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A política de bonificação do estado de Pernambuco, entendida como retribuições especiais ou complementares ao salário devido à realização de determinada tarefa esperada ou cumprimento de metas, é uma mediação essencial ao modelo de gestão e organização do trabalho na TESE. Na organização e gestão do trabalho na fábrica pensado por Taylor, o objetivo era estimular esforços excedentes dos(as) trabalhadores(as) levando em conta, todavia, que a gratificação adicional não poderia conduzir por si só um sistema de gestão do trabalho. Considerava Taylor (2006, p. 89) que

É absolutamente necessário, então, quando os trabalhadores estão encarregados de tarefa que exige muita velocidade de sua parte, que a eles também seja atribuído pagamento mais elevado, cada vez que forem bem-sucedidos. Isto implica não somente em determinar, para cada um, a tarefa diária, mas também em pagar boa gratificação ou prêmio todas as vezes em que conseguir fazer toda a tarefa em tempo fixado.

No caso da TESE, a estratégia de bonificação, algo que perpassa o modelo do Procentro e o PEI, tem sua inspiração nos chamados incentivos de curto prazo (ICP) da TEO (Odebrecht). O ICP é apresentado no site143 da Odebrecht como uma iniciativa que “[...]

estimula a inovação e aumenta a produtividade”. Ainda é pontuado que se trata de uma “[...]

parcela variável da RT [renda total] do integrante [...] cuja apuração reflete um período máximo de 12 meses”. Por fim, a empresa afirma que tais remunerações adicionais são formas de valorizar

[...] o talento, espírito de servir, capacidade de inovar, disponibilizar conhecimento, de se relacionar e agregar valor para as comunidades.

143 Disponível em: https://www.odebrecht.com/ Acesso em: 07 jun. 2020.

Esses prêmios fazem parte de programas institucionais, concebidos e implementados na Odebrecht144.

Inspirado nessa estratégia, o modelo da TESE previa aos(às) professores(as) dos CEE:

o salário base; uma gratificação de 125% desse salário-base, por localização especial, ao ser integrado ao projeto; e mais uma gratificação de produtividade proporcional à pontuação obtida pelo professor. O valor dessa última pode chegar a 30% do valor da segunda parcela. Considerando que um professor tivesse o salário-base de 1000 reais, sua gratificação por localização especial seria de 1250 reais. Esse valor multiplicado por 12 meses é igual a 15000 reais. Portanto, a gratificação de produtividade, atingindo o escore máximo, era de 30% de 15000, ou seja, 4500. Note-se que esse valor corresponde exatamente a um 14° ou 15° salários, a serem pagos no mês de janeiro do ano subsequente ao avaliado (MAGALHÃES, 2008, p.

87).

A remuneração acabou se tornando um elemento chave para o desenvolvimento de esforços excedentes exigidos pela TESE. Sem falar que também era um importante atrativo para os(as) professores(as) da rede estadual de ensino dispostos a trabalharem nos Centros de Ensino Experimental já que eram proventos bem acima do que comumente se observava na realidade das escolas estaduais, principalmente, naquela época145.

Com o PMGP-ME e o pacto pela educação, a lógica organizacional da rotina meritocrática já presente no Procentro foi institucionalizada em diversas políticas, como podemos observar tanto em uma das principais diretrizes do PPE: “reconhecimento do mérito, desempenho, monitoramento e avaliação dos processos” (PERNAMBUCO, 2011, destaques nossos) ou no art. 2° do PEI que dentre suas finalidades busca:

VI - consolidar o modelo de gestão por resultados nas Escolas de Referência e Escolas Técnicas do Estado, com o aprimoramento dos instrumentos gerenciais de planejamento, acompanhamento e avaliação;

II - sistematizar e difundir inovações pedagógicas e gerenciais (PERNAMBUCO, 2008b, destaques nossos).

A presença dos termos “consolidar”, “aprimorar”, “sistematizar” e “difundir”

relacionados a aspectos da gestão gerencial por resultados é mais uma evidência da restauração da racionalidade empresarial da TESE do Procentro na política de educação integral do governo de Eduardo Campos. Demonstra também que foram necessárias inovações visando seu “aprimoramento” que dizem respeito às “sistematizações” e

“difusões”, como é o caso da estratégia da bonificação em análise.

144 idem

145 Início dos anos 2000.

Cumpre-se colocar que a política de bonificação é uma orientação prevista em diretrizes mais amplas, portanto, possui nexos com a política nacional vigente no que tange ao modelo gerencial de valorização docente como está explícito, por exemplo, no documento Compromisso Todos pela Educação. A saber:

XIII - implantar plano de carreira, cargos e salários para os profissionais da educação, privilegiando o mérito, a formação e a avaliação do desempenho;

XIV - valorizar o mérito do trabalhador da educação, representado pelo desempenho eficiente no trabalho, dedicação, assiduidade, pontualidade, responsabilidade, realização de projetos e trabalhos especializados, cursos de atualização e desenvolvimento profissional;

(BRASIL, 2007, destaques nosso)

No caso de Pernambuco, a estratégia de bonificação se transforma em política pública da rede estadual de ensino em 2008146, passando a se chamar Bônus de Desempenho Educacional (BDE) vinculado ao PMGP-ME e ao Pacto pela Educação. Algumas modificações foram realizadas em relação à estratégia do Procentro que dizem respeito ao conjunto dos valores investidos147 e nos critérios para premiação, deixando-a mais enxuta e dando mais visibilidade ao desempenho da unidade escolar como um todo e não ao(à) professor(a) isoladamente. Ficou estruturado da seguinte maneira: “I) desempenho da unidade escolar em Português em Matemática; II) Fluxo escolar e evasão; III) cumprimento das metas específicas de cada escola” (PERNAMBUCO, 2008h).

