por exemp lo, é u ma categoria presente na visão de mundo de ativistas, acadêmicos e gestores,
CAPÍTULO 3 – POLÍTICAS PÚBLICAS
3.2 IMPACTO DO “PAPEL DE ESTADO” NA AGENDA ANTI HOMOFOBIA
3.2.1 O Estado Indutor
A categoria “Estado Indutor” não é novidade na análise de governos brasileiros. No fim da Era Vargas (1946-1962), a “indução” foi um termo utilizado para classificar os governos que “induziam o desenvolvimento”, ou seja, criavam empresas públicas que competiam no mercado financeiro (GOMES;; VIEIRA, 2009). O “Estado Indutor” de Lula que ora apresento difere da análise institucionalista e econômica, pois é mais baseado no trabalho de campo da agenda anti- homofobia do que propriamente nos conceitos da ciência da Administração. Dessa forma, desenvolverei aqui uma noção de “Estado Indutor” situacional no sentido que responde, a partir do geral, a uma rede discursiva produzida no seio do específico. Apresentarei ambas as noções de “Estado Indutor” com base na divisão do governo Lula em “núcleo econômico” e “núcleo social” e, posteriormente, refletirei sobre a categoria com base em meu trabalho de campo.
Os primeiros usos da categoria “Estado Indutor” remetem ao período pós-Vargas como tendo sido “indutor do desenvolvimento”,
68 NUNES, Augusto. A candidata quer ser presidente sem sequer saber ser candidata.
Disponível em: <http://veja.abril.co m.br/blog/augusto-nunes/direto-ao-ponto/a-candidata-quer- ser-presidente-sem-sequer-saber-ser-candidata/>. Acesso em: 09 set. 2010.
com base na injeção de recursos públicos no mercado financeiro. É então uma categoria do setor econômico que dialoga com o trabalho, mas não propriamente com a pauta social que ora analiso. Como afirmam João Gomes e Marcelo Vieira (2009), é “Estado Indutor” aquele que possibilitou o contexto da estatização do campo da energia elétrica no Brasil, particularmente com a criação da Eletrobras em 1962. Seriam características do “Estado Indutor” do período pós-Vargas “uma maior participação do estado no setor elétrico, com aumento dos investimentos públicos, especialmente nas concessionárias estaduais” (GOMES;; VIEIRA, 2009, p. 300). Desse modo, a “indução” é de fato uma “ação”, e não um qualificador do “tipo” de Estado, ou seja, não é que “o Estado seja indutor”, naquele momento específico “o Estado induziu o desenvolvimento do setor elétrico”. Se o “Estado Indutor”, do ponto de vista econômico, diz respeito a uma ação de induzir; do ponto de vista da política social, ele é aquele que, como já apresentado, “cria as condições para que as coisas sejam feitas”. E a categoria “coisas” de Dilma Rousseff fala da participação do Estado no mercado financeiro, mas também ultrapassa essa noção, conferindo-lhe a possibilidade de interpretação como um “modelo de gestão”.
