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ENTRE SABERES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOCENTES: A FORMAÇÃO PROFISSIONAL

PERMANENTE DE PROFESSORES(AS) EM FOCO

Os Artigos 62 e 63 (Inciso I), respectivamente, da atual LDBEN/96 preconizam que a formação inicial (ou formação iniciante) de docen-tes para lecionar na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental I (1º ao 5º ano do Ensino Fundamental de nove anos – antiga pré-escola e 1ª a 4ª séries do ensino primário) deve ser realizada em curso Normal técnico-profissionalizante (também chamado de curso de Magistério ou curso de Formação de Docentes), ofertado por escolas públicas ou particulares, em nível de Ensino Médio; ou ainda em curso Normal Superior24, junto às universidades públicas ou pri-vadas. (BRASIL, 1996)

Todavia, a formação inicial de professores(as) para exercer o magis-tério nos Anos Finais do Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano do Ensino Fundamental de nove anos – antiga 5ª a 8ª séries do ensino ginasial/

colegial) e no Ensino Médio precisa, necessariamente, ser efetuada em nível de Ensino Superior, em cursos de graduação em licenciatura plena, nas diferentes áreas do conhecimento científico, ofertados por universidades ou institutos superiores de educação públicos e privados;

conforme determina o Artigo 62 da LDBEN/96. (BRASIL, 1996) Atualmente, a Lei supra aludida também autoriza que a formação de docentes para ministrar aulas na Educação Básica escolar pode ser desenvolvida, nos moldes de formação continuada, em cursos de for-mação/complementação pedagógica de licenciatura, que são ofertados somente para profissionais já diplomados(as) e egressos(as) de cursos superiores de graduação, tanto de bacharelado quanto de tecnologia, realizados em instituições públicas ou particulares de Educação Su-perior. Para tanto, o Artigo 63, Inciso II, da legislação educacional em vigor estabelece que as instituições superiores de educação deverão ofertar “programas de formação pedagógica para portadores de diplo-mas de educação superior que queiram se dedicar à educação básica”.

(BRASIL, 1996)

Entretanto, a mesma LDBEN/96, em seus Artigos 64 e 66, pres-creve, de modo respectivo, que:

24 Curso de graduação (licenciatura) atualmente extinto em muitas instituições brasileiras de Educação Superior, dada a existência de celeumas, controvérsias e relativa concorrência em relação aos tradicionais cursos de Licenciatura em Pedagogia. Os cursos Normal Superior que ainda existem são ofertados de modo presencial, semipresencial/híbrido ou na mo-dalidade de educação a distância (EaD) on-line, por meio de mídias interativas; como era o caso, por exemplo, do Curso Normal Superior ofertado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), localizada na cidade de Ponta Grossa – Estado do Paraná (PR), Brasil. Tais cursos de destinam, em particular, à formação de docentes para atuar na Educação Infan-til e nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Sobre esta questão, em específico, vide, por

Art. 64 – A formação de profissionais de educação para administração25, planejamento, inspeção, su-pervisão e orientação educacional para a educação básica será feita em cursos de graduação em peda-gogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional.

[...]

Art. 66 – A preparação para o exercício do magis-tério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e dou-torado. (BRASIL, 1996)

Contudo, e coadunando com Cunha (2001), apenas a forma-ção inicial em curso de licenciatura ou a formaforma-ção/complementaforma-ção pedagógica de licenciatura não é suficiente para ser um(a) bom/boa professor(a) na contemporaneidade, onde o mercado de trabalho se apresenta cada vez mais exigente, competitivo e escasso.

Devido a estes fatores, faz-se necessário que os(as) docentes e demais profissionais da educação estejam em constante processo de estudo, aprendizado e pesquisa científica, que pode e deve ser realizado em cursos de formação permanente – denominada também formação continuada, formação contínua ou formação em serviço. (BEHRENS, 1996; BRASIL, 1996; IMBERNÓN, 2001)

Além da formação inicial, a vigente LDBEN/96 apregoa o seguinte sobre a formação profissional permanente de professores(as):

Art. 61 – A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes ní-veis e modalidades de ensino e as características

