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CAPÍTULO IV – SIMBOLOGIAS RELIGIOSAS

IV.11 Escadório dos Cinco Sentidos

O Escadório dos Cinco Sentidos tem registrado seu início em 1722 (Massara, 1988) e a obra tem como idealizador D. Rodrigo de Moura Telles o qual não a viu finalizada, pois faleceu em setembro de 1728. A finalização do Escadório será de crédito dos padres Jesuítas; Massara explica “Foram os padres jesuítas do Colégio de São Paulo, de Braga, que conceberam o escadório dos Cinco Sentidos e escolheram, na fábula e na Bíblia, as figuras que ornamentam os muros, as fontes e respectivas inscrições que cada uma ostentava.” (Massara 1988:69)

Entre as inúmeras edificações observadas no santuário de Braga, desde as Capelas da Via Dolorosa, as esculturas do Antigo e Velho Testamento, o terreiro de Moisés, o adro da Igreja, o Templo, Terreiro dos Evangelistas, as representações das Virtudes Teologais, encontra-se o Escadório34 dos Cinco Sentidos.

Pois bem, não é intenção tecer o histórico do Escadório dos Cinco Sentidos, até mesmo porque há autores que já se empenharam em tal feito. Deste modo ir-se-á ficar na tentativa de entender os símbolos que encerra.

Se na análise da Via Crucis foi usada em alguns momentos a denominação VIA DOLOROSA, pois o sacrifício é o princípio, o Escadório dos Cinco Sentidos poder-se-á denominar como VIA SENSÍVEL, por estar diretamente ligado às sensações. Se, como afirma Rothen, as sensações e percepções

estão estritamente ligadas aos órgãos dos sentidos, de uma forma clássica os sentidos externos (cinco sentidos), e estes recebem influências dos objetos externos, o que é percebido pelas sensações, e produz em nós os primeiros contatos com a realidade para formarmos os conhecimentos. Com os sentidos obtemos conhecimento daquilo que é concreto, os objetos que ocupam lugar no espaço. (Rothen 2012:03)

E se, segundo Aristóteles afirma,“nada chega ao intelecto sem antes ter passado pelos sentidos” (apud Rothen 2012:09), significando com isso que a inteligibilidade é a abstração dos conceitos universais do conhecimento os quais devem ocorrer primeiramente passando pelos sentidos e pelas percepções sensoriais.

Pode-se entender que a maneira como o ser humano recebe as suas informações é um processo cognitivo que acontece esse no plano do conhecimento sensitivo e do intelectivo e quem alimenta esse plano são os sentidos.

                                                                                                                         

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O filósofo Thomas Reid, dentro das limitações científicas de seu tempo, acreditava que era possível entender a natureza humana partindo do princípio baseado na observação e na investigação dos cinco sentidos; Segundo dentro da sua teoria da percepção, isso se dá “por uma lei de nossa natureza”, ou seja, em virtude constituição natural do homem (Reid apud Pereira 2009). Portanto, conforme o pensador escocês o ser humano concebe sensações e acredita na existência delas. Pereira apresenta deste modo a teoria de Reid:

Portanto, o que percebemos é que o modelo padrão da percepção de Reid pode ser delineado da seguinte forma: um objeto externo causa alguma mudança física em algum órgão dos sentidos que, pelas leis de nossa natureza, causa alguma sensação na mente. Essa sensação, novamente segundo as leis de nossa natureza, faz surgir uma concepção e uma crença sobre o objeto externo, que são imediatas. Temos, assim, o que Reid chama de percepção. Dizemos, então, que o argumento de Reid repousa sobre a tese de que a percepção implica crença na existência da coisa percebida. (Pereira 2009:133-134)

Assim, é função da percepção e da sensação recolher informações do ambiente que são recebidas pelos órgãos dos sentidos. Desde modo a energia do ambiente é codificada, organizada, selecionada e interpretada pelas sensações. Este intercâmbio de informações é peculiar; segundo Pallasmaa “eu empresto minhas emoções e associações ao espaço e o espaço me empresta a sua aura, a qual incita e emancipa minhas percepções e pensamentos.” (Pallasmaa 2005:11)

Juhani Pallasmaa traz ainda a informação de que na Renascença havia uma hierarquização dos sentidos e esta estava relacionada com a imagem do Corpo Cósmico35; assim a VISÃO se correlacionava com o FOGO e a LUZ; a AUDIÇÃO ao AR; o OLFATO ao VAPOR; o PALADAR à ÁGUA e o TATO a TERRA, e amplia mais “a visão está no topo e o tato na base.” (Pallasmaa 2005:16)

Após essas breves palavras, volta-se ao Escadório dos Cinco Sentidos para então poder iniciar a descrição das imagens nele produzido.

