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4 O PENSAMENTO ALGÉBRICO NA PERSPECTIVA DA TEORIA DA

4.3 Expressão semiótica

A expressão semiótica também é considerada por Radford (2010) como uma característica do pensamento algébrico. O autor da Teoria da Objetivação defende que ensinar-aprender a linguagem algébrica vai além de nos remetermos a um simbolismo sintático e mental, ela abrange elementos de análise multimodais, que ultrapassam medições exatas. Por isso, a expressão semiótica se remete à forma, tipo ou qual meio semiótico os alunos utilizam para nomear o indeterminado de uma equação.

A valorização dos meios/recursos semióticos empregados pelos estudantes ocorre porque para Radford, o pensamento algébrico não consiste apenas no que é mental, mas é formado também por componentes externos e corporais, se constituindo como multimodal. Ele diz que é possível o sujeito pensar com e através do corpo, por isso, pondera a relevância dos meios semióticos manifestos pelos alunos para se referirem ao indeterminado, o que requisita uma análise multimodal por parte do professor-pesquisador (RADFORD, 2013). Ao adotar tal posicionamento, Radford valoriza o papel das diferentes formas de manifestação da linguagem e aborda o pensamento como uma unidade dinâmica.

D’Amore, Pinilla e Iori (2015) explicam que a Teoria radfordiana parte de uma concepção de cultura como manifestação de significados, dando à mesma um caráter dinâmico e simbólico. Sendo assim, na TO, o conhecimento matemático e sua representação está ligada a um contexto cultural específico e é produzido socialmente, então, para essa concepção, os signos possuem um significado cultural. Nesse sentido, partindo dos estudos da TO, Vergel (2014) aponta que os meios e recursos semióticos constituem o processo de objetivação, porque fazem parte da produção de significados dos objetos matemáticos. No caso do pensamento algébrico, em suma, o papel dos diversos meios semióticos, como os gestos, a voz e as palavras, são essenciais para a TO, pois, baseado numa perspectiva materialista e simbólica, a Teoria da Objetivação defende que o pensamento matemático não se limita aos aspectos cerebrais, mas também inclui os gestos e ritmos dos sujeitos. O pensamento, então, possui múltiplas formas.

Gomes (2016) também ressalta o valor cultural atribuído pela TO para os meios e recursos semióticos. Conforme o autor, o pensamento como prática social

atribui aos meios semióticos um caráter central e não periférico, pois, pensar é um movimento dialético que pode ser visualizado por meio do corpo e dos artefatos por ele utilizados, e que se desdobra em mudanças no indivíduo. Gomes ainda acrescenta que os significados atribuídos aos meios e recursos semióticos dependem de seu contexto de utilização, sendo assim, é possível utilizar o mesmo signo, artefato ou instrumento que, dependendo do contexto, pode adquirir um significado diferente (GOMES, 2016).

Em nossa investigação, concebemos que o pensamento apresenta múltiplas formas e modos de manifestação, por isso, no processo de caracterizar as estratégias de pensamento demonstradas pelos alunos no processo de introdução à álgebra, interessa-nos identificar, inicialmente, indícios de quais meios/recursos semióticos os estudantes utilizam ao se referirem ao indeterminado. Tal expressão semiótica é um componente essencial do pensar algébrico, para Radford.

No capítulo seguinte, abordamos as especificidades metodológicas da presente investigação.

5 DESENHO DA INVESTIGAÇÃO

No presente capítulo, tratamos sobre os aspectos metodológicos da investigação. Inicialmente abordamos a fundamentação metodológica para, em seguida caracterizar o lócus e o público. Posteriormente, explicamos a organização das sessões e por último, elencamos o processo de constituição dos dados de pesquisa e as especificidades da análise de dados. Essa organização se baseou em Vergel (2014, 2016).

Nossa investigação se caracteriza como qualitativa (LUDKÉ; ANDRÉ, 1986), do tipo descritiva e interpretativa (VERGEL, 2014, 2016), fazemos uso do método multisemiótico/multimodal (RADFORD; EDWARDS; ARZARELLO, 2009; RADFORD; SABENA, 2015) baseado na Teoria da Objetivação. Consideramos como objeto de análise a atividade, por meio de uma apreciação multimodal (RADFORD; EDWARDS; ARZARELLO, 2009; RADFORD, 2006c).

Ludké e André (1986) reiteram que na abordagem qualitativa o pesquisador não é um mero observador, mas um participante ativo, que reflete, atua e intervém na realidade. Nesse sentido, o percurso, sua caracterização e desdobramentos são mais importantes que o produto. Uma vez que o processo educativo é complexo e não linear, o foco da abordagem qualitativa se encontra nos significados dos diferentes acontecimentos, elementos, sujeitos e componentes que envolvem o ensino- aprendizagem. Essa significação deve ser interpretada e descrita detalhadamente pelo pesquisador. Por isso, nossa investigação promoveu, assim como em Vergel (2016), a interpretação e descrição dos fatos, bem como dos elementos que envolvem o ensino-aprendizagem no processo de introdução da álgebra.