25 Habilitação educacional, dentre outras, ofertada pelos antigos cursos de Licenciatura em Pedagogia que, segundo “o Parecer nº 251/62, [...] tinham o encargo de formar professo-res para os cursos normais e profissionais destinados às funções não docentes do setor educacional, os “técnicos de educação ou especialistas de educação” (LIBÂNEO; PIMENTA, 2002, p.17), tais como administradores/diretores escolares, planejadores educacionais, inspetores escolares, supervisores escolares e orientadores educacionais. Atualmente, as expressões “administrador(a) escolar” ou “diretor(a) escolar” foram substituídas pelas ter-minologias vocabulares de “gestor(a) escolar”, “gestor(a) educacional” e “gestor(a) pedagó-gico(a)”, apresentando semelhanças e diferenças teórico-práticas. A despeito da origem e evolução históricas do curso de Licenciatura em Pedagogia, no Brasil, bem como sobre as habilitações pedagógicas ofertadas pelo curso em questão, recomendamos as leituras das obras científicas de Bortolini (1997), Brzezinski (1996), Cambi (1999), Larroyo (1974), Silva (1999) e Veiga et al (1997).

de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos:

I - a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço.

[...]

Art. 63 – Os institutos superiores de educa-ção manterão:

[...]

III - programas de educação continuada para os profis-sionais de educação dos diversos níveis.

[...]

Art. 67 – Os sistemas de ensino promoverão a valo-rização dos profissionais da educação assegurando--lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos pla-nos de carreira do magistério público:

[...]

II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim. (BRASIL, 1996; ênfases nossas)

Observe-se que a legislação educacional supracitada utiliza as expressões vocabulares “capacitação em serviço”, “programas de edu-cação continuada” e “aperfeiçoamento profissional continuado” para fazer menção à formação permanente de docentes, que deve ocorrer por meio da relação dialética teoria-prática (práxis26), tendo em vista a valorização e melhor qualificação dos profissionais da educação em geral no intuito de que o processo ensino-aprendizagem escolar seja cada vez mais significativo, produtivo, eficaz e eficiente.

A formação permanente dos(as) professores(as) pode ser realizada de modo presencial, semipresencial/híbrido ou na modalidade de edu-cação a distância (EaD) on-line, seja em escolas ou colégios de Eduedu-cação Básica das redes pública e privada de ensino, faculdades particulares, universidades (públicas ou privadas) e/ou em demais instituições edu-cacionais voltadas à capacitação e ao aperfeiçoamento profissional docente em seus aspectos técnico, didático-pedagógico e metodológico.

Para tanto, a formação profissional continuada dos(as) docentes é possível de ser desenvolvida por meio da participação ativa dos(as)

26 Pimenta (2002a) defende a ideia de que há unidade entre a teoria e a prática, de modo que ambas são processos distintos e componentes indissociáveis da práxis, a qual é

conceitual-mesmos(as) – mediante certificação autorizada e reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC), pelas Secretarias Estaduais ou Mu-nicipais de Educação (SEEDs/SMEs) e/ou pelos Núcleos Regionais de Educação (NREs) de cada Estado brasileiro – em diversos eventos acadêmico-científicos, tais como: palestras públicas, cursos de extensão universitária, minicursos, oficinas pedagógicas, mostras científicas, workshops, congressos (nacionais e internacionais), simpósios, seminá-rios temáticos, mesas-redondas, encontros temáticos, feiras literárias, feiras de ciências, conferências, semanas acadêmicas, grupos de estudos e pesquisas científicas, dentre outros.

Além da participação dos(as) professores(as) em tais eventos, os quais são muitos deles gratuitos, salvaguardados alguns casos parti-culares de cobranças de taxas de inscrição (que podem ser custeadas parcial ou integralmente pelos(as) próprios(as) docentes ou pelos estabelecimentos de ensino onde eles(as) trabalham), a formação per-manente dos(as) profissionais da educação também pode se dar nas instituições de ensino superior junto aos cursos de pós-graduação lato sensu (especializações e MBAs) e de pós-graduação stricto sensu (mes-trados acadêmicos, mes(mes-trados profissionais, doutorados acadêmicos, doutorados profissionais, pós-doutorados e livres-docência), que atual-mente podem ser realizados de maneira presencial e, em alguns casos específicos, nas modalidades semipresencial/híbrida ou de educação a distância (EaD) cem por cento on-line, por meio do uso de modernas mídias tecnológicas interativas de informação e comunicação, a saber:

Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs), plataforma Moodle, chats, sites de internet, fóruns de discussão, videoaulas, webconferências, skype, chamadas de vídeo via telefone móvel (telefone celular), aplicativos educacionais (apps), softwares educativos, posts, whatsapp, bibliotecas digitais, e-books (livros eletrônicos), computadores, notbooks, laptops e redes sociais em geral (correio eletrônico ou e-mail, instagram, facebook, youtube, messenger, linkedln, twitter, pinterest e orkut).