O homem escolheu a arte para representar o complexo universo cultural para expressar suas ideias e comunicar-se com o mundo, utilizando pinturas, esculturas, arquitetura (entre outras) para manifestar esse conhecimento acerca da produção imagética. Como era o produtor artístico do século XVII. Este homem era um ser crente e buscava interpretar o que os encomendadores solicitavam baseados nas Escritas

                                                                                                                         

35Segundo a Teosofia, todo corpo cósmico é uma entidade formada por uma estrutura interna invisível e

uma estrutura externa, frequentemente visível. Teilhard de Chardin contempla o Universo como Corpo Cósmico de Cristo. (apud Frei Beto, O Corpo Cósmico)

Sagradas e ou simplesmente realizando o que lhe foi pedido dentro dos padrões artísticos da época que era baseado na ornamentação do Barroco com passagem para o Rococó. Desde modo imagens sagradas e profanas irão se misturar para resultar numa beleza pura que nos remete às mais sublimes interpretações simbólicas.

Sobre as fontes do Escadório, Correia descreve a sua interpretação:

(...) Descendo pela fuste, a água alude, lance a lance, a cada um dos cinco sentidos. A ordem clássica do elenco, do mais material para o mais imaterial (do tacto à vista), aparece aqui aparentemente invertida (da vista ao tacto) aos olhos do peregrino que sobe ao monte.(...) Já fora da série, acrescenta-se um fontenário de recapitulação, com cinco bicas. Encerra ele o curso descendente da água (discurso sobre a Revelação), mas abre o percurso ascendente da via-crucis (o discurso sobre a Redenção). (...) Em sentido descendente chamar-se-lhe-ia dos Cinco Sentidos. Em sentido ascendente, melhor lhe caberia o nome das Cinco Chagas. (...) A encimar ambos os campos, o inferior com a heráldica das Quinas, e o superior com alusões à Paixão, oferece-nos num bem lapidado engaste, a chave de leitura: PURPUREOS

FONTES ODIUM RESERAVIT ADOXUM NUNC IN CRYSTALLOS HIC TIBI VERTIT AMOR. (2011:49)

O Escadório é formado por seis fontes: Purpureos Fontes, Fonte dos Olhos (Vir

Prudens), Fonte da Audição (Idithun), Fonte do Olfato (Vir Sapiens), Fonte do Paladar

(Joseph), Fonte do Tato (Salomão). Cada fonte tem diferentes elementos interpretativos, mas é a água, comum em todas. A água está presente não só no escadório, mas nas capelas dos Passos da Paixão do Bom Jesus do Monte de Braga e em outros locais da estância; Lurker nos diz: “A água, que cai do céu e forma fontes e ribeiros, é o meio mais comum para o refrigério dos que tem sede, para eliminar a impureza e para o combate ao fogo.” (Lurker 1993:2) No caso da água que jorra das fontes do escadório do Bom Jesus há uma passagem bíblica que em opinião permeia a interpretação: “Quem beber da água que eu lhe der, nunca mais terá sede.” (Jo 4,7-14); o peregrino deverá alimentar o seu corpo com o conhecimento que cai nestas fontes que são representadas nos cinco sentidos, pois a água também interpreta a força curativa de Cristo. Lurker (1993:03) acrescenta “A aspersão com a água benta, como, por exemplo, ao entrar nas igrejas, é símbolo de purificação espiritual e, ademais, recordação do batismo.” Chevalier e Gheerbrant finalizam focando a ideia de Lurker: “Em todas as outras tradições do mundo, a água desempenha igualmente papel primordial, que se articula em torno de três temas: prima matéria, pureza e vida”(Chevalier e Gheerbrant 2009:19), comentando que a simbologia da água num sentido descente e celeste, é a chuva, representando o masculino: a semente que fecunda a terra; a água nascente, que brota da terra é feminina, a fertilidade. E partindo desse, a água em um sentido

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masculino e feminino, iremos encontrar outro símbolo nos escadórios que merece ser interpretada, a concha. A concha por sua vez produz uma interpretação feminina: ela abriga a pérola num sentido embrionário. Eliade interpreta: “(...) a semelhança entre as conchas dos mariscos e os órgãos genitais da mulher, as relações unindo ostras, as águas e a lua, enfim, o simbolismo ginecológico e embriológico da pérola, formada na ostra.”(Eliade 1991:123) Mircea Eliade acrescenta também, em seus comentários sobre a concha, ser este um elemento da fertilidade que várias civilizações utilizaram como emblema significativo para representar a mulher “(...) desde os tempos pré-helênicos, as conchas estiveram em estreita relação com as Grandes Deusas. (...) o mito de Afrodite nascida de uma concha foi provavelmente propagado no mundo mediterrâneo.”(Eliade 1991:129) Mas também a concha foi utilizada nos ritos fúnebres, nos monumentos romanos simbolizavam a ressurreição.

