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Episódio de análise 3 a proto-analiticidade no processo de introdução à álgebra

4 O PENSAMENTO ALGÉBRICO NA PERSPECTIVA DA TEORIA DA

6.3 Episódio de análise 3 a proto-analiticidade no processo de introdução à álgebra

Nesta sessão, a exposição desta tarefa tem o intuito de ressaltar que no processo de introdução à álgebra no Ensino Fundamental, de acordo com nossa investigação, podem ocorrer situações em que as crianças apresentam estratégias que se aproximem à deduções, na perspectiva adotada na TO, mas ainda assim não demonstram operar com o indeterminado, visto que atuam apenas com números conhecidos.

A tarefa apresentada neste tópico compunha a sessão 7 que, conforme mencionamos no desenho investigativo, possibilitou aos alunos vivenciarem em grupos a resolução de sentenças matemáticas com operações de adição e subtração com a presença de uma incógnita, denominada de termo desconhecido. Propomos, em sessões anteriores, oportunidades para que os alunos se familiarizassem com práticas culturais dessa natureza. Ao retomarmos oralmente esses momentos de vivência com o termo desconhecido, a estudante MT explica que:

Aluna MT: Os problemas normais já dá... É... tipo... Já dá... é... é... Quanto é 2 ((risos da aluna)) mais 4... é só um exemplo, mas aí a gente tinha que simplesmente

só somar. E ((na sessão anterior)) a gente tinha um desses quadrados ((se referindo a sessão anterior em que, na situação, os alunos já tinham o resultado 15 e a parcela com o numeral 10 da adição. Precisavam descobrir dois termos desconhecidos que, somados ao 10, resultassem em 15)). A gente já tinha o resultado, a gente só precisava descobrir como chegar [1:40; 2:05]

Dessa forma, conforme o relato da aluna, o grupo estava sendo introduzido na familiarização de situações matemáticas que, para MT, não eram “normais”, visto que os problemas denominados por MT de “normais”, são aqueles como (2 + 4 =). Ou seja, a turma estava iniciando a vivência de situações como a mencionada pela aluna (? + 10 + ? = 15), em que o símbolo de igualdade não indica diretamente uma operação a ser realizada e sim denota o sentido de equivalência, conforme explicam Castro e Molina (2007), é importante que as crianças convivam com expressões em que o símbolo de igualdade indique outros sentidos, além de apenas uma indicação de resultado.

Após essa discussão, conforme a Figura 18, a seguinte situação foi apresentada, dando continuidade ao trabalho com o termo desconhecido:

Professora Luanna: Eu pensei num número, certo? Não vou dizer que número eu pensei ((cola na cartolina uma caixinha com uma interrogação escrita)). Vocês vão tentar descobrir. Cada grupo vai receber um desafio diferente... Aí o que foi que eu fiz? Eu adicionei a esse número ((cola na cartolina uma caixinha com o sinal de adição escrito)) doze... ((cola na cartolina uma caixinha com o número doze escrito)) Certo? E resultou... ((cola na cartolina uma caixinha com sinal de igual)) em dezesseis. Olhe só {aluno fala_ não compreensível} calma, qual número eu pensei? [4:42; 5:20]

Figura 18 – Situação (? + 12 = 16) apresentada no início da sessão 7

Fonte: arquivo da autora

Ao propor coletivamente uma discussão acerca das estratégias de resolução, iniciou-se o seguinte diálogo:

Professora Luanna: Alguns já falaram a resposta porque coloquei número pequeno. NÉ? Aí está fácil! ((se referindo a situação exposta no quadro)) Mas, como vocês pensaram para chegar ao resultado? Quem poderia / [6:57; 7:09]

[

Aluna IN: Fui do doze que vai dar 16. Fui indo do doze até chegar no 16. ((se referindo a sentença: ? + 12 = 16)) [7:10; 7:15]

Professora Luanna: IN usou a ideia de completar, ela foi partindo do doze até chegar ao dezesseis, aí faltava quatro. Diga AU. [7:16; 7:22]

Aluno AU: Eu... diminuí. [07:23; 07:24]

Professora Luanna: Diminuiu o quê? [07:25; 07:26]

Aluno AU: doze menos dezesseis ((apontando para o quadro)) [07:27; 07:28] Alunos em coro: ((corrigem o aluno AU)) dezesseis menos doze! [07:29; 07:30]

Professora Luanna: dezesseis menos doze! E você MT? ((a aluna estava com a mão levantada, esperando a vez de falar)) [07:31; 07:34]

Aluna MT: Eu fiz a mesma que AU... Só que para ficar mais fácil eu separei as dezenas. [07:35; 07:38]

A fala da aluna MT, no turno de fala das 07:35 às 07:38, chamou-nos atenção por apresentar um indício de referência ao indeterminado pelo reconhecimento de que o mesmo poderia ser explicitado ao utilizar a decomposição de dezenas e unidades.

Ao interpretarmos o relato da aluna MT de “separar as dezenas”, verificamos um indício da utilização da seguinte propriedade:

a + b = c logo a = c – b b = c – a

A separação entre dezenas e unidades relatada pela aluna indica um vestígio de que para a mesma a expressão inicial (? + 12 = 16) se constitui como uma verdade e a partir dela, é possível fazer deduções. A fala da estudante indica que ela agiu por etapas ao subtrair a mesma quantidade em ambos os termos da expressão até chegar a uma solução. Conforme Radford (2018a), deduzir é uma ação de analisar e agir sobre o desconhecido com base no que é conhecido. A analiticidade consiste em: 1) operar com o indeterminado e 2) fazer uso de deduções nessa operação. Na situação apresentada, há indícios da utilização de uma premissa dedutiva, contudo, a aluna não aponta agir com o desconhecido, não conferindo, assim, sentido ao indeterminado.