Todas estas formas de realizar formação profissional permanente contribuem substancialmente para a ressignificação e o redimensio-namento das práticas pedagógicas escolares, o compartilhamento de experiências profissionais docentes e não docentes na escola, e para o aprimoramento dos saberes da docência ou saberes docentes: saberes pedagó-gicos, saberes experienciais (saberes da experiência ou saberes práticos), saberes das áreas específicas do conhecimento científico, saberes profissionais ou da formação profissional, saberes disciplinares e saberes curriculares. (PIMENTA, 2002; TARDIF, 2006)

Diz-se isto, porque corroboramos de modo muito especial com Pimenta (2002) ao postular que, no contexto dos saberes da docência,

[...] a identidade do professor se baseia na tríade sabe-res das áreas específicas, sabesabe-res pedagógicos e saberes de experiência� É na articulação desses saberes com os desafios que a prática cotidiana nas escolas lhe coloca que o professor constrói e funda-menta o seu saber ser professor. Assim, da experi-ência acumulada em sua vida, refletida, submetida a análises, a confrontos com as teorias e as práticas, próprias e as de outrem, a avaliações de seus resulta-dos, é que o professor vai construindo seu jeito de ser professor. Nas áreas do conhecimento encontra o referencial teórico, científico, técnico, tecnológico e cultural para garantir que os alunos se apropriem também desse instrumental no seu processo de de-senvolvimento humano. Nas áreas pedagógicas encontra o referencial para trabalhar os conhecimen-tos enquanto processo de ensino, que se dá em situação histórico-sociais, e ensinar em espaços coletivos – as salas de aulas, as escolas, as comunidades escolares, concretamente consideradas. (PIMENTA, 2002, p. 8;

negritos no original)

Neste diapasão, Tardif (2006, p. 36-39) assim se posiciona:

Entretanto, a relação dos docentes com os saberes não se reduz a uma função de transmissão dos conhecimentos já constituídos. Sua prática integra diferentes saberes, com os quais o corpo docente mantém diferentes rela-ções. Pode-se definir o saber docente como um saber plural, formado pelo amalgama, mais ou menos coe-rente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais.

[...] Pode-se chamar de saberes profissionais ou saberes da formação profissional (das ciências da educação e da ideologia pedagógica) o conjunto de saberes transmitidos pelas instituições de formação de professores (Escolas Nor-mais ou Faculdades de Ciências da Educação). [...] Além dos saberes produzidos pelas Ciências da Educação e dos saberes pedagógicos, a prática docente incorpora ainda saberes sociais definidos e selecionados pela instituição universitária. Estes saberes integram-se igualmente à prática docente através da formação

(ini-oferecidas pela universidade. Podemos chamá-los de saberes disciplinares. São saberes que correspondem aos diversos campos do conhecimento, aos saberes de que dispõe a nossa sociedade, tais como se encontram hoje integrados nas universidades, sob a forma de discipli-nas, no interior de faculdades e de cursos distintos.

Os saberes disciplinares (por exemplo, matemática, história, literatura, etc.) são transmitidos nos cursos e departamentos universitários independentemente das Faculdades de Educação e dos cursos de formação de professores. Os saberes das disciplinas emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes. [...] Ao longo de suas carreiras, os professores devem também apropriar-se de saberes que podemos chamar de curriculares. Estes saberes correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta os saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelos da cultura erudita e de formação para a cultura erudita. Apresentam-se concretamente sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, méto-dos) que os professores devem aprender a aplicar. [...]

Finalmente, os próprios professores, no exercício de suas funções e na prática de sua profissão, desenvolvem saberes específicos, baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio. Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles incorporam--se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus27 e de habilidades, de saber-fazer e de saber-ser.