Outro significado da concha (ou vieira) encontra-se na referência aos caminhos de Santiago de Compostela:

A vieira é o mais antigo símbolo conhecido de representação do peregrino, e é mencionada pela primeira vez com esse significado no sermão Veneranda Dies, que compõe o livro I do Liber Sancti Jacobi, parte integrante do Código Calixtino, datado de meados do século XII. Nesse sermão, a vieira é apresentada como símbolo das “boas obras”, sendo levada pelos peregrinos cosida às suas roupas para honrar a São Tiago. Extrai-se do Veneranda Dies o seguinte excerto: “As duas partes ou valvas são o símbolo da caridade, do amor de Deus e do amor ao próximo. A concha se assemelha a uma mão que se abre para realizar boas obras, porque o peregrino deve ser dadivoso, casto, sóbrio e deve extirpar tudo o que seja origem de pecado”.36

Com essas considerações sobre a simbologia da água e da concha pode inferir-se que esses elementos no escadório possuem um conjunto em que se assemelham, pois a concha necessita da água para a existência e ambas possuem um significado ligado à fecundidade, à vida. Pensando no escadório como uma Via Sensível, a vida é pulsante para o peregrino que busca nestes locais acalanto para a suas dores espirituais e/ou físicas, pois, possível associar a entrada no escadório como um momento de resgate da vida unida pela água e concha, e a concha como um copo para suprir a sede e revigorar a caminhada.

                                                                                                                         

36Trecho do livro “O Caminho do Coração – rumo a Santiago de Compostela” disponível

 

Figura  48  –  Detalhe  representação  da  Concha  com  água  –  foto  acervo  da  autora

 

Outro símbolo que se encontra no escadório é a representação da águia seguida na mesma fonte (da Visão, figura 49) pelo sol37; Em Chevalier e Gheerbrant a águia é a “Rainha das aves, encarnação, substituto ou mensageiro da mais alta divindade uraniana e do fogo celeste – o sol, que só ela ousa fixar sem queimar os olhos.” (Chevalier e Gheerbrant 2009:22) Talvez por isso ela esteja juntamente com o sol na fonte dos olhos; Chevalier e Gheerbrant complementam: “A águia a fixar o sol é também símbolo da percepção direta da luz intelectiva. Ela olha o sol bem de frente e sem temor.” (Idem) O sol aparece nesta fonte por estar ligado ao mito da águia, e representar a luz divina. Nesta fonte a água jorra dos olhos da imagem representando a pureza e a vida. Na mão esquerda dessa representação a imagem segura um óculos, simbolizando a fraqueza da visão perante o conhecimento, Deus e o sol, remetem ao mito da águia que quando a sua visão enfraquece busca rejuvenescer nas águas. Sobre esta fonte há uma escultura que está com a mão no peito e os olhos para cima, numa pose que é momento da oração.

                                                                                                                         

37  nos remetendo a Pallasmaa sobre o comentário da relação com o Corpo Cósmico, em que os olhos são

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Figura  49  –  Detalhe  da  Fonte  dos  Olhos  –  águia  e  sol  –  foto  acervo  da  autora

Na fonte da Audição (figura 50), a água jorra pelos ouvidos, como se neste ato se pudesse lavar e extirpar o que não se quer ouvir. Esta fonte está ladeada da representação do boi, repetida três vezes. Pode colocar-se a hipótese se realmente estas imagens são a representação de boi ou de touro; por norma nos dicionários de símbolos cristãos essa imagem se remete ao touro, “ainda que algumas tradições se diga ‘bois’ segundo Lurker (1993:240) que continua: “Por seu valor material e por causa da ideia da força fecundante, da fertilidade do significado simbólico em ligação com a vida, escolhiam-se os touros especialmente para determinadas ocasiões como sacrifício;” e Chevalier e Gheerbrant (2009:137) comentam que o boi, ao contrário do touro, é símbolo da bondade, de calma e força pacífica, que possui capacidade de trabalho e de sacrifício; é evidente que esse animal possui um aspecto de doçura e de desapego que evoca contemplação. Na Antiguidade grega o boi era um animal sagrado que, muitas vezes, era imolado em sacrifício38. Conta à mitologia que Apolo tinha os seus bois e

estes foram roubados por Hermes;39 então para Apolo perdoar Hermes pediu em troca a

sua lira que era feita pelos nervos da pele de boi. Talvez esteja aí o motivo de essa fonte associar a audição com o boi, pois a lira emite um dos sons mais sublimes aos ouvidos;