No final dos anos 1990, o termo “Estado Indutor” passa a se referir a um determinado “modelo de gestão”.69 Tal “modelo” preconiza a qualidade das políticas públicas de forma que outras instituições (inclusive a sociedade civil), com base na competência e expertise, passam a cumprir funções de executoras de ações do Estado. Esse “modelo” em que a sociedade civil executa políticas públicas, uma forma, portanto de resistência ao “intervencionismo”, atua na
69 Um dos exemplos de uso da categoria “Estado Indutor” como se referindo a um “modelo de
gestão” mais “competente” e “eficaz” foi a “reforma do Estado ” de Pernambuco imp lementada pelo governador Jarbas Vasconcelos, entre 1998 e 2002 (CA RVA LHO FILHO, 2006). Buscando “resgatar o desenvolvimento sustentável” de Pernambuco, foi proposta uma mudança que atuava em três frentes: (i) a construção de um “projeto de futuro”;; (ii) a realização de um ajuste fiscal; e (iii) u ma reforma de Estado (CA RVA LHO FILHO, 2006). Co mo aponta Acácio Ferreira de Carvalho Filho (2006), a reforma do Estado de Pernambuco “não se tratava [...] de simp lesmente redu zir o Estado, mas, s im, de criar u m novo estado em um mundo que se estava transformando velozmente” (p. 3). E a criação desse “novo Estado” envolvia “resgatar [...] a possibilidade do Executivo de definir e fazer cu mprir as políticas públicas que promovam o desenvolvimento e o bem-estar social, segundo os anseios da sociedade” (p. 2). Além disso, no “projeto de futuro” pernambucano, incluía-se a “participação popular”, com vistas a “inserir Pernambuco no ciclo das modernas economias competitivas e criar condições para enfrentar as desigualdades sociais” (p. 1). O respeito aos “anseios da sociedade”, dessa forma, cortam a “liberdade total” do Estado na busca do bem-estar social proposto pelo intervencionismo, preconizando a “participação popular” co mo forma de “escutar” a sociedade para “diagnosticar” os seus “anseios”.
complexificação dos nossos entendimentos entre público e privado, conjurando a consigna do movimento feminista de politização da vida privada (FERREIRA; MELO, 2003).
As principais críticas da oposição ao governo Lula defendem o “Estado Mínimo” e utilizam a categoria acusatória de “privatização do Estado” ao abordar o governo Lula. Como afirmou a oposição de direita ao governo Lula, “durante oito anos, o PT loteou as agências reguladoras, a administração pública direta e indireta, ministérios e estatais: um projeto de poder”.70
Dilma Rousseff tentava mediar essas acusações afirmando, como vimos, que o mito do “Estado Mínimo” é uma “tese falida” e que cabe ao presidente “mandar algumas coisas”.71 “Mandar”, portanto, é uma categoria que se insere no estilo de governança do governo Lula e estrutura, dessa forma, a “política de indução”. É esse “mandar” que se liga ao intervencionismo. “Mandar” soa, de alguma forma, como a “liberdade total” do Estado na busca do bem-estar social, o que enfurece o liberalismo e o neoliberalismo em seu princípio de “redução do Estado”.
Dilma Rousseff argumentou a favor do Estado:
É primário ficar nessa discussão de que o governo, para não ser chamado de intervencionista, seja um governo omisso, de braços cruzados, que não se interessa por resolver as questões da pobreza nem do desenvolvimento econômico.72
Se Dilma Rousseff não aceita, conforme se viu no trecho da entrevista acima transcrito, a classificação do governo Lula como “intervencionista” — conceito clássico colado à institucionalização dos direitos sociais, característico do período autoritário do Brasil e classificado como “Era Vargas” (CARDOSO, Fernando Henrique apud SILVA JUNIOR, 2003) —, a então ministra chefe da Casa Civil assume seu projeto de Estado como “Estado Indutor”:
foi o estado mínimo dos neoliberais que nos antecederam e que ficou conhecido pelas
70 Disponível em:
<http://www.ogirassol.com.br/pagina.php?editoria=Últimas%20Not%C3%A Dcias&idnoticia= 19943>. Acesso em: nov. 2010.
71 Disponível em: <http://acaoilheus.org/news/1368-qso-tupiniquim-usa-tese-falida-do-estado-
minimoq -diz-d ilma>. Acesso em: nov. 2010.
dificuldades de tudo aquilo que deixou de cumprir, porque era Estado do não: não planejava, não fortalecia as empresas públicas, não promovia alianças com o setor privado, não protegia o setor privado diante da crise, não incrementou o investimento público e não financiou o investimento privado. E, antes de ser Estado mínimo, foi um Estado omisso. Depois assistimos, no governo Lula, à construção do Estado indutor, que cria as condições para que as coisas sejam feitas, ao mesmo tempo em que cobra dos agentes econômicos que as coisas sejam bem feitas porque isso é o papel do Estado.73
3.2.2 O compromisso do governo Lula com o combate à homofobia