À vista disso, nossas reflexões investigativas visaram descrever, interpretar e caracterizar, na introdução da álgebra, estratégias de pensamento manifestadas por crianças do 4º e 5º ano do Ensino Fundamental, anos iniciais do NEI/CAp-UFRN. Radford e Sabena (2015) esclarecem que o método não se restringe a procedimentos e ações técnicas, uma vez que é um “esforço reflexivo e crítico, uma prática filosófica” (RADFORD; SABENA, 2015, p. 159, tradução nossa). Assim, em nossa investigação, consideramos que o pensar acontece de múltiplos modos: pelas ações, oralidade, linguagem escrita, gestos, dentre outros, consequentemente, utilizamos o método multisemiótico/multimodal de análise, que consiste na consideração reflexiva acerca

da maneira que os sujeitos utilizam e interpretam os diferentes meios semióticos na atividade ou labor conjunto. Como já esclarecido, o ensino-aprendizagem não é um processo puramente mental, mas envolve aspectos culturais, sociais e históricos, desta forma, coerentemente com nosso referencial teórico, atentamos para a utilização de diversos meios semióticos para expressão de significados.

Acerca disso, Radford e Sabena (2015) afirmam que o objeto de estudo da semiótica são os significados atribuídos e comunicados por meio de múltiplos modos e representações/registros, como as palavras e os gestos. Então, atentamos para as diferentes maneiras que os sujeitos utilizam os meios semióticos e expressam significados. A compreensão/significação é uma característica do movimento de ensinar-aprender ocorrido na atividade. Desse modo, o labor conjunto é essencialmente uma atividade de significação (RADFORD; SABENA, 2015).

No processo de interpretação e descrição dos significados acerca da maneira como os sujeitos utilizam os meios e recursos semióticos, utilizamos a análise multimodal,

O termo multimodalidade é frequentemente utilizado para sublinhar tanto a relevância como a coexistência de uma gama de diferentes funções cognitivas, físicas e sensitivas (por exemplo, perceptivo, auditivo, tátil) modalidades ou recursos desempenhando um papel nos processos de ensino-aprendizagem e, mais, em termos gerais, na produção de significados matemáticos: “estes recursos ou modalidades incluem tanto a comunicação simbólica escrita, bem como desenho, gesto, a manipulação física e artefatos eletrônicos e vários tipos de movimento corporal31” (RADFORD et al. 2017, p. 10 tradução nossa, grifo do autor)

Em suma, a análise multimodal consiste em considerar, na atividade (labor

conjunto), os diversos meios e recursos semióticos utilizados como forma de

expressar reflexões e ações culturais. Os recursos podem ser de diferentes naturezas, como por exemplo, os textos escritos e/ou falados, os gestos corporais e seus significados, uso de instrumentos, dentre outros. Sendo assim, o corpo dos sujeitos e

31 Texto original: “The term multimodality is often used to underline both the relevance and mutual

coexistence of a range of different cognitive, physical, and sensuous (e.g., perceptual, aural, tactile) modalities or resources playing a role in teaching-learning processes and, more broadly, in the production of mathematical meanings: “These resources or modalities include both oral and written symbolic communication as well as drawing, gesture, the manipulation of physical and electronic artifacts, and various kinds of bodily motion”.

seus elementos gestuais e sensoriais são elementos chave para a análise, pois, na TO, eles fazem parte do processo de objetivação (VERGEL, 2014), uma vez que o pensamento não é apenas algo interior, mas pode ser materializado corporalmente.

No processo de análise, definimos o gesto como um meio de ajudar o sujeito a produzir ideias (ARZARELLO, 2006). À vista disso, consideramos e reafirmamos que outros meios e recursos semióticos, ao se integrarem aos gestos, colaboram também na apreensão de significados e comunicação de sentidos. Ocorrendo, dessa maneira, um movimento dinâmico de associação de meios e recursos semióticos na atividade. Para a interpretação e descrição reflexiva acerca da visão e maneira das crianças operarem esses recursos/meios semióticos no fomento ao encontro com o saber algébrico, filmamos as 10 sessões.

Radford et al. (2017, p. 1) reiteram que a elucubração semiótica na perspectiva da Teoria da Objetivação constitui o processo de ensino-aprendizagem porque os “gestos, postura corporal, ações cinestésicas, artefatos e sinais em geral são considerados uma série de recursos a serem levados em conta ao investigar como os alunos aprendem e como os professores ensinam32”, assim, os autores fazem

referência e defendem uma concepção de pensamento ou mente multimodal nas práticas ocorridas na atividade.

Dessa maneira, nossa análise, fundamentada na Teoria da Objetivação, investiga a ação dos sujeitos na atividade ou labor conjunto e suas distintas formas de manifestação de estratégias de pensamento, procurando deduzir: como, o quê e porque os indivíduos atuam de determinada maneira; o que utilizam, como e porquê o fazem no processo de introdução a álgebra. Consideramos, então, os meios semióticos como partes do pensamento, num processo de valorização dos modos de ação e reflexão manifestados pelas crianças.

32 Texto original: “Gestures, body posture, kinesthetic actions, artifacts, and signs in general are considered a fruitful array of resources to be taken into account when investigating how students learn and how teachers teach”.