                                                                                                                         

38  O qual os gregos chamavam de “hecatombe”, um sacrifício com cem bois.

39“A lira foi inventada por Hermes. Símbolo da harmonia cósmica possuía sete cordas: sete planetas;

essa fonte tem ainda esculpida a figura de um mancebo que toca cítara, o rei David tocando harpa e uma mulher tocando lira.

 

Figura  50  –  Detalhe  da  Fonte  da  Audição  –  foto  acervo  da  autora

Outra relação possível que pode fazer-se desse “mancebo” é associá-lo a Orfeu, que foi representado pela arte em diversos locais, como em catacumbas e mosaicos. Na representação artística, Orfeu aparece tocando harpa (instrumento que muitas vezes é confundido com a lira) e cercado de animais. Lurker explica essa simbologia: “Equivale a um símbolo de Cristo, o verdadeiro Orfeu, que, com seu canto, o logos harmoniza homem e cosmos.” (Lurker 2006:500) Assim, a voz de Cristo penetra em nossos ouvidos e, como água, limpa e purifica, harmoniza e educa com seus ensinamentos.

A fonte do Olfato, figura 51, (a água é expelida pelas narinas) integra outro animal: o cachorro ou cão. O cachorro sempre foi um animal apreciado pelo homem e recebeu o titulo de “melhor amigo do homem” devido sua fidelidade, sendo conhecido por ser excelente farejador e por possuir uma sensibilidade olfativa aguçada.

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Figura  51  –  Detalhe  da  Fonte  do  Olfato  –  foto  acervo  da  autora

Na antiga Roma, o uivar dos cães era sinal de desgraça e morte, pois se acreditava que os cães podiam ver espíritos. Cérbero (grego) e Garm (germânico) eram considerados os guardiões no portal do mundo dos mortos. No Egito o deus da morte fundiu-se entre homem e chacal (cão), Anúbis. Lurker informa que “Entre os Santos Padres os cães que lambem feridas são considerados um símbolo dos pregadores, que com sua língua (palavra) tocam a alma dos pecadores (...)”; e explica mais:

Como símbolo da fidelidade, o cão aparece em esculturas de túmulos da Antiguidade e medievais e como atributo da virtude teológica Fides (fé); em sentido negativo é cavalgadura da Invídia (inveja). (Lurker 2009:114)

Finalizando, pode-se associá-lo com a fidelidade, ser fiel em Cristo. Assim essa fonte nos incita em “farejar” o incrédulo e o inimigo que se aproxima e anunciá-lo com seu sonido.

 

Figura  52  –  Detalhe  da  Fonte  do  Olfato  –  foto  acervo  da  autora

Continuando na linha de compreensão da presença da representação de animais, na Fonte do Paladar, figura 53, (a água é expelida pela boca) está a imagem do macaco. Na totalidade são três representações. Há muitas simbologias em torno do macaco: representado como signo do zodíaco Chinês e Asteca; no templo de Nikko40 são representados em três em que o primeiro tapa os ouvidos, o segundo, os olhos e o terceiro, a boca, simbolizando a expressão da sabedoria e da felicidade; no Egito é encarnação de Tot (patrono dos sábios e dos letrados); no Japão, ele afasta os maus espíritos; mas no geral ele irrita, é aventureiro, brincalhão. Chevalier e Gheerbrant comentam: “Na iconografia cristã, ele é frequentemente a imagem do homem degradado por seus vícios e, em particular, pela luxúria e malícia.” (Chevalier e Gheerbrant 2009:575) Partindo desse comentário, na fonte do Paladar podemos entender que a representação do macaco é uma advertência aos vícios carnais do homem, até mesmo porque o macaco, provocativo e brincalhão, está representado segurando uma maçã, fruta proibida da árvore do conhecimento e símbolo genesíaco da tentação e do pecado. Assinale-se que na fábula da Branca de Neve e na Alta Idade Média a maçã representava a morte.

