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A Estética na Geração de Sentido

1.ª PARTE: CATEGORIAS DE ANÁLISE E QUADRO TEÓRICO

3.5 A Estética na Geração de Sentido

A conexão do leitor com a realidade se efetiva pela cor, porque a realidade é colorida e assim o homem percebe o mundo com cor.

Nossa visão reconhece a cor como elemento gerador de sentido. Ou seja, se paramos num sinal vermelho e se seguimos com o sinal verde, se levantamos a hipótese de uma carne estar estragada a partir da cor, se utilizamos determinadas cores de roupa para determinadas ocasiões, e se fazemos leituras do tempo a partir da cor do céu, é porque, enxergando a cor, somos capazes de atribuir significados diferentes a objetos que, tendo a mesma forma, tenham coloração diferente. Isso reafirma que, fisiológica e

10 Conurbação (do lat. urbis, cidade) é a unificação da malha urbana de duas ou mais cidades, em

consequência de seu crescimento geográfico. Geralmente esse processo dá origem à formação de regiões metropolitanas.

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culturalmente, o homem se habituou a decodificar as informações do mundo considerando a cor como um elemento gerador de significado.

Assim, como atribuímos sentidos diferentes a coisas de cores diferentes, quando nos deparamos com uma imagem em preto-e-branco temos dificuldade de atribuir sentido a seus elementos constitutivos, uma vez que uma parcela significativa dos elementos deflagradores de sentido ficou desativada. Por mais nítidos que sejam os contornos da forma, por mais que as retículas de cinza possam simular a cor real, a imagem em preto e branco é mais limitadora para o leitor que a mesma imagem colorida.

Isso explica porque certos fotógrafos preferem trabalhar com o preto e branco: em imagens artísticas, é importante deixar uma parcela desse significado para ser desvelada pelo leitor – e esse processo se potencializa se trabalhamos com uma imagem que não guarde relação objetiva e imediata com o objeto retratado.

Segundo Jackson (1994), o fenômeno da cor está na mente, devendo ser considerado a partir das características fisiológicas, físicas e psicológicas envolvidas no processo de visão. Daí a importância de ressaltar o processo de percepção visual, pelo qual o homem mantém o contato com o mundo, obtém informações sobre ele, conhece os objetos, os eventos, os lugares e suas representações no meio ambiente (p.67).

As imagens de satélite, uma vez colorizadas, se transformam em elementos híbridos, que combinam técnica e estética.

Esse tipo de imagem hoje está presente no nosso cotidiano, se popularizando, por exemplo, nos telejornais na previsão do tempo, na web no acompanhando dos últimos movimentos de um ciclone, de um tsunami e até do desmatamento na Amazônia, nos aparelhos de última geração, como os GPS11, que permitem a movimentação segura e com grande precisão na superfície do planeta.

Imagens que são lidas a partir de um texto decifrável, atrativo pela composição e harmonização das cores. Há dois tipos de imagem de satélite colorizada. No primeiro tipo, a imagem precisa ser lida e devidamente decodificada pelo leitor comum; esta

11 O sistema de posicionamento global, popularmente conhecido por GPS (acrónimo do original inglês

Global Positioning System, ou do português "geo-posicionamento por satélite") é um sistema de navegação por satélite que fornece a um aparelho receptor móvel a posição do mesmo, assim como informação horária, sob todas quaisquer condições atmosféricas, a qualquer momento e em qualquer lugar na Terra, desde que o receptor se encontre no campo de visão de quatro satélites GPS.

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quanto mais próxima do real, mais facilmente atingirá seu objetivo, equivalendo ao texto escrito em linguagem jornalística (Figura 18). O segundo tipo é a imagem colorizada a partir de um ponto de vista prioritariamente estético, que objetiva gerar um objeto belo o suficiente para deflagrar o processo de fruição. Esta última se aproxima do texto escrito em linguagem literária (Figuras 19 e 20).

Do ponto de vista da recepção estética, podemos dizer que a leitura da imagem de satélite com sentido e fruição requer um trabalho técnico com aptidões estéticas o que decorre da expressão dinâmica de cores e formas. Atribuem muitas vezes que as qualidades estéticas ou artísticas das imagens sejam pura questão de bom gosto, de esquema de cor harmonioso e apelo sensorial. Entretanto uma imagem trabalhada técnica e esteticamente, pode traduzir os aspectos salientes da mensagem nas qualidades expressivas do meio de expressão, de tal modo que a informação seja obtida com um impacto direto de forças perceptivas.

São imagens fruíveis, que não remetem à geração de sentido, mas que existem apenas para apresentação do belo.

