por exemp lo, é u ma categoria presente na visão de mundo de ativistas, acadêmicos e gestores,
2.3 A CRIAÇÃO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, ALFABETIZAÇÃO E DIVERSIDADE NO
2.3.1 A estrutura administrativa da SECAD
Bactérias no meio é cultura. (Arnaldo Antunes)
Apresento aqui uma breve descrição sobre a estrutura administrativa da SECAD, pois foi neste setor que as políticas públicas de combate à homofobia na educação foram gestadas, elaboradas e desenvolvidas ao longo do governo Lula. O conhecimento de sua estrutura nos possibilita entender, nos moldes propostos por Bruno Latour (1983), uma instituição/laboratório que se autodefine por seu papel de mediação entre Estado e sociedade civil.
A SECAD é uma agência de governo dividida em “departamentos” e “coordenações”. Essa divisão tem impacto sobre a forma como são executadas as políticas, na medida em que as tarefas relacionadas à agenda anti-homofobia são atribuídas institucionalmente a essas diferentes unidades. Como essas atribuições são tratadas nos diferentes capítulos desta tese, optei por introduzir o leitor nessa estrutura administrativa particularmente com base no trabalho de campo etnográfico e documental.48 Priorizarei uma apresentação da estrutura interna da SECAD balizada na observação participante e análise documental que resulta na centralidade de três departamentos que estão em diálogo com a agenda anti-homofobia. O primeiro é o “Departamento de Articulação Institucional da SECAD”;; o segundo é o “Departamento de Avaliação e Informação Educacional da SECAD”;; o terceiro é o “Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania”. Há uma série de outras coordenações que poderiam figurar nesta rápida apresentação, como a “Coordenação de Direitos Humanos”,
48 Não se encontra um organograma sistematizado da SECAD no site do MEC. O
“organograma oficial” que apresentarei na FIGURA 4 é fruto de uma busca longa na internet. Encontrei a figura no site <www.planalto.gov.br> e parece, mas não há dados suficientes para confirmar, u ma exposição de slides feita por u m gestor da SECA D em apresentação a uma “missão italiana”. No Decreto nº 5.159, de 28 de ju lho de 2004, há um organograma, mas não se poderia dizer que a estrutura regimental da SECAD esteve em sintonia com esse decreto durante as duas gestões do governo Lula.
mas, dada a sua pouca relevância na lógica nativa e para a análise como um todo, optei por mantê-las fora deste momento introdutório e ilustrativo e citá-las, quando relevante, ao longo do texto. Como afirma a música “Cultura”, de Arnaldo Antunes (em epígrafe), há sempre mais de uma possibilidade, se não infinitas, de se olhar uma situação e, nesse sentido, fazemos sempre os recortes que nos parecem produtivos, eficazes e rentáveis teoricamente. Optei por entender a SECAD a partir dos dados da agenda anti-homofobia, e esta me levou a esses três departamentos.
Conforme o Decreto nº 5.159, de 28 de julho de 2004 (ANEXO D), a estrutura regimental da SECAD se divide em quatro departamentos: “Departamento de Educação de Jovens e Adultos”, “Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania”, “Departamento de Avaliação e Informações Institucionais” e “Departamento de Desenvolvimento e Articulação Institucional”, além do “Gabinete do Secretário” com sua chefia (FIG. 4). O “Departamento de Educação de Jovens e Adultos” possui três coordenações-gerais sendo elas a de “alfabetização”, a de “educação de jovens e adultos” e a de “pedagogia de alfabetização e EJA”. O “Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania” possui cinco coordenações-gerais: a de “educação ambiental”, a de “diversidade e inclusão educacional”, a de “educação escolar indígena”, a de “educação no campo” e a de “ações educacionais complementares”. O “Departamento de Avaliação e Informações Institucionais” possui três coordenações-gerais: a de “sistemas de informação”, a de “acompanhamento de programas” e a de “estudos e avaliação”. O “Departamento de Desenvolvimento e Articulação Institucional” possui duas coordenações-gerais, sendo elas a de “articulação institucional” e a de “planejamento e convênios”. Como o “Departamento de Educação de Jovens e Adultos” não aparece nos dados sobre a agenda anti-homofobia, não é analisado neste tópico.
FIGURA 4: Organograma da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) do Ministério da Educação (MEC).
O Departamento que mais produziu discursos oficiais (por meio da publicação de notícias no sítio eletrônico da SECAD) sobre gênero e sexualidades, bem como sobre os princípios de governança na área, foi o “Departamento de Articulação Institucional da SECAD”. Se a SECAD/MEC produz suas políticas, como veremos, em articulação com o “núcleo social” do governo Lula, este departamento cumpre função essencial, visto possuir função, entre outras, de mediação e diálogo entre a SECAD e outras instituições, governamentais ou não (especialmente as conveniadas com esta Secretaria). Não há uma só política da agenda anti-homofobia nesta agência que não dialogue com outros órgãos tanto do “núcleo social” do governo Lula como de outras esferas de governança e também da sociedade civil. A própria substituição do primeiro secretário Ricardo Henriques por André Lázaro mostra que o saber produzido nesse departamento foi levado a cabo na escolha do segundo secretário a assumir a SECAD, uma vez que André Lázaro, antes de se tornar secretário, fora diretor do departamento. Além de André Lázaro, também foi diretor/coordenador-geral o gestor Francisco Potiguara Carvalho Júnior. Um dos exemplos de discursos que mostram o estilo de governança da SECAD associado a esse departamento é proferido por Francisco Potiguara Cavalcante Júnior, quando este anuncia a realização do “Seminário AIDS e Religião”, em parceria com o Ministério da Saúde (MS):
A Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC) é parceira do Ministério da Saúde na prevenção ao HIV através do Programa Saúde e Prevenção nas escolas. “É neste trabalho que o MEC tem sentido a necessidade de promover articulação com representantes religiosos”, afirma o diretor do Departamento de Desenvolvimento e Articulação Institucional da Secad, Francisco Potiguara (53).