                                                                                                                         

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Figura  53  –  Detalhe  da  Fonte  do  Paladar  –  foto  acervo  da  autora

Assim essa fruta doce e vermelha é convidativa aos vícios, sinônimo de provação; o sabor da fruta no paladar é a demonstração do livre arbítrio, o destino de cada um associado à vontade própria.

 

Figura  54  –  Detalhe  da  Fonte  do  Paladar  –  foto  acervo  da  autora

Finalmente a quinta fonte dos Sentidos, a Fonte do Tato, figura 55. Na sua representação há uma pessoa segurando um cântaro de onde cai água. O tato por sua vez

na literatura e no senso comum é representado pela mão, que exprime a ideia de produtora de atividades e ao mesmo tempo de poder e dominação. “Na tradição bíblica e cristã, a mão é o símbolo do poder e da supremacia. Ser alcançado pela mão de Deus é receber a manifestação de seu espírito.” (Chevalier e Gheerbrant 2009:591) Deste modo, quando a mão de Deus toca o homem, este recebe força divina. Já no Antigo Testamento a mão de Deus significa a totalidade de seu poder e de sua eficácia: a mão que cria, protege, também destrói e se opõe. Pallasmaas (2005) escreve em seu livro que o Tato representa a terra, consequentemente faz pensar na relação do tato (mãos) com o cultivo da terra visto como ferramenta para fazer a terra produzir.

Mas a mão também pode ‘ver’, pois também está ligada ao conhecimento, à visão, a linguagem. A linguagem dos sinais dos surdos e a ‘visão’ dos cegos para identificar objetos e ler em braile. Essa linguagem das mãos também foi utilizada por vários povos que realizavam danças ritualísticas em que as mãos e dedos bailavam com significados diversos; é o caso dos hindus, por exemplo. Nas artes plásticas, quando se representa a mão divina a esquerda é associada com a justiça e a mão direita à misericórdia, ou as palmas das mãos voltadas para o céu representam a pacificação, assim a imagem se comunica com seu espectador.

 

Figura  55  –  Detalhe  da  Fonte  do  Tato  –  foto  acervo  da  autora

Para Zilles, (1990:60) “A mão sempre foi símbolo de força, trabalho, de comunicação interpessoal (...) a mão pede, manda, toca, comunica; a mão quer

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expressar algo invisível.” O tato ativa também todos os outros sentidos, pois o tato irradia através do toque na pele toda uma sensibilidade.

Nesta Fonte encontra-se a representação da aranha; este aracnídeo tem entre as suas simbologias, na Índia, ser observada como a tecelã do mundo sensível “Visto que produz de si mesma os fios de sua rede, como o Sol os seus raios, é também símbolo solar, e deste ponto de vista, a rede pode representar também a emanação do espírito divino.” (Lexicon apud Marques 2010:6); e aponta mais: “Já na Bíblia a aranha aparece como símbolo de fragilidade e de esperança vã, por causa de sua rede pouco resistente.” (Idem) Neste pensamento, realmente a fonte agrega essas duas interpretações referentes ao Cristo: Ele mesmo produz seus raios que emanam a sua espiritualidade sobre a terra, como também demonstra a sua fragilidade enquanto homem que sofreu as dores piores possíveis para “salvar” e dar esperança à humanidade.

 

Figura  56  Detalhes  da  Fonte  do  Tato  –    aranha  -­‐  foto  acervo  da  autora      

 

Figura  57  -­‐  Detalhes  da  Fonte  do  Tato  –    aranha  -­‐  foto  acervo  da  autora

Nas Fontes dos Cinco Sentidos, de modo geral, agregam-se diversas simbologias referentes a questões relacionadas à compreensão do mundo que cercava aquele homem que vivia naquele ambiente e dentro das questões políticas, econômicas, sociais e religiosas do seu tempo. Os adornos encontrados nas fontes como as representações da fauna e flora foram produzidos baseados nos modismos da época com variação entre o

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Barroco e o Rococó, que se utiliza de volutas, arabescos dispostos simetricamente dentro de um complexo artístico primoroso.

As Fontes dos Cinco Sentidos, produzidas no complexo do Santuário do Bom Jesus do Monte de Braga têm como função aguçar os sentidos que, diante das suas imperfeições, necessitaram depurar e interpretar observando as ilusões, enganos e falhas; desde modo passar pela VIA SENSÍVEL é perceber o que cada momento