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Episódio de análise 1 o emprego de estratégias aritméticas no processo de

4 O PENSAMENTO ALGÉBRICO NA PERSPECTIVA DA TEORIA DA

6.1 Episódio de análise 1 o emprego de estratégias aritméticas no processo de

A presente tarefa ocorreu na sessão 8 que, conforme apresentamos em nosso desenho de investigação, teve como meta pedagógica a resolução de sentenças matemáticas com operações de multiplicação e divisão em que um dos termos é desconhecido. Esta tarefa compõe nossas análises com o objetivo de possibilitar a reflexão sobre a iniciação da álgebra, no sentido de reconhecer que nesse processo as crianças empregam estratégias aritméticas na resolução de problemas, como, por exemplo, a utilização de operações inversas.

No entanto, reiteramos, a partir de nossa investigação que, mesmo que um aluno tenha um conhecimento aritmético refinado, esse refinamento é apenas um dos aspectos que colabora no desenvolvimento e estruturação do pensamento algébrico. Para a TO, o aspecto-chave é a analiticidade.

A tarefa consistia no jogo “Qual número digitei?”, adaptado de Smole e Diniz (2016) e foi realizada com 3 grupos de 4 e um de 5 componentes. Em nossa estrutura de objeto-objetivo-tarefa (Figura 9), apresentamos nosso objetivo - a resolução de sentenças matemáticas com um termo desconhecido, a partir da noção de equivalência. Por isso, possibilitamos diversas vivências para que, em um labor

conjunto, o saber se atualizasse em conhecimento (RADFORD, 2017b), a medida

que, é na atividade que o objeto matemático de pensar algebricamente a resolução de equações se torna acessível; um saber alcançável.

Na atualização do saber em conhecimento, ensino-aprendizagem são tratados como um continuum. Por isso, são muitos os elementos envolvidos. Um deles é o que denominamos de aprendizagem não linear. Isso significa dizer que o processo de introdução à álgebra não acontece no simples contato com uma tarefa com um termo desconhecido. No processo, há rupturas, “idas e vindas”, erros e acertos, dúvidas, reflexões, questionamentos, conclusões e inconclusões. Ou seja, a introdução da álgebra nos anos iniciais do Ensino Fundamental e o desenvolvimento do pensamento algébrico não é algo considerado simples e espontâneo, é um processo de tensão, que envolve aspectos cognitivos, corporais, culturais, sociais e afetivos.

Para exemplificar, em nossa sessão 8, deparamo-nos com a seguinte situação, adaptada de Smole e Diniz (2016), “Pensei em um número, somei com 1125

e multipliquei por 2. Resultando em 2590. Que número pensei?” Com esse enunciado

pretendíamos verificar, primeiramente, de que modo os alunos interpretariam as informações apresentadas no enunciado e como as organizariam em uma sentença matemática (? + 1125 x 2 = 2590) e em segundo lugar, reconhecer qual a estratégia para a resolução e quais os meios semióticos utilizados.

Ao verificarmos a filmagem, chamou-nos atenção a explicação do aluno CC, que sinalizou por meio da combinação do recurso semiótico linguístico e corporal, a compreensão de que a multiplicação e divisão são operações inversas, bem como a adição e subtração. Vejamos o seguinte trecho da transcrição:

Professora Luanna: CC, explique para seus colegas como você fez [20:00; 20:01]

Aluno CC: Eu simple/ eu simplesmente fui fazendo tudo ao contrário ((balançando a cabeça e apontando o dedo para a expressão da folha com um movimento rápido do dedo do início para o final da expressão, e do final para o início)) [20:02; 20:07]

O aluno CC combinou os meios semióticos da expressão linguística, numérica e gestos com as mãos para justificar o uso da operação inversa. Uma vez que movimentou rapidamente o dedo indicador na horizontal, sinalizando que a parte inicial da equação (+1125 x 2), antes do símbolo de igualdade (Figura 14), com seus números e sinais das operações, após o símbolo de igualdade, seriam o inverso ou “contrário” (:2 – 1125), como demonstrado nas Figuras 14 e 15.

Figura 14 - Gesto indicador do uso da operação inversa

Figura 15 – Gesto indicando a operação inversa

Fonte: arquivo da autora

Aluno CC: Eu fui, né? 2590 x 2 aí você ((aponta para o 2590 dividido por 2)) dividido por 2 menos 1125 aí deu 170. ((O aluno escreve que o valor do quadrado é 170)) [20:06; 20:29]

Então, ao manifestar, por meio da expressão linguística e gestual, o “fui fazendo tudo ao contrário”, o aluno utiliza a operação inversa para reconhecer, comunicar e fazer referência ao indeterminado, uma vez que indica compreender que o desconhecido seria o resultado de “fazer ao contrário”. O aluno CC realizou o seguinte registro numérico:

Figura 16 – Registro escrito do aluno CC

Fonte: arquivo da autora

Inicialmente, o diálogo e registro numérico apresentados nos chamou atenção pelo fato de que o aluno justifica sua ação ao relatar que “foi fazendo tudo ao

contrário”, indicando que o mesmo fez uso da adição-subtração e divisão-

multiplicação como operações inversas. Ou seja, utilizou a seguinte propriedade com relação a adição e subtração

Se a + b = c logo, c – b = a ou

c – a = b

Quanto à multiplicação e divisão, “o contrário” para o aluno é o mesmo que Se a x b = c

logo, c : b = a ou

c : a = b

Após identificarmos o uso da operação inversa e o seu resultado como um indício de reconhecer e se referir ao indeterminado, partimos para um segundo momento analítico, que consistia na busca do sentido da indeterminação e do processo de dedução, componentes do principal elemento do pensamento algébrico, a analiticidade. Nosso olhar investigativo se baliza nos três vetores acerca desse pensamento sustentados por Radford (2010, 2013, 2018a) e legitimados por Vergel (2016) e Vergel e Rojas (2018), que são: representação semiótica, o indeterminado e a analiticidade.

Ao nos debruçarmos sobre o registro escrito e a transcrição, concluímos que o aluno separou o desconhecido no primeiro membro da expressão e fez operações apenas no segundo membro para descobrir o valor do desconhecido, ou seja, ao fazer (? = 2590 : 2 – 1125) indica não agir com o indeterminado como se fosse determinado, uma vez que o mesmo não utilizou o símbolo de igualdade como equivalência e sim como a indicação direta de um resultado.

Em suma, na utilização do símbolo de igualdade como equivalência, as operações do primeiro membro da expressão deveriam resultar no valor do segundo membro, isto é, (2590 = 2590). A ação inicial do aluno de isolar o termo desconhecido para calcular o seu valor, manipulando apenas os números conhecidos, não corresponde a uma ação de agir com o indeterminado como se o mesmo fosse determinado, uma vez que o símbolo de igualdade foi utilizado como indicação de operação imediata. Portanto, não conferiu sentido ao indeterminado.

No procedimento abaixo, por exemplo, considera-se a indicação das autoras do jogo “Qual número digitei?”, adaptado por nós (SMOLE; DINIZ, 2016), quanto ao uso do parêntese ou da compreensão de que, no caso apresentado, o procedimento adequado seria realizar a multiplicação (1125 x 2 ) no primeiro membro. Assim,

? + 1125 x 2 = 2590 ? + 2250 = 2590 ? = 2590 – 2250 ? = 340 Deste modo, 340 + (1125 x 2) = 2590 340 + 2250 = 2590 2590 = 2590

Ao invés disso, o aluno agiu a partir da concepção do símbolo de igualdade como a indicação direta de um resultado, porque sua primeira ação, expressa pelo meio semiótico da escrita, foi separar o desconhecido e agir apenas com o que era conhecido (? = 2590 : 2 – 1125). Ou seja, o indeterminado não se manteve em primeiro plano, dado que a prioridade foi a manipulação de números conhecidos.

Na apresentação desta tarefa, nosso objetivo não foi verificar se a criança errou ou acertou o resultado e sim identificar as estratégias e os meios semióticos usados no processo introdutório da álgebra, para poder analisar a presença ou não da analiticidade. O pensamento analítico se caracteriza na operação com o indeterminado e no processo de dedução.

Na situação apresentada, o aluno CC empregou recursos linguísticos e corporais para expressar o conhecimento acerca das operações inversas e fazer referência ao indeterminado. Contudo, o mesmo não operou com o desconhecido como se fosse conhecido, assim, não apresentou indícios do pensamento analítico, conforme sintetiza o Quadro 17.

Quadro 17- Vetores e indícios do pensamento algébrico no episódio de análise 1 Vetores do pensamento algébrico Indícios

Indeterminado O valor do termo desconhecido “?”

Expressão semiótica Ao utilizar a expressão linguística “fui fazendo tudo ao contrário”e o gesto para demonstrar seu raciocínio (Figuras 14 e 15), o aluno CC utilizou propriedades das operações para comunicar e reconhecer que o indeterminado seria o resultado da operação inversa.

Analiticidade Agiu apenas com números conhecidos, por isso, não manifestou indícios de analiticidade.

Demonstrou ainda um erro matemático na solução, visto que escreveu 170 no resultado, ao invés de 340. Entretanto, consideramos que erros matemáticos fazem parte do processo de introdução e desenvolvimento do pensamento algébrico com crianças. Na presente tarefa, por exemplo, o aluno não tinha vivência culturais com situações em que o símbolo de igualdade indica uma relação de equivalência, por isso, fez uso da transposição direta de números e operações dos membros da expressão para utilizar apenas números conhecidos e obter o resultado.

A partir dessas considerações, concluímos que no processo de introdução à