Assim, no novo formato, as escolas que alcançassem 50% da meta receberiam a metade do bônus, e a partir daí será considerado o intervalo de 10% até atingir 100% da meta.

Conforme artigo 4º, é afirmando que o pagamento do bônus ocorre quando a escola atinge pelo menos “[...] 50% (cinquenta por cento) da meta estabelecida em Termo de Compromisso de Gestão Escolar, e calculado, para cada servidor beneficiado, conforme critérios estabelecidos em Regulamento” (PERNAMBUCO, 2008h).

Há, no entanto, disparidades no que tange ao recebimento do bônus em função da carga-horária (jornada de trabalho). Os professores que possuem uma carga horária de 40

146 Lei nº 13.486, de 1º de julho de 2008. Institui o Bônus de Desempenho Educacional - BDE, no âmbito do Estado de Pernambuco, e dá outras providências.

147 O valor gasto com o BDE, segundo informações da secretaria de educação do estado de Pernambuco em 28/10/2016, saiu de 12 milhões (2015) para 15 milhões (2016) contemplando 502 escolas. Destas 342 atingiram 100% das metas e 160 atingiram entre 50 e 99%. Foram beneficiados com R$ 907,00 (quase o dobro de 2015) 19.553 professores e 3.387 técnicos de educação do Estado. Disponível em:

http://www.educacao.pe.gov.br/portal/?pag=1&cat=37&art=3196. Acesso em: 20/02/2018.

horas semanais (tempo-integral) podem alcançar um bônus de 199% do valor do salário base.

Já os das semi-integrais (32h) gratificação de 159% do valor do salário base.

Na contramão da persuasão há também o mecanismo de coerção do BDE. Se existe premiação, de um lado, para os “esforços excedentes” considerados exitosos, punem-se as escolas e os professores que tiverem seu desempenho avaliado como negativo, por outro. E mais: no caso dos(as) docentes, além de não receberem o bônus, podem ser desligados do PEI. Esse tipo de punição demonstra que também foram restauradas práticas de punição existentes no Procentro que remontam aos mecanismos mormente utilizados no âmbito empresarial.

Aprofundando a política gerencial da bonificação, em 2016 o governo de Paulo Câmara criou o Adicional de Eficiência da Gestão (AEG) - lei nº 15.973. A partir desta legislação, gestores, gestores adjuntos, secretários e educadores de apoios também passaram a receber uma gratificação concebida para estimular a equipe gestora. Este adicional é concebido mensalmente e se traduz, dependendo da função exercida, num aumento que beira os 135% em relação à gratificação de representação do cargo. Os valores variam de R$ 300,00 a R$1.140,00 dependendo do porte da escola e função dos profissionais. Quando somados os valores das gratificações de representação e o AEG, as bonificações podem chegar a R$

2.400,00 (PERNAMBUCO, 2016).

O AEG gerou forte reação na categoria dos(as) docentes148 que denunciaram tal medida como incentivo desmotivador e que inferioriza a importância dos professores na escola149.

Para um estudo mais aprofundado do BDE e de como as estratégias de punição/premiação repercutem na organização do trabalho pedagógico e na gestão escolar da rede estadual de Pernambuco, especialmente das escolas do PEI, recomenda-se a pesquisa de Santos (2016).

O exame das ações implementadas pelo estado de Pernambuco em função do PEI expressa o papel fundamental que exerce na condição de “educador”, sem qual a filosofia,

148 Em matéria publicada no seu portal, o Sindicato dos Trabalhadores de Pernambuco (Sintepe) se posicionou de maneira contrária ao AEG e defende que “os recursos financeiros sejam utilizados para a melhoria do salário do professor, que é o pior do Brasil” (SINTEPE, 2013). Como projeto alternativo, assevera que seria mais viável utilizar o dinheiro investido no BDE por dentro do “Plano de Cargos e Carreira e na forma de salário, repercutindo também na aposentadoria e não apenas uma gratificação paga anualmente e com critérios nunca esclarecidos” (idem). Consultar em: < http://www.sintepe.org.br/site/v1/index.php/saiunamidia/4601-2017-08-23-17-35-28> Acesso em: 08/04/2018.

149 Consultar em: https://www.sintepe.org.br/site/v1/index.php/publicacoes/coluna-semanal/3651-bde-e-municipalizacao. Acesso em: 31/12/2019.

métodos de gestão e estrutura da TESE não se generalizaria na rede estadual de ensino.

Direcionadas ao controle da rotina de trabalho docente, são ações que combinam consenso e coerção e se manifestam como rupturas [gestão escolar], continuidades [avaliação, bonificação, formação] e inovações [monitoramento, tecnologias, currículo].

No próximo capítulo analisaremos qual é o perfil de docente exigido pela TESE e a estrutura ideológica mobilizada na produção de nexos psicofísicos.

6 AS COMPETÊNCIAS E OS IDEÁRIOS DA DOCÊNCIA SOB A TESE: NEXOS