Desta forma, a este departamento é atribuída a tarefa de “mediação” entre a agência e outras instituições sociais. Como a agenda anti-homofobia acontece com base na articulação entre o governo e a sociedade civil, mas também entre diferentes agências do “núcleo social” do governo federal, a “articulação institucional” ocupa lugar importante neste campo de políticas de combate à homofobia no MEC.
Associado à produção, estudo, demanda e compartilhamento de “dados” sobre as temáticas concernentes à SECAD está o “Departamento de Avaliação e Informação Institucional da SECAD”. Diferentemente do INEP, que é um instituto de pesquisas propriamente dito, este departamento também “compartilha” e divulga pesquisas de outras instituições e “produz” demandas para as pesquisas tanto do INEP como de outras agências. Assim, esse departamento é responsável pela construção das “demandas” por indicadores que envolvam as temáticas da SECAD. Um diretor que figurou nesse departamento durante o período estudado foi o gestor Jorge Telles, que, ao afirmar a inclusão de “novas questões” no Censo Escolar mostra, que, à medida que se densificam as agendas da SECAD, este departamento produz demandas aos institutos de pesquisa que possibilitam o adensamento teórico/estatístico das problemáticas enfrentadas pela SECAD:
A partir do próximo ano, o censo escolar vai contemplar perguntas relativas à inclusão social e
à diversidade na escola.49 Os novos
questionamentos abordarão temas como meio ambiente, combate à violência contra crianças e adolescentes, identidade cultural, questões étnico-
49 Segundo o Censo Escolar 2006, “em 2005, pela primeira vez o governo brasileiro inclu iu no
Censo Escolar u m encarte com perguntas específicas sobre ações de prevenção em DST/aids, ações de saúde sexual e saúde reprodutiva, prevenção ao uso de drogas e gravidez na adolescência” (BRASIL, 2006).
raciais, de gênero e orientação sexual [...]. Com esses novos dados, será possível propor programas e projetos para a promoção, permanência e sucesso de grupos sociais menos favorecidos em todas as etapas do ciclo estudantil [...]. Os resultados do censo ajudarão na criação de políticas públicas educacionais comprometidas com o fortalecimento de uma educação mais democrática e disposta a reconhecer e respeitar a diversidade de povos, culturas, tradições e de raça que o país possui, afirma Jorge Telles, diretor de Avaliação e Informações Educacionais da Secad [...]. Além do financiamento de programas de inclusão social, o resultado dos novos levantamentos do censo escolar norteará o Ministério da Educação nos projetos de formação continuada de professores, na elaboração de materiais didáticos e paradidáticos, e nos projetos especiais de atividades educacionais no contraturno (turnos, durante a semana, em que os alunos não estão em sala de aula) (57).
Entender a dinâmica em que as agências de governo demandam e traduzem os dados que guiam suas políticas públicas tem mostrado que os “problemas não estão lá” a priori, mas que, diferentemente disso, vão sendo produzidos e reforçados ao longo do processo de consolidação de agendas sociais no período estudado. Como afirmou Rosiléa Willie, gestora da SECAD envolvida na agenda anti-homofobia, “estávamos construindo o trem e o colocando no trilho” [Diário de Campo, 17/11/2010].
Em diálogo com as agendas anti-homofobia, antissexismo e antirracismo, na SECAD, está o “Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania”, com sua variante “Educação para a Cidadania”. Formalmente, possui como missão “promover uma política de educação inclusiva e de qualidade centrada na ética da diversidade” e, como objetivo geral, “planejar, orientar, coordenar e acompanhar a formulação de políticas educacionais voltadas para as comunidades indígenas, populações do campo e afrodescendentes em articulação com os sistemas de ensino”. Informalmente, este departamento ultrapassou o objetivo apresentado em suas atribuições, tendo produzido discursos relacionados tanto ao “combate às desigualdades sociais”, como de “promoção da cidadania” de populações entendidas pela SECAD como
marginalizadas e/ou excluídas dos sistemas de ensino. Respondendo a esses problemas, o departamento parece sempre afirmar “modelos de atuação” com formas consideradas mais eficazes de combate às desigualdades sociais no Brasil. O diretor que figurou neste departamento durante o trabalho de campo foi Armênio Bello Schmidt, cujo “cargo” é “diretor de Educação para a Diversidade e Cidadania da SECAD”, ou “diretor de Educação para a Cidadania da SECAD”. Como apontou o diretor Armênio, “para combater as desigualdades é preciso mostrar para os gestores experiências muito simples, mas de sucesso, que podem ser implementadas em qualquer escola do país” (4). Dessa forma, há uma unidade específica na SECAD preocupada com vulnerabilidades, exclusões e discriminações direcionadas às populações marginalizadas, que compõe, para a SECAD, o quadro de sujeitos da “diversidade sóciocultural”.
Entender a estrutura interna da SECAD abre pistas para como se implementaram as políticas anti-homofobia no MEC de modo que diferentes tarefas e demandas envolvidas nas políticas eram direcionadas a diferentes departamentos e coordenações com competências específicas.
2.4 A CRIAÇÃO DO GRUPO DE TRABALHO DO BRASIL SEM