Figura 18: Imagem de satélite do fenômeno popularmente conhecido como "Encontro das Águas". A confluência entre o rio Negro, de água preta, e o rio Solimões, de água barrenta. Por uma extensão de mais de 6 km, as águas dos dois rios correm lado a lado sem se misturar.

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Figura 19: Vulcões - "Estudo no azul”. Cones vulcânicos ao longo da fronteira Chile-Argentina cerca de 1800 vulcões espalhados por esta região, 28 estão ativos. A imagem foi tirada pela Enhanced Thematic Mapper plus (ETM +) instrumento a bordo do satélite Landsat 7.

http://www.gizmodo.com.br/conteudo/imagens-de-satelite-transformam-terra-em-pintura/

Figura 20: Mistura de areia e pântanos do deserto de Dasht-e-Kavir, no Irã. Imagem de satélite Landsat 7 que usou a combinação de 8 faixas do espectro.

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Para textos diferentes, com objetivos diferentes, colorizações diferentes. No primeiro tipo, a marca de cada elemento deve estar clara o suficiente para fornecer ao leitor os elementos que vão permitir o acesso ao seu repertório; no segundo, o único compromisso é com a harmonia das formas e cores, deflagrando não uma leitura racional e objetiva do objeto-texto-imagético produzido, mas uma leitura sensorial e subjetiva desse objeto.

Para Gagliardi (1990) a estética é uma "forma de conhecimento sensorial", em contraposição ao conhecimento intelectual. É uma "forma expressiva de ação", desinteressada e sem uma finalidade instrumental específica. É uma "forma de comunicação" diferente da comunicação oral e é caracterizada pela possibilidade de partilhar sentimentos e conhecimentos tácitos, os quais não podem ser explicados ou codificados. Enfim, a estética é uma forma de apreendermos a realidade moldada por nossas experiências sensoriais. A estética está associada ao belo, mas não exclusivamente a ele. Estão ligados, da mesma forma, à unidade, à integridade e à harmonia, atributos presentes nas obras de arte.

A sensibilidade estética surge nesse processo de percepção dos objetos que transcende a dimensão utilitária direta e ultrapassa uma atitude unívoca diante da realidade. Na relação estética o sujeito entra em contato com o objeto mediante a totalidade de sua riqueza humana, não apenas sensível, mas também intelectiva e afetiva. Os fenômenos naturais só se tornam estéticos quando adquirem uma significação social e humana.

O prazer estético nasce da compreensão do sujeito com respeito à prática que vive, envolve participação e apropriação. Na atitude estética, o leitor deleita-se com o objeto que lhe é exterior. Descobre-se, apropriando-se de uma experiência do sentido do mundo. Diante da obra percebe sua própria atividade criativa de recepção da vivência alheia. É a consciência desse processo que gera o prazer estético. Em outras palavras, para o sujeito, a experiência estética consiste em sentir e saber que seu horizonte individual, moldado à luz da sociedade de seu tempo, mede-se com o horizonte da obra e que, desse encontro, lhe advém maior conhecimento do mundo e de si próprio. Eis a essência do prazer estético. (Manguel,2010).

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Assim a imagem de satélite colorizada esteticamente nos leva a descobrir formas até então inusitadas de perceber o mundo, acionando o repertório individual do leitor, entrando em contato com marcas, pistas e indícios textuais, que funcionam como uma espécie de roteiro, o que faz com que o leitor não se perca e que o sentido gerado pela leitura seja pertinente. Embora cada leitor, por ter acumulado experiências distintas, siga pistas diferentes e construa livremente sentidos sobre o que lê, existem fios que conduzem à rede de construção de significado.

Para Iser (1996), o requisito primeiro a presidir a leitura é a reciprocidade entre o texto (polo artístico) e o leitor (polo estético), a imagem de satélite, é um texto visual, é uma obra potencialmente capaz de suscitar a experiência estética naquele que se compromete com a recepção, pois todo conhecimento é obtido pelo forte componente visual.

O tipo de conhecimento resultante através da informação geográfica é devido ao fato da imagem de satélite retratar certos aspectos visuais dos objetos que representa. As imagens orbitais estimulam o raciocínio biogeográfico a partir da visualização mais abrangente do espaço. Gonçalves (2005) enfatiza a contribuição das imagens de satélite nos estudos do meio ambiente devido à sua abrangência espacial que possibilita perceber as inter-relações de um fenômeno pontual e suas implicações regionais e globais. Podemos entender então que mapas e imagens provenientes das geotecnologias nos dão um instante no qual estão sendo representados diversos fenômenos situados no espaço-tempo.