição de diretores pelos sujeitos entrevistados

Sujeito Papel da eleição de diretor Naturalização ou resistência ao sistema?

Professora A Romper a indicação Abrir à escola à comunidade

Mãe A Via mais democrática de escolha Possibilidade de os sujeitos escolherem

Estudante

A1 Permite escolher alguém que tome decisões certas Possibilidade de os sujeitos escolherem Estudante

A2 Permite escolher alguém capaz de elevar a qualidade do ensino Possibilidade de os sujeitos escolherem

Fonte: entrevistas com os sujeitos do Município A (2018).

A partir das entrevistas, percebemos que há aparências de partilha de poder, até mesmo porque os sujeitos ressaltaram a ação das maiorias no sentido de fazer a escolha do diretor, embora a importância do mecanismo tenda a se restringir a apenas o momento da eleição, sem que seja possível captarmos a ideia de resistência ao sistema nas respostas obtidas. Por outro lado, assim como entende Mendonça (2001), tomar a eleição como mecanismo mais radical de democratização da escola constitui uma prática um pouco distante das realidades escolares. Ao menos nessa instituição do Município A, os sujeitos manifestaram em suas respostas limites para uma democratização que aqui situamos no plano contra-hegemônico, o que dá mostras de que, por mais que o plano formal- institucional esteja arquitetado para iluminar experiências de democratização, ele não constitui garantia de que tais experiências ocorram efetivamente nas escolas.

2 Em termos de delimitação do campo empírico do estudo ao qual se filia este trabalho, dois municípios catarinenses foram pesquisados.

A definição deles decorreu do processo de análise de documentos que constituiu a base do plano formal-institucional, este que, na nossa leitura, indicia uma orientação do projeto de democratização local. Neste trabalho, no entanto, apresentamos alguns dos resultados referentes a um dos municípios selecionados.

36 VI Congresso Regional de Docência e Educação Básica | Anais Eletrônicos Eixo 1 - Práticas escolares

No documento Anais completos (páginas 34-36)

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