Então, na presente tarefa, podemos concluir que há uma aproximação ao pensamento analítico, uma proto-analiticidade, posto que há a indicação da presença de um vetor da analiticidade: a dedução, pois ela não agiu por “tentativa e erro”, no entanto, não visualizamos a ação com quantidades indeterminadas. Para melhor refletirmos sobre esta situação, podemos interpretar e inferir matematicamente a conclusão de MT da seguinte forma:

? + 12 = 16

? + 12 + ( -10) = 16 + (-10) ? + 2 = 6

6 – 2 4

Assim, apesar da produção de MT não evidenciar explicitamente a retirada da dezena em ambos os lados. Nossas análises indicam, a partir do relato da aluna, que ao separar as dezenas e restar as unidades, fez um processo de compensação, concebendo a expressão de modo bidirecional, a partir do símbolo de igualdade como uma equivalência uma referência ao indeterminado por meio da operação aritmética (6 – 2).

? + 12 = 16

Logo ? = 16 – 12 (para MT 6 – 2, pois subtraiu a dezena em ambos os membros) ? = 6 - 2

MT fez uso do recurso linguístico ao oralizar “eu separei as dezenas” para expressar sua estratégia de pensamento e entendimento de que é possível decompor ou “separar” dezenas de unidade, como 16 em (16 - 10 = 6) e 12 em (12 – 10 = 2). Vergel (2016b, p. 24) aponta a relevância dos meios semióticos de objetivação, como os gestos e o ritmo e seu papel central na atualização do saber em conhecimento. Acrescentamos também o recurso linguístico, como o utilizado por MT ao dizer que “separou as dezenas”, como uma forma de materialização e exposição da estratégia de pensamento.

A partir do indício da indeterminância e expressão semiótica, partimos para um segundo momento e verificamos indicativos de proto-analiticidade nesta tarefa. Sintetizamos nossas considerações acerca dessa situação no Quadro 19.

Quadro 19 – Vetores e indícios do pensamento algébrico da aluna MT Vetores do pensamento algébrico Indícios

Indeterminado O resultado de 6 – 2

No decorrer do processo, utiliza a operação inversa e age a partir da retirada da dezena

? + 12 = 16

? + 12 + ( -10) = 16 + (-10) ? + 2 = 6

6 – 2 4

Expressão semiótica Reconhece e se refere ao objeto indeterminado a partir de uma operação e propriedade aritmética ao dizer “separar as dezenas” – utilizou o recurso linguístico Analiticidade Demonstra indícios de proto-analiticidade,

pois há uma aproximação ao pensamento analítico. A estudante indica operar a partir da premissa (? + 12 = 16) e, a partir disso, subtrai a mesma quantidade em ambos os termos da expressão. No processo, vai passando de uma expressão para a outra, sucessivamente até chegar a uma solução. Dessa forma, aparenta conceber a expressão de modo bidirecional (atentando para os dois termos) com base no símbolo de igualdade como indicação de equivalência. No entanto, não operou com a incógnita, já que trabalhou apenas com números conhecidos

? + 12 = 16

? + 12 + ( -10) = 16 + (-10) ? + 2 = 6

6 – 2 4 Fonte: Elaborado pela autora

Consoante a Radford (2018a), o critério de analiticidade é o que distingue a álgebra da aritmética. Isso acontece porque na ação algébrica o trabalho com o desconhecido é realizado a partir do que é conhecido, como em um “passo a passo”, que se baseia em uma certeza e considera suas consequências (RADFORD, 2018a). Verificamos, então, que MT reconhece e se refere ao indeterminado ao expressar a “separação das dezenas” como uma estratégia facilitadora para se chegar a resolução. Estratégias de decomposição como o que foi manifestado pela aluna MT, por exemplo, sugerem que a mesma agiu compreendendo seu procedimento matemático. A aluna fez uso do princípio aditivo e da propriedade da decomposição do Sistema de Numeração Decimal para ajudar na resolução da situação aritmética. Contudo, MT não operou com a incógnita, uma vez que não agiu com o indeterminado como se fosse determinado. Assim, conforme apresentado no Quadro 19, na introdução à álgebra, de acordo com nossa investigação, a criança nem sempre demonstrará explicitamente uma analiticidade algébrica. Na tarefa apresentada neste tópico, por exemplo, de acordo com a base teórica da Teoria da Objetivação, há indícios, visualizados por meio das estratégias demonstradas pela aluna, de uma aproximação ao pensamento analítico, já que a aluna indicou agir por deduções, no entanto, concluímos que o tipo de sentença matemática com apenas uma incógnita não suscitou a operação com o desconhecido, diante disso, problematizações com mais de uma incógnita ou questionamentos orais com outras possibilidades e situações poderiam ter fomentado, no labor conjunto, a ação das crianças com o indeterminado, contudo, tais reflexões não foram suscitadas pelo professor (ou por alunos).

6.4 Episódio de análise 4 - a operação com o indeterminado no processo de