Podemos chamá-los de saberes experienciais ou práticos.

27 Sistema de disposições incorporadas ou tendências que organizam as formas pelas quais os indivíduos percebem o mundo social ao seu redor e a ele reagem (em termos de classe social, religião, nacionalidade, etnia, educação, profissão, etc.). É adquirido através de mimesis (termo crítico e filosófico que abarca uma variedade de significados, incluindo a imitação (dos gestos, da voz e das palavras de outrem), representação, mímica, imitatio, a receptividade, o ato de se assemelhar, o ato de expressão e a apresentação do eu) e reflete a realidade vivida a que os indivíduos são socializados, sua experiência individual e oportunidades objetivas. Assim, o habitus representa a forma como a cultura do grupo e a história pessoal moldam o corpo e a mente e, como resultado, moldam a ação social no presente (BOURDIEU, 1979). De acordo com Costa (2013), o conceito de habitus (também conhecido como capital cultural incorporado) foi desenvolvido pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002) com o objetivo de pôr fim à antonomia indivíduo/sociedade dentro da sociologia estruturalista. Relaciona-se à capaci-dade de uma determinada estrutura social ser incorporada pelos agentes por meio de disposi-ções para o seu modo de ser, sentir, pensar e agir. O habitus é, portanto, um conjunto unificador e separador de pessoas, bens, escolhas, consumos, práticas, etc.

Em outras palavras, é possível afirmar, resumidamente, que os saberes docentes elencados por Pimenta (2002) e Tardif (2006) se classificam de forma basilar em:

a) Saberes disciplinares: conteúdo das discipli-nas escolares.

b) Saberes curriculares: conteúdo dos progra-mas escolares.

c) Saberes pedagógicos: baseados nas didáticas, nas metodologias e em técnicas pedagógicas, aprendi-dos na formação inicial docente. É o campo teórico do ensino e da educação escolares.

d) Saberes experienciais: fruto da experiência e da prá-tica cotidiana do docente e do seu trabalho como professor na interação com os alunos, na gestão da classe. (CAMPOS, 2007, p. 23-24)

Assim sendo, cabe-nos frisar, em última instância, que todos os saberes da docência permeiam, direta ou indiretamente, as teorias educacionais, as tendências pedagógicas escolares, as práticas peda-gógicas professorais e a formação profissional inicial e permanente dos(as) docentes das diferentes áreas do conhecimento científico, nos diversos níveis e modalidades de ensino.

A despeito das práticas pedagógicas docentes, em particular, os sa-beres da docência estão presentes no pensar e fazer o trabalho pedagógico na escola e em sala de aula, seja por meio do uso de técnicas e métodos de ensino, das sistemáticas de avaliação da aprendizagem, da didática professoral, da abordagem dos conteúdos curriculares programáticos, da seleção de textos, apostilas escolares e livros didáticos e paradidáti-cos, da utilização de mídias tecnológicas educacionais, da elaboração dos planejamentos de ensino e planos de aulas, e do cumprimento dos ditames educacionais contidos no projeto político-pedagógico escolar.

Posto isto, torna-se mister compreender, grosso modo, que:

O pedagógico refere-se a finalidades da ação educa-tiva, implicando objetivos sociopolíticos a partir dos quais se estabelecem formas organizativas e metodológicas da ação educativa. [...] O processo educativo se viabiliza, portanto, como prática social pre-cisamente por ser dirigido pedagogicamente. Em outras

elemento diferencial nos processos educativos que se manifestam em situações históricas e sociais con-cretas. [...] Em síntese, dizer do caráter pedagógico da prática educativa, é dizer que a Pedagogia, a par de sua característica de cuidar dos objetivos e formas metodológicas e organizativas de transmissão de saberes e modos de ação em função da construção humana, refere-se, explicitamente, a objetivos éti-cos e a projetos polítiéti-cos de gestão social. [...] Dessa forma, o trabalho docente é pedagógico porque é uma atividade intencional, implicando uma dire-ção (embora nem todo trabalho pedagógico seja trabalho docente). O que significa dizer que todo ensino supõe uma “pedagogização”, isto é, supõe uma direção pedagógica (intencional, consciente, organizada), para converter as bases da ciência em matéria de ensino. (LIBÂNEO, 1999, p. 22-27)